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Prescrição intercorrente no processo do trabalho

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9 PRAZOS PARA RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE

Antes de tudo convém esclarecer quando a prescrição pode ser argüida, e ainda, se precisa ser argüida.

Para efeito de explicitação de entendimento, é importante deixar claro desde logo que o termo inicial dos prazos de prescrição remonta à violação do direito, ou seja, o momento de surgimento da pretensão. E considerando-se que a prescrição somente pode ser interrompida uma vez, na forma do art. 202/NCC, o manejo de atos volitivos tendentes à sua efetivação precisa ser bem ponderado, sob pena de eventual interrupção irrefletida conduzir ao fracasso da pretensão. Assim, um protesto ou uma demanda arquivada podem ser fatais, porquanto mesmo em demanda extinta sem resolução de mérito os efeitos da interrupção da prescrição se expandem.

Vale ressaltar que o preceito em análise é de aplicação integral no direito do trabalho, estendendo seus efeitos para o processo do trabalho, sendo certo que a regra ali contida (possibilidade única de interrupção da prescrição) seja, talvez, a que mais espaço abriu para a plena efetivação da prescrição intercorrente.

A prescrição intercorrente, contudo, é um instituto cuja atuação do tempo lhe é essencial. No dizer de José Manoel Arruda Alvim (ALVIM, 2.006, p. 26), rigorosamente, por cada ato do processo, interrompe-se a prescrição, novamente, sempre com a inutilização do período já decorrido. E só a partir da inércia, quando ao autor couber a prática de ato, e este não vier a ser praticado, durante o prazo superior ao da prescrição é que ocorrerá a prescrição intercorrente.

A grande indagação é saber como e quando, havendo a interrupção, esta recomeça a correr, sendo que de acordo com o entendimento esposado por Ilse Lora (LORA, 2.001, p. 163), “conta-se o prazo do último ato processual praticado no feito, com intimação das partes”.

Exercendo-se a pretensão em juízo, interrompe-se a fluência do prazo de material, bastando a mera distribuição do feito no processo do trabalho, ou a determinação de citação no processo comum, inteligência do inciso I, do art. 202/NCC e § 4º, do art. 219/CPC. A partir do momento em que se interrompeu o prazo prescricional, outro (integral) começa a fluir, que é exatamente o prazo da prescrição intercorrente.

Não sendo a matéria tratada na Teoria Geral do Direito, como deveria, quer parecer que a regra contida no Direito Civil, e, portanto, destinada a toda a sociedade, busca esclarecer a questão, ao estabelecer no artigo 193/NCC, que a prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, pela parte a quem aproveita.

A norma apontada é claríssima, mas acomoda-se apenas parcialmente no Direito Processual do Trabalho. Vejamos:

Considerando-se que a CLT não aborda, especificamente, o momento próprio para a argüição, por força do art. 8º da CLT, a regra civil pode ser invocada para acobertar a matéria. Todavia, o TST tem Súmula regulamentando a questão, conforme verbete 153, pelo qual “não se conhece de prescrição não argüida na instância ordinária”.

A questão resolve-se através da interpretação do aludido artigo 8º da CLT, pelo qual: as autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e por outros princípios e normas gerais de direito, principalmente de direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o direito público. 

 Levando-se em conta que a jurisprudência é fonte de direito, que a matéria é sumulada pelo TST, esta a posição científica que deve prevalecer, exceto se o magistrado, com sua liberdade na apreciação da prova e do direito, inteligência do disposto no art. 131 do CPC, fundamentadamente, indicar que não irá aplicar o verbete em questão, esclarecendo o motivo pelo qual entende imprópria sua atuação.

Não o fazendo, temos assim, que em matéria trabalhista, em princípio, a prescrição somente poderia ser argüida perante a instância originária.

Atualmente, temos de considerar, contudo, novo aspecto, ou seja, que pela regra constante do § 5º, do art. 219 do CPC, com a redação que lhe foi dada pela Lei 11.280/06, o Juiz poderá conhecer a prescrição ex officio. E, sendo assim, os magistrados das instâncias extraordinárias também poderão conhecer a prescrição, independente de provocação das partes.

Tal situação traz, então, uma exceção à regra disposta no verbete apontado. Quando a prescrição for alegada pela parte a que aproveita, deverá estar jungida à instância originária, e quando o instituto ensejar o conhecimento de ofício poderá extrapolar tal limite, indo até a instância extraordinária.

No tocante à prescrição intercorrente, a questão comporta distinta consideração. Isso porque, enquanto a prescrição de direito material somente pode ser oponível entre nós na instância originária, a prescrição intercorrente não sofre tal restrição, até porque, incompatível com o próprio instituto.

A prescrição intercorrente, como fenômeno processual que é, poderá ocorrer inclusive nas instâncias extraordinárias, em quaisquer de suas modalidades, isto é, alegada pela parte ou conhecida de ofício pelo Juiz.

Em sede doutrinária está assentado que o prazo prescricional intercorrente começa a fluir a partir do momento em que o titular da pretensão deixa de movimentar o processo, quando lhe cabia isso. E a partir desse termo inicial intercorrente o prazo prescricional, que se consuma com o advento do terminus ad quem previsto no direito material sem que, antes dele, tenha a parte suprido a falta (ALVES, 2.006, p. 661).

Segundo as regras postas no direito positivo, o prazo prescricional não pode ser alterado por convenção entre as partes, nos moldes do art. 192 do Novo CC, ou seja, através de um negócio jurídico, para aumentar ou diminuir o interregno legalmente estabelecido. Também pende para a nulidade, eventual ajuste que vise pré-excluir causa de suspensão ou interrupção de prescrição.

No direito material, o prazo da prescrição começa a correr a partir do momento em que o direito se torna disponível, enquanto no âmbito processual e mais especificamente da prescrição intercorrente, começa a correr do último ato tendente a impulsionar o feito que foi praticado pelo demandante em atendimento a um comando judicial ou por sua vontade, ante a falta de indicação mais precisa. Entretanto, quando pretender declarar de ofício a prescrição intercorrente, é de bom alvitre e democraticamente correto que o Juiz intime a parte para dar efetivo andamento, sob pena de ver o processo julgado extinto, com resolução de mérito, bem como dar ciência também à outra parte, porquanto pode ensejar algum ato ou fato capaz de justificar a não aplicação do instituto.

Oportuno lembrar que a prescrição intercorrente pode ocorrer tanto na fase de conhecimento, quanto na fase de execução.

Na fase executiva, a prescrição intercorrente pode atingir toda a pretensão declarada, como também apenas parte dela. Com efeito, o julgado pode contemplar prestações contínuas, como um complemente de aposentadoria, uma indenização enquanto perdurar determinada condição e assim por diante. Idem em relação aos direito de perceber frutos, dividendos e outras prestações sucessivas decorrentes de trabalho ou ato ilícito.

Um último alerta é que durante o período de suspensão do processo, seja a fase de conhecimento ou execução, a prática de atos processuais não é tolerada, salvo os urgentes a fim de evitar danos irreparáveis. Logo, não se pode admitir que o Juiz pronuncie a prescrição enquanto estiver suspenso o processo (RABELLO, 2.005, p. 116).


10 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A prescrição implica o encobrimento de uma pretensão em face da inércia de seu titular durante um tempo determinado.

A análise dos estudos aqui realizados revela que o Direito Processual do Trabalho passa a acompanhar os demais ramos do direito processual, reconhecendo e aplicando a prescrição intercorrente. Este instituto, aliás, exclusivo do direito processual, deveria integrar a própria Teoria Geral do Processo, na medida em que se irradia em todos os seguimentos processuais e significa autêntica garantia procedimental.

O reconhecimento e a aplicação do instituto em exame, de forma alguma atenta contra os princípios que informam o Direito Processual do Trabalho, pois a doutrina sempre agasalhou o fenômeno do passar do tempo, assim como a legislação processual do trabalho.

Outra conclusão a que se chega, é que o direito fundamental à ação, a ser exercido não só com as garantias constitucionais processuais, mas também em tempo razoável, constitui verdadeira quinta geração de direitos humanos, situação que deixa a prescrição intercorrente como matéria de ordem pública e objetivo do Estado, devendo ser aplicada em todos os seguimentos do Poder Judiciário.

O Direito do Trabalho sempre foi irrenunciável, entretanto jamais foi imprescritível.

Nesse sentido, importante considerar o relevante papel da jurisprudência, entretanto, se de um lado é certo que os tribunais têm plena autonomia para formar suas Súmulas, não menos certo é que cabe ao Supremo Tribunal Federal dar a última palavra em termos objetivos de interpretação do direito, não havendo razão lógica e proveitosa dentro do sistema que acomode verbete expressamente contrário à sua Súmula.

Nesse sentido, grife-se que o STF é, por excelência, o guardião da Constituição Federal, ápice de seu ordenamento jurídico e pilar principal do Estado Democrático de Direito brasileiro, e hodiernamente suas decisões consolidadas são ainda mais prestigiadas, podendo atingir, inclusive, efeito vinculante (conforme inovações da Emenda Constitucional nº 45, de 08 de dezembro de 2004, que trouxe o artigo 103-A à Constituição Federal).

A jurisprudência até aqui resistente, passa a aceitar que ao lado do impulso oficial, fatos alheios à vontade dos julgadores, por vezes, ensejam na paralisação do processo e devem ensejar sua extinção, como garantia pessoal do demandado e maneira de não desprestigiar a própria Justiça. Melhor que os Juízes estejam mesmo ocupados com os processos cujos resultados são desejados, do que comprometer a eficiência estrutural com o dispêndio de energia em feitos desprezados pelos demandantes, pois a duração do processo passou a ser um dos principais objetivos do Estado.

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Também a nova competência da Justiça Especializada agrega novos valores culturais, no sentido de que institutos jurídicos acomodados noutros sistemas passam a exercer influência entre nós. A percepção mais nítida somente foi possível quando a Justiça do Trabalho passou a julgar execuções fiscais, onde quem está menos estruturado no processe e, assim, merecedor de tutela diferenciada passou a figurar também no pólo passivo da demanda, minando a clássica resistência em se considerar o instituto em estudo. Isso porque, nas execuções fiscais, o empregador, teoricamente o mais capacitado, quando executado pela União Federal nos mesmos autos da demanda, merece atuação dos princípios informadores do Direito Processual do Trabalho, independente de ser em proveito do empregado ou do empregador, porquanto ambos são destinatários de seus efeitos.

O perigo que isto pode representar, contudo, é a aplicação indistinta do instituto, após ruir na doutrina a impossibilidade de reconhecimento da prescrição intercorrente, e a esperada supressão ou alteração do verbete 114, da Súmula do Colendo TST (situação até desejada para a coerente atuação do direito), dado à sua condição anacrônica. Súmula contrária a súmula é fator de instabilidade democrática, de multiplicação de recursos e processos, além de gerar jurisprudência ilegítima, porquanto constitucionalmente inadequada, na medida em que não respeita os princípios e a integridade do sistema.

Sempre que a parte de menor sustentabilidade na situação processual puder ser beneficiada com a declaração da prescrição intercorrente, inexiste qualquer reserva para isso. E mesmo nos casos que o trabalhador, em demanda típica, estiver sujeito ao fim do exercício de sua pretensão ou título executivo, pela prescrição, ainda assim, se intimado a pronunciamento deixar escapar tal oportunidade, após o lapso temporal assinalado, deve ver extinto o processo onde deixou de manejar seu interesse, nas hipóteses cujo impulso oficial não possa suprir.

Não é justo que o credor sujeite o devedor eternamente ao seu jugo, impedindo que o tempo que a tudo consome exerça sua força numa situação jurídica processual.

O processo é essencialmente um instrumento de lealdade e sua perpetuação não beneficia as partes e contribui para o descrédito da Justiça, portanto, inclinamo-nos no sentido de que a prescrição intercorrente tem por escopo a paz social e plena aplicação na Justiça do Trabalho.


Prescription Intercurrent in the Work Process

ABSTRACT

The declaration of prescription intervening in the labor process is strongly resisted by respectable current doctrinal and jurisprudential. The innovations brought by the laws in force the Civil Code and Code of Civil Procedure have caused profound changes at the institute of the prescription and, therefore, the law operators must investigate such changes because of the possibility of loss of the right, before the procedural inertia. It is known that injury occurred to a law, the injured could rise up against it by the relevant action. If not do at any given time, will lose the right to sue the infringer, occurring prescription benefit security of legal relations. The institute of the prescription, therefore, has the character of public policy, for the sake of social peace. It is a prescription extinguished. However, the implementation is under way in court asks whether there may still be prescribed at this point and especially the scholars differ. Also important to note the conflict between the established precedents of higher courts around the prescription intervening in the labor process. The matter is controversial and try to elucidate it is the objective of this work, without pretension, however exhausting it, even if it fosters the continuing debate, the only way to reach consensus on any area of the humanities.

Keywords: Prescription; Inertia; Intercurrent; Conflict.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano. Vol. I. 5. ed. Forense. Rio de Janeiro. 1983.

ALVIM, José Manoel Arruda. Da prescrição intercorrente, in Prescrição no Código Civil: uma análise interdisciplinar. Coordenadora Mirna Ciani. 2. ed. Saraiva. São Paulo. 2006.

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. LTr. São Paulo. 2.005.

GIGLIO, Wagner. Direito Processual do Trabalho. 16. ed. Saraiva. São Paulo. 2.007.

LORA, Ilse Marcelina Bernardi. A prescrição no direito do trabalho. LTr. São Paulo. 2.001.

MACIEL JÚNIOR, Vicente de Paula. Nulidades dos atos processuais. In: Compêndio de direito processual do trabalho. Coordenado por Alice Monteiro de Barros. LTr. São Paulo.1.998.

PINTO, José Augusto Rodrigues. Execução trabalhista. 11. ed. LTr. São Paulo. 2.006.

PRUNES, José Luiz Ferreira. Tratado sobre a prescrição e a decadência no Direito do Trabalho. LTr. São Paulo. 1.998.

RABELLO, Bruno Resende. Prescrição intercorrente: uma releitura. Dissertação de Mestrado. UFMG. Inédita. Belo Horizonte. 2.005.

RUSSOMANO, Mozart Victor. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. V.I. 13. ed. Rio de Janeiro. Forense. 1.990.

SERAFIM JUNIOR, Arnor. A prescrição na execução trabalhista. LTr. São Paulo. 2.006.


Notas

[1] Parte minoritária da doutrina entende que o inciso XXIX, do art. 7º/CF, revogou o art. 11/CLT, acabando com a chamada prescrição parcial. Assim, consoante a norma constitucional, teria o demandante sempre o direito de rever os últimos cinco anos do contrato de trabalho, não importando o interregno entre o distrato e a data do ajuizamento da reclamação, desde que, naturalmente, seja respeitado o prazo de dois anos após a extinção do pacto (MACIEL JÚNIOR, 1.996, p. 520).

[2] Bruno Rabello distingue, com acerto, tais fatos jurídicos, afirmando que “É importante deixar claro que não se pode considerar como intercorrente a prescrição da pretensão executiva, pois esta não se configura durante o curso de nenhum processo...”; e mais: “... outra prova incontestável de que se trata de nova pretensão pode-se extrair do art. 741/CPC que, ao enumerar as matérias que podem ser alegadas em sede de embargos à execução de título judicial, contempla a prescrição, desde que superveniente à sentença. Prescrição superveniente à sentença, passível de ser alegada em embargos, só pode ser prescrição da pretensão executiva, nunca a prescrição da pretensão que deu origem ao processo de conhecimento em que o título executivo se formou” (RABELLO, 2.055, p. 17).

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Sobre a autora
Andréia Araújo Ferreira Pacheco da Costa

Advogada atuante nas áreas de direito do trabalho e direito civil, desde 1997. Pós-graduada em Direito Processual pelo Centro Universitário do Planalto de Araxá.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COSTA, Andréia Araújo Ferreira Pacheco. Prescrição intercorrente no processo do trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3758, 15 out. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25517. Acesso em: 25 abr. 2024.

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