Os principais riscos e perigos do Bug podem se resumir na impossibilidade do conhecimento dos seus reais efeitos, na incerteza de que nada irá acontecer, ainda que todos os esforços tenham sido empreendidos, e na discussão jurídica decorrente da responsabilidade do pagamento dos custos de adaptação e de eventuais prejuízos emergentes.
Aspecto importante e preocupante é a probabilidade da ocorrência do chamado efeito dominó, cascata ou onda, que se resume no colapso seqüencial de sistemas dependentes um dos outros. Nessa hipótese, as conseqüências serão extremamente graves. Deve-se ressaltar, ainda, que a adaptação isolada poderá ser ineficaz, vez que todos dependemos de fatores externos. Esse raciocínio aplica-se também ao comércio internacional globalizado, que poderá sofrer interrupções, dada a interação de economias distintas, inclusive quanto ao nível de adaptação relacionado ao Bug .
Na ciência econômica, alguns especialistas entendem que a taxa de desemprego poderá sofrer uma elevação brusca, tudo por causa dos prejuízos que eventualmente possam se concretizar (nos Estados Unidos, 2,2 milhões de empregos estão ameaçados - na Austrália, estima-se que 10% de falha nos pequenos e médios negócios (44% não pretendem fazer nada) poderá gerar a perda de 200.000 a 350.000 empregos).
Nota-se, também, que os investimentos estrangeiros em fundos de curto prazo vêm apresentando certa preocupação, especialmente pela proximidade da virada do ano. O receio daquilo que é incerto, mas possível, também poderá causar uma crise de liquidez global e um aumento no preço dos commodities e dos metais em virtude do incremento da demanda preventiva. Sempre é bom lembrar que ações de empresas que apresentarem problemas e prejuízos certamente terão os seus valores reduzidos.
INDENIZAÇÕES NO BRASIL PODEM ATINGIR R$ 20 BI
Os custos totais envolvendo o Bug , incluindo as indenizações judiciais, estão avaliados entre U$ 1 trilhão a U$ 2 trilhões. As seguradoras deverão desembolsar, nos Estados Unidos, somas entre U$ 15 bilhões a U$ 35 bilhões (conclusão da consultoria Milliman & Robertson Inc.). O Brasil deverá movimentar de R$ 15 bilhões a R$ 20 bilhões em indenizações por todo o tipo de prejuízo causado aos consumidores, usuários, fornecedores, distribuidores, credores, mutuários, investidores, acionistas, comunidades e terceiros pelo Bug do ano 2000. Incluem-se danos operacionais, financeiros, corporativos, patrimoniais, físicos e morais.
Ressalta-se que, segundo o Gartner Group, mesmo tomando todas as providências necessárias contra o Bug do milênio, o que não é fácil, dada a extensão e complexidade dos trabalhos que já foi comparado a troca de todas as lâmpadas do mundo, as corporações precisam se preparar para enfrentar eventuais falhas graves, que podem causar sérios danos aos negócios. Isso porque teste algum pode garantir a completa aderência ao Ano 2000. Em alguns casos é impossível localizar o que deve ser corrigido. Em outros, sistemas adequados podem conter novos Bugs.
Como o problema do Bug envolve quantias consideráveis (para cada dólar não gasto em adaptação haverá o desembolso de cinco vezes ou mais em indenizações judiciais), com iminentes reflexos econômicos, e considerando que muitos prejuízos serão inevitáveis, a questão jurídica emerge como a área fundamental à sobrevivência de qualquer pessoa. É importante frisar que todos serão afetados, sem distinção, até mesmo aqueles que não possuem relacionamento direto com a informática.
As Leis brasileiras não exigem normas específicas para a matéria, assegurando a efetiva aplicação da responsabilidade civil e penal, destacando-se a proteção exemplar disposta no Código de Proteção e Defesa do Consumidor, inclusive para empresas. Esse entendimento é amparado pelo Ministério da Justiça, conforme a Portaria n.º 212/1999 e pelo Ministério do Orçamento e Gestão (SEAP), nos termos da Portaria n.º 601/1999, sujeitando-se o infrator às medidas estabelecidas no Decreto n.º 2181/1997, inclusive às sanções pela inobservância das normas de consumo, tais como: multa, suspensão temporária da atividade, revogação da concessão ou permissão de uso e intervenção administrativa. Acrescente-se que, quanto aos prejuízos causados ao Estado, os órgãos públicos estão habilitados a tomar as medidas jurídicas necessárias ao ressarcimento.
O ordenamento jurídico brasileiro permite, na grande maioria dos casos, a possibilidade de atribuir ao fornecedor a responsabilidade pela adaptação, exigindo-se, por medida liminar, a adequação imediata de sistemas incompatíveis, sem ônus ao requerente. Da mesma forma, é possível recuperar investimentos necessários à adaptação de sistemas já convertidos. Eventuais prejuízos morais ou materiais serão suportados por aquele que os causou, permitido o direito de regresso, na hipótese do efeito dominó. Atenção especial merece o aspecto preventivo, especialmente a análise legal de riscos, as implicações contratuais, a informação jurídica adequada, a documentação, os contratos de seguro e o recall.
Como se percebe, o campo jurídico tem fundamental importância no problema do Bug , especialmente quanto a questão das responsabilidades. Os Estados Unidos já contam com mais de 70 processos ajuizados. Aproximadamente 800 ações aguardam a distribuição, todas envolvendo a responsabilidade oriunda da falha, alguns processos atribuindo responsabilidade pessoal de administradores, fato que também poderá ocorrer no Brasil.
As repercussões legais dos efeitos do Bug poderão ultrapassar as preocupações técnicas. A imprevisibilidade dos efeitos obriga o acompanhamento e a integração do setor jurídico com a área econômica. As indenizações dependem diretamente dos custos de adaptação e dos prejuízos. Podem, ao que tudo indica, induzir ao processo de insolvência. Os aspectos jurídicos do Bug , na grande maioria dos casos, determinarão o futuro das corporações, razão pela qual impõe-se, desde já, a preocupação básica da sociedade.