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O depósito recursal na Justiça do Trabalho como forma de impedir o livre acesso ao Judiciário

Leia nesta página:

Assunto espinhoso que gera reações antagônicas em relação à defesa ou crítica do respectivo instituto.

Com fundamento no artigo 899 e seus parágrafos da C.L.T., nas Leis 8.177/91 e 8.542/92, vem a Justiça do Trabalho julgando desertos os recursos, interpostos pelos reclamados, que não efetuam os depósitos em conta vinculada do trabalhador.


Esse procedimento é justificado, segundo maioria esmagadora dos entendimentos jurisprudenciais, como forma de se garantir a execução.

Tal entendimento, porém, não se justifica, sendo os acima referidos dispositivos legais inconstitucionais, por ferirem o livre acesso ao judiciário, o duplo grau de jurisdição e a igualdade de tratamento entre as partes.

Inicialmente deve-se destacar que a garantia da execução ocorre em regular procedimento executório, movido pela parte interessada ou ‘ex officio’ pelo Juiz (art. 878 da CLT), onde estes requererão a expedição de mandado de citação ao executado a fim de que este pague a quantia devida ou indique bens que a garantam.

Por trazer um comando excepcional, qual seja, o de autorizar o magistrado a agir como se parte fosse, esta regra deverá ser aplicada restritivamente, ou seja, poderá o Juiz iniciar apenas e tão somente o procedimento de execução.

Contudo, pretendendo a parte a execução provisória do título executivo, representado pela sentença de primeiro grau de jurisdição, deverá REQUERER a extração de carta de sentença, nos termos dos artigos 896 e 899 do Diploma Consolidado combinados com os artigos 521, 589 e 590 do Código de Processo Civil.

Logo, a execução provisória depende da manifestação da parte interessada, sendo que qualquer outro entendimento, muito embora com o louvável intuito de se proteger o "hiposuficiente", fere de morte o "caput" do artigo 5º da Constituição Federal.

É de se destacar que o Juízo está autorizado a promover a execução, o que somente ocorrerá após o trânsito em julgado da decisão de primeira instância que poderá ser revista parcial ou totalmente em sede de grau recursal.

Portanto, qualquer iniciativa de se impor a uma das partes um ônus, notadamente a antecipação da execução, sem que este provenha de ato da parte interessada, provoca o desequilíbrio processual entre os litigantes, ocasionando a tão odiosa desigualdade, repudiada pelo texto Constitucional no artigo acima mencionado.

Ressalte-se que durante a fase de conhecimento, englobando esta a fase recursal, deverá manter o Magistrado seu caráter de imparcialidade, garantindo a igualdade de tratamento entre as partes, estando autorizado a agir de ofício, pelo Diploma Consolidado, somente com vistas a promover a execução.

Além do mais ao exigir depósito prévio para a interposição de recurso, de qualquer da partes, fere, os dispositivos legais acima mencionados, o artigo 5º, inciso XXXIV, letra "a", da C.F., que assim reza: "Art. 5º. ... XXXIV - são a todos assegurados, independentemente, do pagamento de taxas: a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;"

A exigência de depósito prévio para a interposição de recurso fere, ainda, os incisos XXXV e LV, do mesmo artigo 5º, da Constituição Federal.

As violações acima mencionadas ocorrem uma vez que privam o jurisdicionado da apreciação pelo Judiciário de seu inconformismo, bem como impede o exame da matéria em sede de grau recursal.

Nem ao menos se diga que eventualmente as empresas, tendo em vista serem pessoas jurídicas, teriam condições de suportar os depósitos judiciais haja vista que seus valores frente ao capital, não trariam grandes embaraços.

Ocorre que a maioria esmagadora dos empregadores do Brasil, são micros, pequenos e médios empresários que frente a uma exigência inconstitucional ficam ou descapitalizados ou impedidos de ver apreciado o seu apelo, inibindo a revisão da lide em segundo grau, ferindo mandamento constitucional.

Ressalte-se que a atividade judicante é exercida unicamente pelo Estado representado pelo Poder Judiciário, visando a distribuição da Justiça, o que enaltece sua essencialidade para as relações humanas.

Impor um tratamento desigual a fim de se garantir uma possível igualdade, que é dúbia frente à grande maioria de micro, pequenos e médios empresários, é partir de uma visão esteriotipada de que todo aquele que é vencido, num primeiro momento, em uma discussão Judicial visa apenas prejudicar o vencedor, ou burlar a legislação.

Em nossos dias vê-se a alteração do relacionamento entre capital e trabalho, objetivando-se sua flexibilização, uma vez que notadamente nossa população vem adquirindo um maior amadurecimento nas relações interpessoais, sobretudo entre empregadores e seus colaboradores.

Observa-se também que muitas das questões que são postas em discussão junto ao Judiciário, em especial a nível trabalhista, trazem em seu bojo pretensões opostas juridicamente viaveis, que justificam a análise do caso em segundo grau.

Em virtude destas transformações e ante a viabilidade das pretensões opostas, colocar óbice ao acesso ao Judiciário e ao duplo grau de jurisdição, violenta sobremaneira a Constituição e as partes.

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Além disso, o valor depositado com o intuito de "garantir" o juízo pode mostar-se insuficiente ou excessivo, dependendo do caso concreto, sendo que no primeiro caso nada garantiria e no segundo oneraria desmesuradamente o recorrente.

Sendo assim, por todos os ângulos que se analise a questão, seja no tratamento diferenciado entre as partes, seja no óbice ao exame da matéria perante o segundo grau de jurisdição, verifica-se a inconstitucionalidade do depósito recursal, ou ainda seja pela inexistência ou excesso de garantia.

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Sobre o autor
Luís Fernando Lavigne de Souza

advogado em Sorocaba (SP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Luís Fernando Lavigne. O depósito recursal na Justiça do Trabalho como forma de impedir o livre acesso ao Judiciário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 42, 1 jun. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1264. Acesso em: 23 dez. 2024.

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