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Processo tributário na Alemanha

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03/01/2010 às 00:00
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5. Autodenúncia de impostos

Albert HENSEL, em grande clássico do pensamento jurídico alemão, já vislumbrava, à luz do ordenamento de 1919, a existência de tributos que se procedimentalizavam sem qualquer interferência da autoridade administrativa (sistemática esta que não traduz autolançamento) [21]. Neste tópico, o Código Tributário alemão (com a formulação de 1977) prevê, na verdade, uma espécie de autoliquidação:

§ 150

Forma e Conteúdo das Declarações de Impostos

(1) As declarações de impostos devem ser prestadas conforme formulário oficial, sempre que não seja admitida a declaração verbal. O contribuinte deverá calcular na declaração de impostos o próprio imposto, quando esse procedimento for exigido em lei (autodenúncia de impostos).

(2) As informações nas declarações de impostos devem ser prestadas conforme a verdade e o melhor conhecimento. Isto deve ser declarado por escrito, se estiver previsto no formulário.

(...)

§ 167

Denúncia do Imposto pelo Próprio Contribuinte

Utilização de Selos e Estampilhas

Quando o imposto for denunciado pelo próprio contribuinte, com base em obrigação legal (§ 150, inciso 1, 2º período), o lançamento feito nos termos do § 155 somente será necessário quando o lançamento levar a um imposto divergente. Aplica-se esta norma também quando a lei exige que o imposto seja pago através da utilização de selos ou estampilhas.

§ 168

Efeitos da Denúncia do Imposto pelo Próprio Contribuinte

A denúncia do imposto feito pelo próprio contribuinte equivale a um lançamento sob ressalva de revisão. Se dessa denúncia resultar uma redução de imposto já devido ou um crédito fiscal a título de incentivo, a norma deste parágrafo somente se aplicará se houver concordância da repartição fiscal. Essa concordância não precisa ser formal.

(..)

Dizer que a autodenúncia de impostos equivale a lançamento sob ressalva de revisão significa que essa modalidade de lançamento é provisória, a depender sempre de exame posterior pela autoridade administrativa:

§ 164

Lançamento sob Ressalva de Revisão

(1) Enquanto o caso tributário concreto não tiver sido examinado conclusivamente, os impostos poderão ser lançados com a ressalva de exame posterior, de uma forma geral ou em determinado caso, sem necessidade de justificação para esse procedimento. O lançamento de um pagamento adiantado constitui sempre um lançamento com ressalva de exame posterior.

(2) Enquanto vigorar a ressalva, o lançamento poderá ser anulado ou modificado. O contribuinte, a qualquer tempo, pode requerer a anulação ou alteração do lançamento. A decisão a este respeito, no entanto, poderá ser adiada até o exame conclusivo do caso, que deverá ser realizado dentro de prazo adequado.

(...)

O inciso (2) deste § 164, como se vê, estabelece uma espécie de retificação indireta. Diferentemente do que sucede na ordem jurídica brasileira (que contempla a retificação direta – levada a efeito pelo próprio administrado), o Código Alemão dispõe que a retificação (anulação ou alteração do lançamento) é requerida pelo contribuinte à Fazenda Pública, a qualquer tempo (enquanto vigorar a "ressalva"). Assim, caberá à autoridade administrativa proceder (ou não) a essa retificação pleiteada. Este mecanismo, embora possa, à primeira vista, parecer menos pragmático que o nosso, tem a vantagem de assegurar ao sujeito passivo a manifestação estatal acerca de seu pedido. Atende, destarte, aos reclamos da segurança jurídica, na medida em que consagra a bilateralidade desse procedimento.


6. Execução

A SEXTA PARTE do Código Tributário alemão apresenta uma espécie de execução fiscal administrativa:

SEXTA PARTE

Execução

Primeira Seção

NORMAS GERAIS

§ 249

Autoridades Incumbidas da Execução

(1) As autoridades fiscais podem executar, no âmbito da administração, atos administrativos com que se exige uma prestação pecuniária, uma prestação de fazer, de tolerar, ou de não fazer. Esta regra se aplica também às declarações de imposto (§ 168). Repartições incumbidas da execução são os ofícios de finanças e alfandegários; o disposto no § 328, inciso 1, terceiro período, não é afetado por esta norma.

(2) Para preparar a execução, as repartições fiscais podem investigar a situação patrimonial e de rendas do devedor executado.

(...)

§ 254

Pressupostos para o Início da Execução

(1) Salvo disposição em contrário, a execução somente poderá ser iniciada quando a prestação estiver vencida e o devedor executado tiver sido intimado para fazer ou tolerar ou deixar de fazer (ordem de prestar) e tiver decorrido, após a intimação, no mínimo, uma semana. A ordem de prestar pode ser emitida em conjunto com o ato administrativo a ser executado. A emissão de uma ordem de prestar também é necessária quando o ato administrativo tem eficácia contra o devedor executado, sem ter sido levado ao conhecimento dele. Se o devedor executado não tiver cumprido uma prestação por ele devida em razão de declaração de imposto, não haverá necessidade de uma ordem de prestar.

(2) Não é necessário emitir uma ordem de prestar para fins de acréscimos moratórios e juros, quando cobrados em conjunto com o imposto. Esta regra se aplicará, no que couber, às custas de execução, quando cobradas em conjunto com o principal.

Como se vê, há intimação prévia à execução, abrindo-se oportunidade de quitação da obrigação.


7. Recurso contra autodenúncia de imposto

A SÉTIMA PARTE do Código trata do sistema recursal e leva o título PROCESSO DE RECURSO EXTRAJUDICIAL. O § 347 enumera as hipóteses de cabimento de Recurso [22], ao passo que o § 348 [23] elenca os casos de sua vedação. Dieter BIRK esclarece:

Il ricorso è legittimo, secondo il § 347 cap. 1 n. 1 AO, nelle questioni impositive, ai sensi del § 347 cap. 2 AO, nelle quali l’ AO trova applicazione (vedi in merito il § 1 AO). Il § 347 cap. 1 nn. 2-4 AO regola ulteriori campi, nei quali il ricorso è legittimo. Secondo il § 347 cap. 3 AO, le prescrizioni in merito al ricorso, non sono utilizzabili per le procedure penali e le sanzioni pecuniarie. Il ricorso non è legittimo, secondo il § 348 n. 1 AO, contro decisioni su ricorsi, ai sensi del § 367 AO. Queste rappresentano sì atti amministravi in questioni impositive, secondo l’AO, però per esse il contribuinte può proporre azione presso l’autorità giudiziaria competente in materia di tributi. Il § 348 n. 2 AO dichiara inoltre il ricorso non legittimo, quando non verte su di un ricorso (diversamente però il § 347 cap. 1 p. 2 AO per il caso in cui, dietro un''istanza di emanazione di un atto amministrativo, p.es. dilazione, ecc., non sia stato deciso entro un termine ragionevole). Anche in questo caso il cittadino deve intentare un''azione giurisdizionale (di contestazione o condanna ad adempiere) (cosidetta azione contro l’inerzia secondo il § 46 FGO). Poiché ai tribunali, in virtù del § 102 FGO, nel caso di atto discrezionale, spetta solo una competenza limitata di verifica (vedi n.356), mentre l’autorità finanziaria riesamina l’atto amministrativo nella sua interezza (vale a dire tanto secondo la conformità al diritto quanto secondo la sua conformità allo scopo!), questo può dimostrarsi svantaggioso per i contribuenti.

Inoltre, non è legittimo (§ 348 n. 3 AO) il ricorso contro atti amministrativi delle Autorità finanziarie superiori della Federazione e dei Länder, salvo quando una legge preveda la procedura di ricorso, e secondo il § 348 n. 4 AO, contro le decisioni delle Comissioni per l’ammissibilità e le Comissioni di verifica dell’OFD, in questioni riguardanti la legge sulla consulenza fiscale [24].

Mais adiante nessa SÉTIMA PARTE (numa Terceira Seção – denominada Normas Processuais Especiais), temos o § 367 (DA DECISÃO SOBRE O RECURSO). Cabe aqui importante remissão à Lei do Procedimento Administrativo da República Federal da Alemanha (Verwaltungsverfahrensgesetz), de 26-5-1976, que valoriza a motivação do ato administrativo [25].

Esse § 367 outorga competência decisória para a mesma autoridade fiscal que lavrou o ato impugnado – que acumula, assim, as funções executiva e julgadora – inciso (1). Nessa ordem de idéias, esse ato do administrado teria mesmo natureza jurídica de pedido de reconsideração (e não de recurso propriamente – sob a ótica da técnica processual). O mesmo preceito ainda prevê, no inciso (2), a possibilidade de reformatio in pejus [26].

Interessante instituto é previsto na Segunda Seção (NORMAS GERAIS DE PROCESSO): o recurso contra a autodenúncia de imposto:

§ 355

Prazo de Recurso

(1) De acordo com § 347, inciso 1, primeira alínea, os recursos contra ato administrativo devem ser interpostos dentro de um mês após a publicação do ato administrativo. Um recurso contra autodenúncia de imposto deve ser interposto dentro de um mês após a sua entrega nas repartições fiscais; nos casos do § 168, segundo período, dentro de um mês após a divulgação da concordância.

(2) Não há prazo para o recurso previsto no § 347, inciso 1, alínea 2.

(grifou-se)

Isso significa dizer que há recurso cabível, ainda que o lançamento (melhor dizendo: o procedimento de liquidação) tenha sido efetivado pelo próprio contribuinte. O Código não vislumbra qualquer incoerência nessa possibilidade.


8. Impugnabilidade de atos administrativos – A Lei de Procedimento Administrativo

A Lei de Procedimento Administrativo da República Federal da Alemanha (Verwaltungsverfahrensgesetz), de 26-5-1976, estabelece um rito de impugnação de atos administrativos diverso daquele que está no Código Tributário. É como explica Hartmut MAURER:

O cidadão pode impugnar o ato administrativo, segundo sua concepção antijurídico, e, com isso, obter sua revogação pela autoridade de recurso ou o tribunal administrativo. (...) A autoridade, que publicou o ato administrativo, porém, pode, mais além, revogar também por ele mesmo um ato administrativo – fora do procedimento de impugnação – isto é, na terminologia da lei de procedimento administrativo: "retratação".

A impugnação de atos administrativos está regulada na ordenação da organização da jurisdição administrativa. Ela transcorre, em regra, em dois graus. Inicialmente, deve ser interposto oposição, sobre a qual, em regra, a autoridade administrativa que segue em hierarquia, excepcionalmente, também a autoridade administrativa que publicou o ato administrativo, têm de decidir. Se o procedimento de oposição fica sem resultado, então pode o afetado promover demanda de impugnação no tribunal administrativo. O procedimento de oposição ainda permanece no âmbito administrativo e apresenta, com isso, um controle intra-administrativo. Com a demanda de impugnação, o âmbito administrativo é excedido e causado um controle extra-administrativo. O tribunal administrativo decide como instância independente e provido de pessoas versadas em direito. Sua posição especial e o procedimento judicial administrativo, dotado de garantias especiais, garantem um exame jurídico amplo e neutro. A autoridade, que até então era "dona do procedimento", entra – como o cidadão demandante – no papel de uma parte processual e precisa expor e defender sua concepção jurídica diante das barreiras do tribunal.

(...) a impugnação tem, fundamentalmente, efeito suspensivo, portanto, o ato administrativo impugnado não se torna provisoriamente eficaz juridicamente com a conseqüência que o ato administrativo não pode ser executado até a decisão definitiva. O efeito suspensivo, contudo, não acontece, se o interesse público prepondera na execução imediata, o que deve ser comprovado pela autoridade e, em último lugar, pelo tribunal administrativo, por ponderação dos interesses diferentes, no caso particular. Em seus pormenores, isso está regulado nos §§ 80, 80ª da ordenação da organização da jurisdição administrativa [27].

Em matéria tributária, porém, a regra geral é a não concessão do efeito suspensivo (cf. previsão do Código) [28]. A possibilidade de suspensão da execução (que tem caráter excepcional) dependerá do prudente alvedrio da autoridade pública.


9. Conclusão

A legislação alemã examinada permite assentar as seguintes premissas:

- É assegurado ao administrado o direito de audiência prévia – § 91 do Código Tributário;

- O ato administrativo (que tem, como uma de suas espécies, o lançamento) somente é eficaz quando comunicado ao administrado – § 124 do Código;

- A notificação é intrínseca ao conceito de lançamento (fala-se em "ato notificado de lançamento") – art. 155 do mesmo diploma;

- Também existe a autoliquidação no Direito Alemão, com o nome de "autodenúncia de impostos", com caráter provisório – § 164;

- Mesmo essa espécie de lançamento (elaborada pelo próprio contribuinte) comporta recurso – § 355.

Nesse quadro, não há lugar para o crédito tributário não contencioso, pois ao contribuinte é assegurado o direito de divergir até de si próprio – o que, convenhamos, pode ocorrer com relativa freqüência.


Notas

  1. A recepção constitucional dessas novas tendências da Declaração dos Direitos individuais, para conferir ao Estado a posição de prestador de benefícios, verificou-se em duas Constituições do mundo ocidental, que se distinguem pelas peculiaridades de cada uma, mas que se identificam nas circunstâncias extraordinárias que precederam sua eclosão. Trata-se da Constituição Política dos Estados Unidos Mexicanos, de 5 de fevereiro de 1917, produto da revolução mexicana, votada pelo Congresso Constituinte, reunido no Teatro da República, na cidade de Querétaro, documento que os mexicanos consideram a Primeira Constituição Política e Social do Mundo, e da Constituição da República Alemã, de 11 de agosto de 1919, aprovada pela Assembléia Constituinte, reunida da cidade de Weimar, pouco depois da explosão revolucionária que se seguiu à derrota militar da Alemanha, à abdicação do Kaiser Guilherme II e à supressão da Monarquia. Em 10 de novembro de 1918, no dia imediato aos eventos da abdicação do Imperador, formou-se em Berlim o "Conselho dos Operários e Soldados", que proclamava a nova ordem: "A velha Alemanha não existe mais. A dinastia acabou. A Alemanha é uma República, uma República socialista. Os titulares do poder político são os Conselhos dos Operários e Soldados". Esse o clima que antecedeu à Constituição de Weimar, que se equipara ao que viu nascer a Constituição do México, clima de violência revolucionária, que as duas Constituições procuram apaziguar no equilíbrio das soluções jurídicas.
  2. (...)

    A Constituição Alemã de 1919, a Constituição de Weimer, não deixa entrever nas regras de seu texto famoso os clamores revolucionários que percorrem os artigos da Constituição do México, com as chamas da revolução crepitando no seu texto, às vezes desordenado, dando a impressão de um curso caudaloso que vai levando no turbilhão das águas tudo o que encontra no seu caminho agitado e apressado. A Constituição de Weimar recebeu a ordenação técnica do Professor Hugo Preuss, que lhe esboçou o Projeto e nele imprimiu o rigor técnico-formal, característico dos textos do Direito alemão.

    A Constituição de Weimar converteu-se no texto paradigma do constitucionalismo do primeiro pós-guerra e ainda é o marco que separa duas épocas históricas: a do constitucionalismo liberal dos séculos XVIII e XIX e a do constitucionalismo social do século XX, que com ela adquiriu expansão universal, deixando na penumbra a Constituição do México de 1917, que a precedeu no tempo.

    (HORTA, Raul Machado. Direito Constitucional. 3ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p.218-9)

  3. A ADMINISTRAÇÃO NO ESTADO TOTALITÁRIO DO CHEFE (FÜHRER)
  4. A par de outras razões, o falhanço do Estado parlamentar perante as difíceis tarefas de governo de Estados pluralistas de massas no período das depressões conduziu, na Itália (1922-1944), no Reich alemão (1933-1945), em Espanha (1936-1978) e noutros locais, a uma ampla eliminação revolucionária dos princípios democráticos e liberais do Estado de direito liberal (bürgerlichen Rechtsstaates). Simultaneamente, mediante o recurso à dependência das pessoas na sociedade industrial, foram restabelecidas relações idênticas às do Estado de Polícia. O Estado transformou-se em aparelho de execução de um poder social ou de um "partido". A sua intromissão no domínio de vida pessoal, de acção e de propriedade não esteve sujeita a quaisquer limites jurídicos gerais.

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    A transição tornou a Alemanha de 1930-1932 num Estado presidencialista autoritário, no qual procurou integrar, no lugar das resoluções construtivas da assembléia impotente do Reich (R. Smend), o Presidente do Reich eleito pelo povo como "defensor da Constituição" (C. Schmitt). O Presidente do Reich suspendeu, de acordo com as necessidades, importantes direitos fundamentais, emitiu regulamentos com força de lei no lugar das leis (regulamentos de estado de necessidade, nos termos do art. 48 II WRV – o chamado parágrafo da ditadura) e intensificou a Administração no sentido da "assistência existencial" (satisfação das necessidades básicas), da mediação e da conformação social. Em resultado disso, estes governos presidencialistas (Brüning, Papen, Schleicher) não se apresentaram em condições de deter a crescente depauperação das massas, nem de evitar a radicalização daí surgida.

    (WOLFF, Hans Julius, BACHOF, Otto et STOBER, Rolf. Direito Administrativo. Vol.1. Tradução do original alemão por Antônio Francisco de Sousa. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2006, p.117-8)

  5. Mais perturbador ainda era o modo pelo qual os regimes totalitários tratavam a questão constitucional. Nos primeiros anos de poder, os nazistas desencadearam uma avalanche de leis e decretos, mas nunca se deram ao trabalho de abolir oficialmente a Constituição de Weimar; chegaram até a deixar mais ou menos intactos os serviços públicos – fato que levou muitos observadores locais e estrangeiros a esperar que o partido mostrasse comedimento e que o novo regime caminhasse rapidamente para a normalização. Mas, após a promulgação das Leis de Nuremberg (leis que baniram os judeus de todos os aspectos da vida nacional), verificou-se que os nazistas não tinham o menor respeito sequer pelas suas próprias leis. Em vez disso, continuou a "constante caminhada na direção de setores sempre novos", de modo que, "afinal, o objetivo e a alçada da polícia secreta do Estado", bem como de todas as outras instituições estatais ou partidárias criadas pelos nazistas, não podiam "de forma alguma definir-se pelas leis e normas que as regiam". Na prática, esse estado de permanente ilegalidade era expresso pelo fato de que "muitas das normas em vigor já não [eram] do domínio público". Teoricamente, correspondia ao postulado de Hitler, segundo o qual "Estado total não deve reconhecer qualquer diferença entre a lei e a ética" (Hitler aos juristas, em 1933), porque, quando se presume que a lei em vigor é idêntica à ética comum que emana da consciência de todos, então não há mais necessidade de decretos públicos. A União Soviética, onde os serviços públicos pré-revolucionários haviam sido exterminados durante a revolução, e onde o regime pouco se havia incomodado com questões constitucionais durante o período de mudança revolucionária, chegou a dar-se ao trabalho de promulgar em 1936 uma Constituição inteiramente nova e muito minuciosa ("um véu de frases e preceitos liberais encobrindo a guilhotina escondida no fundo"), fato que foi aclamado na Rússia e no exterior como o fim do período revolucionário. No entanto, a publicação da Constituição coincidiu com o início do gigantesco superexpurgo que, em menos de dois anos, liquidou a administração existente e apagou todos os vestígios de vida normal e da recuperação econômica conseguida durante os quatro anos que se seguiram à liquidação dos kulaks e à coletivização forçada da população rural. Daí por diante, a Constituição stalinista de 1936 teve exatamente o mesmo papel que a Constituição de Weimar sob o regime nazista: completamente ignorada, nunca foi abolida; a única diferença é que Stálin pôde dar-se ao luxo de mais um absurdo – com a exceção de Vishinski, todos os autores da Constituição (que nunca foi repudiada) foram executados como traidores.
  6. (Grifou-se – ARENDT, Hannah. Origens do Totalitarismo. 3ª reimpressão. São Paulo: Companhia das Letras, 1998, p.444-5).

  7. MARINS, James. Direito Processual Tributário Brasileiro (Administrativo e Judicial). 2ª ed. São Paulo: Dialética, 2002, p.348.
  8. Introdução à Constituição
  9. Lei Fundamental para a República Federal da Alemanha

    23 de maio de 1949

    com as emendas inseridas até 26 de julho de 2002

    Em sessão Pública realizada em Bonn am Rhein, em 23 de maio de 1949, o Conselho Parlamentar declarou que a Lei Fundamental para a República Federal da Alemanha, decretada pelo Conselho Parlamentar em 8 de maio de 1949, foi ratificada na semana de 16 a 22 de maio do mesmo ano, pelos representantes de mais de dois terços dos Estados alemães participantes.

    Com base nessa declaração, o Conselho Parlamentar, representado por seus Presidentes, assinou e promulgou a Lei Fundamental.

    A Lei Fundamental foi, consequentemente, publicada no Diário Oficial Federal (Bundesgesetzblatt), conforme dispõe o seu art. 145, § 3º.

  10. Preâmbulo
  11. Consciente da sua responsabilidade perante Deus e os homens, animado pela vontade de servir à promoção da paz no mundo, em igualdade de condições com os demais países-membros de uma Europa unida, o Povo Alemão, no exercício de seu poder constituinte, adotou esta Lei Fundamental.

    Os Alemães dos Estados de Baden-Württemberg, Baviera, Berlim, Brandemburgo, Bremem, Hamburgo, Hesse, Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental, Baixa Saxônia, Renânia do Norte-Vestfália, Renânia-Palatinado, Sarre, Saxônia, Saxônia-Anhalt, Schleswig-Holstein e Turíngia concretizaram, por livre autodeterminação, a unidade e a liberdade na Alemanha. Assim, esta Lei Fundamental aplica-se a todo o Povo Alemão.

    OBS:

    Não deixa de ser curioso, e digno de nota, neste ano de 2007 (momento em que esta nota de rodapé é redigida), no qual se recorda os setenta anos do ataque, pelos aviões da Legião Condor alemã, à sagrada GUERNICA (26-4-1937), que os alemães continuem a afirmar, no Preâmbulo de sua Constituição, que estão conscientes "da sua responsabilidade perante Deus e os homens", seguindo animados "pela vontade de servir à promoção da paz no mundo". Nesse bombardeio (de 2.500 bombas incendiárias, lançadas por 33 aviões, em pleno centro urbano) contra uma população indefesa, a cidade símbolo do nacionalismo basco foi reduzida a cinzas. Em poucas horas, estava em chamas e seus habitantes (quase todos civis – incluindo mulheres, idosos e crianças) eram metralhados indiscriminadamente. Ao todo, foram 50 toneladas de bombas capazes de criar, por ignição, temperatura de 2.700º C. O governo basco da época noticiou 1.654 mortos e 889 feridos. PICASSO retratou esse episódio dantesco, em sua obra mais conhecida. Essa foi, enfim, a experiência que os alemães precisaram para "testar" suas armas e afiá-las devidamente para o conflito que deflagrariam dois anos depois (1939-1945 – iniciando com o ataque à Polônia), no qual cometeram o genocídio contra seis milhões de judeus – e sobre o qual muitas páginas já foram escritas.

    Desse modo, essas retóricas palavras inseridas no Preâmbulo da Constituição Alemã nos remetem a Johannes HESSEN, quando ele ensina que tudo se faz em nome dos valores. Discursos com intensa expressividade emocional, carregados de chavões declamatórios, como "responsabilidade perante Deus" e "promoção da paz no mundo" servem a todo propósito e justificam qualquer atrocidade ou carnificina.

    Reflexões dessa natureza nos remetem ao conhecido capítulo de BECKER, tão maravilhoso quanto desmistificador, intitulado FASCÍNIO PELA "KULTUR" GERMÂNICA, e do qual se destaca a seguinte passagem:

    "O homem moderno padece do fascínio pela Kultur germânica. Principalmente o jurista. Se aquilo que ele está lendo foi escrito por um alemão e está impresso no idioma teutônico, então, é algo tanto mais admirável quando mais complicado. E recebido respeitosamente como a verdade científica que não admite prova em contrário, salvo se escrita por outro alemão, de preferência em letras góticas.

    Ora, aplicam-se perfeitamente à doutrina jurídico-teutônica as mesmas palavras de Jean Dabin aos que sofrem a psicose do Direito Romano. Em matéria de teoria jurídico-tributária, não há o Berlim locuta est. Os alemães não descobriram tudo e aquilo que eles descobriram não é sempre a verdade pura e perfeita. Depois dos alemães, ainda há lugar para um esforço crítico pessoal de elucidação de pontos obscuros e até mesmo de abandono de conceitos deles recebidos.

    (...)

    halo de cientificidade da língua alemã decorre do fato de o idioma germânico ser o mais apto para criar abstrações. De modo que um alemão, ao escrever seja lá o que for, parece sempre pensar, ainda que ele não faça mais do que construir uma simples frase banal.

    (...) Quando se emprega uma palavra estrangeira, explica Stephen Ullmann – ela é empregada não porque haja necessidade real, mas sim pelo seu valor de esnobismo, pelo ar de distinção que confere à linguagem, obtendo-se assim o que se pode chamar de efeitos evocadores secundários.

    (...) Para alcançar a reputação e para atrair os jovens, nos tempos modernos, é necessário pensar idéias obscuras e escrevê-las confusamente (...)".

    (BECKER, Alfredo Augusto. Carnaval Tributário. 2ª ed. São Paulo: LEJUS, 2004, p.111-2)

  12. Artigo 19 da Constituição Alemã
  13. 1.Quando, segundo esta Lei Fundamental, um direito fundamental por restringido por lei ou em virtude de lei, essa lei será aplicada de maneira geral e não apenas para um caso particular. Além disso, a lei deverá especificar o direito fundamental afetado e o artigo que o prevê.

    2.Em hipótese nenhuma um direito fundamental poderá ser afetado em sua essência.

    3.Os direitos fundamentais se aplicarão igualmente às pessoas jurídicas nacionais, na medida em que a natureza desses direitos o permitir.

    4.Quem tiver seus direitos lesados pelo Poder Público poderá recorrer à via judicial. Não havendo foro especial, o recurso deverá ser encaminhado à Justiça comum. Este parágrafo não interferirá no disposto na segunda frase do § 2º do artigo 10.

  14. Ekkehart STEIN explica:
  15. "La Ley Fundamental concede a la jurisdición un papel fundamental. Tiene como misión someter el poder estatal a la Constitución y atribue al Tribunal Constitucional Federal la tarea de vigilar el mantenimiento de este vínculo. El Tribunal Constitucional Federal puede declarar nula cualquier decisión de un órgano estatal. Además, la Ley Fundamental somete el poder ejecutivo a la Ley y al Derecho. Los tribunales administrativos deciden en cada caso concreto si una autoridad ha lesionado el Derecho. Pueden, de esta manera, anular las decisiones de cualquier autoridad administrativa. (...)

    (...)

    Hay que partir del hecho de que, en la República Federal, los tribunales penales y civiles están integrados en los llamados tribunales ordinarios, mientras que los tribunales de trabajo, que también aplican Derecho civil, están configurados como una rama especial de la jurisdicción. Junto a los tribunales administrativos generales se encuentran los tribunales sociales y financieros, dos ramas especiales de la jurisdicción administrativa. En total, los tribunales se estrucuran en seis ramas. El tribunal superior de cada rama es un tribunal federal, y todos los demás son tribunales de los Länder. Dentro de cada rama existe un sistema de instancias que permite la apelación y la revisión. Solo los tribunales constitucionales de la Federación y de los Länder son independientes entre sí; los tribunales constitucionales de los Länder deciden en primera y última instancia sobre cuestiones de Derecho constitucional del Land. Sus sentencias (como las de cualquier otro tribunal) solo pueden ser recurridas ante el Tribunal Constitucional Federal por infringir la Ley Fundamental".

    (STEIN, Ekkehart. Derecho Politico. Tradução de Fernando Sainz Moreno. Madrid: Biblioteca Jurídica Aguilar, 1971, p.104-5)

  16. GOMES DA SILVA, Sérgio André Rocha. Controle Administrativo do Lançamento Tributário. O Processo Administrativo Fiscal. Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2004, p.93-6.
  17. La giurisdizione tributaria è l’unica, nella Repubblica Federale di Germania, che (per motivi storici) presenti due soli gradi di processo. Non esiste nemmeno un giudizio di secondo grado, nel quale tutta la controvérsia sia riesaminata anche dal punto di vista dei fatti, ma vi è solo un procedimento di cassazione, che è limitato alla verifica giuridica della sentenza del giudice tributario (vedi § 118 FGO). I motivi che portano alla ammissibilità del ricorso per cassazione sono espressi in modo tassativo nel § 115 cap. 2 FGO.
  18. (BIRK, Dieter. Diritto Tributario Tedesco. Tradução do alemão por Enrico de Mita. Milano: Giuffrè Editore, 2006, p.159-60)

  19. Artigo 97
  20. Independência de Juízes

    1.Os juízes serão independentes e se submeterão apenas à lei.

    2.Juízes admitidos por tempo integral e no quadro permanente só poderão ser demitidos, contra sua vontade, antes de terminado o seu mandato, ou ser definitiva ou temporariamente destituídos de suas funções, ou ser transferidos para outro posto ou ser aposentados, unicamente por decisão judicial, pelos motivos e nas formas previstas em lei. A legislação poderá instituir a aposentadoria compulsória para juízes vitalícios a partir de determinada idade. Alterando-se a organização dos tribunais ou de suas comarcas, poderão os juízes ser transferidos para outro tribunal ou ser afastados do cargo, mas continuarão percebendo salário integral.

  21. Direito Processual Tributário Brasileiro (Administrativo e Judicial). 2ª ed. São Paulo: Dialética, 2002, p.348.
  22. MARINS, James. Op.cit. p.349-50.
  23. NOGUEIRA, Ruy Barbosa et alii. Novo Código Tributário Alemão. Rio de Janeiro – São Paulo: co-edição: Companhia Editora Forense e Instituto Brasileiro de Direito Tributário, 1978, p.XI-XII.
  24. La Ordenanza Tributaria de la República Federal Alemana data, en su versión original, del 13 diciembre de 1919. Pese a las numerosas modificaciones sufridas durante este tiempo, ha sobrevivido a un cambio múltiple de constitución política – del Imperio a la República de Weimar; de ésta a la Dictadura, y, tras el hundimiento de 1945, de la Dictadura al actual Estado social y democrático de Derecho –, prueba de la calidad de esta ley, políticamente neutral desde todo punto de vista. Por una Ley de 27 de noviembre de 1975 se reformó la Ordenanza Tributaria con efectos a partir del 1 de enero de 1977, sin que su concepción fundamental se modificase en nada esencial.
  25. Una breve referencia histórica podría explicar el nacimiento de la Ordenanza Tributaria: hasta su promulgación en 1919, el Reich alemán constaba de 26 Länder, con otras tantas legislaciones tributarias. Estas leyes tributarias, cuyo contenido en modo alguno coincidía, no sólo comprendían disposiciones jurídico-materiales, sino también los necessarios preceptos relativos al procedimiento de imposición, los quales eran por su parte divergentes entre los distintos Länder.

    Mientras que la Constitutión del Reich promulgada por Bismarck en 1871 y vigente hasta 1918 había atribuído a los Länder en el campo financiero y tributario un predominio con respecto al Reich, la situación se alteró con la pérdida de la Primera Guerra Mundial. Las reparaciones impuestas al Reich alemán por las potencias vencedoras ocasionaram un incremento, de dimensiones hasta entonces desconocidas, en las cargas tributarias a soportar por la población. Esto, a su vez, dio lugar forzosamente a una reordenación fundamental de toda la imposición y a una modificación de las bases mismas del sistema financiero vigente. A fin de poder levantar las altas cargas de las reparaciones, la Constitución del Reich de Weimar sustrajo a los Länder toda fuente de ingresos imaginable y la transfirió al Reich. Además, el Reich se hizo con toda la Administración financiera al crear una Administración financiera unitaria bajo la dirección central del Ministro de Hacienda del Reich, que perduró hasta la entrada en vigor de la Ley Fundamental de Bonn en el año 1949. Todos los impuestos recaudados total o parcialmente en favor del Reich eran administrados por sus autoridades financieras. El fundamento jurídico de ello venía dado poe la Ley del Reich sobre la Administración Financiera de 10 de septiembre de 1919 y por la Ordenanza Tributaria del Reich. A ésta se le había asignado una doble tarea: por una parte, acabar con la dispersión de las disposiciones procedimentales en el ámbito del Derecho tributario y crear un Derecho de procedimiento uniforme para todo el territorio del Reich. Por otra, la Ordenanza debía servir para delimitar mutuamente las posiciones jurídicas del Estado por un lado y de los ciudadanos por otro y fijar sus derechos y deberes recíprocos en el procedimiento de imposición. Debía en especial, dada la elevada cuantía de las cargas tributarias, garantizar la igualdad y la justicia de la imposición. Para conseguir estos objetivos se creó en 1919 el Tribunal de Hacienda del Reich, con sede en Munich, como órgano judicial supremo en materia tributaria, con el fin de asegurar y preservar la unidad del Derecho en el ámbito del Derecho tributario y una imposición igual y justa. De esta forma se eliminó en lo essencial la dispersión jurídica hasta entonces existente en este ámbito.

    (PAULICK, Heinz. Ordenanza Tributaria Alemana. Tradução de Carlos Palao Taboada. Madrid: Instituto de Estudios Fiscales – Ministério de Hacienda, 1980, p.33)

  26. O título deste § 91 é "Anhörung Beteiligter", expressão que Ruy Barbosa Nogueira traduziu como AUDIÊNCIA DAS PARTES. "Anhörung" quer aqui significar algo como "direito de ser ouvido" ou "direito de se manifestar". Dessa forma, o termo AUDIÊNCIA está aqui colocado como essa oportunidade de manifestação das partes (e não no sentido de sessão solene – determinada por autoridade judicial para a prática de atos processuais ou julgamento).
  27. § 34
  28. Deveres dos Representantes Legais e dos Administradores de Bens

    1.Os representantes legais de pessoas naturais e jurídicas, bem como os dirigentes de associações de pessoas e massas patrimoniais sem personalidade jurídica, devem cumprir os respectivos deveres tributários. Devem especialmente fazer que os impostos sejam pagos com os recursos que lhes cabe administrar.

    2.Se as associações de pessoas sem personalidade jurídica não têm dirigente, aos respectivos membros ou associados cabe cumprir os deveres a que alude o inciso 1. A autoridade fiscal pode exigir o cumprimento de tais deveres a qualquer membro ou associado. As mesmas regras deste inciso se aplicam às massas patrimoniais sem personalidade jurídica, respondendo pelo cumprimento dos deveres tributários as pessoas a quem cabe o patrimônio.

    3.Se a administração do patrimônio for exercida por outras pessoas que não os proprietários dele, ou por seus representantes legais, os deveres tributários a que se refere o inciso 1 serão cumpridos pelo administrador do patrimônio dentro dos limites de sua administração.

  29. § 125
  30. Nulidade do Ato Administrativo

    1.O ato administrativo será nulo quando padecer de vício particularmente grave e esse fato se tornar manifesto numa prudente apreciação de todas as circunstâncias que devam ser levadas em consideração.

    2.Independentemente da existência dos pressupostos mencionados no inciso 1, será nulo o ato administrativo:

    1.que tiver sido baixado por escrito e não der a conhecer a autoridade fiscal expedidora;

    2.que não puder ser cumprido por ninguém, por razões de fato;

    3.que exigir a prática de um ato contrário à lei e que constitua pressuposto de um delito ou de uma infração administrativa;

    4.que for contrário aos bons costumes.

    3.O ato administrativo não é nulo pelo simples fato de que:

    1.não tenham sido respeitadas as normas sobre a competência territorial;

    2.tenha dele participado uma pessoa excluída conforme o § 82, inciso 1, período 1, itens 2 a 6, e período 2;

    3.uma comissão chamada a participar por norma jurídica não tenha tomado a deliberação prescrita para a expedição do ato administrativo ou não tenha estado em condições de deliberar;

    4.tenha sido omitida a participação de outra autoridade, exigida em norma jurídica.

    4.Se a nulidade atingir apenas uma parte do ato administrativo, ele será nulo em sua totalidade, quando a parte nula for de tal importância, que a autoridade fiscal não teria baixado o ato administrativo sem a parte nula.

    5.A repartição poderá declarar a nulidade de ofício, a qualquer tempo. Deverá ser declarada, mediante requerimento, se o requerente tiver legítimo interesse.

    MAURER escreve:

    "A mera impugnabilidade do ato administrativo é a regra. Excepcionalmente, um ato jurídico antijurídico é nulo. Isso é, como já foi exposto, então o caso, quando ele sofre de um vício manifesto e grave. Se não existem dúvidas sobre a antijuridicidade, não seria justificado deixar o ato administrativo, por fundamentos da certeza jurídica, tornar-se (provisoriamente) eficaz juridicamente.

    ato administrativo nulo não desenvolve efeitos jurídicos. Ele não pode ser observado e executado pela Administração. Ele não precisa ser cumprido pelo cidadão. A nulidade pode ser feita valer a qualquer hora e em qualquer procedimento. De uma prestação que se baseia em um ato administrativo nulo pode, sem mais, ser pedida a devolução, uma vez que o ato administrativo nulo – de outra forma como o ato administrativo antijurídico, mas somente impugnável – não apresenta uma base jurídica suficiente para a prestação. Isso vale tanto para subvenções do Estado ao cidadão como para impostos e outros tributos do cidadão ao Estado. O ato administrativo nulo, todavia, não é totalmente insignificante. Ele pode causar direitos de indenização. Ademais, ele pode ser objeto de procedimento judicial. Se existem dúvidas sobre os pressupostos da nulidade (manifestação e gravidade do vício), pode o cidadão pedir a comprovação da nulidade pela autoridade administrativa competente e pelo tribunal administrativo (§ 44, V, da lei do procedimento administrativo, § 43, da ordenação da organização da jurisdição administrativa). Para isso, o cidadão, certamente, não está coagido. Ele pode ignorar um ato administrativo que ele considera nulo, mas faz isso por sua conta e risco. É, melhor dito, em todo caso, possível que a autoridade não compartilhe da sua concepção e tente executar o ato administrativo. Se o prazo de impugnação expirou, então a objeção do cidadão, que o ato administrativo é, embora não nulo, sempre, pelo menos, antijurídico, não mais auxilia. O cidadão está, por isso, bem aconselhado se ele, por precaução, promove, em tempo oportuno, demanda de impugnação. Segundo a doutrina dominante, o tribunal administrativo também pode, no quadro de uma demanda de impugnação, revogar um ato administrativo nulo. Isso não é dogmaticamente indubitável. Está mais próximo transmutar o procedimento de impugnação em um procedimento de comprovação de nulidade, quando se mostra que o ato administrativo é nulo.

    (MAURER, Hartmut. Elementos de Direito Administrativo Alemão. Tradução de Luís Antônio HECK. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2001, p.103-4)

  31. (FORSTHOFF, Ernst. Traité de Droit Administratif Allemand. Traduit de l’allemand por Michel Fromont. Bruxelles: Établissements Émile Bruylant, 1969, p.343-4)
  32. Neste ponto, os tradutores do Código Tributário Alemão aduziram a seguinte nota:
  33. "Notificação de lançamento, na tradução, designa não propriamente a comunicação do lançamento, mas o próprio ato administrativo de lançar notificado ao contribuinte (Stenerbescheid). O § 155, inciso 1, dessa forma define o conceito de Stenerbescheid. Para designar o só ato de lançar o imposto, como ato administrativo ainda não notificado, dispõe a língua alemã da expressão Stenerfestsetzung. O temo Veranlagung, que é sinônimo de Stenerfestsetzung, tampouco envolve a noção do ato notificado. Também se usa Steuerbescheid no sentido de simples notificação, como ocorre no § 169, inciso 1, item 1".

    (Op.cit. p.66)

  34. Un gran número de impuestos son pagados directamente por el obligado (o un tercero afectado) sin intervención de la autoridad administrativa; en estos tipos de tributos no se necesita ninguna "liquidación", ningún acto de liquidación que fije en el caso concreto la cuantía del crédito tributario. No obstante, en estos impuestos se puede producir un acto de liquidación facultativo si surgen dudas que deban ser aclaradas a instancias del deudor con la Administración, o interviene ésta por sí mesma porque cree que el deudor no puede cumplir con su obligación o, al menos, no satisfactoriamente. Al contrario que éstos, se encuentran aquellos tipos de impuestos en los que la autoridad tributaria está obligada por ley a colaborar en la resolución de cada uno de los casos; en ellos la Administración debe fijar simpre el crédito y comunicárselo al obligado tributario, remitiéndole un acto obrigatorio. Cuál de las dos posibilidades procedimentales disponga el legislador en cada impuesto depende de consideraciones políticas y técnicas. (...)
  35. (HENSEL, Albert. Derecho Tributario. Tradução do alemão por Andrés Báez Moreno, Maria Luisa González-Cuéllar Serrano y Enrique Ortiz Calle. Tradução baseada na reimpressão da 3ª edição da obra original – 1933. Madri / Barcelona: Marcial Pons Ediciones Jurídicas y Sociales, 2005, p.348-9)

  36. Primeira Seção
  37. RECURSOS ADMISSÍVEIS

    § 347

    Recursos Admissíveis

    1.Os recursos desta parte são admitidos:

    1.em questões tributárias sobre as quais se aplica esta lei;

    2.em processos de execução de atos administrativos sobre outras questões que não as referidas no número 1, desde que os atos administrativos tenham de ser executados por autoridades fiscais federais ou autoridades fiscais estaduais, de acordo com as prescrições desta lei;

    3.em litígios de direito público e profissional a respeito de questões regidas pela primeira parte, pela segunda e sexta seções da segunda parte e pela primeira seção da terceira parte da lei de consultoria fiscal;

    4.em outros assuntos administrados pelas autoridades fiscais, desde que as normas sobre os recursos extrajudiciais tenham sido ou venham, através de lei, a ser declarados aplicáveis.

    Além disso, o recurso é admissível quando se evidenciar que, em recurso anteriormente interposto, uma das questões caracterizadas no item 1 não tenha sido decidida, dentro do prazo previsto, por decreto de um ato administrativo sem comunicação de um motivo fundamentado.

    2.Questões tributárias são todas as questões relacionadas com a administração dos tributos, inclusive com o reembolso do tributo a título de incentivo, ou com a aplicação das normas jurídicas tributárias, pelas autoridades fiscais, inclusive os atos das autoridades fiscais federais e das autoridades fiscais do Estado-membro de Berlim, para a observância das proibições e restrições à circulação de mercadorias através da fronteira; as questões da administração dos monopólios fiscais equiparam-se às questões tributárias.

    3.As regulamentações da Sétima Parte não se aplicam ao processo penal, nem ao processo de multa administrativa.

  38. § 348 Inadmissibilidade do recurso de reconsideração
  39. recurso de reconsideração não é admissível:

    1.contra decisões de recursos de reconsideração (§ 367),

    2.em face da omissão de decidir sobre um recurso de reconsideração,

    3.contra atos administrativos dos órgãos fiscais superiores da União e dos Estados-membros, salvo previsão legal do procedimento de reconsideração,

    4.contra decisões em matérias relativas à segunda e sexta seções da segunda parte da Lei de Consultas Tributárias.

    5.(revogado)

    6.nos casos relativos ao § 172, item 3.

  40. BIRK, Dieter. Diritto Tributario Tedesco. Tradução do alemão por Enrico de Mita. Milano: Giuffrè Editore, 2006, p.151-2.
  41. A fundamentação, fundamentalmente, necessária segundo o § 39, I, da lei do procedimento administrativo, tem uma função tríplice: ela deve, por um lado, comunicar as considerações determinantes da autoridade para que ele se possa fazer uma idéia sobre a conformidade ao direito do ato administrativo e estimar as chances de um recurso jurídico; ela, por outro, serve o autocontrole da Administração que, pelo dever da declaração expressa dos fundamentos, é coagida a examinar rigorosamente os pressupostos do ato administrativo; ela deve, por fim, facilitar o controle pelos tribunais administrativos.
  42. (MAURER, Hartmut. Elementos de Direito Administrativo Alemão. Tradução de Luís Antônio HECK. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2001, p.103-4)

  43. Terceira Seção
  44. NORMAS PROCESSUAIS ESPECIAIS

    § 367

    Decisão sobre o Recurso

    1.Decide, em decisão específica, sobre o recurso a autoridade fiscal que expediu o ato administrativo. Se, posteriormente, outra autoridade fiscal ficou responsável pelo caso, esta autoridade é que decidirá; mantém-se inalterado o disposto no § 26, período segundo.

    2.A autoridade fiscal que decidir sobre o recurso terá de examinar novamente toda a questão. O ato administrativo também poderá ser modificado em prejuízo daquele que apresentou o recurso, caso este tenha sido avisado, com a indicação dos motivos, da possibilidade de uma decisão pior e lhe tenha sido dada oportunidade de se pronunciar a esse respeito. Uma decisão de recurso só será necessária caso a autoridade fiscal não acolha o recurso.

    (2a) A autoridade fiscal pode decidir, em primeiro lugar, sobre partes do recurso, se isto for útil à discussão. A autoridade fiscal deve determinar, nessa decisão, em relação a que partes não se aplicará a supressão de apelação.

    (2b) Recursos pendentes, que digam respeito a questão jurídica decidida pelo Tribunal das Comunidades Européias, pelo Tribunal Federal Constitucional ou pela Corte Federal das Finanças e que não possam ser solucionadas após a conclusão do processo perante estes Tribunais, podem ser recusados através da disposição geral. A autoridade competente para o despacho da disposição geral é Repartição Fiscal mais elevada. A disposição geral deve ser publicada no Diário Oficial de Impostos e no site da Internet do Ministério Federal das Finanças. Passa a ter validade enquanto dada ao conhecimento no dia subseqüente à sua publicação no jornal em que foi publicada. Diferentemente do § 47, inciso 1, da Regulamentação do Código Financeiro, o prazo para reclamação se encerra depois de decorrido um ano após o dia da publicação. O § 63, inciso 1, nº 1 do mesmo Código Financeiro também é valido, desde que o recurso tenha sido recusado através de uma disposição geral de acordo com a norma 1.

    3.Se o recurso for suscitado contra ato administrativo, expedido por autoridade que, com base em normas legais, o fez para a autoridade fiscal competente, esta decidirá sobre o recurso. Também a autoridade que atuou para a autoridade fiscal competente tem o direito de acolher o recurso.

  45. MAURER, Hartmut. Elementos de Direito Administrativo Alemão. Tradução de Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 2001, p.105-6.
  46. § 361

Suspensão da execução

1.A interposição do recurso não suspenderá a execução do ato administrativo impugnado, ressalvado o disposto no inciso 4; principalmente não será sustada a cobrança de um tributo. O mesmo se aplica à impugnação de notificações de bases de cálculo destinadas a fundamentar os atos subseqüentes.

2.A repartição fiscal que tenha expedido o ato administrativo impugnado poderá suspender a execução total ou parcialmente. Aplicar-se-á, no que couber, o § 367, inciso 1, segunda parte do período. A suspensão deverá ser determinada a pedido, quando houver sérias dúvidas a respeito da legitimidade do ato administrativo impugnado, ou quando a execução acarretar, como conseqüência, para a pessoa atingida, um rigor injusto, não pretendido pelo interesse público preponderante. Poderá tornar a suspensão dependente da prestação de garantia.

3.Sempre que a execução de ato que apura bases de cálculo for suspensa, deverá ser igualmente suspensa a execução de um ato subseqüente. A prática do ato subseqüente continua válida. Na suspensão de um ato subseqüente se decidirá sobre a prestação de garantia, a menos que na suspensão da execução do ato que apurou bases de cálculo a prestação da garantia tenha sido expressamente excluída.

4.Em virtude da interposição de recurso extrajudicial contra a interdição de estabelecimento industrial ou do exercício da profissão, ficará suspensa a execução do ato administrativo impugnado; não é afetado por esta norma o disposto no § 45, inciso 3, do monopólio de mercadorias inflamáveis. A repartição fiscal que expediu o ato administrativo poderá remover, total ou parcialmente, o efeito suspensivo, através de uma ordem especial, se ela considerar isso necessário no interesse público; ela terá de justificar o interesse público por escrito. Aplicar-se-á, no que couber, o disposto no § 367, inciso 1, segunda parte do período.

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Sobre o autor
Paulo Adyr Dias do Amaral

Doutor em Direito Público - UFMG. Mestre em Direito Tributário - UFMG. Diretor da Associação Brasileira de Direito Tributário - ABRADT. Membro do Grupo de Estudos da Associação Brasileira de Direito Financeiro - ABDF/Minas. Membro da Associação Latino-Americana de Direito Comparado. Professor nos Cursos de Pós-graduação em Direito Tributário da PUC/Minas, das Faculdades Milton Campos, do Centro de Estudos na Área Jurídica Federal - CEAJUFE, do Centro de Atualização em Direito - CAD (em convênio com a Universidade Gama Filho).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AMARAL, Paulo Adyr Dias. Processo tributário na Alemanha. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2377, 3 jan. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14125. Acesso em: 24 abr. 2024.

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