Artigo Destaque dos editores

Os institutos do direito informático

Exibindo página 2 de 3
01/07/2002 às 00:00
Leia nesta página:

VII- Relação do Direito Informático com outros ramos do Direito

A relativa autonomia anteriormente assinalada não impede que o Direito informático, por vezes, se apresente no quadro geral do Direito em posição de subordinação; em outras, em posição de coordenação com as demais disciplinas jurídicas. Vejamos:

a) Com o Direito Constitucional

No que se refere ao Direito Constitucional a relação é manifesta, mesmo sem nos fixarmos exclusivamente no direito positivo de cada país, inspirado, como necessariamente há de ser, nos princípios constitucionais vigentes.

O direito informático tem uma estreita relação com o Direito Constitucional porquanto a forma e manejamento da estrutura e órgãos fundamentais do Estado, é matéria constitucional. Deve ser ressaltado que dito manejamento e forma de controlar a estrutura e organização dos órgãos do Estado, se leva cabo por meio da informática, colocando o Direito Informático na berlinda, já que com o devido uso que é dado a estes instrumentos informáticos, se levará a uma idônea, eficaz e eficiente organização e controle destes entes. De outro ponto de vista, a Constituição Federal de 1988 tem dado chancela a liberdade informática, quando estabelece em seu artigo 5º caput:

"Todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, a igualdade, à segurança e à propriedade, nos seguintes termos:

"XII- é inviolável o sigilo da correspondência........"

A liberdade de comunicação via internet é uma das expressões fundamentais da liberdade de pensamento e, sua reserva constitui-se numa das mais antigas modalidades de proteção à privacidade.

O que fere a liberdade de omitir pensamento é, pois, entrar na comunicação alheia, fazendo com que o que devia ficar entre sujeitos que se comunicam privativamente passe ilegitimamente ao domínio de terceiro. Portanto, qualquer norma ordinária, que disponha sobre faculdade, atribuída de forma genérica às pessoas jurídicas ou físicas, de violar o conteúdo das mensagens eletrônicas de terceiros será considerada inconstitucional.

Assim ao se corresponder, por meio do correio eletrônico, o usuário do serviço compartilha, com o receptor, informações de cunho pessoal, as quais não podem ser violadas, sob pena de se incorrer em mácula ao direito de privacidade. A Lei Máxima tutela expressamente a intimidade e a vida privada, de cada indivíduo.

Estes pontos serão tratados posteriormente em outros estudos, por hora, só se deseja ressaltar a importância do Direito informático, quando se é dado a categoria constitucional a liberdade informática, que constituem figuras e instituições jurídicas específicas do Direito informático, o qual sustenta algo mais a teoria expressada nesta investigação acerca do direito informático como ramo autonômo do direito.

b) Com o Direito Penal

Neste área podemos notar estreita relação entre o direito informático e o direito penal, porque o direito penal regula as sanções para determinadas ações que constituam violação de normas de direito e neste caso do Direito Informático, em matéria de delito cibernético ou informático, então se poderia começar a falar do Direito Penal Informático.

Igualmente com o direito penal guarda o Direito Informático estreitas relações tanto que, alguns autores alemães, afirmam a existência de um Direito Penal Informático. A verdade é que tão importantes são as relações entre os dois ramos da ciência jurídica que, em razão da informática, novas figuras delituosas surgiram deixando desatualizado e inerte os tipos penais mencionados nos Códigos penais.

Em face das lacunas oriundas da modernidade, a reprimenda aos novos crimes virtuais que afloram em nosso meio deverá acatar o princípio da reserva legal, conquanto verificada no artigo 1º do Código Penal Brasileiro e consagrado pelo artigo 5º, XXXIX da Constituição Federal de 1988: "Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal".

Enquanto isso, o Direito Penal, tutelador dos bens jurídicos mais relevantes, quais sejam, vida e liberdade, deve ser regido pelas normas penais vigentes. A sociedade não pode submeter-se a falta de interpretação destas ou ficar a mercê do Direito Costumeiro e da analogia para definir a sua aplicação.

Nesta linha, emerge o Projeto de Lei nº 1589/99 da Ordem dos Advogados do Brasil/SP, que apesar de enfatizar muito mais a proteção da intimidade do usuário do que especificamente o combate ao crime, tem por escopo também disciplinar alguns dos ‘novos tipos penais’ oriundos da era digital.

Através dos mecanismos legais existentes e dos que estão por vir, deve brotar a resistência às condutas criminosas, anulando, assim, o desdém com que parte da sociedade prefere tratar as inovações ‘eletrônicas’ presentes cada vez mais em nosso meio.

c) Com os Direito Humanos

Os direitos humanos indispensáveis para defender os direitos fundamentais do homem, tais como a vida, a igualdade, o respeito moral, vida privada e intimidade que levam o homem a ser digno e por conseguinte a ter dignidade, como o que permite catalogar as pessoas como íntegras, convivendo em ambiente de respeito, de liberdade e fazendo possível sociedades verdadeiramente civilizadas.

Que relação pode ter o Direito informático com os Direitos humanos ? pois bem, é tão grande essa ligação que seria motivo de inúmeros livros e monografias; sem embargo, muito simples brevemente se pode mencionar a possibilidade de que exista através do direito informático esta regulamentação jurídica que apoie o bom funcionamento do órgãos jurisdicionais, só para dar um simples exemplo; é de imaginar, a eficácia e eficiência com que se manejam nossas leis que colaborariam em um alto grau a celeridade processual, ponto indispensável para defender os direitos humanos das pessoas que se encontram nos cárceres nacionais, declaradas estas a nível internacional, como centros violadores de direitos humanos. Então, ao existir celeridade, haverá possibilidade de evitar a superpopulação dos cárceres, fator que tem influído na constante violação desses direitos; por produzir esta superpopulação, escassez de alimento para os reclusos, assim como a carência de meios sanitários e de higiene mínima necessários.

Também, se pode mencionar outras relações tratadas em matéria de direitos humanos como a de privacidade e intimidade, que poderiam ser burladas através da utilização ilícita dos meios informáticos.

d) Com a Propriedade Intelectual

Nesse ponto é fundamental a tomada de medidas, especialmente no Brasil. Onde há necessidade, com urgência, de um melhor controle desta matéria, para penalizar os plágios, a pirataria bem como qualquer delito contra os direitos do autor ou industriais produzidos contra e por meio de instrumentos informáticos.

Tal como ocorre com o direito autoral em geral, a tutela jurídica das bases de dados deriva do acúmulo de disposições normativas, regionais e nacionais.

No plano internacional podemos verificar o Convênio de Berna para a Proteção das Obras literárias e artísiticas de 1971 – como é de esperar a partir da época de sua promulgação – não se refere a base da dados. Não obstante a linguagem ampliou alguns de seus preceitos (concretamente os artigos 2.1 e 2.5) permitem estendê-las como coleções, suscetíveis de receber proteção equiparável a das obras literárias e artísticas em geral. Assim se expressou o Comitê de Expertos da OMPI durante sessão realizada em 1994.

Nesse mesmo ano a OMPI emitiu o denominado "Acordo sobre os ADPIC" (Acordo sobre os Aspectos dos Direito de Propriedade Intelectual relacionados ao comércio) cujo o número 10.2 – trasncrito literalmente- que passou atualmente artigo 5 do "Tratado da OMPI sobre direito do autor", adotado pela Coferência Diplomática sobre certas questões de direito do autor e direitos conexos, realizada em Genebra em 20 de dezembro de 1996 e que, neste sentido, constitue o preceito internacional de maior interesse na matéria. Estabelece dita norma:

"Artigo 5.- Copilações dados (bases de dados). As copilações de datos e outros materiais, em qualquer forma, que por razões de seleção ou disposição de seus conteúdos constituem criações de caráter intelectual, estão protegidas como tais. Essa proteção não compreende os dados materiais em si mesmo e se estende sem prejuízos a qualquer direito do autor que subsista a respeito dos dados ou materiais contidos na copilação".

As bases de dados são idubitavelemente credoras de proteção jurídica outorgada as obras tecnológicas em geral, tutela que é distinta e independente do que a que se confere as aplicações empregadas para criá-las e administrá-las.

e) Com o Direito Civil

Iremos encontrar inúmeros pontos de convergência, no campo da doutrina, principalmente, naquilo que diz respeito às obrigações. Revela notar que o Direito Informático não só aproveita princípios de Direito Civil, mas também influi sobre o próprio Direito Civil. Trata-se de uma disciplina nova que vai buscar noutra certos princípios e, depois de aproveitá-los, os desenvolve e modifica. Essas modificações não só estruturam o novo direito como, também, aperfeiçoam o direito-fonte, que se amolda outras exigências.

O contrato, por exemplo, pode ser definido como a espécie de negócio jurídico, de natureza bilateral ou plurilateral, dependente, para sua formação, do encontro da vontade das partes, que cria para ambas uma norma jurídica individual reguladora de interesses privados.

Esta definição é perfeitamente aplicável aos contratos eletrônicos, posto que do seu conteúdo se depreende inexistir qualquer elemento incompatível com os mesmos. A natureza bilateral do negócio jurídico é perfeitamente identificável nos contratos eletrônicos, bem como a sua formação pressupõe o encontro da vontade emanada das partes contratantes, tal qual nos contratos em geral. Assim sendo, são eles perfeitamente aptos a produzirem os efeitos jurídicos inerentes aos contratos, fazendo lei entre as partes.

Estão presentes também nos contratos eletrônicos os elementos estrutural, que pressupõe a convergência de duas ou mais vontades; e funcional, pela composição dos interesses contraposto de ambas as partes, com o fim de constituir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial.

Assim verificamos um pequeno exemplo da correlação entre esse dois ramos da ciência jurídica.

f) Com o Direito Comercial

A economia está mudando. As transações de bens materiais continuam importantes, mas as transações de bens intangíveis, em um meio desta mesma natureza, são os elementos centrais de uma nova onda da dinamicidade comercial, a do comércio eletrônico. Uma nova legislação deverá abraçar um novo entendimento: de que as mudanças fundamentais resultantes de um novo tipo de transação, requererão novas regras comerciais compatíveis com o comércio de bens via computadores e similares. Nem a natureza do objeto, muito menos da transação, em computadores, são similares a compra e a venda de bens efetuados atualmente. As leis relacionadas à compra de imóveis, automóveis, torradeiras, etc., não são aplicáveis e apropriadas a contratos envolvendo a troca de banco de dados, sistemas de inteligência artificial, software, multimídia, e comércio de informações pela Internet.

As transações eletrônicas, atualmente, são governadas por uma complexa e inconsistente mistura de diferentes aspectos, envolvendo jurisprudências, a aplicação da analogia (quando cabível) e várias instruções normativas, muitas destas relacionadas a assuntos diversos do comércio eletrônico que determinam flagrantemente a influência do Direito Comercial com o Direito Informático.

g) Com o Direito Adminisitrativo

Note-se a intervenção do Estado através de seus órgãos administrativos, nas fiscalização e controle da execução das relações envolvendo procedimentos informáticos.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

No Brasil podemos observar a criação de Certificados Eletrônicos da Secretaria da Receita Federal e do credenciamento de Autoridades Certificadoras para sua emissão, através da Instrução Normativa SRF no. 156 de 22.12.1999.

Esta instrução normativa institui Cartórios Cibernéticos para conferir validade jurídica - através da emissão de Certificados Eletrônicos - às declarações anuais de imposto de renda enviadas pela rede mundial de computadores – internet.

Referida Instrução Normativa expedida pelo titular da Secretaria da Receita Federal tem gerado uma série de debates acerca da verificação do atendimento aos requisitos legais de validade da norma, bem como a apreciação das imbricações da norma com outras disposições administrativas ou diplomas legais de superior hierarquia, haja vista que a matéria regulada pela instrução normativa, além de ter residência no Direito Administrativo, espraia-se pela seara do Direito Informático e do Direito Notarial, dentre outras.

Assim a Informática Jurídica ainda dá seus primeiros passos no direito positivo brasileiro, estabelecendo vínculo forte entre o Direito Informático e o Administrativo

h) Com o Direito do Trabalho

O Direito do Trabalho, como todas as ciências, vem sofrendo, ao longo dos anos deste século, uma inacreditável mutação, mercê das máquinas cibernéticas, criadas em curto espaço de tempo, mas que ensejaram, sem sombra de dúvida, uma revolução instantânea, que marcará este século, como o da civilização cibernética, não no sentido de submissão a ela, mas de dominação sobre ela.

É nítida a correlação entre o direito informático e o direito do trabalho nos seus mais variados aspectos que vão desde a automação das empresas até o poder hierárquico exercido pelo empregador, horário de trabalho e nas relações entre os próprios funcionários.


VII- Princípios norteadores

Princípios são aquelas linhas diretrizes ou postulados que inspiram o sentido das normas e configuram a regulamentação das relações virtuais, conforme critérios distintos dos que podem ser encontrados em outros ramos do direito.

Segundo Américo Plá Rodrigues princípios "são linhas diretrizes que informam algumas normas e inspiram direta ou indiretamente uma série de soluções pelo que, podem servir para promover e embasar a aprovação de novas normas, orientar a interpretação das existentes e resolver os casos não previstos"(2).

Transpondo a noção de princípios gerais do direito, válidos em todo o direito, para os princípios do Direito Informático aplicáveis somente na área deste direito, podemos dizer que são as idéias fundamentais e informadoras da organização jurídica virtual. São eles os seguintes:

a) Princípio da existência concreta - revela a importância, não só das manifestações tácitas durante a vigência do pacto, mas também o predomínio das relações concretas travadas pelas partes sobre as formas, ou da própria realidade sobre a documentação escrita ou virtual. O que deve ser levado em consideração nas relações virtuais é aquilo que verdadeiramente ocorre e não aquilo que é estipulado em, por exemplo contratos virtuais. Significa referido princípio que em caso de discordância entre o que ocorre na prática e o que surge de documentos e acordos se deve dar preferência ao que sucede nos terreno dos fatos. O desajuste entre os fatos e a forma pode evidenciar a simulação de uma situação jurídica distinta da realidade viciada por um erro na transmissão de dados e informações.

b) Princípio da racionalidade – consiste na afirmação essencial de que o ser humano procede e deve proceder nas suas relações virtuais conforme a razão. Os revolucionários burgueses creditavam na força da razão. Por isso que a lei não passava, para eles, de norma descoberta pela atividade racional, razão pela qual não poderia ela atentar contra a justiça e a liberdade. Os revolucionários, neste caso, não faziam mais do que conciliar as lições pronunciadas pelos arautos do racionalismo iluminista: entre tantos, Montesquieu e Rousseau.

Suas características essenciais são sua flexibilidade, já que é um critério generalizado, de natureza puramente formal, sem um conteúdo concreto e de forma nitidamente subjetiva.

A pertinência de um princípio dessa natureza parece resultar mais naquelas áreas onde a índole das praxes normativas deixam amplo campo para a decisão individual. Mas essa amplitude da margem de atuação derivada da impossibilidade mesma das previsões que não podem confundir-se com a discricionariedade, nem com a liceidade de qualquer comportamento, por arbitrário que seja.

Trata-se como se vê, de uma espécie de limite ou freio formal e elástico ao mesmo tempo, aplicável naquelas áreas do comportamento onde a norma não pode prescrever limites muito rígidos, nem em um sentido, nem em outro, e sobretudo onde a norma não pode prever a infinidade de circunstâncias possíveis.

Em conclusão: na aplicação do Direito, não há uniformidade lógica do raciocínio matemático, e sim a flexibilidade do entendimento razoável do preceito. É supreendente observar que, já em 1908, nosso grande Clóvis Benviláqua, tivera nítida percepção destas idéias, pois, ao expor as doutrinas hermenêuticas de sua preferência, assim as sintetizava nesta fórmula precursora:

"Em conclusão, na interpretação da lei deve atender-se antes de tudo ao que é razoável, depois às conseqüências sistemáticas e, finalmente ao desenvolvimento histórico da civilização"(3).

Recaséns Sinches, ao considerar os vários métodos modernos-método teleológico, método histórico-evolutivo ou progressivo, "método da "vontade da lei", nos mostra que cada um deles encerra uma parte de verdade, mas que em sua síntese final, em cada caso concreto, será dada pelo "logos do razoável". Mal comparando, a operação interpretativa se assemelha à execução de uma partitura musical. Vários são os instrumentos – no caso os métodos de interpretação – mas eles devem formar um conjunto harmônico, sob a batuta do maestro, no caso, o logos do razoável, o qual, como veremos em breve, ‘informado pela idéia básica do bem comum"(4).

c) Princípio da lealdade – Todo homem deve agir em boa-fé, deve ser verdadeiro: ex honestate unus homo alteri debet veritatis manifestationem, e é este um princípio que foi incorporado pelo Direito

Muitas leis da nossa disciplina o recolheram como um dos princípios dirigentes nas relações entre as partes. Conseqüêntemente a boa fé e o respeito mútuo entre as partes para o fiel cumprimento das obrigações estabelecidas ou pactuadas.

A boa fé, entendida no significado objetivo do cumprimento honesto e escrupuloso da obrigações, se distingue da boa fé subjetiva ou psicológica abrangente o erro ou falsa crença, significa lealdade de conduta completamente leal nas relações virtuais.

Ao princípio da boa-fé empresta-se ainda outro significado. Para traduzir o interesse social de segurança das relações jurídicas, diz-se, como está expresso no Código Civil alemão, que as partes devem agir com lealdade e confiança recíprocas. Numa palavra, devem proceder com boa-fé. Indo mais adiante, aventa-se a idéia de que entre o credor e o devedor é necessária a colaboração, um ajudando o outro na execução do contrato. A tanto, evidentemente, não se pode chegar, dada a contraposição de interesses, mas é certo que a conduta, tanto de um como de outro, subordina-se a regras que visam a impedir dificulte uma parte a ação da outra.

Nos contratos, há sempre interesses opostos das partes contratantes, mas sua harmonização constitui o objetivo mesmo da relação jurídica contratual. Assim há uma imposição ética que domina toda matéria contratual, vedando o emprego da astúcia e da deslealdade e impondo a observância da boa-fé e lealdade, tanto na manifestação da vontade (criação do negócio jurídico) como, principalmente, na interpretação e execução do contrato. "As partes são obrigadas a dirigir a manifestação da vontade dentro dos interesses que as levaram a se aproximarem, de forma clara e autêntica, sem uso de subterfúgios ou intenções outras que não as expressas no instrumento formalizado. A segurança das relações jurídicas depende, em grande parte, da lealdade e da confiança recíproca. Impende que haja entre os contratantes um mínimo necessário de credibilidade, sem o qual os negócios não encontrariam ambiente propício para se efetivarem. E esse pressuposto é gerado pela boa-fé ou sinceridade das vontades ao firmarem os direitos e obrigações. Sem ele, fica viciado o consentimento das partes. Embora a contraposição de interesses, as condutas dos estipulantes subordinam-se a regras comuns e básicas da honestidade, reconhecidas ó em face da boa-fé que impregna as mentes"(5).

O interprete, portanto, em todo e qualquer contrato tem de se preocupar masi com os espírito das convenções do que com sua letra. "L’ espirit prime la lettre; la volonté réelle domine le rite; le droit n’est plus dans les mots, mais dans les réalités. Ceux-là ne peuvent, en aucun cas, permettre de défòrmer celles-ci"(6).

É o que se prevê no art. 85 do Código Civil brasileiro, quando se ordena que "nas declarações de vontade se atenderá mais à sua intenção que ao sentido literal da linguagem.

Além de prevalecer a intenção sobre a literalidade, compreende-se no princípio da boa-fé a necessidade de compreender ou interpretar o contrato segundo os ditames da lealdade e confiança entre os contratantes, já que não se pode aceitar que um contratante tenha firmado o pacto de má-fé, visando locupletar-se injustamente à custa do prejuízo do outro. O dever de lealdade recíproca (honestidade) acha-se explicado no Código Civil alemão e prevalece doutrinariamente em todo o direito de raízes romanas.

A boa-fé subjetiva diz respeito à ignorância de uma pessoa acerca de um fato modificador, impeditivo ou violador de seu direito. É pois a falsa crença acerca de uma situação pela qual o detentor do direito acredita em sua legitimidade, porque desconhece a verdadeira situação.

Já a boa-fé objetiva, pode ser definida a grosso modo, como sendo uma regra de conduta, isto é, o dever das partes de agir conforme certos parâmetros de honestidade e lealdade, a fim de se estabelecer o equilíbrio nas relações de virtuais. Não o equilíbrio econômico, mas o equilíbrio das posições contratuais, uma vez que, dentro do complexo de direitos e deveres das partes, em matéria de relações virtuais, como regra, há um desequilíbrio de forças. Entretanto, para chegar a uma equilíbrio real, somente com a análise global do contrato do contrato, de uma cláusula em relação às demais, pois o que pode ser abusivo u exagerado para um não o será para outro.

Assim quando se fala em boa-fé objetiva, pensa-se em comportamento fiel, leal, na atuação de cada uma das partes contratantes a fim de garantir respeito a outra. É um princípio que visa garantir a ação sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão a ninguém, cooperando sempre para atingir o fim colimado no contrato, realizando os interesses das partes no âmbito virtual.

d) Princípio intervenção estatal – a intervenção direta do Estado para garantir efetivamente as relações virtuais, não só visando assegurar o acesso a produtos e serviços essenciais como para garantir qualidade e adequação dos produtos e serviços (segurança, durabilidade, desempenho)

Tal garantia está em consonância com os demais princípios legais e constitucionais antes retratados da garantia de dignidade da pessoa humana.

Deve ser estabelecida uma "política nacional das relações virtuais", por conseguinte, o que se busca é a propalada "harmonia" que deve regê-las a todo o momento. Além dos "princípios" que devem reger referida política, terão relevância fundamental os "instrumentos" para sua execução, pois cabe ao Estado não apenas desenvolver atividades nesse sentido, mediante a instituição de órgãos públicos de regulamentação e fiscalizacão das relações virtuais, como também incentivando a criação de associações civis que tenham por objeto a referida missão.

O Direito informático pretende realizar uma igualdade substancial (não apenas formal) entre os envolvidos nas relação virtual, opondo-se a essa desigualdade, criando as condições de uma igualdade prática pela concessão as partes de uma aparato legal institucional propício e seguro a essa relações. Ë conhecida a frase de Savatier: "a igualdade jurídica não é mais do que um pobre painel po detrás do qual cresceu a desigualdade social".

e) Princípio da Subsidariedade – apesar de não concordarmos que a utilização da legislação vigente para dirimir conflitos provenientes de relações virtuais, a realidade da carência de normas e institutos que ainda devem demorar muitos anos para surgir em sua plenitude nos faz admitir que este princípio atualmente é fundamental para o desenvolvimento do direito informático. Porém referidas normas, institutos e estudos da doutrina do direito em geral só poderão ser aplicados se: a) não esteja aqui regulado de outro modo ("casos omissos", "subsidiariamente"); b) não ofendam os princípios do direito informático ("incompatível"); a aplicação de institutos não previstos não deve ser motivo para maior eternização das demandas e tem que adptá-las às peculiaridades próprias. O interprete necessita fazer uma primeira indagação: se, não havendo incompatibilidade, se permitirão a celeridade e a simplificação, que sempre são almejadas na solução dos conflitos.

f) Princípio da efetividade- significa que o juiz é incompetente para proferir sentença que não tenha possibilidade de executar. É intuitivo que o exercício da jurisdição de pende da efetivação do julgado, o que não exclui a possibilidade de ser exercida a respeito de pessoas que estejam no estrangeiro e portanto fora do poder do tribunal. O que se afirma é que, sem texto de lei, em regra o tribunal deve-se julgar incompetente quando as coisas, ou o sujeito passivo, estejam fora de seu alcance, isto é, do alcance da força de que dispõe. Este princípio é fundamental para dirimir as relações virtuais em virtude da mobilidade da transações, bem como as questões de fixação de competência e atribuição para execução do julgado.

g) Princípio da submissão- significa que, em limitado número relações virtuais, uma pessoa pode voluntariamente submeter-se à jurisdição de tribunal a que não estava sujeita, pois se começa por aceitá-la não pode pois pretender livrar-se dela. Mas este princípio está sujeito a duas limitações: não prevalece onde se encontre estabelecida por lei a competência de justiça estrangeira, e não resiste ao princípio da efetividade, isto é, não funciona quando este deva funcionar. Por conseguinte, no silêncio da lei indígena, o tribunal deve declarar-se incompetente quando não tenha razoável certeza de que poderá executar seu julgado.

O elenco desses princípios é inconcluso, melhor dizendo, aberto no mais amplo sentido. Limitou-se a expor aqueles princípios considerados fundamentais. Mas eles não estão enquadrados em moldura fechada e congelada. Não se pode descartar a possibilidade de incorporar outros, como resultado do próprio dinamismo da vida virtual ou como furto de observações, críticas e sugestões de quem aprofunde seu estudo ou discorde de nossas afirmações ou desenvolvimentos.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Mario Antonio Lobato de Paiva

Sou advogado há mais de 20 anos e trabalho com uma equipe de 10 advogados aptos a prestar serviços jurídicos em todas as áreas do Direito em Belém, Brasília e Portugal. Advogado militante em Belém, foi Conselheiro e Presidente da Comissão em Direito da Informática da OAB/PA, Ex-Professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Pará, especialista em Direito da Informática; Assessor da OMDI- Organização Mundial de Direito e Informática; Membro do IBDI- Instituto Brasileiro de Direito da Informática; Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico -IBDE ; Colaborador de várias revistas e jornais da área jurídica nacionais e estrangeiros tendo mais de 400 (quatrocentos) artigos publicados; autor e co-autor de livros jurídicos; palestrante a nível nacional e internacional. Site: www.mariopaiva.adv.br email: [email protected]

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAIVA, Mario Antonio Lobato. Os institutos do direito informático. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 57, 1 jul. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2571. Acesso em: 28 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos