Objetivamos neste estudo abordar a amplitude da assistência judiciária e o cabimento dos honorários advocatícios dela decorrente na Justiça do Trabalho.
II - Da atuação do advogado
Após séculos de trabalho árduo em pró da sociedade como um todo, o advogado tem o seu papel reconhecido, sendo considerado indispensável à administração da Justiça (art. 133, CF; art. 2º, Lei 8.906/94; e art. 2º, Cód. de Ética Profissional), estando em igualdade com o juiz e os membros do ministério público (art. 6º, Lei n. 8.906/94).
O advogado é independente no exercício da profissão; nenhum receio de desagradar a magistrado ou a qualquer autoridade, nem mesmo o seu prestígio pessoal, deve deter o advogado em sua função (arts. 18 e 31, Estatuto da Ordem dos Advogados; art. 2º, parágrafo único, II, Cód. de Ética e Disciplina).
Não se trata de uma profissão cheia de louros ou mesmo glória, como muitos possam pensar, mas cheia de sacrifícios e renúncias sempre em uma busca incansável, onde a cada dia o profissional é obrigado a dar mais de si, privando-se de suas vontades pessoais.
III - Da assistência judiciária gratuita
A assistência judiciária fez parte da Constituição de 1934, esquecida pela de 1937, também está presente nas 1946, 1967 e 1988.
"É dever do Estado prestar assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos" (art. 5º, LXXIV, CF).
A assistência judiciária consiste no benefício concedido ao necessitado de, gratuitamente, utilizar os serviços profissionais de advogado e demais auxiliares da Justiça e movimentar o processo.
"Assistência judiciária" é o gênero e a "Justiça Gratuita" a espécie: esta, no sentido de isenção de emolumentos de serventuários, custas e taxas. "Isenção de custas" é o benefício parcial que alcança além das custas, os emolumentos.(1)
IV - Da legislação pertinente ao tema
A Lei n. 1.060, de 5.2.1950, disciplina a concessão da assistência judiciária, basilando seus requisitos e abrangência.
Importante mencionar que os benefícios da assistência judiciária gratuita alcançam não apenas os brasileiros, mas também os estrangeiros residentes no País, que necessitarem recorrer à Justiça penal, civil, militar ou do trabalho (art. 2º, Lei n. 1.060/50).
Na Justiça do Trabalho, temos a assistência judiciária prestada pelo Sindicato profissional a que pertencer o trabalhador (art. 14, caput, Lei n. 5.584/70).
V - A sucumbência no processo do trabalho
Pela natureza do processo do trabalho, não se aplica a sucumbência no procedimento laboral, como ocorre no processo civil.
A lei trabalhista determina: a) as custas serão pagas à final, sendo que em caso de procedência parcial, não há a sua fixação de forma proporcional, assumindo o reclamado (réu) a responsabilidade pelo seu pagamento (art. 789, CLT); b) não há a hipótese quanto ao pagamento da verba honorária, pois, é atribuído às partes a capacidade postulatória (art. 791). Por outro lado, pondere-se que não há expressa previsão legal quanto ao cabimento ou não da sucumbência.
Também não pode se falar em aplicação subsidiária do processo civil, na medida em que o instituto da sucumbência é incongruente com o processo laboral (art. 769, CLT). O procedimento laboral sofre a influência do princípio protetor, o qual é a razão histórica e doutrinária do Direito do Trabalho.
Discute-se se o princípio protecionista do Direito do Trabalho deve prevalecer também no direito processual. Trueba Urbina responde afirmativamente, tanto as normas substantivas como as processuais são essencialmente protecionistas e tutelares dos trabalhadores", afirmação que é também de Radbruch, para quem o "direito processual oficial caracteriza-se pelo protecionismo". Reflexos estão no arquivamento do processo, quando o empregado não comparece à audiência, e na condenação à revelia, diante do não-comparecimento do empregador. No ônus da prova, mais acentuado para o empregador, está outra manifestação. Na intervenção do juiz para verificar a verdade, também temos outro fenômeno, observável no direito processual trabalhista. (2)
VI - A assistência judiciária é monopólio da entidade
sindical no
processo do trabalho? Como ficam os honorários advocatícios?
Entendemos que a prestação da assistência judiciária no âmbito da Justiça do Trabalho não é monopólio da Entidade Sindical profissional, em que pese o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho esboçado no Enunciado n. 219. Na Justiça do Trabalho, a condenação de honorários advocatícios, nunca superior a 15%, não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte estar assistida por Sindicato da Categoria profissional e comprovar percepção de salário inferior ao dobro do mínimo legal, ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família.
Em relação ao tema, não devemos nos esquecer do Enunciado n. 11. É inaplicável na Justiça do Trabalho o disposto art. 64 do Código de Processo Civil, sendo os honorários de advogado somente devidos nos termos do preceituado na Lei n. 1.060, de 1950. Editado pela Resolução Administrativa n. 28/69, DO 21.8.69.
O mencionado artigo 64 do Código de Processo Civil diz respeito ao Código de 1939, o qual tem seu correspondente no artigo 20 da atual Lei Processual.
É uma das garantias do ser humano, como cidadão, a assistência jurídica integral e gratuita, sendo obrigação do Estado a sua concessão. A assistência jurídica é prevista no ordenamento jurídico, antes mesmo do advento da Lei n. 5.584/70, através do diploma Lei n. 1.060/50.
A assistência, na prática, não se restringe ao disposto na Lei n. 5.584/70, arts. 14 e 18. Temos, assim que a exigência da realidade supera a norma jurídica e a ela se antecipa de há muito. E dentro dessa realidade, justo e salutar que se adote o princípio da sucumbência, como medida saneadora (aí incluído o pagamento de custas etc., nos termos do art. 21 do CPC) em homenagem aos princípios da restitutio in integrum e da perpetuatio jurisdictionis, evitando-se, por outro lado, pedidos exorbitantes e/ou desprovidos de fundamento legal. (3)
A questão em debate não deve ser confundida com as controvérsias em torno do jus postulandi na esfera trabalhista. São questões diversas.
É obrigação do Estado a criação de mecanismos para assegurar a gratuidade, visando a efetiva implantação da assistência jurídica integral aos necessitados. Porém, isto não elide a gratuidade quando prestada pelo advogado, seja integrante ou não do sindicato.
É odiosa a diferenciação que se faz entre o advogado particular e o integrante do quadro judiciário da entidade sindical. Deve o Judiciário Trabalhista, quando se solicita a assistência judiciária, deferir a verba, independente de estar o reclamante assistido ou não por advogado da entidade sindical.
A L. 5.584/70, art. 14 (em apêndice), não pode ser interpretada, como vem sendo, no sentido de ter excluído do processo trabalhista a L. 1.060, tornando a assistência uma exclusividade dos sindicatos dos empregados: a) porque o texto não diz (como poderia parecer) que na Justiça do Trabalho a assistência "só será prestada pelo sindicato"; b) porque uma interpretação limitadora, que se deixe levar pela primeira impressão gramatical que transmite o texto, contraria o progresso histórico brasileiro; este é no sentido de seu aperfeiçoamento. Pontes de Miranda afirma mesmo que "a escolha de advogado pela parte marca a evolução da justiça gratuita no Brasil" ("Comentários ao CPC/39", art. 67); viola ainda os postulados igualitários; significa retrocesso no próprio direito processual comum brasileiro; falta-lhe visão da grandeza da Justiça e da missão do advogado; c) porque, perquirindo-se a finalidade da lei, não há vantagem na discriminação contra o necessitado trabalhista, em cotejo com o necessitado do processo comum; seja o advogado do sindicato, seja o advogado escolhido pelo trabalhador, os honorários serão pagos pelo adversário vencido; d) porque era inconsistente o argumento de que na Justiça do Trabalho o advogado era desnecessário quando se reconhecia às partes o direito de postular (v. art. 791, nota 1). E, além do mais, era como dispensar-se assistência médica dizendo-se que o doente pode automedicar-se; e) porque se deixariam sem assistência judiciária: os trabalhadores das cidades onde não há sede do sindicato e existe Junta de Conciliação e Julgamento (os promotores nesses casos não têm atribuições); os trabalhadores de sindicatos que não possam organizar a assistência; os servidores públicos estaduais e municipais, que não tenham categoria que os represente; as domésticas e seus patrões; as hipóteses em que o advogado do sindicato está impedido; o pequeno empreiteiro; o cliente deste; o pequeno empregador arruinado; certos humildes reclamados (tão hipossuficientes quanto seus reclamantes); o trabalhador que discorde da orientação adotada pelo sindicato. O remédio não será permitir a aplicação da L. 1.060 a esses casos apenas, mas reconhecer francamente a coexistência das duas, sem limitações. "A defesa dos pobres deve ser igual à de seu adversário" (Gaetano Franceschini, "Il Patrocinio", Milano, 1903). (4)
O trabalhador, diante do princípio da igualdade (art. 5º, caput, CF), deve ter o direito de escolha quanto a pessoa que irá assisti-lo em juízo, seja advogado particular ou integrante do corpo jurídico da entidade sindical profissional.
Com fundamento no mesmo princípio constitucional - princípio da igualdade, o advogado não pode ser preterido em relação ao integrante do corpo jurídico da entidade sindical profissional, quanto a fixação da verba honorária em condenação pela assistência judiciária.
Por outro lado, convém salientar que a Lei n. 5.584/70, em seus artigos 14 e seguintes não revogou, ainda que tacitamente, os teores da Lei n. 1.060/50.
As duas leis coexistem no mundo jurídico, na medida em que a Lei n. 5.584/70 limita-se a declinar que é uma das atribuições do sindicato a assistência judiciária.
Pondere-se que a lei nova, a qual estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior (art. 2º, § 2º, LICC).
VII - Enfoque jurisprudencial
A jurisprudência, em algumas decisões, tem acatado a tese de que a verba honorária advocatícia pode ser fixada, em caso da assistência judiciária, para o advogado particular, como se vislumbra das seguintes ementas:
"Havendo declaração da obreira, nos autos, afirmando ser pessoa necessitada, e, por conseqüência, não ter condições de arcar com as despesas processuais sem prejuízo próprio e de sua família, não desconstituída pela parte contrária, são devidos os honorários advocatícios nos termos da Lei n. 1.060/50, com as alterações da Lei n. 7.510/86, e da Lei n. 7.115/83, e conforme a última parte da Súmula n. 219 do e. TST" (TRT - 9ª R - 2ª T - Ac. n. 3965/96 - Rel. Juiz Luiz E. Gunther - DJPR 16.02.96 - pág. 279).
"Assistência judiciária gratuita. A concessão da assistência judiciária gratuita não se vincula àquela prestada pelo Sindicato de classe. A Lei n. 5.584/70, no caput do art. 14, simplesmente, determina que o órgão da categoria profissional do trabalhador preste a assistência judiciária a que se refere a Lei n. 1.060/50. O fato de se socorrer de advogado particular não significa que o hipossuficiente possua condições de demandar em Juízo sem prejuízo do sustento próprio ou da família" (TRT - 2ª R - 8ª T. - RO n. 02980009681 Rel. Raimundo Cerqueira Ally DOE 12.5.98).
"Por uma questão de isonomia os requisitos para concessão devem ser os mesmos exigidos do empregado, com exceção é óbvio da limitação salarial, bastando desse modo a simples declaração da parte, ou de seu procurador legalmente constituído, que não possui condições de demandar em juízo sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família, que valerá até prova em contrário" (Revista n. 03, do IGT, LTr, 2º semestre 1994, pág. 99 artigo de autoria do Exmo. Sr. Procurador Regional do Trabalho da 18ª Região, Dr. Edson Braz da Silva)(TRT - 18ª R. - Proc. n. 1.199/98 - Rel. Ialba-Luza Guimarães de Mello - DOE 17.8.98).
VIII - Conclusão
A assistência judiciária e os seus respectivos honorários advocatícios não nos parece ser um privilégio da entidade sindical profissional, sendo que deve ser atribuída também ao advogado particular, na medida em que a Lei n. 1.060/50 é aplicável ao processo trabalhista.
Notas
- CARRION, Valentin. A Assistência Judiciária. In: Revista LTr 42/1208.
- NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 12ª edição, pág. 43
- OLIVEIRA, Francisco Antonio de. Comentários aos Enunciados do TST. São Paulo: Revista dos Tribunais, 4ª edição, 1997, pág. 49.
- CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. São Paulo: Saraiva, 23ª edição, 1998, pág. 598.
Bibliografia
CARRION, Valentin. A Assistência Judiciária. In: Revista LTr 42/1208.
_______________ . Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. São Paulo: Saraiva, 23ª edição, 1998.
JORGE NETO, Francisco Ferreira e Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante. Responsabilidade e as Relações do Trabalho. São Paulo: LTr, 1998.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 12ª edição.
OLIVEIRA, Francisco Antonio de. Comentários aos Enunciados do TST. São Paulo: Revista dos Tribunais, 4ª edição, 1997.
ROMITA, Ario Sayão. Direito do Trabalho - Temas em Aberto. São Paulo: LTr, 1998.