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Da possibilidade (ou não) da extinção da cláusula de inalienabilidade de bem imóvel constituída através de doação ou testamento

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27/11/2008 às 00:00
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7. Considerações finais.

Através do presente trabalho, quedou-se demonstrado que a propriedade plena possui quatro faculdades, quais sejam: uso, gozo, disposição e reivindicação. Ao ser gravada com cláusula de inalienabilidade a propriedade se torna limitada, vez que a faculdade de alienação é tolhida, ensejando ocorrer uma situação excepcional.

Entendemos que o artigo 1.676 do Código Civil/1916 (atual art. 1911) preceitua uma imposição que deve ser aplicada segundo as particularidades de cada caso, sob pena de um rigor excessivo e injustificável, tornando-se a letra fria da lei uma medida a atentar contra os interesses da própria sociedade, pois existe o interesse social e até público na circulação dos bens, tendo em mira, inclusive, os preceitos constitucionais que asseguram o direito de propriedade e, mais do que isso, de que a propriedade deve ter uma finalidade social (art. 5º inc. XXII e XXIII, da nossa Carta Política de 1988).

Não obstante conhecermos orientação jurisprudêncial contrária, entendemos ser perfeitamente possível a retirada (cancelamento) dos gravames de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade, sem a necessidade de sub-rogação, conforme determina o parágrafo único do art. 1911 do novel Código Civil, visto que está-se diante de "indeterminação do preceito", cabendo ao magistrado decidir no caso concreto, à luz dos princípios de direito, ex vi art.1.911 do CC, art. 1109 do CPC, art. 5º, LICC, art. 5º inc. XXII e XXIII, da da Constituição da República.


Bibliografia.

ALVES, Joaquim Augusto Ferreira. Manual do Código Civil Brasileiro, vol XIX.

BEVILAQUA, Clovis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil – v. VI., 10.ed. Rio de Janeiro: Paulo de Azevedo, 1958.

NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria Andrade. Código Civil Comentado, 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

NERY, Rosa Maria Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, 9 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

RODRIGUES, Sílvio. Direito civil: v.7 - Direito das sucessões, São Paulo: Saraiva, 1979.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil:Direito das Sucessões. São Paulo: Atlas, 2003.


Notas.

"CIVIL. PROCESSO CIVIL. DOAÇÃO COM CLÁUSULA DE INALIENABILIDADE. MORTE DOS DOARES. PRETENSÃO DE EXTINÇÃO DAS RESTRIÇÕES. CARÊNCIA DE AÇÃO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO.

01.É facultado ao doador gravar os bens doados com cláusula de inalienabilidade temporária ou vitalícia, na forma do caput do artigo 1.911, do Código Civil, sendo vedado ao Poder Judiciário, salvo em casos especialíssimos, invalidar a cláusula que instituiu o gravame;

02.Embora seja admissível se temperar os rigores das disposições do artigo 1.911, do Código Civil, de modo a se afastar a cláusula de inalienabilidade em casos excepcionais, para evitar prejuízos irreparáveis aos donatários, é necessário que as justificativas sejam sérias, bastantes e suficientes para convencer o julgador, o que não ocorre no caso em espécie.

03.Encontrando a pretensão deduzida em juízo óbice no Código Civil é caso de impossibilidade jurídica do pedido

04.Recurso conhecido e desprovido, sentença mantida". (20070110491348APC, Relator JOÃO BATISTA TEIXEIRA, 3ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, julgado em 18/06/2008, DJ 02/07/2008 p. 92). (grifou-se).

2. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil:Direito das Sucessões. São Paulo: Atlas, 2003, p. 208.

3. Art. 128. À margem dos respectivos registros, serão averbadas quaisquer ocorrências que os alterem, quer em relação às obrigações, quer em atinência às pessoas que nos atos figurarem, inclusive quanto à prorrogação dos prazos.

4. Art. 167 - No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos.

(...)

II - a averbação:

(...)

11) das cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade impostas a imóveis, bem como da constituição de fideicomisso;

5. Art. 247 - Averbar-se-á, também, na matrícula, a declaração de indisponibilidade de bens, na forma prevista na Lei.

6. VENOSA, Silvio de Salvo. Op. Cit, p. 210.

7. Consoante dispõe o art. 1676 do Código Civil de 1916 a cláusula de inalienabilidade não impede a expropriação por necessidade ou utilidade pública, nem a execução por dívidas provenientes de impostos relativos ao respectivo imóvel. Diverso não é o entendimento dos tribunais sobre o tema, senão vejamos: "CIVIL. CLÁUSULA DE INALIENABILIDADE. DESPESAS CONDOMINIAIS. O imóvel, ainda que gravado com a cláusula de inalienabilidade, está sujeito à penhora na execução de crédito resultante da falta de pagamento de quotas condominiais. Recurso especial não conhecido. (REsp 209.046/RJ, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 08.11.2002, DJ 16.12.2002 p. 311) e EXECUCAO FISCAL. PENHORA SOBRE BENS ALIENADOS FIDUCIARIAMENTE. CREDITO DA FAZENDA PUBLICA. Responde pelo pagamento da divida ativa da fazenda publica a totalidade dos bens e rendas de qualquer origem ou natureza do sujeito passivo, inclusive os gravados por ônus real ou clausula de inalienabilidade, no termos do art. 30, da lei 6.830/80. Assim, os bens alienados fiduciariamente podem ser penhorados para garantia da execução fiscal. Alem disto, compete ao credor invocar a impenhorabilidade visto que a garantia foi estabelecida a seu favor. AGRAVO DESPROVIDO". (Agravo de Instrumento Nº 70004831632, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio Heinz, Julgado em 30/10/2002).(grifou-se).

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8. Pela cláusula de incomunicabilidade, os bens assim gravados não se comunicam ao cônjuge herdeiro, não importando qual seja o regime do casamento.

9. Súmula 49 do STF: A cláusula de inalienabilidade inclui a incomunicabilidade dos bens.

10. Imperioso se faz ressaltar, por necessário, que a problemática da exclusão da cláusula de inalienabilidade imposta na doação se dá apenas quando o doador vem a falecer, não havendo como o donatário suprimir o gravame.

11. No caso do bem de família a impenhorabilidade, que é uma das formas ou espécies de inalienabilidade, é estabelecida em benefício da família, e não do instituidor.

12. RODRIGUES, Sílvio. Direito civil: v.7 - Direito das sucessões, São Paulo: Saraiva, 1979, p. 139.

13. VENOSA, Silvio de Salvo. Op. Cit, p. 207.

14. "EMBARGOS À EXECUÇÃO - TÍTULO DE CRÉDITO - PRESCRIÇÃO - INEXISTÊNCIA - IMÓVEL - CLÁUSULA DE INALIENABILIDADE E IMPENHORABILIDADE - MORTE DA EXECUTADA - EXTINÇÃO DO ÔNUS. - Não há falar em prescrição, quando proposta a ação e ocorrida a citação válida dentro do prazo legal, pois conforme disposição legal, feita a citação esta interrompe o prazo prescricional. Inteligência do art. 219 do CPC. - Com efeito, não subsisti o vínculo em função da superveniência da morte da executada, transferindo-se o bem, livre e desembaraçado aos herdeiros daquela, podendo assim a penhora sobre ele recair". (Apelação Cível nº 483.095-3, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Rel. Des. Domingos Coelho, DJ: 21/05/2005). (grifou-se). Nesse mesmo sentido: "DIREITO CIVIL-TESTAMENTO PÚBLICO-BEM GRAVADO COM CLÁUSULA DE INALIENABILIDADE INCOMUNICABILIDADE-CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS-CARACTERIZAÇÃO-LEGALIDADE. I. Havendo disposição testamentária com cláusula de inalienabilidade», ocorrendo a morte do beneficiado extingui-se a clausulação. II. Não existindo, nenhum óbice, eficaz a Cessão de Direitos Hereditários. À unanimidade de votos, dar provimento ao recurso de apelação, reformando na integra a sentença monocrática. (Apelação Cível nº 150933-1, 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Pernambuco, Rel. Des. Leopoldo de Arruda Raposo, julgado em 10/10/2007, DJ 23/11/2007). (grifou-se).

15. VENOSA, Silvio de Salvo. Op. Cit, p. 207.

16. ALVES, Joaquim Augusto Ferreira. Manual do Código Civil Brasileiro, vol XIX, p. 190.

17. O Código Civil de 1916 permitia a imposição imotivada da Cláusula de Inalienabilidade.

18. NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria Andrade. Código Civil Comentado, 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, pp.995-996.

19. É importante registrar que a problemática da exclusão da cláusula de inalienabilidade imposta na doação se dá apenas quando o doador vem a falecer, não havendo como o donatário suprimir o gravame.

20. BEVILAQUA, Clovis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil – v. VI., 10.ed. Rio de Janeiro: Paulo de Azevedo, 1958, p. 105.

21. BEVILAQUA, Clovis. Op Cit, p. 105.

22. Esta possibilidade de sub-rogação de gravame já era prevista art. 1° do Decreto-Lei nº 6.777/44: Art. 1º Na sub-rogação de imóveis gravados ou inalienáveis, estes serão sempre substituídos por outros imóveis ou apólices da Dívida Pública.

23. Consoante o abalizado escólio de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery "Somente nos casos expressos em lei pode o juiz decidir por equidade (CPC 127). Em todos os procedimentos de jurisdição voluntária, há autorização para o juiz assim proceder (CPC 1109). A lei processual concede ao juiz a oportunidade de aplicação dos princípios da equidade ao arrepio da legalidade estrita, podendo decidir escorado na conveniência e oportunidade, critérios próprios do poder discricionário, portanto inquisitorial, bem como de acordo com o bem comum. NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, 9 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p.1061.

24. "AUTORIZAÇÃO JUDICIAL - BEM IMÓVEL - EXCLUSÃO DA CLÁUSULA DE INALIENABILIDADE - TRANSMISSÃO NÃO ONEROSA - IMPOSSIBILIDADE - O ordenamento jurídico não salvaguarda a pretensão do proprietário de exclusão da cláusula de inalienabilidade incidente sobre o imóvel que lhe fora transmitido de forma não onerosa, excetuando-se a situação de substituição do bem gravado". (Apelação Cível n° 465.017-1, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Rel. Des. Sebastiao Pereira de Souza, DJ 03/06/2005). (grifou-se).

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Sobre o autor
Carlos Eduardo Jar e Silva

Advogado em Recife (PE). Membro do escritório Trigueiro Fontes Advogados. Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Carlos Eduardo Jar. Da possibilidade (ou não) da extinção da cláusula de inalienabilidade de bem imóvel constituída através de doação ou testamento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1975, 27 nov. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12011. Acesso em: 26 abr. 2024.

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