Se a justiça é cega, a Ordem dos Advogados do Brasil parece ter perdido não apenas os olhos, mas também a voz — e, tragicamente, o pulso.
A OAB, outrora um bastião da democracia, da justiça social e da defesa intransigente dos direitos dos advogados, atravessa hoje o que se pode denominar de “fase zumbi” — uma existência formal, mas esvaziada de sentido. O corpo até continua em pé, mas a alma parece ter abandonado a casa há algum tempo.
Advogados e advogadas em todo o país convivem com a insegurança profissional, a falta de apoio diante de arbitrariedades judiciais, a omissão da OAB frente à precarização das condições de trabalho e à criminalização sutil da advocacia combativa. Enquanto isso, magistrados ignoram prerrogativas, instituições se esquivam da legalidade, e a entidade segue preocupada com discursos institucionais, agendas políticas de ocasião e com a manutenção de seu status — em detrimento da defesa cotidiana da categoria. Seus legítimos representados permanecem acuados em um ambiente cada vez mais hostil onde o respeito à função virou exceção.
Na ausência de uma entidade combativa e funcional, o que impera é a lógica do mais forte. E isso levanta uma questão incômoda, mas absolutamente pertinente: a quem serve a OAB de hoje?
A resposta a essa pergunta não é apenas jurídica ou política, é também simbólica. Quando a entidade que deveria assegurar os alicerces da legalidade se torna espectadora silenciosa, abre-se um vácuo perigoso. Nesse vácuo, florescem os discursos antidemocráticos, a normalização da violência institucional e a aceitação da precariedade como regra.
O silêncio ensurdecedor da entidade diante das inúmeras mazelas que a cercam parece ser um atestado fático de que ela se tornou refém de sua própria estrutura burocrática, sequestrada por interesses corporativos, por dinastias regionais e por um carreirismo disfarçado de institucionalidade.
Fala-se muito em “defesa das instituições democráticas”, mas se esquece que não há democracia sem advogados respeitados, livres e valorizados. Hoje, vê-se juízes desautorizando advogados, opinando sobre a linha de defesa empregada, pronunciando-se fora dos autos e punindo a parte pelo mero exercício do direito fundamental ao contraditório, por meio de multas desarrazoadas.
Talvez estejamos diante de um momento crucial: ou a OAB resgata sua relevância histórica, ou continuará a se desintegrar em sua própria burocracia. O que está em jogo não é apenas a dignidade da advocacia, mas a própria saúde da democracia brasileira. Afinal, sem uma advocacia livre e respeitada, não há justiça — há apenas poder.