4. A interpretação econômica e a interpretação extensiva
A teoria da interpretação econômica consiste em prestigiar o conteúdo econômico das relações jurídicas em detrimento das formas legais. Contudo, ela não deve ser adotada como princípio prevalente pois, o princípio da legalidade é o que impera em Direito Tributário e, portanto, ele não pode ser violado sob o argumento da busca do conteúdo econômico de determinada relação jurídica.
A interpretação econômica em Direito Tributário está autorizada quando o contribuinte comete abuso de forma jurídica para enquadrar o caso concreto em um comando resultante não só da literalidade do texto legislativo, mas também do seu espírito da mens ou ratio legis.
Com isto, percebe-se que a sua aplicação pelo interprete imprescinde a atipicidade ou a anormalidade da forma, ou seja, em casos em que o contribuinte artificiosamente cria situações anormais, manipulando a forma jurídica e resguardando os efeitos econômicos com o intuito de obter um menor pagamento do tributo ou até um não pagamento.
Por exemplo, no caso do Imposto Sobre Serviços, se a lista elencasse, dentre as hipóteses de incidência, o transporte escolar em ônibus e vans, ninguém poderia eximir-se do pagamento do imposto alegando que a lei nada fala acerca do transporte escolar realizado por um veículo do tipo minivan. Esta seria uma astúcia do contribuinte para elidir a tributação, pois a intenção de tributar o transporte escolar se depreende da mens legis, certo que o legislador não precisa descer a tamanha minúcia, já que os exemplos mostram, claramente, a vontade do legislador de tributar o serviço, restando ao intérprete a tarefa de conceituar concretamente o fato gerador neste caso, subsumindo o fato na norma, através da interpretação extensiva. Além disso, sabe-se que a cada ano são lançados novos modelos de carros, consequência da velocidade dos avanços tecnológicos, absolutamente imprevisíveis para o legislador.
Desta forma, quando se fala em interpretação econômica, deve-se ter em mente que o que se está interpretando é a operação celebrada pelas partes, não a norma jurídica em si. Na verdade, se está buscando o conteúdo econômico de determinada relação jurídica. Descoberta a realidade econômica do negócio realizado, parte-se para a identificação do dispositivo legal mais próximo, capaz de regular a referida relação jurídica, sempre observando o princípio da legalidade.
Historicamente, a interpretação econômica surgiu na Alemanha, em 1919, como reação ao formalismo conceitual excessivo predominante em matéria tributária, por obra de Enno Becker. A teoria de Becker foi seguida por alguns juristas italianos, muito embora tenha sido criticada por Griziotti – que criou a teoria da interpretação funcional do Direito Tributário – tendo como seguidores Vanoni e Dino Jarach.
Se se analisar a idéia de Griziotti (a respeito da interpretação funcional do direito tributário), ver-se-à que essas idéias estavam, até certo ponto, em consonância com a teoria alemã de Enno Becker, pois a interpretação funcional nada mais é do que atribuir relevância e elementos outros, na relação jurídica: sociológicos, econômicos, políticos, e assim por diante. De modo que essa chamada interpretação funcional de Griziotti possui campo mais ampliado do que o da interpretação econômica. Funcional e econômico, no fundo, quase chegam a significar a mesma coisa; ambas procuram a teleologia, as finalidades da lei.8
No Brasil, a teoria da interpretação econômica do Direito Tributário é plenamente acolhida pelo professor Amílcar de Araújo Falcão, além de ter sido explicitada em estudos de Rubens Gomes de Souza, o que fez com que começasse a ganhar certa aceitação. Por outro lado, há autores como Eros Roberto Grau que a repelem de forma contundente.
O mestre Falcão (1994) defende o método exegético de interpretação econômica, asseverando que este não acarreta violação ao requisito da legalidade, além de ser perfeitamente adequado ao princípio da legalidade em matéria de fato gerador.9
Já na concepção de Hugo de Brito Machado (2002):
deve o intérprete considerar, acima de tudo, os efeitos econômicos dos fatos disciplinados pelas normas em questão. Na relação jurídica tributária há uma relação econômica subjacente, e esta é que deve ditar o significado da norma.10
Finalmente cumpre acrescentar que os artigos 109 e 110 do Código Tributário Nacional sinalizam no sentido da aceitação da teoria da interpretação econômica do Direito Tributário cabendo, ainda, ressaltar que mesmo no anteprojeto do atual Código Tributário Nacional, elaborado por Graça Aranha e Rubens Gomes de Souza, chegou a figurar um dispositivo determinando que:
a interpretação da legislação tributária visará a sua aplicação não só aos atos ao situações jurídicas nela nominalmente referidos como também, aqueles que produzem, ou sejam susceptíveis de produzir resultados equivalentes.11
4.2 A interpretação extensiva
A interpretação extensiva determina tanto o conteúdo da lei, não expresso suficientemente no seu texto, quanto o seu alcance. Isto porque supõe-se que a lei tenha dito menos do que queria dizer (dixit minus quam voluit), já que o seu texto foi mal formulado pelo legislador, que acabou deixando de fora alguma hipótese que deveria vir expressa na norma. Neste caso, é fundamental que o aplicador da norma reconheça que a referida hipótese deveria estar abrangida pela norma.
Sucede que a interpretação não se confunde com analogia, que é um instrumento de integração que consiste na aplicação de uma norma legal, prevista para um caso semelhante, a um caso em que a lei não tenha previsão expressa – ubi eadem legis ratio, ibi eaden legis dispositio .12
Portanto, não devemos confundir a interpretação extensiva, que é um método de interpretação, com a analogia, método de integração. Integrar é preencher lacuna. É importante ressaltar que na analogia a lei não teria levado em consideração a hipótese, mas, se o tivesse feito, supõe-se que lhe teria dado idêntica disciplina. Já na interpretação extensiva, a lei teria querido abranger a hipótese, mas, em razão da má formulação do texto, deixou a situação fora do alcance expresso da norma, tornando necessário que o aplicador da lei reconstitua o seu alcance. 13
É importante que se diga que a distinção entre analogia e interpretação extensiva é muito sutil. Isso porque é difícil identificar quando o sentido da lei precisa ser complementado, ou quando o conteúdo enseja uma extensão.
A doutrina ainda fala em lacuna intra legem e praeter legem. A lacuna intra legem aparece nas enumerações exemplificativas, portanto, sua solução ocorre via interpretação extensiva (analogia por extensão), enquanto, a lacuna prateter legem é um caso de integração, que se dá através do método da analogia (analogia por compreensão).
Estabelecidas tais diferenças, resta distinguir os casos de enumeração taxativa dos casos de enumeração exemplificativa. Essa identificação se depreendeu da obra de Berliri e foi seguida pela doutrina Brasileira, especialmente, por Amílcar de Araújo Falcão, Flavio Bauer Novelli e Aliomar Baleeiro. Consiste na identificação dos elementos da norma, que no caso da enumeração exemplificativa "a abundância dos casos contemplados e a presença do elemento comum, permite reuni-los em um grupo único, classificá-los em uma só categoria" e no caso da enumeração taxativa "a limitação dos casos indicados, a especificação de elementos secundários que nada tem a ver, com o elemento comum, a indeterminação ou, em todo caso, vaga presença do dito elemento comum".14
4.3 A interpretação econômica e a interpretação extensiva do fato gerador do ISS sob a ótica da tipicidade aberta
A interpretação econômica no Direito Tributário faz as vezes de instrumento de efetivação do princípio da igualdade colimando o fim precípuo da justiça fiscal. Isso ocorre na medida em que a interpretação econômica permite que nas hipóteses em que um contribuinte manifeste capacidade economicamente equivalente a um outro, em mesma situação, sejam tratadas de modo igual.
Consequentemente, com a interpretação econômica se estará caminhando para uma tributação mais justa, através da distribuição uniforme dos encargos sociais.
O princípio da interpretação econômica comporta várias nuances: a busca da autonomia dos conceitos do Direito Tributário em detrimento do direito privado; dar privilégio ao conteúdo econômico dos negócios jurídicos desprezando a forma jurídica adotada; buscar o significado econômico através do método teleológico; combater o abuso das formas de direito privado; priorizar a interpretação dos fatos contrariando a interpretação da norma; a persecução dos efeitos econômicos do ato praticado, entre outros.
O presente trabalho pretende dar enfoque à interpretação econômica, no que tange ao Imposto Sobre Serviços, no sentido de buscar o significado econômico de uma hipótese de incidência abstratamente prevista em lei, através da aplicação do método de interpretação teleológico. Tudo isso se depura da ideia de que situações que manifestem igual capacidade contributiva devem ser igualmente sujeitas à tributação, ainda que uma delas não esteja expressa na lei. Isso será possível, desde que o tipo, em cujo fato esteja subsumido, se expresse através de uma enumeração exemplificativa, ou seja, desde que se considere que a tipicidade de norma é aberta. Daí se infere que a teoria da tipicidade aberta propícia tanto a interpretação econômica do fato gerador, como a interpretação extensiva.
No que tange ao Imposto Sobre Serviços, vale mencionar a hipótese de "Bancos de sangue, leite, pele, olhos, óvulos, sêmen e congêneres" do item, 4.19, da lista de serviços, anexa a Lei Complementar nº 116. Ao inserir a expressão "congêneres", o legislador permite que haja a subsunção, por exemplo, do congelamento de cordão umbilical, através da interpretação extensiva. A intenção do legislador foi, exatamente, a de elastecer o tipo, que não descreveu com palavras um conceito, mas expressou-o através da apresentação de um rol exemplificativo, motivo pelo qual, os seus efeitos econômicos podem ser estendidos a uma situação não expressa literalmente no texto, mas que pode ser perfeitamente inserida naquele conceito, construído através de exemplos.
Portanto, quando se está diante de um tipo, cujo conceito foi formulado através de exemplos que configuram uma expressão genérica, este tipo será aberto. Cumpre ressaltar que os tipos abertos - que aparecem quando o legislador utiliza vários exemplos que guardam, entre si, identidade - acabam apresentando um conceito sem definí-lo, conceito este representado por um rol exemplificativo. Por outro lado, quando o tipo é fechado não há identidade de conceitos entre os exemplos, cada exemplo, cada conceito, terá função normativa própria e o rol apresentado será numeros clausus, ou seja, um rol taxativo.
É importante destacar que deve-se partir do pressuposto que só poderá haver tributação se determinado serviço constar na lista – nullum tributum sine lege. Não pode um serviço ser tributado sob o argumento da interpretação econômica se ele não puder ser incluído em um determinado item da lista que comporte um rol exemplificativo. Só haverá a tributação se o serviço puder ser abrangido por uma hipótese de incidência, descrita na norma, através da interpretação extensiva, veiculada pela interpretação econômica do fato gerador, caso em que a lei quis atribuir igual tratamento jurídico a situações distintas, que guardem uma identidade entre si.
Note-se que a interpretação extensiva não fica ao alvedrio do aplicador ou intérprete da lei, mas depende da intenção do legislador, que dará ensejo a sua inclusão em uma determinada hipótese legal desde que seja este o espírito da norma. O aplicador da lei não está autorizado a transfigurar uma hipótese de incidência nela prevista, para abarcar hipótese nela não prevista, com o fim de arrecadar o tributo.
5. A Lista de serviços: taxativa ou exemplificativa?
A questão da taxatividade ou não da lista de serviços do ISS é um tema de relevância prática, já que implicará na incidência, ou não, do Imposto Sobre Serviços, uma vez que certos serviços podem figurar na lista de forma implícita, desde que nela constem serviços de mesma natureza, dispostos em rol exemplificativo.
Sabemos que com a evolução tecnológica e a globalização, em todo momento, surgem novos serviços, fazendo com que a previsão de todas as hipóteses de incidência, pelo legislador, seja tarefa impossível.
Atualmente, sabe-se que não é possível a tributação de novos serviços não arrolados na lista, constante em lei complementar, pois em sentido vertical, a lista é taxativa. Entretanto, a tributação de serviços assemelhados: "similares", "congêneres", "correlatos" e "outros", só é possível, por intermédio de interpretação ampliativa.
Portanto, os argumentos que justificam o caráter exemplificativo da lista, em sentido horizontal, giram em torno de assuntos já discutidos pelo trabalho: tipicidade aberta, interpretação econômica e interpretação extensiva.
Esse tema ensejou discussões polêmicas, que tiveram início logo após a criação da primeira lista de serviços tributáveis, assunto que se sucederá.
5.2 O surgimento da lista de serviços do ISS
Sob o império da Constituição de 1946, a Emenda Constitucional (EC) nº18, de 1965, entregou aos Municípios a competência para a cobrança do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza com a ressalva de que estes não estivessem compreendidos na competência da União ou dos Estados. Esta emenda determinou que competiria à União o imposto sobre serviços de transporte e comunicação - que a atual Constituição de 1988 atribui aos Estados- exceto os de natureza intramunicipal, determinando, ainda, que uma lei complementar estabeleceria critérios para distinguir os serviços das operações de circulação de mercadorias. Com isso, se realizaria a identificação da competência dos Municípios e dos Estados.
Com o advento do Código Tributário Nacional (Lei 5.172/1966), que definiu o fato gerador do ISS, fixando um pequeno rol exemplificativo e acrescentando uma cláusula geral, muitas dúvidas ainda giravam em torno dos critérios de distinção, entre a competência do Estado e dos Municípios, no que tange à tributação dos serviços. Algumas alterações foram inseridas pelos Atos Complementares nº 27 de 8/12/ 1966 e nº 34 de 30/01/1967, que acrescentaram novos serviços no rol trazido pelo artigo 71 do CTN, e o Ato Complementar nº 35 de 28/02/1967 que excluiu as subempreitadas do campo de incidência do ISS.
A conceituação constitucional do ISS, decorrente da discriminação das rendas tributárias, foi mantida pela Constituição de 1967. Esta Constituição acabou aumentando o campo de ação da lei complementar - que na Constituição de 1946 se limitava à estabelecer critérios de distinção entre as atividades sujeitas ao ISS (serviços) e as sujeitas sobre Imposto Sobre a Circulação de Mercadorias (ICMS) – determinando, em seu artigo 25, inciso II, que os serviços tributáveis pelos Municípios deveriam ser definidos por lei complementar. Deste dispositivo constitucional se depuram duas limitações à competência dos municípios: além da vedação da incidência do tributo municipal sobre os serviços sérvios abrangidos pela competência federal e estadual, evitaria eventuais conflitos de competências tributárias, a determinação de que tais serviços fossem "definidos em lei complementar".
Com isto, os Municípios não poderiam definir, em suas leis municipais, serviços que não estivessem previstos em lei complementar. Assim é que nasce a polêmica acerca da taxatividade, ou não da lista de serviços.
Inicialmente, os serviços foram catalogados em número de 29, na lista anexa ao Decreto-lei nº 406, de 31/12/1968. A redação do artigo 13, deste decreto, revogou o artigo 71, do Código Tributário Nacional, muito embora, tenha reproduzido as normas gerais do ISS (art. 8º). É importante que se diga que este decreto foi promulgado como lei complementar com pelo Ato Institucional nº 5, de 13/12/1968.15
Posteriormente, o Decreto-lei nº 406 foi modificado, em parte, pelo Decreto-lei nº 834 de 8/9/1969, alterando para 66 o número de serviços catalogados pela lista.
Em seguida, a Emenda Constitucional nº 1, de 17/10/1969, em nada alterou o conceito constitucional do ISS. O mesmo pode ser dito acerca da Carta de 1988.
Atualmente a lei complementar nº 116 é que dispõe sobre o assunto, ficando revogados, conforme a redação do artigo 10, os artigos: 8, 10, 11 e 12 do Decreto-Lei no 406, de 31 de dezembro de 1968; os incisos III, IV, V e VII do artigo 3º do Decreto-Lei no 834, de 8 de setembro de 1969; a Lei Complementar no 22, de 9 de dezembro de 1974; a Lei no 7.192, de 5 de junho de 1984; a Lei Complementar no 56, de 15 de dezembro de 1987; e a Lei Complementar no 100, de 22 de dezembro de 1999.
5.3 O Papel da Lei Complementar no ISS
Em primeiro lugar, viu-se que a própria Emenda Constitucional nº 18, de 1965, já determinava que uma lei complementar deveria estabelecer critérios para distinguir os serviços das operações de circulação de mercadorias, tendo em vista a repartição constitucional das competências tributárias.
Depois, a Constituição de 1967 exigiu a definição dos serviços Municipais mediante lei complementar, pois, a lei complementar em matéria Tributária tem a função de estabelecer normas gerais, solucionar eventuais conflitos de competência e estabelecer as limitações constitucionais ao poder de tributar, o que está de com o art 18, § 1º, daquela Constituição e artigo 146 da Carta Magna atual.
Sendo assim, ao realizar a discriminação das competências tributárias, a Constituição Federal determinou que os serviços tributáveis pelos Municípios deveriam ser "definidos em lei complementar", nada falando acerca da taxatividade, ou não, da mesma. Esta situação se manteve até a atual Constituição.
Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
[...]
III- Serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art.155, II, definidos em lei complementar.16
Isto significa dizer que a Constituição deu ao Congresso a liberdade de decidir quais serão os serviços tributáveis pelos Municípios, tendo em vista que é a lei complementar quem especifica tais serviços. Assim, o Congresso Nacional aprovou uma lista de serviços, escolhendo quais serviços seriam submetidos ao ISS, além de decidir sobre seu caráter taxativo ou exemplificativo.
Observando a maneira que os serviços estão organizados nesta lista, concluí-se que o legislador complementar confeccionou a lista de modo taxativo (em sentido vertical), muito embora ela comporte interpretação extensiva (em sentido horizontal).
Portanto, a questão da taxatividade da lista de serviços é consequência de uma escolha política do legislador, não uma mera questão de restrição da competência tributária dos Municípios. Nesse sentido dispõe Aliomar Baleeiro (1977):
Parece-me que não é cercear a receita municipal, mas tirar da Prefeitura o discricionarismo na escolha dos serviços ou na alíquota que os tributará. Esse discricionarismo foi entregue ao Congresso, exigindo-se quorum de maioria absoluta. Por outras palavras, o que há de ser onerado ou não onerado obedecerá não ao "peculiar interesse local" mas ao interesse geral da Nação. Nem sempre coincidem. Tanto o Congresso pode preferir limites rígidos quanto flexíveis, segundo a política econômica, fiscal, enfim legislativa, que o inspire em determinada conjuntura.
Assim penso que a lei complementar é que determinará em que sentido será taxativa. Poderá sê-lo ou não.17
Desta forma, percebe-se que cabe ao Congresso definir os serviços tributáveis pelo ISS de modo exemplificativo ou taxativo.
Em 1970, Baleeiro já argumentava a favor da taxatividade da lista, alegando que, ainda que somente os serviços nela mencionados fossem tributáveis, cada item da lista comportaria interpretação ampla e analógica, ressaltando que, não obstante ao fato de a analogia ser proibida pelo CTN, no que tange à definição do fato gerador, esta regra não poderia prevalecer porque a própria lei complementar estaria admitindo expressamente a "analogia ou assemelhação, declarando que os serviços num item não são apenas os definidos ou enunciados nele, mas os equiparáveis como espécies dum mesmo gênero, ‘congêneres’." 18(sic)
Aduzia o mestre que, a despeito de a lista comportar interpretação analógica em determinados itens, a lista não perdia seu caráter taxativo, porque alguns serviços podiam vir a ter diferentes designações, decorrentes da extrema especialização tecnológica da atualidade, o que ensejaria a inclusão de serviços em itens que designassem mesmo gênero.
Infelizmente, naquela edição o autor pecava ao afirmar que a lei complementar estaria autorizando a analogia, o que não acontece. Com toda vênia, sucedera uma confusão entre os conceitos de analogia e interpretação extensiva. No caso da inclusão de serviços não constantes na lista, mas tributáveis pelos Municípios por assemelhação, o que ocorre é a interpretação extensiva, não a analogia, que é método de integração vedado pelo CTN para hipóteses de definição de fato gerador de tributo.
A despeito disso, vale ressaltar um exemplo excelente, introduzido pelo insigne autor, no que tange a interpretação extensiva, que é o da encadernação de livros e revistas. Por intermédio dela, também podem ser abrangidas, pela hipótese de incidência, a encadernação de jornais, mapas, documentos, fotografias, desenhos, etc.19
Isto é assim porque a taxatividade da lista diz respeito aos gêneros nela especificados, o que se chama taxatividade na vertical. No entanto, a lista admite interpretação extensiva para as espécies do mesmo gênero utilizando, muitas vezes, expressões como "congêneres", "similares", "correlatos" e "outros", muito embora a Lei Complementar vigente, sobre a matéria, só tenha se utilizado das expressões "congêneres", "as demais" e "outros". Assim, podemos encaixar bronzeamento artificial, no gênero "Esteticistas, tratamento de pele, depilação e congêneres", item 6.02, bem como, a "yoga", no gênero "Ginástica, dança, esportes, natação, artes marciais e demais atividades físicas", item 6.04.20
No sentido da taxatividade da lista de serviços, Bernardo Ribeiro de Moraes (1984), acertadamente, fala em interpretação extensiva, argumentando que cada item da lista de serviços estaria abrangendo certas atividades de maneira genérica.
Embora taxativa, limitativa, a lista de serviços admite interpretação extensiva para as diversas atividades que enuncia. cada item da lista de serviços abrange certas atividades ali contidas de forma genérica, sem caráter específico rigoroso[...]Embora aceita a taxatividade da lista de serviços, não podemos desconhecer que os itens ali estabelecidos podem se referir, quando assim for proposto, a uma generalidade de serviços "congêneres" e correlatos"a que alude a própria lista. Todavia, se determinado serviço não vem definido ou estabelecido em lei complementar (na lista de serviços), jamais ele poderá constituir fato imponível do ISS, por não ser da competência municipal sua oneração. Estão incluídos no campo de incidência do ISS os serviços previstos na aludida lista. O procedimento é o de numerus clausus.
Em conseqüência, o legislador ordinário condicionado a prévia existência de definição da lei complementar deve decretar o ISS com fiel respeito à lista de serviços, podendo utilizar-se no todo ou em parte dos sérvios nela definidos. É vedado ao legislador ordinário alterar a lista constante de lei complementar, aumentando-a, ou aceitando como serviço atividade nela não descrita. Portanto o ISS não grava qualquer venda de bem imaterial (serviço), mas, sim, apenas certos serviços.21
Cumpre esclarecer que a lista de serviços é taxativa por imperativo de ordem constitucional, que determina quais serviços serão tributáveis pelos Municípios. Isto porque os Municípios deverão obedecer à partilha constitucional de competências tributárias, sendo que a Constituição deu ao legislador complementar o encargo de definir os serviços de qualquer natureza objeto do ISS, pois a Constituição Federal não esgotou a competência tributária dos Municípios, que deverá ser feita através de lei complementar. Tais serviços poderão ser tributados pelos Municípios desde que suas leis orgânicas assim estabeleçam. Uma vez editada a lei complementar, o Município poderá instituir o imposto, por intermédio de sua lei ordinária, realizando assim sua competência constitucional.