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Acesso social à Justiça do Trabalho.

Um estudo sobre a necessidade de reforma da Justiça do Trabalho

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16/11/2008 às 00:00
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2. MATERIAL E MÉTODOS

A base desta pesquisa está consubstanciada no material didático fornecido pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas Virtual) durante o curso de especialização em direto e processo do trabalho (2007/2008), incluindo as aulas por meio de videoconferências e a bibliografia indicada pelos professores e tutores, dentre as quais destacam-se as duas obras citadas no capítulo 2 (justificativa). Em complemento, foram pesquisadas as revistas jurídicas do Tribunal Superior do Trabalho, dos Tribunais Regionais do Trabalho e da Presidência da República, disponibilizadas na Internet.

Para coordenar as idéias em torno do tema escolhido, o presente estudo foi elaborado por etapas e, após algumas versões, constatou-se a necessidade de inclusão de pensamentos de outros autores além daqueles indicados pela Universidade. Assim, uma nova etapa de pesquisas foi vencida e trouxe à luz opiniões de outros especialistas, principalmente de juízes do trabalho.

Portanto, o presente trabalho não se limitará a tecer comentário sobre o significado e alcance da expressão "acesso social à justiça do trabalho", para, ao final, apresentar algumas hipóteses, mas tentará apresentar, como elo entre estes comentários e a sustentação dos argumentos, um breve histórico do direito do trabalho e do processo do trabalho, bem como algumas linhas de conceitos de teoria geral do processo e de processo e procedimento. Também fará parte deste elo, a citação das alterações legislativas mais recentes, principalmente no que diz respeito ao processo civil.

Cumpre ressaltar que, não obstante a vasta bibliografia consultada, principalmente na área cível, as citações dos pensamentos dos autores serão apenas as necessárias para a sustentação dos argumentos. Tal opção de se evitarem cópias de trechos extensos dos autores citados, parte da premissa de que, dessa forma, privilegiam-se os ensinamentos dos professores do curso que se finaliza.

Enfim, a presente pesquisa, baseada nos ensinamentos de grandes mestres, tentará transformar esses fundamentos teóricos em soluções práticas.


3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

O aprendizado não pode prescindir da teoria e da prática. Aprender significa estar apto a fazer. Para isso é necessário que se conheçam os fundamentos (teoria), mas que se desenvolvam as habilidades necessárias à transformação desses fundamentos em ações do dia-a-dia, através da prática, desenvolvendo aptidões e procurando soluções por intermédio dos erros e acertos do passado. Isso é verdade para qualquer campo do conhecimento ou da prática humana, principalmente no ramo do direito que é dinâmico e tem que acompanhar as mudanças de comportamento da sociedade.

De acordo com o professor Serafin (2001):

Não podemos pensar se devemos privilegiar ou a prática ou a teoria. Devemos privilegiar a teoria e a prática. É uma relação includente e não excludente.[...] Abstrair não é fugir da realidade, mas nela se inserir. É compreender o nosso ao redor. E apenas transformamos algo se o compreendemos. Portanto, acredito que o embate entre teoria-prática esconde algo mais profundo: se desejamos ou não transformar o mundo. Se desejamos educar pessoas para a autonomia ou automatonomia[6]. Se desejamos repetidores ou criadores. Se todo o ponto de vista é a vista situada em um ponto, olhando por esse ângulo, podemos perceber a falácia que é separar e diferenciar o status entre a prática e a teoria. Não é lógico, mas ideológico.

Destarte, após reunir toda a teoria em torno do tema e conjugando-a com a prática de magistrados experientes, o presente trabalho se dividirá em capítulos, não necessariamente na ordem do curso que ora se finaliza, mas fazendo uma breve regressão e captando questões pontuais na história do direito e do processo do trabalho que, de alguma forma, estejam relacionadas com o acesso social à justiça.

3.2 Breve histórico do direito e do processo do trabalho

Ao se familiarizar com outros tempos, outras épocas, outras civilizações, adquire-se o salutar hábito de desconfiar dos critérios de seu tempo: eles evoluirão, como outros evoluíram. É a ocasião de revisar, dentro de si próprio, o mecanismo de pensamento, suas próprias motivações etc. por confronto com o outro. (ELIAN ALABI LUCCI).

3.2.1 Evolução do direito do trabalho

A trajetória do direito é marcada pelas lutas e oposições às situações de injustiça. IHERING chega a afirmar que as situações de injustiça são próprias da realidade da vida. Por isso, a vida do Direito é um luta: luta dos povos, do Estado, das classes, dos indivíduos.

O direito do trabalho não fugiu à regra. Muito pelo contrário, sua trajetória é eminentemente marcada por lutas e oposições às situações de injustiça, miséria e exploração de homens, mulheres e crianças.

Na era primitiva ou períodos anteriores à revolução industrial, as relações eram entre pessoas, visto que não havia relação de trabalho e emprego até então. Entretanto, não obstante a ausência de normas, o trabalho é tão antigo como o ser humano. Mudaram-se as formas, mas os conflitos sempre existiram. Entretanto, prevalecia a vontade dos particulares detentores do poder, em razão da inexistência de normas que regrassem as relações entre as pessoas.

O direito do trabalho é produto recente da humanidade, quando a sociedade passou por modificações significativas, mais precisamente no século XIX, tendo como marco principal a Revolução Industrial: a mecanização do trabalho humano em setores importantes da economia.

Com a Revolução Industrial, várias pessoas trabalhando quase sem descanso, inclusive crianças de cinco anos, e número expressivo de acidentes do trabalho, os trabalhadores tiveram uma consciência de união. É, então, exigida do Estado, maior ingerência na ordem social e econômica, ou seja, suas estruturas devem intervir diretamente na melhoria de vida dos menos favorecidos. ( MAIOR, 2007).

Portanto, o trabalho foi transformado em emprego e os trabalhadores passaram a trabalhar por salários e

A relação empregatícia, como categoria socioeconômica e jurídica, tem seus pressupostos despontados com o processo de ruptura do sistema produtivo feudal, ao longo do desenrolar da Idade Moderna. Contudo, apenas mais à frente, no desenrolar do processo da Revolução Industrial, é que irá efetivamente se estruturar como categoria específica, passando a responder pelo modelo principal de vinculação do trabalhador livre ao sistema produtivo emergente. [...] O Direito do Trabalho é, pois, produto cultural do século XIX e das transformações econômico-sociais e políticas ali vivenciadas.(DELGADO, 2007, p.85).

A fragmentação das sociedades campesinas atomizadas tradicionais, que originou as grandes massas de desempregados nas cidades – ou as grandes reservas laborais – fez com que nada se tornasse mais inevitável do que o aparecimento dos movimentos operários, pois aqueles trabalhadores não tinham quaisquer recursos legais, somente alguns rudimentos de proteção pública.

Assim, no século XIX, os pobres não mais se defrontavam com os ricos. Uma classe específica, a classe operária, enfrentava a dos patrões ou capitalistas. A Revolução Francesa deu confiança a essa nova classe e a Revolução Industrial provocou nela uma necessidade de mobilização permanente.

A esses fatores acrescentaram ainda: a Lei de Peel (Inglaterra); o Ludismo ( os ludistas organizavam-se para destruir as máquinas, pois entendiam que eram elas as causadoras da crise no trabalho); os clamores revolucionários de Marx e Engels (Manifesto Comunista 1848 que desperta a consciência de classes, ou seja, a conscientização dos trabalhadores, com o seguinte lema: "trabalhadores de todo o mundo: uni-vos"); a Encíclica Rerum Novarum, publicada em 15 de maio de 1891 pelo Papa Leão XIII ( "não é justo nem humano exigir do homem tanto trabalho a ponto de fazer, pelo excesso de fadiga, embrutecer o espírito e enfraquecer o corpo").

Essas reivindicações revolucionárias é que vão impulsionar o Estado a intervir, criar uma ordem política, criar o Direito do Trabalho e direitos sociais. Não é uma intervenção pura e simplesmente. É uma intervenção do Estado para a manutenção do sistema capitalista de produção, ou seja, manter a correlação de forças entre patrão e empregado.

Querer entender que o Estado passou simplesmente a intervir por si só, é querer enganar-nos a nós mesmos. Será que a intervenção era para os dominados? Quando se sabe que até hoje o Estado tende a proteger os dominantes. ( MAIOR, 2007).

Portanto, o direito do trabalho não surgiu instantaneamente. Há uma flutuação de valores, de idéias até que o direito surgisse. Fo processado de forma lenta, em etapas até que se chegou a um ponto que se fazia inadiável a criação de um direito novo que tivesse estrutura própria para enfrentar o individualismo predominante da sociedade burguesa e harmonizar as relações entre capital e trabalho.

Esse direito novo teria, então, que ser tutelar, protetivo e, ao contrário do cível, valorizar o coletivo em detrimento do individual. Dessa forma, o Estado começa a limitar; a destruir a diferença entre classes e grupos; a fazer sobressair o interesse coletivo, tornando relativo o direito individual e limitando o seu exercício quando ele contrariasse o interesse da sociedade.

O direito do trabalho vai socializando os interesses coletivos. Não a legislação trabalhista.

Fala-se em socialismo jurídico – não socialismo político – mas, no sentido de Justiça Social, igualdade e garantias. De acordo com o Professor Márcio Túlio Viana: capitalismo social.

O sentido era eliminar conflitos ideológicos: interesses revolucionários dos trabalhadores e interesses liberais dos patrões.

O direito do trabalho vai se formando para conduzir o sistema capitalista produtivo a respeitar direitos sociais e trabalhistas: garantias de proteção, irrenunciabilidade, justiça social, pleno emprego, vida digna, etc. Essas eram as pretensões do direito do trabalho. ( MAIOR, 2007).

Aqui no Brasil tudo realmente começou a acontecer a partir de 1930, quando havia uma grande massa de imigrantes com idéias socialistas e anarquistas e quando o governo deu início à industrialização do País.

A partir desse movimento, foram editadas e promulgadas várias leis e decretos e o direito do trabalho ganha status constitucional na Carta Magna de 1937. Em 1º de maio de 1943 é promulgada a CLT.

3.2.2 Evolução do direito processo do trabalho

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Até o direito romano arcaico, as relações conflituosas entre pessoas eram resolvidas pelo regime de autotutela e autocomposição. Após, o Estado passou a participar, mas apenas para indicar o árbitro ao qual recebia do pretor o encargo de decidir a causa: in iure e in iudicum.

A próxima fase é a passagem da justiça privada para a justiça pública. O Império Romano deixa de ser uma sociedade política, para se transformar num Estado guerreiro e conquistador e sua extensão abrange todo o mundo conhecido. O Estado, além do poder de legislar (emitir normas), tinha consigo também o direito de aplicá-las nos casos concretos, julgando. Assim,

A aplicação da lei passa a ser uma atividade essencialmente pública, a cargo de servidores, comandada pelo Imperador. O processo assume a forma escrita, nele registrando-se todos os atos praticados pelo juiz, escrivão e partes.{...}.O processo se burocratiza, tornando-se lento e formalista e o juiz, em razão das restrições que lhe são impostas, não pode mais conduzi-lo livremente, como no período formulário (SILVA,2004, p.24)

A mudança para uma nova era se deu com a Revolução Francesa, 1789, consubstanciada na obra do Barão de Montesquieu, quando se efetivou a divisão do exercício do poder com atribuições diferenciadas e especializadas (tripartição do poder): legislativa, executiva e judiciária. Entretanto, o direito processual era visto apenas como um procedimento formal à mercê do direito material. Somente no ano de 1868, com estudos e obra do jurista alemão Oskar Von Bulow, é que ficou patente que a relação jurídica processual pertence ao direito público.

O processo do trabalho surgiu em etapas e épocas diferentes em função do surgimento do direito do trabalho em cada país. Portanto,

Não é tarefa fácil precisar a origem do direito processual do trabalho no plano mundial, pois ela se confunde muitas vezes com o surgimento da própria jurisdição trabalhista, sendo certo que esta, por sua vez, surgiu em ocasiões diferentes em cada país.[...] Como o direito Processual do Trabalho é um instrumento de realização do Direito do Trabalho, podemos dizer que somente o aparecimento deste é que se pode falar no surgimento daquele. (LEITE, 2007, p. 111).

Na França, foram criadas em 1426 os Conseils de Prudhommes (conselhos dos homens prudentes), existentes até hoje. Têm representantes de empregados e de empregadores e são divididos em várias seções, que apenas julgam e conciliam sem, contudo, executar suas decisões que são encaminhadas para o Poder Judiciário.

A Itália também adotou, em 1800, um sistema semelhante, os probiviri, também com representação paritária, substituídos pela justiça do trabalho instituída pela Carta del Lavoro.

Na Alemanha, foram criados, em 1808, os Tribunais Industriais que conciliavam e decidiam.

No Brasil, até a organização da justiça do trabalho em 1941, como órgão autônomo, o que havia eram juntas de conciliação e julgamento de natureza administrativa. Em 1922 foram criados os Tribunais Rurais em São Paulo que eram compostos por um representante dos fazendeiros e outro dos trabalhadores e presidido pelo juiz de direito da Comarca.

Somente com a Constituição de 1946 é que a justiça do trabalho (tribunais e juízes) passou a pertencer ao Poder Judiciário da União, e os órgãos passaram a ser as Juntas de Conciliação e Julgamento constituídas de um Juiz togado e dois vogais, os Tribunais Regionais do Trabalho e o Tribunal Superior do Trabalho.

Entretanto, o direito processual do trabalho, assim como o ramo do direito material que o criou, também nasceu diferente do direito processual civil que já era disciplinado desde o ano de 1939 por meio de um código. Não só nasceu diferente, como também inovou e assumiu personalidade própria com procedimentos que buscavam o equilíbrio das desigualdades sócio-econômicas entre os demandantes.

Como se sabe, o processo do trabalho está compreendido na própria CLT e quase nada foi mudado até hoje. A Constituição de 1988 manteve a mesma estrutura da Justiça do Trabalho e a reforma do Judiciário, por meio da EC/45/2004, apenas aumentou sua competência material.

3.3 Direitos Fundamentais

Os direitos fundamentais são consagrados tanto no plano constitucional quanto no internacional. Marinoni (2007, p. 02) ensina que:

A Constituição confere dignidade e proteção especiais aos direitos fundamentais, seja deixando claro que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata (art. 5º parágrafo, CF), seja permitindo a conclusão de que os direitos fundamentais estão protegidos não apenas diante do legislador ordinário, mas também contra o poder constituinte reformador – por integrarem o rol das denominadas cláusulas pétreas (art. 60, CF).

Nesta pesquisa, o enfoque principal dos direitos fundamentais será no que se refere ao sistema de garantias que lhes dão suporte, pois são elas que possibilitam o pleno gozo dos direitos por parte dos jurisdicionados, principalmente no que se refere ao processo justo e ao chamado acesso à ordem jurídica justa.

3.3.1 Acesso social à justiça

Como visto, há muito tempo o Estado trouxe para si o monopólio da tutela jurisdicional. Entretanto o acesso à justiça, a garantia de uma decisão justa e a segurança jurídica não eram concretamente realizados em face das arbitrariedades dos julgadores e a prevalência de um padrão filosófico tipicamente individualista, referência dos Estados Liberais. Com efeito,

Nos Estados liberais "burgueses" dos séculos dezoito e dezenove, os procedimentos adotados para solução dos litígios civis refletiam a filosofia essencialmente individualista dos direitos, então vigorante. Direito ao acesso à proteção judicial significava essencialmente o direito formal do individuo agravado de propor ou contestar uma ação. A teoria era a de que, embora o acesso à justiça pudesse ser um "direito natural", os direitos naturais não necessitavam de uma ação do Estado para sua proteção.{...} A justiça, como outros bens no sistema do laisser-faire, só podia ser obtida por aqueles que pudessem enfrentar seus custos; aqueles que não pudessem fazê-lo eram considerados os únicos responsáveis por sua sorte. O acesso formal, mas não efetivo à justiça, correspondia à igualdade, apenas formal, mas não efetiva. (CAPPELLETTI, 1988, p.09).

Destarte, muito ainda precisava ser estudado e difundido, pois não bastava o reconhecimento de ser o direito processual um direito público. Era necessário que não houvesse barreiras discriminatórias que impedissem o efetivo acesso à justiça e, conseqüentemente, a tutela jurisdicional efetiva para todos os cidadãos.

O mundo ocidental passou a perceber que o direito processual necessitava de modificações bem mais profundas e estruturantes para abrigar as ações de direitos novos, oriundos do modo de viver do homem pós-moderno, de forma célere e acessível a todos, visto que,

Numa sociedade em rápida transformação, o passo do legislador, embora trôpego, deve fazer o possível para acompanhar a realidade. A multiplicação das crises de direito material, a litigiosidade crescente, o acúmulo de processo, a lentidão da justiça exigem novas técnicas processuais, aderentes à lide subjacente ao processo. Esta é a vertente judicial, que desformaliza, enquanto se buscam alternativas extrajudiciais, capazes de evitar ou encurtar o processo: ou seja, os meios alternativos de solução das controvérsias e da pacificação social. (GRINOVER,2008)

3.3.2 Acesso social à justiça do trabalho

Dinamarco (1995 p. 48) leciona que não tem acesso à justiça aquele que nem sequer consegue fazer-se ouvir em juízo, como também todos os que, pelas mazelas do processo, recebem uma justiça tardia ou alguma injustiça de qualquer ordem.

Percebe-se, na seara trabalhista, que o acesso à justiça é quase que restrito aos desempregados, haja vista que já não têm mais nada a perder.

E, como disse que são autoritárias as relações de trabalho, à Justiça do Trabalho chegam os despedidos, os desempregados, na sua esmagadora maioria, pois durante a relação de emprego é impossível reclamar na Justiça ou fora dela. (PEREIRA, 2000).

Mesmo nessa condição, o palácio da justiça parece-lhe estranho e as formalidades e olhares transversos dos patrões e de seus advogados inibem-lhe por completo. Nesse sentido,

Ainda hoje os trabalhadores se sentem mal em estarem na Justiça do Trabalho. Talvez por questões culturais: 1º ) por que ainda há uma forte tendência de que estão fazendo algo errado.[...] A relação de emprego é como se fosse um favor. Exemplos ditos por alguns patrões: " bateu na minha porta, fiz um favor e agora o ingrato vai à justiça do trabalho...Não se pode ajudar ninguém".(MAIOR,2007).

Assim, o direito fundamental de inafastabilidade do controle jurisdicional demonstra ser falível. Primeiro, por não dar garantias a quem está trabalhando de fazer valer seus direitos sem o risco de ser demitido e, segundo, por não dar suporte adequado ao reclamante diante das formalidades e das ameaças da parte adversa e de sua banca de advogados.

A partir dessas constatações, parece que o acesso à Justiça do Trabalho ainda está longe de ser alcançado no seu conceito máximo, não obstante haver um direito positivo bastante avançado de proteção, com normas modernas e garantísticas, tanto no direito material como no processual, às quais, para fins didáticos, podem assim ser resumidas:

-Os direitos sociais de natureza trabalhistas constituem importante parcela dos direitos humanos ou fundamentais agasalhados principalmente no art. 7º da Constituição Federal e, como tal, merecem ser considerados "verdadeiros direitos" e devem gozar de proteção especial.

-Na proteção especial que o sistema jurídico deve assegurar aos direitos fundamentais estão contempladas as garantias que assegurem a todo cidadão exigir do Estado a efetividade do direito previsto em lei.

-Um dos pilares do sistema de garantias é o livre acesso do cidadão ao Poder Judiciário, constituindo-se esse ponto central da moderna processualística.

-O livre acesso compreende, não apenas o acesso à Justiça enquanto instituição estatal, mas viabilizar o acesso à ordem jurídica justa.

-Tendo em conta a desigualdade social, mormente a existente em nosso país, um dos fatores mais relevantes de limitação do livre acesso ao Poder Judiciário é de natureza econômica, seja na forma de custas, honorários advocatícios, despesas processuais (peritos etc.). Entretanto, no que se refere ao processo do trabalho, tanto a Constituição Brasileira, como normas ordinárias, prevêem um conjunto de medidas destinadas a assegurar o acesso do hipossuficiente à assistência jurídica ampla.

3.4 Morosidade da justiça

Toda Justiça que não soluciona seus litígios dentro de um prazo razoável configura-se com uma Justiça inacessível (Convenção Européia para Proteção dos Direitos Humanos, artigo 6º , parágrafo único).

Uma série de fatores contribui para atrasar a tramitação dos processos e a solução dos litígios, dentre os quais se podem destacar:

-Os entraves do processo de execução, um dos gargalos mais significativos da morosidade da Justiça, como se observa vista na dificuldade de citação do devedor e penhora de bens de difícil liquidação;

-o excesso de causas repetitivas, ou seja, um volume excessivo de ações idênticas passíveis de serem solucionadas de maneira coletiva e.

-a alta taxa de recorribilidade e o elevado número de recursos disponíveis, que, em muitos casos são meramente protelatórios, principalmente quando versa sobre questões já decididas e pacificadas nos tribunais.

3.4.1 Morosidade da justiça do trabalho

Justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta. Porque a dilação ilegal nas mãos do julgador contraria o direito escrito das partes, e, assim, as lesa no patrimônio, honra e liberdade.(Rui Barbosa, 1920).

Embora a Justiça do Trabalho seja a mais célere do país, ainda não consegue atender aos anseios dos jurisdicionados em um tempo razoável por várias causas, seja de ordem externa, como questões sociais, seja de ordem interna, como falta de estrutura material e humana. Para que se possa chegar à questão da simplificação de procedimentos e às outras sugestões objeto desta pesquisa, devem-se enumerar algumas causas externas que aumentaram significativamente o número de ações na Justiça do Trabalho.

3.4.1.1 Aumento da competência material

A Justiça do Trabalho mantém a mesma estrutura de quando passou a pertencer ao Poder Judiciário da União em 1946, com exceção das juntas de conciliação que passaram a ser chamadas de Varas do Trabalho e a exclusão dos vogais/juízes classistas.

A Constituição da República de 1988 definiu a competência Justiça Especializada para "conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre os trabalhadores e empregadores, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas". Ou seja, a Constituição conferiu à Justiça do Trabalho a competência imediata à solução dos litígios originadas das relações de emprego e deixou a cargo da lei ordinária outras tantas controvérsias.

No final do ano de 1998, o Congresso Nacional aprovou a Emenda Constitucional Nº 20, conhecida sob a alcunha de "Reforma da Previdência", que definiu competência à Justiça do Trabalho para executar, de ofício, as contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir. Vale ressaltar que as regras processuais para a execução das contribuições devidas à Previdência Social, somente foram inseridas na CLT no ano de 2000, por meio da Lei 10.035/00.

Em 1999 a Emenda Constitucional No 24 alterou os artigos 111, 112, 113, 115 e 116, e extinguiu a representação paritária de empregados e empregadores na estrutura da Justiça do Trabalho e as Juntas de Conciliação e Julgamento passaram a ser denominadas de Varas do Trabalho, cuja jurisdição é exercida por um Juiz singular. Evidente que não se trata de aumento de competência, mas houve diminuição de mão-de-obra sem contrapartida.

Por fim, na badalada reforma do Poder Judiciário, a Emenda Constitucional Nº 45/2004 alterou o disposto no art. 114 da Constituição Federal, aumentando consideravelmente a competência material da Justiça do Trabalho.

Assim, com a referida alteração, a Justiça do Trabalho passou a ser competente para processar e julgar as ações oriundas da relação de trabalho; as que envolvam exercício do direito de greve e representação sindical; os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data(matérias específicas); as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho e as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho.

Cumpre deixar registrado que mesmo antes da EC 45/2004, as ações de danos morais, decorrentes da relação de trabalho, eram decididas pela Justiça do Trabalho por força de decisão do Supremo Tribunal Federal.

Portanto, além das novas ações sob sua competência, destacando-se aquelas relativas às relações de trabalho que antes eram restritas aos dissídios entre empregados e empregadores, vale ressaltar que as ações de execuções fiscais referentes às multas administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização e que, antes da Emenda, eram julgadas na Justiça Federal e ali estavam emperradas anos e anos, foram todas "despejadas" na Justiça do Trabalho sem qualquer alteração na estrutura e treinamento de pessoal.

3.4.1.2 Automação e globalização

O desemprego estrutural é uma tendência em que são cortados vários postos de trabalho e uma das principais causas é a automação de várias rotinas de trabalho, substituindo a mão-de-obra do homem. As fábricas estão substituindo operários por robôs, os bancos estão substituindo funcionários por caixas eletrônicos, os escritórios informatizados já possuem sistemas que executam tarefas repetitivas e demoradas, eliminando alguns funcionários. Percebe-se, pois, que

A revolução da microeletrônica, a facilitação dos transportes e a saída do Estado dos principais setores da economia, invertendo a ordem (nos anos 70 as empresas corriam atrás dos governos e hoje ocorre exatamente o contrário), a criação dos blocos econômicos e a interligação das economias, consolidaram o que se chama de globalização. [...] o compromisso do capital é apenas com o lucro. A propósito, observa Sebastião Geraldo de Oliveira: " Na lógica globalizante o capital procura os locais dos menores custos de produção e desloca o produto até o consumidor em qualquer parte do mundo. O produto importado chega com preço competitivo, muitas vezes abaixo do custo de produção interna, comprometendo ou mesmo invibializando o empreendimento nacional.[...] Não é objetivo do empresário a criação de empregos, seu propósito é o lucro"(GONÇALVES, 2007, p. 96/97).

A globalização, mesmo sendo um processo antigo - iniciado com as navegações e o processo colonialista - se impôs na década de 90 como um fenômeno de dimensão realmente planetária, a partir dos Estados Unidos e da Inglaterra e do momento em que a tecnologia da informática se associou à de telecomunicações.

Essa facilidade de interação e comunicação propiciou a globalização do capitalismo e,

Hoje, como vimos, também a indústria se globaliza. Uma empresa pode manter apenas a sua cabeça pensante em Nova Iorque e distribuir suas fábricas pelo mundo. Pode até fabricar o mesmo produto por parte, uma espécie de linha de montagem inter-nações – como faz a GM, que usa 120 mil trabalhadores, em 17 países, para produzir o seu modelo S. É o que se chama de "fábrica mundial". (VIANA, 2007, P. 15).

Nesse contexto, o capital que, evidentemente, está compromissado apenas com o lucro, pode, a qualquer momento, mudar-se à procura de menores custos de produção, gerando uma alta rotatividade de mão-de-obra que, como afirmado por Pereira (2007), é causa de aumento de demandas na justiça do trabalho.

3.4.1.3 Terceirização

Terceirização é a presença de um intermediário entre o trabalhador e a empresa que lhe aproveita a força-trabalho, ou seja, as empresas, objetivando diminuir o custo da mão-de-obra e burlar os direitos dos trabalhadores, rescindem os contratos de trabalho, despedem os seus empregados e sugerem a eles que voltem a trabalhar nelas mesmas, mas contratados por uma cooperativa ou uma empresa de prestação de serviços.

Em linhas gerais, talvez se possa dizer que o sistema passou a trabalhar com a lógica inversa. Em vez de incluir, excluir – empregados, direitos, políticas sociais, etapas do processo produtivo. Como um vulcão que vomita lava e fogo, a fábrica passou a jogar para fora tudo o que não diz respeito ao foco de suas atividades.[...] Em certos casos (terceirização interna), ela reaproveita uma parte dos trabalhadores expulsos, valendo-se de outra empresa, que os comercializa. (VIANA, 2007)

Ainda conforme ensinamento de Viana (2007), a terceirização, em termos de direito do trabalho, desafia não só o princípio protetor, mas o próprio conceito de empregador. Há um sujeito que admite e assalaria e outro que efetivamente dirige.

Há, nessa forma de contrato de trabalho, grande rotatividade de mão-de-obra, visto que a empresa prestadora de serviços nem sempre consegue renovar seus contratos com as tomadoras de serviços, principalmente quando essas são empresas ou instituições públicas em que há necessidade de processo administrativo de concorrência.

3.4.1.4 Fragmentação dos empregos e fragilização dos sindicatos

Viana (2007) ensina que o sindicato tem servido ao longo do tempo para fabricar o direito e afirma que o direito do trabalho é substancialmente fruto de lutas sindicais.

Entretanto, hoje não se vêem mais lutas sindicais e o sindicato está fragilizado em todo o mundo, porque o sistema capitalista foi resolvendo a contradição de ter de reunir as pessoas para fazê-las produzir e vigiá-las e já faz com que produzam segmentadamente.

A forma fragmentada do emprego fragiliza o sindicato. O sindicato fragilizado não tem força para negociar condições de trabalho, reajustes salariais e redução de jornada de trabalho sem diminuição de salário. O resultado é a luta individualizada por direitos subtraídos que, como não podia ser diferente, deságua na Justiça do Trabalho.

3.4.1.5 Fiscalização do trabalho

De acordo com a Lei 10.593, de 6/12/2002, a UNIÃO tem poder para fiscalizar e punir, por intermédio dos Auditores-Fiscais do Trabalho, as empresas que desrespeitem as leis trabalhistas.

Sabe-se que a prevenção é o melhor remédio e que a intervenção estatal é relevante e necessária com seu poder de polícia para impor a vontade da lei, principalmente em defesa dos menos protegidos.

A prioridade da Inspeção do Trabalho, além do imperativo ético, é dever da Administração e inequivocadamente um ato de inteligência, pois incentiva a prevenção, eliminando, tanto quanto possível, as causas dos acidentes e doenças profissionais (OLIVEIRA, 2007).

Entretanto, o número de Auditores-Fiscais é insuficiente para coibir os abusos cometidos pela maioria das empresas que, por não se sentirem ameaçadas, continuam a desrespeitar os direitos dos trabalhadores. Estes, por sua vez, se vêem obrigados a procurar a Justiça do Trabalho para receberem os seus direitos, de forma individualizada.

3.4.1.6 Ministério Público do Trabalho e ações coletivas

De acordo com a Lei Complementar Nº 75, DE 20 DE MAIO DE 1993, o Ministério Público do Trabalho é competente para, entre outras atribuições, promover ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos.

Já o processo coletivo, no campo do trabalho, conforme ensinamento de Nassif (2008) teve início no Estado Social, com gênese nos Sindicatos, por meio dos instrumentos do dissídio coletivo e a ação de cumprimento. Entretanto, é no paradigma do Estado Democrático de Direito que o processo coletivo do trabalho ganha força, embutido no emergente processo coletivo geral.

Cabe registrar que as pesquisas do Projeto de Florença, citado na introdução do presente trabalho, redundaram em trabalhos divulgados em todo o mundo ocidental, nos quais estão inseridos conceitos de direitos coletivos (metaindividuais) e alertas sobre a necessidade de valorização e aperfeiçoamento de ações coletivas para corrigir lesões cujo prêmio é pequeno demais para qualquer indivíduo ser induzido a tentar uma ação.

No que se refere ao direito do trabalho, a questão não pode ser mensurada pelo valor monetário da lesão em face do caráter alimentar da verba, mas pelo receio de todo empregado de reclamar seus direitos e ser demitido.

Assim, considerando que o principal legitimado para propor ações coletivas é o Ministério Público do Trabalho que, além de contar com número reduzido de procuradores, ainda depende de denúncias e de autuações dos Auditores-Fiscais do Trabalho, resta patente que ainda falta muito para a concretude de tais ações. Por tudo isso, a espera da aprovação do código de processo coletivo é ansiosamente aguardada por toda a comunidade jurídica e pelos cidadãos brasileiros.

Visto, mesmo que superficialmente, alguns motivos externos que podem ser considerados como agravantes da morosidade do judiciário, resta promover algumas considerações sobre processo e procedimento, para que, ao final, se possa entender e aceitar, ou não, as propostas de mudanças que serão levadas a efeito nesta pesquisa.

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Sobre o autor
Éder Ângelo Braga

Analista Judiciário do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRAGA, Éder Ângelo. Acesso social à Justiça do Trabalho.: Um estudo sobre a necessidade de reforma da Justiça do Trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1964, 16 nov. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11977. Acesso em: 22 nov. 2024.

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