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Breves comentários sobre universalismo e pluralismo jurídico

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CONCLUSÃO

O Monismo Estatal dos séculos XVII e XVIII entrou em crise de esgotamento e estrutura, em razão do não acompanhamento das profundas transformações econômicas e sociais da segunda metade do século XIX. O desenvolvimento de novas perspectivas de direito, aliado a uma concepção lata de norma jurídica possibilitaram o florescimento de uma teoria jurídica significativamente desprendida da teoria do Estado.

A Escola histórica do direito contribuiu sobremaneira para o estabelecimento de uma teoria jurídica pluralista na medida em que, desprendendo-se da perspectiva dominante acerca do direito natural, que o identificava na vontade divina revelada ou na abstrata razão humana, concebeu-o como o direito positivo universal, conforme determinado no que de permanente se verificasse na experiência histórica das nações. Uma vez que cada Estado soberano constituía seu direito positivo, não haveria que se falar em uma ordem jurídica universal, mas em tantas ordens quantas vontades soberanas se verificassem.

Por sua vez, a corrente de pensamento institucionalista, pautada na filosofia social e no pensamento sociológico antiestatal, centrado na polêmica contra o Estado e na descoberta da sociedade abaixo do Estado, favoreceu a construção conceitual segundo a qual o grupo social organizado constitui ordenamento de natureza jurídica, independente do Estado. Ademais, as rápidas e profundas transformações introduzidas pela Revolução Industrial do século XIX, acelerando o envelhecimento natural da legislação, fizeram o direito estatal parecer mais antigo e ultrapassado a cada instante, derrubando por terra o dogma da completude do ordenamento. Reconheceu-se, assim, a necessidade de complementação do direito do Estado por ordens sociais de natureza diversa.

Bobbio sustenta, nesse sentido, a existência de quatro espécies de ordens jurídicas não-estatais, a saber 1) ordenamentos acima do Estado, como o ordenamento internacional e, segundo algumas doutrinas, a Igreja Católica e as religiões tradicionais; 2) ordenamentos abaixo do Estado, propriamente sociais, reconhecidos pelo Estado e por ele limitados ou absorvidos; 3) ordenamentos ao lado do Estado, como a ordem jurídica internacional, na teoria denominada dualista, ou a Igreja Católica, conforme determinadas acepções, em face de seu peculiar desenvolvimento histórico; e 4) ordenamentos contra o Estado, como organizações criminosas, seitas secretas ou paramilitares.

A teoria jurídica pluralista exerce importante papel na busca pela implementação do ideal de justiça. Sendo assente na doutrina que o direito estatal é incapaz de regular satisfatoriamente toda possível conduta social, necessária se faz a existência de instâncias que complementem a produção normativa do Estado, subsidiando a tomada de atitude do corpo social e a formulação da decisão pelo órgão judiciário do Estado.

A despeito do verificado pluralismo estatal e institucional da era contemporânea, permanece o universalismo jurídico como exigência moral e tendência política. Como exigência moral, pelo interesse no ideal da ordem única, perfeita e completa, que materializasse iguais valores para a totalidade dos homens; como tendência, na vontade, cada vez mais manifesta pela comunidade internacional, da produção de um direito positivo universal, verificada na produção de instâncias regulatórias de nível comunitário, a exemplo do Mercosul e da União Europeia, e de nível internacional, como a Organização das Nações Unidas. Paralelamente ao pluralismo jurídico-institucional, tem-se como tendência, portanto, o universalismo jurídico-estatal.


REFERÊNCIAS

BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 6 ed. Brasília: EdUNB, 1995, p. 162.

COELHO, Luís Fernando. Lógica Jurídica e Interpretação das Leis. Apud MEDEIROS, Honório de. Op. cit., 2010.

DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 18. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 98.

FULLER, Lon L. O caso dos exploradores de cavernas. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006.

KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Trad. J. Cretella Jr e Agnes Cretella. São Paulo: RT, 2001. Apud TEJO, Joycemar. Op. cit., 2010.

MEDEIROS, Honório de. A respeito do pluralismo jurídico. Disponível em <http://www.universia.com.br/images/docs/pluralismojuridico.doc> Acesso em: 24 jun. 2010.

RIBEIRO, Gustavo Ferreira. A Santa Sé e a Cidade do Vaticano sob a ótica do Direito Internacional. Disponível em: <http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=27751> Acesso em 25 jun. 2010.

SILVA, Cissa Maria de Almeida. Do monismo estatal ao pluralismo jurídico. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 4, no 164. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br/ doutrina/texto.asp?id=1057> Acesso em: 28 jun. 2010.

TEJO, Joycemar. Teorias monista e dualista do direito internacional. Disponível em: <http://www.apriori.com.br/cgi/for/teorias-monista-e-dualista-do-direito-internacional-j-tejo-t1183.html> Acesso em 25 jun. 2010.


NOTAS

[1] MEDEIROS, Honório de. A respeito do pluralismo jurídico. Disponível em <http://www.universia.com.br/images/docs/pluralismojuridico.doc> Acesso em: 24 jun. 2010.

[2] SILVA, Cissa Maria de Almeida. Do monismo estatal ao pluralismo jurídico. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 4, no 164. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br/ doutrina/texto.asp?id=1057> Acesso em: 28 jun. 2010.

[3] DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 18. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 98.

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[4] BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 6 ed. Brasília: EdUNB, 1995, p. 162.

[5] "Instituição", aqui, não assume o sentido cunhado por Durkheim, de conjunto de regras e procedimentos padronizados socialmente, reconhecidos, aceitos e sancionados pela comunidade. Toma o significado mais amplo e corriqueiro de organização, fundação, grupo social estruturado para um determinado fim.

[6] COELHO, Luís Fernando. Lógica Jurídica e Interpretação das Leis. Apud MEDEIROS, Honório de. Op. cit., 2010.

[7] BOBBIO, Norberto. Op. cit., 2007, p. 266.

[8] BOBBIO, Op. cit., 2007, p. 267.

[9] Idem, p. 268.

[10] TEJO, Joycemar. Teorias monista e dualista do direito internacional. Disponível em: <http://www.apriori.com.br/cgi/for/teorias-monista-e-dualista-do-direito-internacional-j-tejo-t1183.html> Acesso em 25 jun. 2010.

[11] KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Trad. J. Cretella Jr e Agnes Cretella. São Paulo: RT, 2001. Apud TEJO, Joycemar. Op. cit., 2010.

[12] TEJO, Joycemar. Op. cit., 2010.

[13] RIBEIRO, Gustavo Ferreira. A Santa Sé e a Cidade do Vaticano sob a ótica do Direito Internacional. Disponível em: <http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=27751> Acesso em 25 jun. 2010.

[14] FULLER, Lon L. O caso dos exploradores de cavernas. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006.

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Sobre o autor
Cláudio Ricardo Silva Lima Júnior

Especialista em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC/MG). Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco e pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) - dupla diplomação. Ex-Assessor da Justiça Federal de Primeira Instância na 5ª Região. Ex-Assessor do Ministério Público Federal na 1ª Região. Atualmente, é Oficial de Justiça do Tribunal Regional Federal da 5ª Região.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA JÚNIOR, Cláudio Ricardo Silva. Breves comentários sobre universalismo e pluralismo jurídico. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2588, 2 ago. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17080. Acesso em: 28 set. 2024.

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