5. A APLICAÇÃO DOS TRATADOS INTERNACIONAIS PELOS TRIBUNAIS BRASILEIROS
A jurisprudência brasileira ainda não é unânime com relação à aplicação dos tratados internacionais que versem sobre matéria tributária em face da legislação interna.
Entretanto, vozes há que se avolumam no sentido de garantir ao direito internacional convencional a devida primazia sobre o direito interno, tendo em vista os preceitos permissivos para tanto, sejam eles constitucionais (art. 4º, inc. IX e parágrafo único e art. 5º, parágrafo 2º), legais (art. 98 CTN) ou doutrinários.
Veja-se, por exemplo, decisão prolatada pelo extinto Tribunal de Alçada do Estado do Paraná:
1) No sistema do direito tributário brasileiro cabe ao Presidente da República celebrar contratos, convenções e atos internacionais sujeitos ao referendo do Congresso Nacional (art. 84, VIII, c.c. art. 49, I, CF). 2) Diante da ratificação do acordo internacional para a isenção de tributos pela execução do projeto de gasoduto Brasil-Bolívia pelo Congresso Nacional, convolou-se em norma tributária interna, cabendo aos entes políticos editar leis específicas de isenção enquanto vigorar o acordo, dentro da sua própria competência. 3) Não há discricionariedade do poder público municipal em conceder ou não a isenção nos moldes preconizados no acordo tributário internacional firmado entre o governo federal e o governo da Bolívia, pelo que se impõe em reconhecer como nulo o lançamento efetuado em contrariedade ao definido no Decreto nº 2142/97, a rigor do artigo 98 do Código Tributário Nacional." (TA/PR, 7ª Câm. Cív., Rel. Juiz Miguel Pessoa, Ac. 17.387, Ap. Civ. 208+540-5, DJ 6493 de 07.11.03)"TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ISS. IMPLANTAÇÃO GASODUTO BRASIL-BOLÍVIA. ISENÇÃO TRIBUTÁRIA POR ACORDO INTERNACIONAL RATIFICADO PELO CONGRESSO NACIONAL (DEC. Nº 212/97 E 128/96). ACOLHIMENTO PELOS ENTES TRIBUTANTES. LANÇAMENTO NULO. ISENÇÃO – QUESTÃO PREJUDICIAL À ANÁLISE DA CDA. SENTENÇA MANTIDA EM REEXAME NECESSÁRIO. RECURSO VOLUNTÁRIO NÃO CONHECIDO.
No mesmo sentido, decisão prolatada pelo Superior Tribunal de Justiça:
. 1. Não tem incidência a Súmula nº 126 do Superior Tribunal de Justiça, quando o acórdão recorrido está assentado em compreensão de dispositivos infraconstitucionais, não constituindo fundamento do julgado a mera alusão a artigo da Carta Maior."AGRAVO REGIMENTAL. ICMS. BACALHAU. ISENÇÃO. GATT. FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL INEXISTENTE. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA Nº 126/STJ.ART. 98 DO CTN
2. "Quem tributa ou isenta do ICMS são os Estados, mas a União pode, por acordo internacional, garantir que a tributação, quando adotada, não discrimine os produtos nacionais e os estrangeiros, em detrimento destes." (EDcl no REsp nº 146.236/RJ). 3. Continua em vigor a Súmula nº 71 deste Tribunal, onde se assenta que "o bacalhau importado de país signatário do GATT é isento de ICMS." 4. Agravo regimental a que se nega provimento."
(AgRg no Ag 304.962/RJ, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI, SEGUNDA TURMA, julgado em 06.03.2001, DJ 13.08.2001 p. 136)
Ainda, no mesmo diapasão, o STJ:
1. A importação da Vitamina A-1 - processa-se beneficiada por específica redução de alíquota decorrente do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio - GATT. A lista III, aplicável à Vitamina A-1, não excepcionou os derivados: álcool, palmitato ou acetato. 2. Multifários precedentes jurisprudenciais. 3. Recurso sem provimento." (REsp 129.280/SP, Rel. Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16.11.1999, DJ 27.03.2000 p. 66)"TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. REDUÇÃO DE ALÍQUOTA. DERIVADOS DA VITAMINA A-1 - GATT (Lista III) - CTN, ARTIFOS 96 E 98 - DECRETO 78.887/88.
Possível perceber, deste modo, clara tendência da jurisprudência pátria a reconhecer a primazia do direito convencional internacional sobre o direito interno, mormente num contexto político e histórico que tem por objetivo maior a interação entre os povos para o progresso da humanidade.
A adoção destes princípios pelos tribunais brasileiros só leva a entender que a República Federativa do Brasil, passa assim, a gozar de prestígio na ordem jurídica internacional, tendo em vista a ética e respeito dedicados ao direito das gentes, seja quando este se expressa na ordem exclusivamente internacional, ou quando se integra ao ordenamento jurídico pátrio.
6. CONCLUSÃO
Ante a pesquisa realizada, é possível afirmar que o tema em questão requer, ainda, amplo aprofundamento por parte da doutrina e da jurisprudência para que se reconheça, por derradeiro, a aplicabilidade dos tratados internacionais em matéria tributária em face da ordem jurídica interna brasileira.
É de se levar em consideração que, se a Constituição Federal não delineou expressamente o regramento da questão suscitada no presente trabalho, ao menos indicou, por meios principiológicos, o caminho correspondente aos anseios por ela representados. Não obstante, tendo em vista que o atual panorama jurídico mundial tem se inclinado para a primazia do Direito Internacional Público em detrimento das legislações infraconstitucionais dos países, também se mostra importante a inserção do Estado brasileiro na sociedade mundial globalizada, em que, a cada dia, mais e mais barreiras, sejam políticas, econômicas, culturais, tecnológicas e jurídicas são quebradas.
Assim, visando ao progresso dos povos e à formação de uma comunidade de nações, deve-se engendrar esforços no sentido de ajustar a legislação tributária interna às disposições dos tratados internacionais de que o Brasil faça parte, e de se assegurar a devida aplicabilidade em nossa ordem jurídica dos pactos firmados ante demais atores do Direito Internacional Público. Como restou comprovado, estes são os preceitos adotados, muitas das vezes, pelas vozes jurisprudenciais, tanto as mais tradicionais como as mais modernas.
A doutrina, ainda dividida, mas com nomes de peso a sustentar a supremacia dos tratados internacionais sobre a legislação pátria, há de clarear os trilhos a serem percorridos, para que sejam alcançados denominadores comuns acerca da matéria.
Se faz necessário também que os entes da federação soem em uníssono ante as disposições de direito internacional convencional, no intuito de que seja garantida aplicabilidade eficaz do direito dos tratados, imprimindo credibilidade do Brasil na ordem jurídica internacional.
A sociedade internacional contemporânea, cada vez mais interligada, ainda espera por ações estatais que ponham termo às antinomias existentes entre direito internacional e direito interno, no escopo de se alcançar a efetiva integração mundial dos povos.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Notas
- REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. 5ª ed. rev. e atual., São Paulo: Saraiva, 1995, p.14
- MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito Constitucional Internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 1994, p.9
- ACCIOLY, Hildebrando. Manual de Direito Internacional Público. 15ª ed., rev. e atual., São Paulo: Saraiva, 2002, p.28
- CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 14ª ed. rev. ampl. e atual., São Paulo: Malheiros, 2000, p.161
- FERNANDES, Edison Carlos. Sistema Tributário do Mercosul. 2ª ed. atual., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p.30
- ACCIOLY, Hildebrando. Manual..., p.29
- ACCIOLY, Hildebrando. Manual..., p.30
- CARRAZZA, Roque Antonio. Curso..., p.162
- FERNANDES, Edison Carlos. Sistema..., p.36
- MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito..., p.10
- ACCIOLY, Hildebrando. Manual..., p.34
- XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 5ª ed., reform. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.100
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.100
- Ibid, p.101
- MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito..., p.263
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.102
- MELLO, Celso D. de Albuquerque, Direito..., p.263
- ACCIOLY, Hildebrando. Manual..., p.37
- ACCIOLY, Hildebrando. Manual..., p.37
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.102
- MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito..., p.26
- ACCIOLY, Hildebrando. Manual..., p.38
- Ibid, p.25
- ACCIOLY, Hildebrando. Manual..., p.39
- ACCIOLY, Hildebrando. Manual..., p.41
- ACCIOLY, Hildebrando. Manual..., p.42
- SIDOU, J. M. Othon. Dicionário Jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 1990, p.194
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.106
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.106
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.108
- Ibid, p.113
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.113/114
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.117
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.117
- TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. 16ª ed. rev. e atual., São Paulo: Malheiros, 2002, p.78
- SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. rev. e atual., São Paulo: Malheiros, 2005, p.494
- MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 9ª ed., atual., São Paulo: Atlas, 2001. p.549
- MORAES, Alexandre de. Direito..., p.550
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.117
- MORAES, Alexandre de. Direito..., p.551
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.117
- SIDOU, J. M. Othon. Dicionário..., p.276
- SILVA, José Afonso da. Curso..., p.45
- CASELLA, Paulo Borba. Direito Internacional Tributário Brasileiro. São Paulo: LTr, 1995, p.25
- CARRAZZA, Roque Antonio. Curso..., p.164
- COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Direito Tributário Contemporâneo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p.166
- COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Direito..., p.166
- BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 7ª ed., rev. e complem., Rio de Janeiro: Forense, 2000, p.639
- Ibid, p.167
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.119
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.119
- CASELLA, Paulo Borba. Direito..., p.24
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.93
- MELO, José Eduardo Soares de. Curso de Direito Tributário, 2ª ed., São Paulo: Dialética, 2001, p.130
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.134
- CORRÊA, Sergio Feltrin. Código Tributário Nacional Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p.430
- CARRAZZA, Roque Antonio. Curso..., p.292
- Ibid, p.293
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.124
- CASELLA, Paulo Borba. Direito..., p.27
- AMARAL, Antonio Carlos Rodrigues do. Comentários ao Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 1998, p.36
- CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p.153
- MELO, José Eduardo Soares de. Curso..., p. 100
- Ibid, p.265
- CARRAZZA, Roque Antonio. Curso..., p.331
- CARRAZZA, Roque Antonio. Curso..., p.337
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.136
- XAVIER, Alberto. Direito..., p.137
- AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 11ª ed., rev. e atual., São Paulo: Ed. Saraiva, 2005, p.188
- BEUX, Carla. Direito Tributário Atual. Curitiba: Juruá, 2000, p.203
- AMARO, Luciano. Direito..., p.180
- Ibid, p.180
- RIBEIRO, Maria de Fátima. Comentários ao Código Tributário Nacional. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p.204
- Ibid, p.211
- PAULSEN, Leandro. Direito Tributário. Porto Alegre: Malheiros, 2000, p.94
- BALEEIRO, Aliomar. Direito..., p.639
- MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 24ª ed. rev. atual. e ampl., São Paulo: Malheiros, 2004, p.91
- AMARO, Luciano. Direito..., p.181
79.MACHADO, Hugo de Brito. Revista Dialética de Direito Tributário n.º 93. São Paulo: Dialética, 2003, p.25