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O impacto do advento do §1º do art. 496 ao novo Código de Processo Civil

07/09/2025 às 14:49

Resumo:


  • O §1º do art. 496 do CPC/2015 estabelece a remessa automática dos autos ao tribunal caso a Fazenda não interponha apelação, com o presidente do tribunal avocando os autos em caso de omissão do juízo de origem.

  • Esse dispositivo possui natureza jurisdicional-instrutória, assegurando o duplo grau de jurisdição como garantia fundamental e contribuindo para a uniformização e previsibilidade procedimental, elementos essenciais à segurança jurídica.

  • A jurisprudência do STJ tem delimitado os limites de aplicação do §1º do art. 496, evidenciando a remessa automática, mas observando limites objetivos para evitar o uso indiscriminado do instituto.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O §1º do art. 496 do CPC garante remessa necessária automática contra a Fazenda Pública, mas sua aplicação assegura celeridade e segurança jurídica no processo?

Resumo: O presente estudo examina o §1º do art. 496 do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015), dispositivo que disciplina a remessa necessária em sentenças desfavoráveis à Fazenda Pública, mesmo diante da ausência de recurso voluntário. Analisa-se sua aplicação prática, repercussões doutrinárias e jurisprudenciais, bem como os impactos na celeridade, segurança e previsibilidade processual. A metodologia adotada consiste em revisão bibliográfica crítica, análise de precedentes recentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e reflexão acerca dos desafios enfrentados na prática forense. Conclui-se que o §1º do art. 496 do CPC/2015 constitui avanço significativo no regime da remessa necessária, embora persista a necessidade de ajustes legislativos e procedimentais para garantir plena efetividade.

Palavras-chave: Remessa necessária; Fazenda Pública; CPC/2015; §1º do art. 496; eficiência processual; segurança jurídica.


1. Introdução

A remessa necessária é instituto processual que visa assegurar o reexame das decisões judiciais proferidas contra a Fazenda Pública, independentemente de provocação da parte vencedora. Com a edição do CPC/2015, o art. 496 passou a concentrar as hipóteses de aplicação do instituto, conferindo maior delimitação em comparação ao CPC/1973, e introduziu inovações de relevância prática. Destaca-se, nesse contexto, o §1º do referido artigo, que estabelece a remessa automática dos autos ao tribunal caso a Fazenda não interponha apelação, impondo ao presidente do tribunal o dever de avocação diante de eventual omissão do juízo de origem.

O presente artigo objetiva analisar os impactos desse dispositivo sob quatro perspectivas centrais:

  1. evolução histórica da remessa necessária;

  2. natureza jurídica e alcance do §1º do art. 496;

  3. tratamento jurisprudencial contemporâneo; e

  4. críticas e propostas de aprimoramento legislativo, com vistas a consolidar a efetividade do instituto e a previsibilidade do processo.


2. Evolução histórica da remessa necessária

No CPC/1973, a remessa necessária era aplicada de forma ampla, abrangendo todas as sentenças desfavoráveis à Fazenda Pública, mesmo sem recurso voluntário, com o escopo de proteger o interesse público e resguardar o erário. Contudo, o caráter indiscriminado do dispositivo gerava sobrecarga nos tribunais, acúmulo processual e retardamento do trânsito em julgado.

O CPC/2015 promoveu mudanças substanciais. O art. 496. passou a definir hipóteses específicas de remessa necessária, vinculando sua incidência a critérios objetivos, como o valor da condenação (§3º) e a existência de precedentes vinculantes (§4º). O §1º, por sua vez, estabelece a remessa obrigatória dos autos ao tribunal quando a Fazenda não interpõe apelação, garantindo a atuação jurisdicional de ofício, o que representa inovação significativa em relação ao regime anterior.


3. O §1º do art. 496. do CPC/2015: alcance e natureza

O §1º do art. 496 dispõe: “Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.”

Este dispositivo possui natureza jurisdicional-instrutória, pois assegura o duplo grau de jurisdição como garantia fundamental. Sua aplicação é automática sempre que a Fazenda Pública se abstém de interpor recurso, incumbindo ao magistrado determinar o envio dos autos ao tribunal competente. Em caso de omissão, o presidente do tribunal deve avocar os autos, evitando paralisação processual e garantindo a proteção do interesse público.

O §1º do art. 496 reforça a autonomia do Judiciário, permitindo a revisão de sentenças de ofício, sem depender da iniciativa das partes, o que contribui para uniformização e previsibilidade procedimental, elementos essenciais à segurança jurídica.


4. Jurisprudência contemporânea

A jurisprudência do STJ tem delineado limites e especificidades na aplicação do §1º do art. 496, destacando-se:

  • AgInt no REsp 2.084.081/CE (STJ, 18/11/2024): a remessa necessária não se aplica a condenações líquidas inferiores ao teto previsto no §3º do art. 496.

  • AgInt no REsp 2.116.385/PB (STJ, 27/05/2024): confirma que a ausência de apelação não acarreta remessa quando a condenação não supera limites legais.

  • AgInt no REsp 2.068.436/AL (STJ, 11/03/2024): reforça que a remessa necessária possui efeito devolutivo amplo, permitindo reexame integral da matéria pelo tribunal.

  • AgInt no AREsp 285.333/GO (STJ, 25/06/2019): evidencia inexistência de preclusão para matérias não impugnadas, em razão do caráter obrigatório da remessa.

  • Tema 1081/STJ (2021): debate a necessidade de remessa em sentenças previdenciárias ilíquidas, revelando divergências sobre a aplicação do instituto.

Estas decisões demonstram que o §1º do art. 496 assegura remessa automática, mas observando limites objetivos, evitando a utilização indiscriminada do mecanismo.


5. Críticas e desafios

Apesar dos avanços normativos, o §1º do art. 496 apresenta desafios práticos. A ausência de prazos específicos para a avocação pelo presidente do tribunal pode gerar atrasos processuais, comprometendo a efetividade do instituto. Além disso, não existem sanções para a omissão do magistrado ou do presidente, o que pode comprometer a segurança jurídica e a previsibilidade.

Outro ponto crítico refere-se à vulnerabilidade das partes, sobretudo em demandas previdenciárias e fazendárias, onde o vencedor permanece sujeito a revisão tardia. A operacionalização do instituto também encontra obstáculos em tribunais que não possuem sistemas eletrônicos automáticos, dificultando a remessa.

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Sugere-se aprimoramento legislativo, contemplando: 1. Estabelecimento de prazo máximo para a avocação dos autos; 2. Implementação de sistemas eletrônicos automáticos para remessa; 3. Previsão de sanções para descumprimento do dever legal.

Tais medidas consolidariam a remessa necessária como instrumento eficaz de proteção do interesse público, sem comprometer a razoável duração do processo.


6. Conclusão

O §1º do art. 496 do CPC/2015 representa avanço em relação ao CPC/1973, ao disciplinar de forma clara e restritiva a remessa necessária, assegurando o duplo grau de jurisdição mesmo diante da ausência de recurso voluntário da Fazenda Pública. Sua aplicação contribui para a celeridade, segurança processual e uniformidade na interpretação das decisões judiciais.

Entretanto, persistem lacunas normativas e entraves práticos que limitam sua plena eficácia. A inexistência de prazos, sanções e mecanismos automáticos para a remessa pode gerar insegurança e morosidade, exigindo ajustes legislativos e estruturais. Assim, a consolidação do instituto como instrumento efetivo de proteção do interesse público depende de aperfeiçoamentos que promovam previsibilidade e eficiência processual.


Referências

BRASIL. Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015). Disponível em: https://www.planalto.gov.br. Acesso em: 23 jun. 2025.

DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais. 15. ed. Salvador: JusPodivm, 2024. v. 3.

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil: Comentado artigo por artigo. 3. ed. São Paulo: RT, 2017.

NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e legislação processual civil extravagante. 17. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2023.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ). AgInt no REsp 2.084.081/CE, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 18/11/2024, DJe 20/11/2024.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ). AgInt no REsp 2.116.385/PB, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 27/05/2024, DJe 30/05/2024.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ). AgInt no REsp 2.068.436/AL, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 11/03/2024, DJe 14/03/2024.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ). AgInt no AREsp 285.333/GO, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 25/06/2019, DJe 28/06/2019.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ). Tema 1081/STJ, Primeira Seção, julgado em 28/04/2021, DJe 03/05/2021.

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Sobre o autor
Áthila Robson Louro Borges

Graduando do Curso de Direito, Pontifícia Universidade Santa Úrsula, Botafogo (RJ).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BORGES, Áthila Robson Louro. O impacto do advento do §1º do art. 496 ao novo Código de Processo Civil . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 30, n. 8103, 7 set. 2025. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/115436. Acesso em: 5 dez. 2025.

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