Resumo: O presente artigo propõe uma análise crítica e profunda sobre a degradação do processo penal brasileiro, sua descaracterização principiológica e o afastamento do modelo acusatório consagrado pela Constituição Federal. A partir de uma abordagem doutrinária clássica e moderna, com base nos pilares estruturantes do devido processo legal, evidenciam-se os efeitos devastadores da politização do sistema processual. O trabalho revela como instituições públicas têm ultrapassado limites constitucionais, violando normas internacionais de direitos humanos e destruindo a essência do processo penal garantista, transformando o direito de defesa em simulacro. A desconstrução do sistema é analisada à luz do Código de Processo Penal, dos tratados internacionais de direitos humanos e da jurisprudência comparada.
Palavras-chave: Processo penal. Sistema acusatório. Devido processo legal. Politização da justiça. Direitos humanos. CPP. Constituição Federal. Pacto de San José.
INTRODUÇÃO
Na academia, quando a grade curricular alcança a matéria de processo penal, o professor responsável, logo no primeiro contato, começa a introduzir a Teoria Geral do Processo. Em regra, trata-se de disciplina já cursada anteriormente, mas que volta à tona para fundar a compreensão sistêmica do Direito Processual Penal. Ressalta-se o contexto histórico do processo, sua natureza jurídica, as condições da ação, a relação com outros ramos do Direito e, especialmente, os sistemas processuais e os princípios fundamentais.
Inspirada pelos ensinamentos clássicos de Giuseppe Bettiol, Francesco Carrara, Beccaria, Giuseppe Chiovenda, Enrico Túlio Liebman, Piero Calamandrei, Francesco Carnelutti, Manzini, Ada Pellegrini Grinover e Mauro Cappelletti, a doutrina brasileira importou e consolidou uma estrutura que deveria prezar pela imparcialidade, paridade de armas, contraditório, ampla defesa, dignidade da pessoa humana e pela supremacia da Constituição como marco regulador da ação estatal.
O sistema acusatório, consagrado expressamente com a promulgação da Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime), estabeleceu, no artigo 3º-A do CPP, a vedação à iniciativa probatória do juiz e à sua atuação na fase investigatória. A separação de funções tornou-se cláusula pétrea da ordem democrática: investigar é tarefa da polícia judiciária; acusar é papel do Ministério Público; julgar cabe ao Judiciário.
Contudo, esse modelo tem sido, nos últimos anos, brutalmente deformado. Órgãos públicos acumulam funções de investigação, acusação e julgamento, em verdadeira autofagia institucional. O processo penal brasileiro tem sido esvaziado de seu conteúdo jurídico e substituído por um instrumento político de combate a inimigos escolhidos de antemão. Os fatos deixaram de ser o ponto de partida para a persecução penal — e passaram a ser enquadrados forçadamente em narrativas ideológicas e decisões pré-concebidas.
ANÁLISE CRÍTICA
A Constituição Federal de 1988 não deixou dúvidas: o processo penal brasileiro deve observar o devido processo legal (art. 5º, LIV), com todas as suas garantias formais e substanciais. O CPP, por sua vez, foi parcialmente reformulado para se adequar ao sistema acusatório puro. Em teoria, o Brasil segue um modelo garantista, onde ninguém pode ser privado de sua liberdade sem julgamento justo, imparcial, baseado em provas legalmente admitidas e conduzido por um juiz imparcial.
Na prática, porém, assiste-se à desintegração do modelo acusatório e ao ressurgimento de práticas autoritárias, típicas do sistema inquisitório medieval, onde o juiz investigava, acusava e sentenciava. A autonomia funcional dos órgãos de persecução penal é desrespeitada. As garantias processuais são violadas por decisões baseadas em convicções pessoais, vieses ideológicos ou pressões políticas e midiáticas.
Multiplicam-se os casos em que órgãos de Estado, à revelia da Constituição, pretendem exercer o ciclo completo: investigar, denunciar e julgar, numa inversão completa da lógica democrática. A paridade de armas entre defesa e acusação foi substituída pela desproporção deliberada. Juízes impõem penas exemplares, desproporcionais, seletivas — não com base na lei, mas no adversário político.
Esse cenário representa a morte simbólica e concreta do processo penal brasileiro. A fase probatória é muitas vezes ignorada, e as decisões condenatórias se sustentam em ilações, narrativas e elementos extraprocessuais. Viola-se, com isso, não apenas a Constituição Federal, mas também tratados internacionais de direitos humanos, como a Declaração Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto de San José da Costa Rica, ambos ratificados pelo Brasil com status supralegal.
O processo penal se tornou instrumento de aniquilação política, travestido de legalidade. A neutralidade do juiz tornou-se ilusão. A imparcialidade foi substituída por militância togada. Rasgaram a Constituição, sepultaram o Código de Processo Penal, ignoraram tratados internacionais e desfiguraram a justiça.
CONCLUSÃO
O processo penal brasileiro foi assassinado em praça pública. As garantias constitucionais foram caladas por tiros de retórica autoritária. As páginas da Constituição Federal foram rasgadas com o cinismo de quem deveria protegê-la. O Código de Processo Penal foi sepultado sob os escombros de decisões arbitrárias. Os tratados internacionais de direitos humanos foram ignorados como panfletos sem valor.
Vivemos a era do processo político travestido de processo jurídico, onde o réu é condenado antes do início da instrução, onde a prova é irrelevante e a defesa é mero adorno. O sistema acusatório brasileiro foi traído por aqueles que dele deveriam ser guardiões. O juiz imparcial cedeu lugar ao juiz inquisidor. A toga se contaminou pelo palanque. O processo virou palco de justiçamento, não de justiça.
É hora de reagir. De resgatar a Constituição como pacto de civilidade. De restaurar o CPP como baliza do agir penal. De respeitar os tratados de direitos humanos como compromisso de honra de um país civilizado. Que os juristas brasileiros, inspirados nos mestres italianos que forjaram o conceito moderno de processo, sejam a voz da resistência — e que a Justiça volte a se levantar com o escudo da legalidade e a espada da imparcialidade.
Por fim, não obstante a toda essa destruição processual, com os destroços dos escombros jogados em terra arrasada, ainda é possível encontrar profissionais do direito em todos os setores do sistema de persecução penal, ministros, juízes, promotores, advogados, defensores públicos, policiais, agindo dentro da normalidade Jurídica, com seriedade, imparcialidade, lisura, exercendo suas funções com eticidade, zelo, compromisso ético, mas que também se mostram insatisfeitos com toda essa destruição processual que hodiernamente é possível enxergar na história do país; são profissionais que dignificam o sistema de justiça; são profissionais que ergam o bastão do sentimento justo, que se mostram incomodados com a corrosão que tomou conta do país, essa tentativa, as vezes, com êxito de transformar o processo jurídico em processo político.
Sim, o Direito está ferido. O processo, às vezes, vilipendiado. A toga, em certos cenários, manchada por interesses que não se coadunam com a justiça.
Mas há esperança.
Enquanto houver um juiz que não se curva; um promotor que não se vende; um defensor que não se omite; um advogado que não se acovarda; um policial amante do justo, o Direito continuará vivo.
E mesmo que tentem transmutar o processo em arena de poder, sempre haverá operadores da justiça empunhando o bastão invisível da ética, marchando contra a maré turva da corrupção, e bradando com voz altiva, diante de todos os tribunais, que o processo é instrumento de justiça — e não de dominação ideológica.
Eis o chamado urgente à reconstrução: que o mundo jurídico não se dobre aos vendilhões do templo processual, mas se levante como legião de luz e razão, com a espada da Constituição em punho e o escudo da ética cravado no peito.
Porque o verdadeiro Direito não é o que grita mais alto, mas o que faz calar as injustiças com a força silenciosa da verdade processual bem conduzida.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: Martin Claret, 2001.
BETTIOL, Giuseppe. Manual de Direito Penal. Roma: Edizioni Giuridiche, 1958.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 out. 1988.
BRASIL. Código de Processo Penal. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941.
BRASIL. Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019 (Pacote Anticrime).
CAPPELLETTI, Mauro. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988.
CARNELUTTI, Francesco. As Misérias do Processo Penal. Tradução de Antonio P. de Oliveira. São Paulo: RT, 1989.
CARRARA, Francesco. Programa de Direito Criminal. São Paulo: Saraiva, 1940.
GRINOVER, Ada Pellegrini. As Misérias do Processo Penal. São Paulo: RT, 1993.
MANZINI, Vincenzo. Tratado de Direito Penal. Buenos Aires: EJEA, 1954.
ONU. Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, de 1966. Promulgado no Brasil pelo Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992.
OEA. Pacto de San José da Costa Rica (Convenção Americana sobre Direitos Humanos), de 1969. Promulgado pelo Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992.
O presente texto passou por ajustes estruturais e terminológicos para fins de adequação técnica e argumentativa. Fonte: ChatGPT.