Capa da publicação Estelionato contra PCD agora tem ação penal pública
Capa: Sora

Ação penal pública incondicionada no estelionato contra pessoa com deficiência.

A nova era da justiça inclusiva

04/10/2025 às 15:56

Resumo:


  • A Lei nº 15.229, de 2 de outubro de 2025, altera o Código Penal para tornar a ação penal pública incondicionada no caso de estelionato contra pessoa com deficiência.

  • Essa mudança representa um avanço na proteção penal da vulnerabilidade, ampliando a atuação da Polícia Civil e do Ministério Público na repressão de fraudes contra pessoas com deficiência.

  • A nova legislação reforça o compromisso do Brasil com tratados internacionais de proteção à pessoa com deficiência e com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A nova lei garante ação penal pública em fraudes contra pessoas com deficiência. Como essa mudança reforça a dignidade humana e a proteção estatal?

Resumo: A sanção e publicação da Lei nº 15.229, de 2 de outubro de 2025, representam um marco civilizatório na tutela penal da dignidade humana e da cidadania inclusiva. O diploma legal altera o artigo 171 do Código Penal, para prever que o crime de estelionato cometido contra pessoa com deficiência será processado mediante ação penal pública incondicionada. Tal inovação normativa concretiza princípios constitucionais de igualdade e de proteção integral, reforçando a atuação estatal proativa na defesa de grupos vulneráveis. O presente artigo analisa o contexto jurídico, social e ético da norma, examinando suas implicações práticas para a Polícia Judiciária e o Ministério Público, bem como seu alinhamento com a Constituição Federal, o Estatuto da Pessoa com Deficiência e instrumentos internacionais de direitos humanos. Conclui-se que a nova lei simboliza não apenas uma resposta legislativa, mas um clamor moral de uma sociedade que reconhece na inclusão o verdadeiro sentido da Justiça.

Palavras-chave: Estelionato; Pessoa com deficiência; Ação penal pública incondicionada; Dignidade humana; Inclusão social; Direitos humanos.


INTRODUÇÃO

Entrou em vigor, em 3 de outubro de 2025, a Lei nº 15.229, de 2 de outubro de 2025, que altera o Código Penal Brasileiro para prever que o crime de estelionato cometido contra pessoa com deficiência será processado mediante ação penal pública incondicionada.

O estelionato, previsto no artigo 171 do Código Penal, consiste em obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento.

A pena cominada é de reclusão de um a cinco anos e multa, com agravantes e causas especiais de aumento, como nos casos em que a vítima é idosa ou vulnerável, conforme introduzido pela Lei nº 14.155/2021.

Com a nova legislação, o Estado passa a agir de ofício em defesa das pessoas com deficiência, afastando-se a necessidade de representação da vítima. Essa mudança consolida um avanço na proteção penal da vulnerabilidade, ampliando a atuação da Polícia Civil e do Ministério Público na repressão de fraudes que exploram a fragilidade física, mental ou social de cidadãos com deficiência.

Trata-se de um passo expressivo rumo à Justiça inclusiva, reafirmando o compromisso do Brasil com os tratados internacionais de proteção à pessoa com deficiência e com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.


ANÁLISE CONTEXTUAL DO TEMA

A Lei nº 15.229/2025 tem origem no Projeto de Lei nº 3.114/2023, que tramitou sob forte apoio de entidades voltadas à inclusão social e de organizações que defendem os direitos das pessoas com deficiência.

A nova norma surge em um contexto em que a criminalidade digital e financeira tem se sofisticado, aproveitando-se, muitas vezes, da inocência, confiança ou fragilidade cognitiva de pessoas com deficiência — seja nas relações presenciais, seja nos ambientes virtuais.

Antes da alteração, o crime de estelionato, via de regra, dependia de representação da vítima para que o Estado pudesse agir. Esse modelo, embora justificado sob o prisma da política criminal liberal, revelava-se ineficaz e injusto quando a vítima era uma pessoa com deficiência, frequentemente sem condições cognitivas, físicas ou emocionais de formalizar a representação.

Com a nova lei, o estelionato praticado contra pessoa com deficiência passa a ser de ação penal pública incondicionada, o que significa que o Estado — por meio da Polícia Judiciária e do Ministério Público — pode instaurar inquérito e oferecer denúncia independentemente da vontade da vítima ou de seu representante legal.

Essa alteração legislativa reforça o dever estatal de tutela ativa, concretizando o disposto no artigo 227 da Constituição Federal, que impõe ao Estado o dever de assegurar a dignidade e a proteção de todos os vulneráveis, inclusive pessoas com deficiência.

Do ponto de vista dogmático, a mudança também reafirma a função social do Direito Penal, que deve proteger, prioritariamente, bens jurídicos de alto valor constitucional — neste caso, a dignidade humana e a autodeterminação da pessoa com deficiência.

A lei também se harmoniza com o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), que assegura o direito à igualdade de oportunidades, à acessibilidade e à proteção contra qualquer forma de abuso, violência ou exploração.

Internacionalmente, o Brasil reafirma, com tal norma, seu compromisso com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU, 2006), promulgada pelo Decreto nº 6.949/2009, que impõe aos Estados-partes o dever de garantir plena proteção jurídica às pessoas com deficiência contra a exploração e a fraude em qualquer esfera da vida civil.


REFLEXÕES FINAIS

Destarte, a sanção da Lei nº 15.229/2025 não é apenas uma atualização normativa — é um ato de justiça social e humanitária.

Ela simboliza a vitória da ética sobre o oportunismo, da inclusão sobre a indiferença, da dignidade sobre a fraude.

O legislador brasileiro, atento à realidade de um mundo cada vez mais digital e desigual, reafirma que a vulnerabilidade não pode ser explorada como atalho para o crime, mas deve ser protegida como patrimônio da humanidade.

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A Polícia Civil, em sua missão constitucional de investigar com técnica e sensibilidade, ganha com esta norma mais uma ferramenta de ação legítima e autônoma em defesa dos mais frágeis.

O Ministério Público, por sua vez, fortalece sua atuação como guardião da ordem jurídica e dos direitos humanos.

Em suma, a nova lei eleva o patamar civilizatório do Direito Penal brasileiro, reafirmando o princípio da dignidade da pessoa humana e o compromisso do Estado com uma Justiça acessível, protetiva e inclusiva.

Que esta norma inspire não apenas repressão ao crime, mas também respeito, empatia e solidariedade para com aqueles que lutam diariamente contra as barreiras impostas pela deficiência e pela indiferença social.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940.

BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência).

BRASIL. Lei nº 14.155, de 27 de maio de 2021. Altera o Código Penal e a Lei de Lavagem de Dinheiro, tratando de fraudes eletrônicas e estelionato contra vulneráveis.

BRASIL. Lei nº 15.229, de 2 de outubro de 2025. Altera o Código Penal para prever ação penal pública incondicionada em caso de estelionato contra pessoa com deficiência.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Nova York, 2006). Promulgada no Brasil pelo Decreto nº 6.949/2009.

BRASIL. Estatuto da Pessoa com Deficiência: Comentado. Brasília: Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, 2015.T

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Sobre o autor
Jeferson Botelho Pereira

Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

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