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A criação dos contratos eletrônicos

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A idéia da contratação eletrônica entre duas ou mais partes sem contato físico não é nova, mas já existe há algum tempo, em especial nas transações entre empresas (muitas vezes embasados em contratos anteriores que permitem sub-contratos eletrônicos) e ao invés de computadores utilizava-se antes o telex ou o fax para fins semelhantes aos da Internet de hoje, com a diferença de que estes deixavam um suporte físico em poder das partes para embasar o pactuado e demonstrar como se transacionou. O contrato eletrônico via Internet difere por usar dados codificados em linguagem binária para atingir o mesmo objetivo e também por expandir este tipo de contratação aos usuários comuns da rede, ou seja, os antigos consumidores do varejo.

Não há na legislação nacional nenhum óbice à utilização, aceitação, validade ou mesmo a obrigatoriedade da proposta efetuada em contratos eletrônicos, os também chamados de contratos virtuais, exceto para casos onde haja formalidade expressa ao meio de realização do ato. Há de se lembrar que a lei brasileira aceita até mesmo a existência de um contrato verbal ou tácito (artigo 1.079 do Código Civil brasileiro) no qual nem mesmo os registros eletrônicos que podem comprovar a manifestação da vontade existentes na Web estão presentes. Tecnicamente o contrato via Internet é um contrato entre ausentes e será válido se respeitar os requisitos básicos para a existência de qualquer contrato: duas ou mais pessoas, a livre manifestação de vontade e capacidade civil para o ato que está sendo praticado. É necessário ainda que este contrato verse sobre o objeto lícito e respeite as formalidades que a lei estipular de acordo com seu objeto (para os contratos em que a lei exige atos solenes como documentos escritos, assinados ou originais não será possível, com o que temos hoje, celebrar um contrato via Web), mas não há que se falar em não validade do contrato eletrônico unicamente por ele não estar impresso em uma folha de papel. Hoje a MP nº 2.200-2, que instituiu a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira, a ICP-Brasil, admite o documento eletrônico e criou regras para a assinatura digital em nosso país.

Aliás, a própria estrutura do documento eletrônico pode vir a ser mais segura do que a de um documento em papel. O documento em suporte físico seja ele qual for, pode ser falsificado, copiados o mesmo alterado e para isto no curso dos anos desenvolveram-se técnicas como uso de papéis especiais, selos, autenticações e outros meios específicos para evitar-se qualquer tipo de ameaça a integridade dos documentos. Porém, se aplicados corretamente os meios disponíveis para proteção dos documentos digitais (em especial a criptografia) eles podem ser bem mais seguros que os atuais métodos para papel. A Lei modelo da Uncitral (United Nations Commission on Internet Trade Law) estabelece que os registros eletrônicos (non paper based document) devem, para se revestirem do mesmo nível de reconhecimento legal dos suportes físicos hoje existentes, satisfazer no mínimo o exato grau de segurança que os documentos em papel oferecem: escrito, assinado e original.

Quanto ao requisito por escrito, diz o artigo 6º da Lei Modelo: "Quando a Lei requeira que certa informação conste por escrito, este requisito considerar-se-á preenchido por uma mensagem eletrônica se a informação nela contida seja acessível para consulta posterior". Por assinado, diz o artigo 7º: "Quando a Lei requeira a assinatura de uma pessoa, este requisito considerar-se-á preenchido por uma mensagem eletrônica quando for utilizado algum método para identificar a pessoa e indicar sua aprovação para a informação contida na mensagem eletrônica e quando tal método seja tão confiável quanto seja apropriado para os propósitos para os quais a mensagem foi gerada ou comunicada, levando-se em consideração todas as circunstâncias do caso, incluindo qualquer acordo das partes a respeito". Já sobre o requisito da originalidade do documento, ele assim o será "... quando existir garantia fidedigna de que se preservou a integridade da informação desde o momento da sua geração em sua forma final, como uma mensagem eletrônica ou de outra forma e esta informação for acessível à pessoa à qual ela deva ser apresentada, caso se requeira a sua apresentação", tal como dizem os incisos do artigo 8º da Lei Modelo da Uncitral.

Sobre a real identificação das partes e sua aceitação ao que está pactuado devemos ter em mente que a realização de um negócio pela Internet não se encerra apenas nos bits e bytes que as partes trocam entre si, seja na oferta do vendedor ou na aceitação do comprador: há, necessariamente, de se complementar o tratado entre as partes com ações que serão registradas e efetuadas fora da esfera unicamente das partes, gerando informações seguras sobre a identidade destas e, por conseguinte, sobre sua participação no negócio: o envio do número de cartões de crédito, a transferência de valores entre contas-corrente e os endereços físicos de onde vem e para onde vão os objetos do contrato servem de base para se aferir a real identidade dos envolvidos e envolvem terceiros (bancos, transportadoras, correios, etc). É claro que não se pode, apenas por estes dados, garantir-se a completa segurança nos negócios pela Internet, ao menos no que se refere à identificação: é preciso que se adote meios mais adequados como a assinatura digital, existente em diversos países, dotada de um sistema que use chaves públicas e privadas, oferecendo elevado nível de segurança e proporcionando uma presunção muito forte de que o documento onde se encontra foi criado pela pessoa que dela é titular e, assim, satisfaz o objetivo do legislador na exigência de assinatura para atribuição de valor probatório aos documentos escritos, o que se começa a fazer no Brasil com a criação da Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira, a ICP-Brasil.

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Sobre o autor
Sérgio Ricardo Marques Gonçalves

advogado integrante do escritório Correia Lopes & Gonçalves Advogados Associados

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GONÇALVES, Sérgio Ricardo Marques. A criação dos contratos eletrônicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 54, 1 fev. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2634. Acesso em: 2 nov. 2024.

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