4. LIMITAÇÕES E PROPOSTAS DE APRIMORAMENTO
4.1. Limitações Identificadas
Apesar da previsão constitucional que confere aos Tribunais de Contas competência para fiscalizar a legalidade, legitimidade e economicidade da gestão pública (CF/88, art. 70), a ausência de práticas sistematizadas de avaliação de políticas públicas ainda representa uma limitação concreta à atuação do controle externo no Brasil. Essa deficiência se manifesta na baixa institucionalização de rotinas de monitoramento, na falta de indicadores específicos e na carência de relatórios temáticos voltados à Primeira Infância (LIMA, 2020).
No caso do Tribunal de Contas do Estado do Amazonas (TCE-AM), essa limitação se acentua diante das dificuldades logísticas e territoriais da região, que dificultam a execução de auditorias presenciais e o acompanhamento regular das políticas públicas implementadas em áreas remotas. A ausência de dados organizados e de uma política de transparência ativa sobre fiscalizações relacionadas à infância compromete a efetividade do controle social e o diálogo interinstitucional.
Lima (2020) destaca que a avaliação de políticas públicas requer sistematicidade, institucionalização e compromisso técnico com a identificação de impactos e a proposição de medidas corretivas. Na prática, porém, ainda prevalecem o improviso, o impressionismo e a continuidade de políticas ineficazes por força da inércia orçamentária e da ausência de filtros avaliativos eficientes (LIMA, 2020).
Essas limitações indicam a necessidade de repensar o papel do controle externo no acompanhamento de políticas sociais sensíveis como aquelas voltadas à Primeira Infância, especialmente em contextos de vulnerabilidade estrutural como o amazônico. Sem dados, indicadores e métodos institucionalizados de avaliação, o potencial de indução de mudanças estruturais pelas recomendações dos Tribunais de Contas permanece limitado.
4.2. Propostas de Aprimoramento
O aprimoramento da atuação dos Tribunais de Contas em relação às políticas públicas voltadas à Primeira Infância passa, inicialmente, pela adoção sistemática de auditorias operacionais com foco na utilidade, efetividade e impacto das ações governamentais. Conforme destaca Lima (2020), a avaliação de políticas públicas deve ser compreendida como um processo institucionalizado, contínuo e orientado por evidências, com o objetivo de verificar se os programas atingem de fato os resultados esperados e se os recursos públicos estão sendo empregados com eficiência e legitimidade (LIMA, 2020).
A aplicação prática dessas auditorias pode ser viabilizada por meio da internalização das diretrizes constantes na NBASP 3000 e na GUID 9020 da INTOSAI. Tais normas enfatizam a importância de critérios como planejamento, accountability, implementação e fortalecimento institucional como eixos de análise das políticas públicas. Sua adoção pelo TCE-AM permitiria não apenas maior rigor técnico na fiscalização, como também maior previsibilidade e transparência nos processos avaliativos (LIMA, 2020).
Outra medida essencial é a produção e divulgação periódica de relatórios temáticos sobre políticas públicas sensíveis, como as voltadas à infância. A sistematização de dados, achados de auditoria e recomendações específicas possibilitaria o acompanhamento público das ações fiscalizatórias, fortalecendo o controle social e a responsabilização administrativa. Tal prática é compatível com os princípios constitucionais da publicidade e da eficiência, e contribuiria para ampliar a legitimidade institucional do Tribunal de Contas.
Por fim, destaca-se a necessidade de capacitação técnica dos auditores para atuação intersetorial, sobretudo em temas complexos como os que envolvem saúde, educação, assistência e desenvolvimento infantil. O uso de ferramentas tecnológicas, a integração com outras instituições de controle e a criação de indicadores regionais sensíveis às realidades do Amazonas também se apresentam como estratégias relevantes para aumentar a capilaridade e a eficácia do controle externo em políticas públicas voltadas à Primeira Infância (LIMA, 2020).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo buscou analisar o papel do controle externo exercido pelo Tribunal de Contas do Estado do Amazonas (TCE-AM) na fiscalização de políticas públicas voltadas à Primeira Infância, a partir de uma abordagem bibliográfica e documental. Considerando-se a ausência de relatórios temáticos, diretrizes específicas ou auditorias públicas voltadas diretamente à temática no âmbito do TCE-AM, optou-se por investigar os fundamentos normativos e doutrinários que sustentam a atuação dos Tribunais de Contas nesse campo.
Verificou-se que a Primeira Infância, por sua relevância constitucional e social, exige políticas públicas intersetoriais, continuadas e orientadas por evidências. A Constituição Federal, o Marco Legal da Primeira Infância e as normas internacionais de auditoria conferem aos Tribunais de Contas as condições legais e técnicas para atuarem não apenas como órgãos de controle, mas como agentes de indução de melhorias na gestão pública.
Entretanto, no caso específico do TCE-AM, identificaram-se limitações estruturais e institucionais que dificultam o exercício pleno desse papel. A ausência de sistematização de dados, de auditorias temáticas e de indicadores regionais voltados à infância compromete a capacidade de fiscalização efetiva, especialmente em um estado marcado por desafios logísticos, geográficos e socioeconômicos tão significativos como o Amazonas.
Diante disso, propôs-se o fortalecimento da atuação do TCE-AM por meio da institucionalização das auditorias operacionais, da adoção de metodologias previstas em normas como a GUID 9020, da capacitação técnica de seus quadros e da produção regular de relatórios temáticos. Espera-se, assim, que este estudo contribua para o debate acadêmico e institucional sobre a importância da fiscalização das políticas de Primeira Infância e para o aperfeiçoamento do controle externo como instrumento de garantia de direitos fundamentais.
REFERÊNCIAS
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