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Democracia possível e democracia desejável.

Uma explicação para a democracia como campo de luta

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18/09/2010 às 15:33
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Democracia como campo de luta (uma releitura da lição de Ihering)

A política e a democracia, no entanto, não consistem apenas no instrumento para o desenvolvimento humano, no locus adequado para o exercício pleno da humanidade entre os indivíduos; política e democracia podem também ser consideradas como um "campo de luta" alternativo à guerra; [49] ou pelo menos uma alternativa às armas da guerra: a retórica suplantando os canhões. [50] Embora a esfera pública e mesmo a esfera privada sejam importantes, é o domínio da esfera estatal que pode promover a luta pacífica [51] na sociedade; desta maneira, o Estado que sempre foi um instrumento de dominação, e que talvez nunca deixe de sê-lo, pode promover um campo de luta pacífico para determinar a quem pertencerá o domínio político; em substituição à guerra militar (e como alternativa à competição econômica), a democracia é a esfera da retórica, do diálogo, do convencimento; portanto, ainda assim, democracia é luta e não apaziguamento; sendo luta pressupõe o conflito (o conflito de valores e/ou de interesses), a vitória e a derrota; a diferença é que o derrotado não será aniquilado e o vencedor não terá o poder absoluto, também a todo instante pode ser suscitada a revanche ou pode ser acertado um acordo, mas ainda assim é luta; não se pense que a dissimulação, a traição, os políticos profissionais serão afastados, a distinção é que no campo democrático é possível que todos participem com algumas garantias e com algum equilíbrio entre os oponentes.

Ihering de forma pujante proclama esta lei da história (que pode ser adaptado para o campo democrático):

Todos os direitos da humanidade foram conquistados na luta; todas as regras importantes do direito devem ter sido, na sua origem, arrancadas àquelas que a elas se opunham, e todo o direito, direito de um povo ou direito de um particular, faz presumir que se esteja decidido a mantê-lo com firmeza. [52]

A democracia é também uma conquista; [53] a democracia participativa, enquanto campo de luta, estabelece novas armas e equilibra as relações entre os oponentes: amplia o direito de votar e o direito de discutir. Não se pode, no entanto, desconsiderar outros fatores relevantes para a atividade política e que desigualam o poder de cada participante, por exemplo: as distinções econômicas, as distinções sociais, os graus diferentes de educação, todos eles, mesmo no campo de luta democrático, promovem participantes mais ou menos influentes. Mas não se pode negar que assegurar esferas de deliberação e de discussão em que todos participam com o mesmo status, promove mais igualdade entre indivíduos inevitavelmente desiguais (exceto na sua humanidade); também não se pode negar que a ampliação da participação política é resultado (ou melhor, está sendo o resultado) de um processo histórico de conquistas de direitos. É neste contexto que a democracia participativa está situada.


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Notas

  1. Giovani Sartori e Norberto Bobbio fazem uso corrente destas expressões.
  2. "Por considerar as democracias efetivamente existentes pobres aproximações do ideal democrático, Dahl sugeriu que estas fossem chamadas de poliarquias". Cf. Limongi, Fernado. Prefácio. In: Dahl, Robert A. Poliarquia. São Paulo: Editora da USP, 1997, p. 11.
  3. A conclusão negativa desta indagação implicaria em considerar a democracia de duas maneiras: (a) como uma teoria legitimadora (no sentido de enganação) ou (b) como uma utopia (no sentido de ideal inalcançável, ainda que desejável). Neste sentido, cf. a distinção entre mito e utopia feita por Luís Felipe Miguel: "se a utopia pode ser lida como a meta final que orienta o projeto, o mito é sua degradação, depreciando o debate político e aceitando os mecanismos de identificação já aferidos. (...) Enquanto a utopia integra-se ao projeto como manifestação de suas mais altas ambições, o mito expressa a inocuidade de qualquer projeto". Cf. Miguel, Luís Felipe. Mito e discurso político. Campinas: Editora da Unicamp, 2000, pp. 47-8.
  4. Também sem desmerecer outros teóricos mais atuais como Robert Dahl. Características da democracia para Dahl: a) participação efetiva; b) igualdade de voto; c) aquisição de entendimento esclarecido; d) exercer o controle definitivo do planejamento; e) inclusão dos adultos. Cf. Dahl, Robert. Sobre a democracia, pp. 49-50. Finalidade da democracia para Dahl: a) evita a tirania; b) direitos essenciais; c) liberdade geral; d) autodeterminação; e) autonomia moral; f) desenvolvimento humano; g) proteção dos interesses pessoais essenciais; h) igualdade política; i) a busca pela paz; j) a prosperidade. Cf. Dahl, Robert. Sobre a democracia. Brasília: Editora da UnB, 2001, p. 58. E, ainda, as características de uma democracia em grande escala: a) funcionários eleitos; b) eleições livres, justas e freqüentes; c) liberdade de expressão; d) fontes de informação diversificadas; e) autonomia para as associações; f) cidadania inclusiva. Cf. Dahl, Robert. Sobre a democracia. Brasília: Editora da UnB, 2001, p. 99.
  5. Preferiu-se a expressão democracia (democrático) no sentido que Rousseau emprega república (republicano).
  6. Rousseau "admite que é impossível existir democracia perfeita, pelo menos no sentido de democracia direta perfeita, uma vez que esta implicaria em algo não factível, ou seja, que o povo fizesse política em tempo integral" (Cf. Merquior, José Guilherme. Rousseau e Weber. Rio de Janeiro: Guanabara, 1980, p. 23), mas também "Rousseau devota um dos seus mais extensos capítulos (Livro IV, Cap. 4) à discussão dos métodos de reunião e votação da Roma antiga, e no decorrer de todo o texto é incisivo ao demonstrar que a realização de freqüentes assembléias populares não é inviável, quanto mais impraticável". (Cf. Merquior, José Guilherme. Rousseau e Weber. Rio de Janeiro: Guanabara, 1980, pp. 23-4).
  7. Cf. Bobbio, Norberto. Qual socialismo? Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983, p. 88.
  8. Ou melhor, que são revelados no momento em que, nas situações reais, o ideal democrático não é plenamente aplicável ou que sua aplicação resulta em abrir mão de outros valores ou de outros objetivos ou ainda porque o ideal democrático não cumpre suas promessas. Ver as promessas não cumpridas segundo Bobbio: a) a sobrevivência do poder invisível; b) a permanência da oligarquia; c) a supressão dos corpos intermediários; d) a revanche da representação dos interesses; e) a participação interrompida; f) o cidadão não educado (ou mal-educado). Cf. Bobbio, Norberto. O futuro da democracia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986, p. 10.
  9. No século XX, Hans Kelsen resgatou a concepção do filósofo genebrino de uma maneira diferente.
  10. Hesse também identifica a impossibilidade do autogoverno: "Também a democracia direta, que mais se aproxima do autogoverno do povo, é domínio de homens sobre outros homens, e precisamente, da maioria sobre a minoria; mesmo no caso da unanimidade, ela ainda é o domínio daqueles que participaram na votação, sobre os não-votantes, e a afirmação da identidade de governantes com governados é nada mais que uma identificação entre domínio da maioria e domínio do povo". Cf. Hesse, Konrad. Elementos de direito constitucional da República federal da Alemanha. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998, p. 118.
  11. Neste sentido é o entendimento de Schmitt também: "Democracia es una forma política que corresponde al princípio de la identidad (quiere decirse identidad del pueblo en su existencia concreta consigo mismo como unidad política)". Cf. Schmitt, Carl. Teoría de la constitución. Madrid: Alianza Universidad Textos, 1996, p. 221.
  12. Neste sentido Bidart Campos: a idéia de democracia como autogoverno se sustentava como uma ficção de que os representantes expressavam a vontade do povo. Cf. Bidart Campos, German Jose. El mito del pueblo como sujeto de gobierno, de soberania y de representación. Buenos Aires: Abeledo - Perrot, s/d, p.30.
  13. Bobbio alerta ainda que sob o nome genérico de democracia direta entendem-se todas as formas de participação no poder, que não se resolvem numa ou noutra forma de representação: a) o governo do povo (por delegados investidos de mandato imperativo e revogável), b) o governo de assembléia, c) o referendo. Cf. Bobbio, Norberto. Estado, governo, sociedade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995, p. 154.
  14. Bonavides tem uma novo conceito de democracia direta compatibilizando-a com o instituto da representação política, destacando o aspecto da disponibilidade dos instrumentos de controle do representante. Cf. Bonavides, Paulo. Teoria do Estado. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 354.
  15. Bobbio cita exemplos de democracia direta que não são muito democráticos, como a "democracia plebiscitária ou aclamante". Cf. Bobbio, Norberto. Qual socialismo? Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983, pp. 68-9.
  16. Não trataremos do dilema da democracia de Becker: "resolver o problema econômico pelo método democrático ou deixar de ser sociedade democrática". Cf. Becker, Carl L. O dilema da democracia. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1964, p. 71.
  17. Bobbio também identifica quatro paradoxos - 1º paradoxo: a democracia (ideal) pede sempre mais participação em condições objetivas sempre mais desfavoráveis; 2º paradoxo: O Estado cresceu em complexidade e funções, que obrigou a um aumento do aparelho burocrático, cuja estrutura é hierarquizada e não democrática; 3º paradoxo: o aumento acelerado dos problemas que exigem soluções técnicas e que, portanto, só podem ser entregues a especialistas, tentados para a tecnocracia; 4º paradoxo: a democracia exige participação consciente do cidadão, mas a sociedade de massa se caracteriza pelo homem-massa. Cf. Bobbio, Norberto. Qual socialismo? Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983, pp. 58-62.
  18. "Quanto mais pessoas participarem do poder decisório, mais formais terão de ser nossos procedimentos. Nós temos que ser informados a respeito da reunião, da apresentação de moções e da ordem dos assuntos. Se muitas pessoas devem dar a palavra final em uma decisão, há que ser uma participação padronizada, uma resposta padronizada para uma questão previamente apresentada. Assim, muita importância é atribuída ao teor da questão, e esta é decidida, na maior parte, através de debates informais antes da reunião. Quanto mais ampla for a reunião, maior será a dificuldade de se alterar as propostas ou lidar com questões de ordem no transcorrer dos trabalhos formais, e maior o poder efetivo nas mãos daqueles que organizam a agenda e formulam as propostas com antecedência". Cf. Lucas, John Randolph. Democracia e participação. Brasília: Editora da UnB, 1985, p. 108.
  19. "Weber dava valor ao fato de que o objetivo da democracia direta era a redução da dominação ao mais baixo nível possível mas, em uma sociedade heterogênea, a democracia direta levaria a uma administração ineficaz e a uma ineficiência indesejada, a instabilidade política e, em última instância, a um aumento radical na possibilidade (como Platão e outros críticos tinham observado acerca da democracia clássica) do governo opressivo das minorias". Cf. Held, David. Modelos de democracia. Belo Horizonte: Editora Paidéia, s/d, p. 136.
  20. "Embora o governo dos funcionários públicos seja inevitável, os burocratas adquirem considerável poder graças à sua especialização, informação e acesso a segredos. Este poder pode se tornar, pensava Weber, esmagador. Os políticos e atores políticos de todos os tipos podem se ver dependentes da burocracia". Cf. Held, David. Modelos de democracia. Belo Horizonte: Editora Paidéia, s/d, p. 140. "As promessas da [do ideal] democracia não foram cumpridas porque foi idealizado para uma sociedade muito menos complexa que a de hoje". Cf. Bobbio, Norberto. O futuro da democracia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986, p. 33. O saber técnico cada vez mais especializado torna-se cada vez mais um saber de elites, inacessível à massa. Cf. Bobbio, Norberto. Teoria geral da política. Rio de Janeiro: Campus, 2000, p. 410. "As instituições da democracia direta, ou da auto-administração, não podem simplesmente substituir o Estado; pois, como previu Max Weber, elas deixam um vácuo de coordenação que é prontamente preenchido pela burocracia". Cf. Held, David. Modelos de democracia. Belo Horizonte: Editora Paidéia, s/d, p. 232.
  21. Talvez a maior crítica da democracia, e seu maior obstáculo, inclusive entre os democratas, é que a maioria dos que têm o direito de participação política é incompetente para exercer a atividade política, "isto é, não tem, nelas mesmas, condições para conhecer e exprimir suas necessidades e aspirações, e, quando fazem são portadora do irracionalismo". Cf. Souza, Isabel Ribeiro de Oliveira Gómez de. Reflexões sobre a participação política, p. 69. Neste momento podemos fazer uma indagação: será possível associar a competência para a atividade política com o grau de interesse com tal atividade, e mais relacionar o grau de interesse com fatores como se sentir importante, se sentir participante, entender o objeto da sua atividade. Nesta medida o homem-massa para a política pode ser bastante perspicaz para os negócios, ou ainda um excelente marido ou filho, ou um competente servidor público, ou ainda um excelente professor. Talvez porque possa dominar aquele mundo ao contrário da política. Claro, reduzimos o sentido de massa, que pode ser, como pretendia Ortega y Gasset, próximo da formação de um homem completo com ampla formação humanista. Pretendemos reduzir apenas ao homem que tenha interesse e que seja consciente de suas escolhas e das conseqüências delas.
  22. Cf. Dahl, Robert. Análise política moderna. Brasília: Editora da UnB, 1988, p. 97
  23. Cf. Dahl, Robert. Análise política moderna. Brasília: Editora da UnB, 1988, p. 99. Neste sentido: "é difícil, se não impossível, imaginar qualquer sistema político, como J. S. Mill corretamente observou, no qual todos os cidadãos estariam envolvidos em discussões diretas todas as vezes que surgisse uma questão pública". Cf. Held, David. Modelos de democracia. Belo Horizonte: Editora Paidéia, s/d, p. 232.
  24. "Por que razão, mesmo nas sociedades modernas, onde a educação é amplamente difundida, existe sufrágio universal e um sistema político democrático, o estrato apolítico é tão grande? (...)". Cf. Dahl, Robert. Análise política moderna. Brasília: Editora da UnB, 1988, p. 99.
  25. Cf. Dahl, Robert. Análise política moderna. Brasília: Editora da UnB, 1988, pp. 99-102
  26. Não se pretende afirmar que as novas tecnologias produzem necessariamente liberdade de expressão e participação ativa no debate público, mas apenas que estas novas tecnologias são instrumentos para superar alguns obstáculos operacionais à democracia participativa.
  27. "A idéia de que os recentes e os esperados avanços na tecnologia do computador e telecomunicações possibilitarão conseguir uma democracia direta apropriada para as comunidades muito populosas é atraente não apenas para os teóricos da tecnologia como também para os teóricos da sociedade e filósofos políticos. Mas essa idéia não presta atenção a uma exigência irrecusável de qualquer processo decisório: alguém deve formular as questões". Cf. Macpherson, C. B. A democracia liberal. Rio de Janeiro: Zahar, 1978, p. 99.
  28. "A tecnologia eletrônica, pois, não nos pode dar a democracia direta". Cf. Macpherson, C. B. A democracia liberal. Rio de Janeiro: Zahar, 1978, p. 101.
  29. Cf. Held, David. Modelos de democracia. Belo Horizonte: Editora Paidéia, s/d, pp. 136-7.
  30. Talvez, por isto, na tipologia aristotélica o cerne da distinção entre as três formas boas e suas respectivas formas más não esteja na engenharia institucional, mas no ânimo do governante.
  31. "Em nossa opinião, o problema do político é o controle da complexidade autoproduzida no sistema político. O problema da democracia é o incremento da complexidade e a estabilização da forma de diferenciação em condições de alta instabilidade estrutural". Cf. De Giorgi, Raffaele. Direito, democracia e risco. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 1998, p. 53. Ainda, especificamente sobre a teoria do risco, cf. De Giorgi, Raffaele. Direito, democracia e risco. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 1998, pp. 197-9.
  32. Cf. Held, David. Modelos de democracia. Belo Horizonte: Editora Paidéia, s/d, p. 233.
  33. "Quanto às várias formas de excelência moral, todavia, adquirimo-las por havê-las efetivamente praticado, tal como fazemos com as artes. As coisas que temos de aprender antes de fazer, aprendemo-las fazendo-as - (...) tornamo-nos justos praticando atos justos, moderados agindo moderadamente, e corajosos agindo corajosamente". Cf. Aristóteles. Ética a Nicômacos. Brasília: Editora da UnB, 1992, p. 35.
  34. "A ação, única atividade que se exerce diretamente entre os homens sem a mediação das coisas ou da matéria, corresponde à condição humana da pluralidade, ao fato de que homens, e não o Homem, vivem na Terra e habitam o mundo". Cf. Arendt, Hannah. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária; Rio de Janeiro: Salamandra; São Paulo: Editora da USP, 1981, p. 15.
  35. "O trabalho, ao contrário do labor, não está necessariamente contido no repetitivo ciclo vital da espécie. É através do trabalho que o homo faber cria coisas extraídas da natureza, convertendo o mundo num espaço de objetos partilhados pelo homem". Cf. Lafer, Celso. A política e a condição humana. In: Arendt, Hannah. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária; Rio de Janeiro: Salamandra; São Paulo: Editora da USP, 1981, p. V.
  36. "O labor é uma atividade assinalada pela necessidade e concomitante futilidade do processo biológico, do qual deriva uma vez que é algo que se consome no próprio metabolismo, individual ou coletivo." É atividade que os homens compartilham com os animais. Cf. Lafer, Celso. A política e a condição humana. In: Arendt, Hannah. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária; Rio de Janeiro: Salamandra; São Paulo: Editora da USP, 1981, p. V.
  37. É principalmente na participação política (a participação nos assuntos da comunidade) que reside a ação. Antes de ser propriamente a deliberação política, a ação é discutir, ponderar, argumentar, convencer, aprimorar a humanidade de cada um, ou seja, desenvolver aquilo que só o ser humano tem (seu elemento formal): a capacidade de conviver socialmente, na pluralidade de valores, interesses e opiniões, entre iguais.
  38. Cf. Lucas, John Randolph. Democracia e participação. Brasília: Editora da UnB, 1985, p.110.
  39. Cf. Lucas, John Randolph. Democracia e participação. Brasília: Editora da UnB, 1985, p. 112. Em sentido análogo, Max Weber considera o Parlamento federal de Frankfurt a escola política de Birmarck: "a luta no parlamento (...) não pode ser substituída por nenhuma outra preparação equivalente". Cf. Weber, Max. Economia e sociedade, vol. II. Brasília: Editora da UnB, 1999, p. 562.
  40. "Com uma expressão sintética pode-se dizer que, se hoje se pode falar de processo de democratização, ele consiste não tanto, como erroneamente muitas vezes se diz, na passagem da democracia representativa para a democracia direta quanto na passagem da democracia política em sentido estrito para a democracia social". Cf. Bobbio, Norberto. O futuro da democracia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986, p. 54. "A maior parte das suas instituições [da sociedade] - da família à escola, da empresa à gestão dos serviços públicos - não são governados democraticamente". Cf. Bobbio, Norberto. O futuro da democracia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986, p. 55. Por isto, para Bobbio, o referencial da democracia não é "quem vota", isto é, a extensão do sufrágio, mas "onde vota", isto é, não só na sociedade política, mas também na família, no trabalho etc. No mesmo sentido, embora menos incisivo que Bobbio: "O Estado deve ser democratizado, tornando o parlamento, as burocracias estatais e os partidos políticos mais abertos e responsáveis, enquanto novas formas de lutas a nível local (por meio de políticas baseadas em fábricas, o movimento feminista, os grupos ecológicos) devem assegurar que a sociedade, tanto quanto o Estado, seja democratizada, ou seja, sujeita a procedimentos que assegurem a responsabilidade". Cf. Held, David. Modelos de democracia. Belo Horizonte: Editora Paidéia, s/d, p. 232.
  41. Neste sentido Chomsky é implacável: "De modo geral, porém, as empresas são mais totalitárias do que a maioria das instituições políticas que chamamos de totalitárias". Cf. Chomsky, Noam. Segredos, mentiras e democracia (entrevista a David Barsamian). Brasília: Editora da UnB, p. 13.
  42. "Para Duguit, todo poder es político. Los ‘gobernantes’ son tanto los patronos de una empresa, los jefes de una Igresia, los dirigentes de una asociación como los gobernantes del estado. Esta concepción es compartida por muchos sociologos, que consideran la ciencia o sociologia politica como la ciencia del poder en general". Cf. Duverger, Maurice. Instittuciones politicas y derecho constitucional. Barcelona: Ariel, 1970, p. 30.
  43. Cf. Chomsky, Noam. Segredos, mentiras e democracia (entrevista a David Barsamian). Brasília: Editora da UnB, pp. 17-9. Esta assertiva é a conclusão de uma interessante análise feita por Chomsky sobre uma artigo escrito por Michael Joyce (diretor da Fundação Bradley): 1º) Joyce afirma que o sistema político se afastou do cidadão, que só pede a mínima participação do voto e depois devolve o cidadão para casa; 2º) Para Joyce, apenas votar não é a verdadeira participação; 3º) Para Joyce, participação ativa é: abandonar o político e agir por meio "das associações de pais e alunos, indo à Igreja e fazendo compras no mercado. Assim se deve comportar um cidadão autêntico de uma sociedade democrática"; 4º) Eis a conclusão de Chomsky: "não há nada de errado em participar das associações de pais de alunos, mas (...) o que acontece com a arena política? (...) se abandonarmos a arena política, alguém ocupará o nosso lugar. As empresas não voltarão para casa, nem se inscreverão nas associações de pais de alunos: elas vão decidir as coisas. Mas sobre isso impera o silêncio". Cf. Chomsky, Noam. Segredos, mentiras e democracia (entrevista a David Barsamian). Brasília: Editora da UnB, pp. 17-9.
  44. Cf. Chomsky, Noam. Segredos, mentiras e democracia (entrevista a David Barsamian). Brasília: Editora da UnB, p. 13.
  45. Capella na crítica ao conceito de soberania expõe estes problemas: "O conceito de 'soberania' acunhada nos séculos XVI e XVII como atributo das entidades estatais 'nacionais' é, até certo ponto, um conceito pertencente a um mundo intelectual pré-capitalista, pois foi elaborado a partir da experiência da 'superioridade' do poder dos monarcas absolutos sobre qualquer outro poder nos seus reinos". Cf. Capella, Juan Ramón. Os cidadãos servos. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998, p. 104. "Os Estados já não são 'soberanos supremos' das sociedades que governam. Sua soberania tornou-se porosa, vulnerável à intervenções externas a eles, sobretudo em certos âmbitos: o econômico (fortemente influído pelas instituições econômicas do sistema imperial, como o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial; pelos acordos do GATT; pela capacidade de coerção das empresas multinacionais), o político-militar e o tecnológico". Cf. Capella, Juan Ramón. Os cidadãos servos. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998, p. 105
  46. "Mill encara a função educativa da participação quase nos mesmos termos de Rousseau. Quando o indivíduo se ocupa somente de seus assuntos privados, argumenta, e não participa das questões públicas, sua 'auto-estima' é afetada, assim como permanecem sem desenvolvimento suas capacidades para uma ação pública responsável" Cf. Pateman, Carole. Participação e teoria democrática. Rio de Janeiro: Paz e Terra, pp. 44-5.
  47. "Mill argumentava que de nada servem o sufrágio universal e a participação no governo nacional, se o indivíduo não foi preparado para essa participação a um nível local; é neste nível que ele aprende a se autogovernar. 'Um ato político que apenas se repete com o intervalo de alguns anos, e para o qual não teve o preparo nos hábitos cotidianos do cidadão, deixa seu intelecto e suas disposições morais inalteradas". Cf. Pateman, Carole. Participação e teoria democrática. Rio de Janeiro: Paz e Terra, p. 46.
  48. "Assim, para Mill, é a nível local que se cumpre o verdadeiro efeito educativo da participação, onde não apenas as questões tratadas afetam diretamente o indivíduo e sua vida cotidiana, mas onde também ele tem uma boa chance de, sendo eleito, servir no corpo administrativo local. É por meio da participação a nível local que o indivíduo 'aprende a democracia'." Cf. Pateman, Carole. Participação e teoria democrática. Rio de Janeiro: Paz e Terra, p. 46.
  49. "Guerra é uma luta armada entre duas unidades políticas organizadas (...) O essencial no conceito de arma reside no fato de tratar-se de um meio de eliminação física de pessoas". Cf. Schmitt, Carl. O conceito do político. Petrópolis: Vozes, 1992, p. 58.
  50. Ou ainda como um instrumento de proteção de direitos (e não só de conquista de direitos), em ambos os casos como já previa Ihering: "formulemos estas duas proposições de maneira em harmonia com a aplicação atual: os seres humanos só estão garantidos dos males que outros lhes podem causar na proporção em que têm o poder de se protegerem a si mesmos (...) que cada um é o único guardião seguro dos próprios direitos e interesses". Cf. Mill, John Stuart. O governo representativo. São Paulo: IBRASA, 1983, p. 40
  51. "Debe entenderse que una relación social es de licha cuando la acción se orienta por el propósito de imponer la propria voluntad contra la resitencia de la outra u otras partes. Se denominan ‘pacífico’ aquellos medios de lucha en donde no hay una violencia física efetiva". Cf. Weber, Max. Economía y sociedad. México DF: Fondo de Cultura Economica, 1993, p. 31. No mesmo sentido: "o estado de paz só pode ser definido se definido preliminarmente o estado de guerra. Pode-se dizer que existe um estado de guerra quando dois ou mais grupos políticos encontram-se entre si em relação de conflito cuja solução é confiada ao uso da força". Cf. Bobbio, Norberto. Teoria geral da política. Rio de Janeiro: Campus, 2000, p. 513.
  52. Cf. Ihering, Rudolf von. A luta pelo direito. Rio de Janeiro: Forense, 1992, p. 1.
  53. O liberalismo também. Como bem lembra Ortega y Gasset: "O liberalismo – convém hoje recordar isto – é a suprema generosidade: é o direito que a maioria outorga à minoria e é, portanto, o mais nobre grito que soou no planeta. Proclama a decisão de conviver com o inimigo; mais ainda, com o inimigo débil". Cf. Ortega y Gasset. A rebelião das massas. Rio de Janeiro: Livro Ibero-americano, 1959, p. 120. Não se deve interpretar, no entanto, a assertiva de Ortega y Gasset como uma concessão dos fortes aos fracos, Ihering não nos deixa de lembrar que invariavelmente os direitos e as liberdades são o resultado da conquista.
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Sobre o autor
Nelson Juliano Cardoso Matos

Doutor em Direito pela Faculdade de Direito do recife (UFPE), Mestre em Direito pela Universidade de Brasília (UnB) e Professor Adjunto do Departamento de Ciências Jurídicas da UFPI

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MATOS, Nelson Juliano Cardoso. Democracia possível e democracia desejável.: Uma explicação para a democracia como campo de luta. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2635, 18 set. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17418. Acesso em: 26 abr. 2024.

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