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Ainda é constitucional a exigência de registro de contratos de transferência de tecnologia no INPI, não obstante o artigo 240 da Lei nº 9.279/96

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25/10/2009 às 00:00
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VI – CONCLUSÕES

Toda a Ordem Econômica, em nosso sistema constitucional, está orientada finalística e normativamente à realização de princípios, dentre os quais destacam-se os da "função social da propriedade" e da defesa do interesse nacional, este identificado com a busca de um desenvolvimento econômico e social planejado.

Não é possível, assim, tratar separadamente a figura da averbação dos contratos que impliquem transferência de tecnologia, da proteção e o desenvolvimento da indústria brasileira, e os interesses nacional e social, este como vier a ser identificado caso a caso, segundo os tratados e as convenções a que o Brasil aderir, como enunciado pelo art. 2º, "caput" da Lei nº 9.279/96.

As atividades de – "seleção da tecnologia a absorver", optando-se, entre "processos diversos", "o que mais se adapta à realidade nacional", e a busca de "melhores condições de negociação e de utilização de patentes" – inserem-se necessária e inafastavelmente em uma visão ideológica – porque política constitucionalmente voltada a um objetivo – o "desenvolvimento econômico" associado à "dignidade da pessoa humana" –, e representada, também, pela definição das prioridades científicas e tecnológicas do País.

A vontade constitucional direcionada a um objetivo fundamental permanente – o da busca do desenvolvimento econômico (art. 3º, II, CF/88) como via da diminuição das desigualdades sociais (art. 3º, III CF/88), e assim, um maior desenvolvimento da dignidade da pessoa humana, em termos de qualidade de vida –, e que passa, necessária e forçosamente, pela auto-determinação, pelo Estado brasileiro, acerca das suas prioridades científicas e tecnológicas exige, por consequência, uma também necessária e imperativa elaboração de políticas públicas, que serão integradas por medidas de várias ordens, como as de polícia – controle, caso a caso, de determinada operação de transferência de tecnologia, sempre finalisticamente vinculada ao atendimento de tais políticas públicas – inclusive com a fixação de marcos regulatórios, como no caso da exigência de registro de contratos de transferência dentro de certas condições, não só formais, mas também, e talvez principalmente, materiais.

Em lugar de repartição de competências estanques, e como é próprio em se tratando de formulação e implementação de políticas públicas, os agentes-públicos: políticos e administrativos, órgãos de direção política e de execução administrativa, da Administração Direta e Indireta –, e privados, aqueles, por força de normas diretas, cogentes, determinantes de suas atuações, e estes, através de estímulos e influências, comumente indiretas, as atividades de execução das políticas públicas demandam uma certa regulamentação autônoma, não dependente especialmente de uma lei, mas de um contexto normativo, o qual, no caso brasileiro, também é principiológico – normativo – valorativo constitucional.

A competência para o exercício de poder de polícia por um órgão ou entidade públicos pode ser instituída diretamente por uma política pública constitucionalmente estabelecida, e disso foi exemplo a competência do Conselho Nacional de Justiça para impor proibição de conduta aos Tribunais, assim declarada pelo Eg. STF.

O poder normativo, exercido na forma de regulamentação, não é exclusivo das Agências Reguladoras; muito pelo contrário, decorre simplesmente da atividade administrativa exercida pelo respectivo órgão ou entidade, observados os limites da lei – inclusive, da Lei Maior, a Constituição.

O INPI, portanto, ao exercer uma competência regulamentar em atendimento a uma finalidade imposta por uma política pública constitucionalmente instituída e desejada, em matéria de averbação de contratos de transferência de tecnologia, não está a extrapolar o âmbito da regulamentação normativa típica de qualquer órgão ou entidade públicos, na medida do que for necessário para a normal realização de suas atividades cotidianas.

Com ou sem o período que veio a ser suprimido pelo art. 2º da Lei nº 9.279/96, não haveria como o INPI exercer suas atividades cotidianas sem as providências que eram explicitadas no art. 2º da Lei nº 5.648/70, logo, como quem quer os fins, dá os meios, é de se ter por implícita na própria razão de ser da autarquia a autorização legal para a adoção daquelas medidas.

Assim como o costume pode servir de causa para o advento de uma lei que positive aquelas condutas socialmente aceitas e cuja continuidade é desejada, os precedentes decisórios formados em resposta a situações individuais também podem servir de fonte para a edição de um Regulamento.

Logo, também sob essa perspectiva, o poder normativo terá que ter se manifestado quando das respostas dadas pelos órgãos e entidades públicos a situações particulares, como requisito histórico de formação do Regulamento.

Os registros de contratos de transferência de tecnologia no INPI têm historicamente integrado atos e metas de planejamento e de realização de políticas públicas industriais no Brasil.

Tais registros, em si mesmo considerados, constituem-se não só em forma de controle e de limitação das atividades negociais dos particulares, verdadeiro exercício de poder de polícia, mas também como instrumento de estímulo em favor da "[...] aplicação de pesquisas tecnológicas e científicas já ultimadas em outros países e que acarretem progresso para o Brasil[...]", logo, instrumento de política pública de desenvolvimento econômico e de propriedade industrial.

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Não se pode vislumbrar, assim, nesses registros, uma função meramente burocrática; destinam-se a concretizar, até mesmo indiretamente, metas de desenvolvimento industrial que são de interesses nacional e social.

Um paralelo pode ser dado através da análise do conteúdo do art. 71, IX da CF/88, que institui competência do TCU para o exame, para fins de registro, de atos de admissão de pessoal da Administração Pública.

O art. 13, I do Decreto nº 5.147/2004 explicitamente atribui competência à Diretoria de Contratos de Tecnologia e Outros Registros do INPI para

[...] analisar e decidir quanto à averbação de contratos para exploração de patentes, uso de marcas e ao que implique transferência de tecnologia e franquia, na forma da Lei nº 9.279, de 1996, de modo alinhado às diretrizes de política industrial e tecnológica aprovadas pelo Governo Federal.

Portanto, não só há um reconhecimento autêntico do Chefe do Poder Executivo no sentido de que órgão do INPI pode exercer poder normativo segundo as diretrizes de política industrial e tecnológicas aprovadas pelo Governo Federal – ou seja, competência fundada em políticas públicas –, como, também, há expressa atribuição de exercício de poder de polícia, através do registro de contratos de transferência de tecnologia, sendo perfeitamente adequado usar-se o mesmo fundamento que aceito em relação ao TCU, para concluir-se pela possibilidade de controle de legalidade ou de razoabilidade, segundo aquelas diretrizes.


VII – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências Reguladoras – e a evolução do Direito Administrativo Econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2002. 509 p.

BORGES, Denis Barbosa. Contratos de licença e de tecnologia – a intervenção do INPI. Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/view/4959/4528>. Acesso em: 12 ago. 2009.

BRASIL. Tribunal Regional Federal. Região, 2. A M S nº 2006.51.01.5041578-RJ, 2ª Turma Especializada, Rel. Des. Fed. Liliane Roriz, dec. p. maioria pub. DJU, Seção 2, de 04 dez. 2008.

BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito Administrativo e Políticas Públicas. São Paulo: Saraiva, 2002. 298 p.

CAETANO, Marcelo. Princípios Fundamentais do Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1989. 583 p.

EISNER, Marc Allen. Contemporary Regulatory Policy. London and Colorado: Lynne Rienne Publishers, Inc. 2000. 333 p.

FONSECA, João Bosco Leopoldino da. Direito Econômico. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. 334 p.

HABERMAS, Jurgen. Técnica e Ciência como "Ideologia". Tradução Artur Morão. Lisboa: Edições 70, 1987. 149 p.

IDS – Instituto Dannemann Siemsen de Estudos de Propriedade Intelectual. Comentários à Lei da Propriedade Industrial. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. 531 p.

MOREIRA, Eduardo Ribeiro. Neoconstitucionalismo – A Invasão da Constituição. São Paulo: Método, 2008. 239 p.

NALLAR, Daniel M. El Estado Regulador y el Nuevo Mercado Del Servicio Público – análisis jurídico sobre la privatización, la regulación y los entes regulatórios. Buenos Aires: Depalma, 1999. 200 p.

OCDE. Regulatory Reform, Privatisation and Competition Policy. Paris, 1992. 133 p.

PONDÉ, Lafayette. Do Regulamento Administrativo. In: Estudos de Direito Administrativo. Belo Horizonte: Del Rey. 1995. 444 p.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. 878 p.

SOUTO, Marcos Juruena Villela. Agências Reguladoras. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, Renovar - Fundação Getúlio Vargas, 216/128, abr.- jun. 1999.

VAZ, Isabel. Direito Econômico das Propriedades. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. 673p.


Notas

  1. BRASIL. Tribunal Regional Federal. Região, 2. A M S nº 2006.51.01.5041578-RJ, 2ª Turma Especializada, Rel. Des. Fed. Liliane Roriz, dec. p. maioria pub. DJU, Seção 2, de 04.12.2008.
  2. BORGES, Denis Barbosa. Contratos de licença e de tecnologia – a intervenção do INPI. Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/view/4959/4528>. Acesso em: 12 ago. 2009: "Parece-nos razoável concluir, como o faz Luis Leonardos, que a lei vigente retirou do INPI o poder de intervenção nos contratos, quanto à sua conveniência e oportunidade, como parte do poder antes atribuído à autarquia de regular a transferência de tecnologia para o país: ‘Esta orientação veio culminar com a nova Lei de Propriedade Industrial (Lei nº 9.279, de 14/05/96), vigente a partir de 15.05.97, e que suprimindo o parágrafo único, do Art. 2º, da Lei 5.648/70, eliminou das atribuições do INPI, a de regular a transferência de tecnologia.’ No entanto, persistem, na forma da legislação tributária e cambial, as competências delegadas ao INPI de atuar como assessor, ex ante, da Receita Federal e do Banco Central na análise da questões atinentes àquelas autoridades, relativas aos contratos que importem em transferência de tecnologia."
  3. BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito Administrativo e Políticas Públicas. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 241: "Políticas públicas são programas de ação governamental visando a coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas, para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados. Políticas públicas são ‘metas coletivas conscientes’ e, como tais, um problema de direito público, em sentido lato." E à p. 269: "Finalmente, o adjetivo ‘pública’, justaposto ao substantivo ‘política’, deve indicar tanto os destinatários como os autores da política. Uma política é pública quando contempla os interesses públicos, isto é, da coletividade – não como fórmula justificadora do cuidado diferenciado com interesses particulares ou do descuido indiferenciado de interesses que merecem proteção – mas como realização desejada pela sociedade. Mas uma política pública também deve ser expressão de um processo público, no sentido de abertura à participação de todos os interessados, diretos e indiretos, para a manifestação clara e transparente das posições em jogo."
  4. MOREIRA, Eduardo Ribeiro. Neoconstitucionalismo – A Invasão da Constituição. São Paulo: Método, 2008. p. 08: "Passamos de um direito em que as normas ditam o que fazer para um direito em que os princípios indicam o que se pode fazer." Á p. 112: "O campo de avanço do direito civil-constitucional está na detecção dos problemas reiterados no direito privado e da transposição para as necessidades coletivas, seja como um modo de reforma – elaboração legislativa de direito privado – seja como forma de política pública, com proteção a direitos fundamentais, tradicionalmente concebidos como do direito privado." E à p. 139: "Uma importante conclusão jurídica que se extrai com tal estudo é que o foco passa a incidir nas normas de organização do Estado (políticas), que vinculam as escolhas públicas. [...] A organização do Estado, conforme prevista na Constituição, passa a veicular, em boa parte, a transformação do Estado e corrigir as políticas do governo executadas com incompatibilidade, expressa ou omissiva."
  5. VAZ, Isabel. Direito Econômico das Propriedades. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 419 e 423.
  6. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 285/287.
  7. VAZ, op. cit., p. 420.
  8. Ibid., p. 428-429.
  9. HABERMAS, Jurgen. Técnica e Ciência como "Ideologia". Tradução Artur Morão. Lisboa: Edições 70, 1987. p. 68.
  10. BUCCI, op. cit., p. 241-242.
  11. CAETANO, Marcelo. Princípios Fundamentais do Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1989. p. 95, "fine"/96.
  12. Disponível em: < http://www.desenvolvimento.gov.br/sitio/interna/interna.php?area=3&menu=1783>. Acesso em: 25 abr. 2009.
  13. Habermas, op.cit., p. 75.
  14. CAETANO, op. cit., p. 98.
  15. Ibid., p. 253-254.
  16. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências Reguladoras – e a evolução do Direito Administrativo Econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 369.
  17. FONSECA, João Bosco Leopoldino da. Direito Econômico. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 240.
  18. OCDE. Regulatory Reform, Privatisation and Competition Policy. Paris, 1992. p. 13.
  19. EISNER, Marc Allen. Contemporary Regulatory Policy. London and Colorado: Lynne Rienne Publishers, Inc. 2000. p.05.
  20. MOREIRA apud SOUTO, Marcos Juruena Villela. Agências Reguladoras. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, Renovar - Fundação Getúlio Vargas, 216/128, abr.- jun. 1999.
  21. NALLAR, Daniel M. El Estado Regulador y el Nuevo Mercado Del Servicio Público – análisis jurídico sobre la privatización, la regulación y los entes regulatórios. Buenos Aires: Depalma, 1999. p. 114, "fine"/115.
  22. PONDÉ, Lafayette. Do Regulamento Administrativo. In: Estudos de Direito Administrativo. Belo Horizonte: Del Rey, 1995. p. 174.
  23. IDS – Instituto Dannemann Siemsen de Estudos de Propriedade Intelectual. Comentários à Lei da Propriedade Industrial. Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2005, p. 446.
  24. PAES, P. R. Tavares. Propriedade Industrial. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1987. p. 111.
  25. NALLAR, op. cit., p. 115.
  26. SILVA, op. cit., p. 733.
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Sobre o autor
Alberto Nogueira Júnior

juiz federal no Rio de Janeiro (RJ), mestre e doutor em Direito pela Universidade Gama Filho, professor adjunto da Universidade Federal Fluminense (UFF), autor dos livros: "Medidas Cautelares Inominadas Satisfativas ou Justiça Cautelar" (LTr, São Paulo, 1998), "Cidadania e Direito de Acesso aos Documentos Administrativos" (Renovar, Rio de Janeiro, 2003) e "Segurança - Nacional, Pública e Nuclear - e o direito à informação" (UniverCidade/Citibooks, 2006); "Tutelas de Urgência em Matéria Tributária" (Forum/2011, em coautoria); "Dignidade da Pessoa Humana e Processo" (Biblioteca 24horas, 2014); "Comentários à Lei da Segurança Jurídica e Eficiência" (Lumen Juris, 2019).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NOGUEIRA JÚNIOR, Alberto. Ainda é constitucional a exigência de registro de contratos de transferência de tecnologia no INPI, não obstante o artigo 240 da Lei nº 9.279/96. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2307, 25 out. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13647. Acesso em: 22 nov. 2024.

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