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Anotações pontuais sobre a Lei nº 10.409/2002 (nova lei anti-tóxicos).

Procedimentos e instrução criminal

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01/02/2002 às 01:00
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7. Artigo 38, caput.

            7.1. Prazo para o oferecimento de denúncia

            A Nova Lei ampliou os prazos anteriormente previstos.

            A Lei 6.368/76 estabelecia em seu art. 22, caput, o prazo de 3 (três) dias para o oferecimento de denúncia, e o parágrafo único do art. 35 a duplicidade do prazo em se tratando de crimes previstos nos arts.12, 13 e 14.

            Sem distinção quanto a estar preso ou solto o investigado, agora o prazo é de 10 (dez) dias, observadas as regras gerais de contagem de prazo, consoante estabelece o Código de Processo Penal.

            7.2. Queixa subsidiária

            Embora a Lei se refira apenas ao oferecimento de denúncia, é possível o início da ação penal também por intermédio de queixa-crime subsidiária, instaurando-se a denominada ação penal privada subsidiária da pública, conforme estabelecem os arts. 5º, LIX, da CF, e 29, do CPP.

            Em tal hipótese, o prazo para o oferecimento da queixa-crime será de 10 (dez) dias, contados do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia, desimportando se o investigado está preso ou solto.

            7.3. Procedimento

            Antes do recebimento da denúncia, deverá o juiz, em 24 (vinte e quatro) horas, ordenar a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias, contado da data da juntada do mandato aos autos ou da primeira publicação do edital de citação, e designará dia e hora para o interrogatório, que se realizará dentro dos 30 (trinta) dias seguintes, se o réu estiver solto, ou em 5 (cinco) dias, se preso.

            A citação ocorrerá antes do recebimento da denúncia.

            A resposta à acusação, antes do recebimento da denúncia, assemelha-se, no particular, à regra estabelecida no artigo 514 do CPP. Na resposta, consistente de defesa prévia e exceções, o acusado poderá argüir preliminares e invocar todas as razões de defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas que pretende produzir e arrolar testemunhas.

            Se a resposta não for apresentada no prazo, o Juiz nomeará defensor para oferecê-la em 10 (dez) dias, concedendo-lhe vista dos autos no ato de nomeação.

            Apresentada a resposta o Juiz concederá prazo de 5 (cinco) dias para manifestar-se o representante do Ministério Público e em igual prazo proferirá decisão de recebimento ou não da denúncia, podendo, antes, se entender imprescindível, determinar a realização de diligências, com prazo máximo de 10 (dez) dias.

            Se a denúncia for recebida, a decisão poderá ser atacada pela via do habeas corpus, quando do recebimento se evidenciar flagrante constrangimento ilegal. Se for rejeitada, o recurso cabível continua sendo o recurso em sentido estrito, a teor do disposto no art. 581, inc. I, do CPP.

            7.4. Citação do réu preso

            Com o advento da Nova Lei Antitóxicos descabe a discussão outrora estabelecida sobre a necessidade de citação pessoal ou da mera requisição para o interrogatório (TJSP, Ap. 144.374-3, 5ª CCrim., j. 04-11-1993, rel. Des. Poças Leitão, JTJ 155/297; STF, HC 74.333-1/RJ, 2ª T., j. 26-11-1996, rel. Min. Maurício Corrêa, DJU, 21.02.1997, RT 742/550; TJSP, Ap. 234.718-3, 3ª CCrim., j. 17-02-1998, rel. Des. Walter Guilherme, JTJ 208/272.).

            Entendia-se majoritariamente ser desnecessária a citação por mandado, bastando a requisição para o interrogatório (TJSP, Ap. 165.392-3, 4ª CCrim., rel. Des. Christiano Kuntz, j. 08-02-1996, JTJ 180/284).

            Com a nova disciplina, em razão da modificação do procedimento, deverá ocorrer a citação por mandado para que o acusado venha a "responder" à acusação por escrito. Descabe, pois, a simples requisição, que acabaria por não surtir os efeitos desejados pela Lei. A requisição se justificava pelo fato da necessidade de saída do preso do estabelecimento prisional para ser apresentado em Juízo e interrogado. Agora a citação visa possibilitar ao acusado a apresentação de resposta escrita. O interrogatório só irá ocorrer após a resposta; após a apreciação e julgamento de eventuais preliminares e exceções (art. 38, §§ 1º e 2º); após eventual produção de provas por determinação judicial (art. 38, § 5º), e após eventual recebimento da denúncia (art. 41).

            7.5. Resposta escrita: compreensão do tema

            A resposta escrita, consistente de defesa prévia e exceções, a ser apresentada antes do recebimento da denúncia ou queixa (subsidiária), envolve o questionamento de toda e qualquer matéria defensória.

            Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, a resposta escrita deverá atacar, inclusive, o mérito da acusação, e deverá conter o rol das testemunhas cuja oitiva se pretenda no curso da instrução, não havendo outro momento para a indicação.

            A defesa poderá, entretanto, argüir matéria objetivando a rejeição da inicial acusatória, e, se for o caso, postular a produção de provas com tal finalidade, cumprindo ao Juiz decidir, após a manifestação do Ministério Público (art. 38, § 4º), da necessidade ou não de se realizar diligências para melhor formar sua convicção e embasar sua decisão de recebimento ou rejeição da inicial (art. 38, § 5º).

            Note-se que neste momento processual somente serão realizadas diligências voltadas à formação da convicção do Juízo no tocante ao recebimento ou rejeição da denúncia ou queixa (subsidiária). A prova destinada ao mérito será produzida após o recebimento, em momento oportuno. Não faz sentido imaginar o contrário, até porque, se assim não fosse, seria possível colher-se a prova e depois sobrevir decisão de rejeição da peça acusatória, o que seria um incomensurável absurdo. Ademais, está evidente que também ocorreria colidência com o que está estabelecido no art. 41 da Lei.

            7.6. Prazo para o oferecimento da resposta escrita

            O prazo para o oferecimento da resposta escrita é de dez (10) dias, contados da data da juntada do mandado aos autos ou da primeira publicação do edital de citação.

            Citado o acusado (na linguagem da Lei), se a resposta não for apresentada no prazo de 10 (dez) dias, o juiz nomeará defensor para oferecê-la em 10 (dez) dias, concedendo-lhe vista dos autos no ato de nomeação.

            7.7. Ausência de resposta no prazo legal

            Sempre se entendeu que a ausência de defesa prévia não acarretava nulidade processual, pois "o CPP determina que nulidade ocorre quando não se dá oportunidade ao oferecimento de defesa prévia, a qual é facultativa para o réu" (TJSP, Ap. 206.259-3/4, 3ª CCrim., j. 04-06-1996, rel. Des. Segurado Braz, RT 732/622).

            Sob a força de tal entendimento, era assente na doutrina e jurisprudência que "o que acarreta a nulidade do processo não é ausência da defesa prévia ou das alegações finais e sim a não concessão dos prazos para o oferecimento dessas peças, bem como a falta de intimação dos defensores" (TRF, 4ª Região, ApCrim 96.04.60544-5/PR, 1ª T., j. 01.04.1997, rel. Juiz Gilson Dipp, DJU, 21.05.1997, RT 742/737).

            Considerando o disposto no § 3º do art. 38, da Lei 10.409/2002, se após regular citação do acusado a resposta não for apresentada no prazo, o juiz nomeará defensor para oferecê-la em 10 (dez) dias, concedendo-lhe vista dos autos no ato de nomeação.

            Pelo que se vê, pouco importou ao legislador se o acusado contratou ou não advogado de sua confiança e se a opção defensória foi pelo silêncio, o que é perfeitamente possível, inclusive em razão do princípio da ampla defesa, e à defesa técnica compete optar pelo caminho a se seguir, inclusive pelo total e absoluto silêncio, conforme autorização Constitucional.

            O texto é taxativo no sentido de que não havendo resposta no prazo legal, o Juiz "nomeará" defensor para oferecê-la. Verificada a hipótese tratada na lei, a nomeação será obrigatória.

            Sendo assim, quer nos parecer que na hipótese do defensor nomeado permanecer inerte, deverá o Juiz providenciar a nomeação de outro em substituição, para a apresentação da resposta escrita, inobstante a ausência de texto expresso.

            Tal conclusão, embora possa parecer estranha, decorre do fato de que, podendo o Juiz nomear defensor no caso de inércia, após regular citação, mesmo sem saber se houve ou não a contratação de advogado pelo acusado e a opção foi pelo silêncio, poderá com mais razão nomear outro defensor em substituição àquele desidioso.

            Comparecendo nos autos, entretanto, o defensor constituído, ainda que fora do prazo para a resposta escrita, prevalecerá a manifestação deste, que continuará no processo, ainda que já tenha ocorrido a nomeação de defensor pelo Juiz do feito, resultando tal nomeação sem efeito.


8. Artigo 39

            8.1. Hipóteses de rejeição da denúncia

            Nos precisos termos do art. 43 do CPP, a denúncia ou queixa será rejeitada quando: o fato narrado não constituir crime; já estiver extinta a punibilidade, pela prescrição ou outra causa; for manifesta a ilegitimidade da parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal.

            Além das sobreditas causas ensejadoras de rejeição da inicial acusatória, a Nova Lei Antitóxicos elencou outras, a saber: quando a denúncia for manifestamente inepta, ou faltar-lhe pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal, e quando não houver justa causa para a acusação.

            Quer nos parecer, entretanto, que a previsão era absolutamente desnecessária, e pode levar o leitor menos atento à equivocada conclusão no sentido de que o artigo 43 do CPP é taxativo, quando é cediço que não.

            Ao acrescentar outras causas de rejeição da inicial acusatória, até com uma certa precisão técnica, o Novo Diploma parece querer esgotar as hipóteses de rejeição, suprindo eventual lacuna da legislação processual penal, entretanto, a questão permanece em aberto, pois outras tantas causas não elencadas de rejeição existem, e nem por isso a inicial acusatória, em se tratando de crimes previstos na Legislação Antitóxicos será recebida quando evidenciada uma delas.

            Sem estender demais o rol das hipóteses não previstas de rejeição da denúncia ou queixa comporta citar, por exemplo, que será imperativa a rejeição quando a inicial não estiver grafada em língua nacional.

            Esqueceu-se o legislador que o rol do artigo 43 do CPP é apenas exemplificativo, e não taxativo.

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            Nem se diga que o legislador pretendeu destacar, dar maior importância, às hipóteses que enumerou em acréscimo, já que, seja qual for a causa de rejeição, o resultado será sempre o mesmo, e não há que se cogitar em hierarquia entre causas de rejeição.


9. Artigo 40.

            9.1. Cautelas

            Conforme dispõe o art. 40 da Nova Lei Antitóxicos, já no despacho de recebimento da denúncia o Juiz deverá designar dia e hora para ter lugar a audiência de instrução e julgamento, ordenando a intimação do acusado, do Ministério Público e, se for o caso, do assistente.

            Não faz sentido imaginar que haverá um despacho de recebimento da inicial acusatória e outro, em momento distinto, posterior, designando dia e hora para a audiência de instrução e julgamento, e ordenando a intimação do acusado, do Ministério Público e, se for o caso, do assistente, só porque a Lei não diz: "Recebendo a denúncia, o juiz designará...", ou: "Ao receber a denúncia, o juiz designará...".

            O fato do legislador ter empregado a expressão "recebida a denúncia", no passado, não quer dizer outra coisa senão indicar o recebimento como ato anterior, numa mesma ordem sucessiva de raciocínio e decisão. Num único despacho.

            Embora a Lei não faça qualquer menção, o Juiz deverá também determinar, no mesmo despacho, a intimação do defensor e das testemunhas arroladas na inicial acusatória e na defesa prévia (resposta escrita), bem como a cientificação da autoridade policial e dos órgãos dos quais dependa a remessa de peças ainda não constantes dos autos.

            De igual maneira, na mesma ocasião deverá decidir sobre as provas requeridas pelo Ministério Público por ocasião do oferecimento da denúncia (art. 37, inc. III, última parte), em sendo o caso, e também sobre eventuais requerimentos formulados na resposta escrita, em termos de defesa prévia.

            O art. 23, caput, da Lei 6.368/76, era de melhor técnica ao estabelecer que por ocasião da designação da audiência de instrução e julgamento o juiz deveria determinar a notificação do réu e das testemunhas que nela deveriam prestar depoimento, intimando-se o defensor e o Ministério Público, cientificando-se a autoridade policial e os órgãos dos quais dependia a remessa de peças ainda não constantes dos autos.

            9.2. Assistente

            Há quem entenda que a intervenção do assistente no processo penal justifica-se apenas quando for cabível a possibilidade de reparação de danos ex delicto. Desse entendimento comunga Marco Antonio Vilas Boas (Processo Penal Completo, São Paulo: Saraiva, 2001. p. 302), que citando Paulo Lúcio Nogueira menciona que "assistente é o nome que se dá ao ofendido pelo crime e que tem interesse a reparar na esfera civil. Trata-se de titular do bem jurídico lesado pelo crime e que necessita ser reparado’. Como parte contingente, sua atuação no processo não é fundamental. Age com interesse futuro, de olhos na esfera civil. Por isso, evidente é o seu empenho na condenação do réu".

            Por outro lado, conforme anotação de Damásio E. de Jesus (Código de Processo Penal Anotado, São Paulo : Saraiva, 17ª ed., 2000, p. 190): "Segundo o STF, o interesse do ofendido não está ligado somente à reparação do dano, ‘mas alcança a exata aplicação da justiça penal’ (HC 17.453, 2.ª Turma, DJU 27.10.94 p. 29163)".

            Para aqueles que entendem que a intervenção do assistente só se justifica quando houver possibilidade de reparação de danos a atuação deste será bastante reduzida no âmbito da Lei Antitóxicos. Por outro vértice, acolhida a posição mais ampla, a intervenção se justificará em toda e qualquer hipótese.

            9.3. Despacho saneador

            O despacho de recebimento da inicial acusatória revela-se um verdadeiro despacho saneador. Com efeito, após a citação e resposta do acusado, depois da manifestação do Ministério Público o Juiz deverá decidir sobre a necessidade ou não de produção de provas que o habilitem ao recebimento ou rejeição da peça inicial.

            Havendo necessidade, determinará a produção de provas (art. 38, § 5º).

            Não havendo necessidade ou, realizadas as provas que entender pertinentes, o Juiz deverá proferir despacho de recebimento ou rejeição (art. 39), apreciando, inclusive, eventuais preliminares argüidas. Se optar pelo recebimento deverá decidir, de forma fundamentada, apreciando, ainda, requerimentos eventualmente formulados e que irão influir na instrução probatória e no mérito do processo (art. 37, inc. III, e 38, § 1º).

            Deverá, literalmente, sanear o processo.

            Como se vê, trata-se de verdadeiro despacho saneador, muito embora a Lei assim não o denomine, como o fazia expressamente a Lei 6.368/76 em seu art. 23, caput.

            9.4. Ausência do despacho

            Sob a égide da Lei 6.368/76 decidiu-se reiteradamente que a ausência de despacho saneador constituía mera irregularidade, que não fulminava o processo de nulidade (TJSP, HC 170.438-3, 3ª CCrim., j. 17-10-1994, rel. Des. Segurado Braz, v.u., JTJ 163/149), não sendo ele de exigibilidade absoluta (TJSP, HC 174.414-3, 1ª CCrim., j. 24-10-1994, rel. Des. Fortes Barbosa, JTJ 165/356; TJSP, Ap. 186.858-3/4, 1ª Câm., j. 18.09.1995, rel. Des. Jarbas Mazzoni, RT 726/635; TJSP, Ap. 186.858-3, 1ª CCrim., j. 18-12-1995, rel. Des. Jarbas Mazzoni, JTJ 176/313; TJSP, Ap. 11.350-3, 3.ª CCrim., j. 29-3-1982, rel. Des. Costa Mendes, v.u., RT 560/305; TJSP, HC 15.901-3, 2ª CCrim., j. 2-8-1982, rel. Des. Onei Raphael, v.u., RT 563/301.), considerando-se preclusa a matéria se não houvesse oportuna reclamação até a audiência de julgamento (TJSP, Ap. 11.350-3, 3ª CCrim., j. 29.3.1982, rel. Des. Costa Mendes, v.u., RT 560/305), ou na audiência de julgamento (TJSP, Ap. 11.350-3, 3ª CCrim., j. 29-3-1982, rel. Des. Costa Mendes, v.u., RT 560/305).

            Na sistemática da Nova Lei Antitóxicos, todavia, a questão tem novo relevo. Com efeito, no mesmo despacho deverá o Juiz decidir, entre outros temas, sobre o recebimento ou rejeição da inicial acusatória e, recebendo-a, decidir desde já sobre as provas requeridas (art. 37, inc. III, e art. 38, § 1º).

            Assim, considerando a amplitude da decisão a ser proferida, resulta evidente que a ausência do referido despacho acarretará inegável nulidade do feito. A nosso ver, nulidade absoluta, que deverá ser reconhecida em qualquer tempo e grau de jurisdição.

            9.5. Desclassificação da conduta por ocasião do despacho

            Não é cabível.

            A oportunidade para tal desclassificação, em sendo o caso, é a da sentença, a teor do disposto nos arts. 383 e 384 do CPP, aplicáveis à hipótese em razão do disposto no art. 27 da Lei 10.409/2002.

            9.6. Preclusão da matéria decidida

            O despacho de recebimento da inicial acusatória e apreciação das provas eventualmente requeridas não estabelece preclusão sobre qualquer matéria pertinente ao direito de defesa.


10. Artigo 41

            10.1. Interrogatório

            Nos precisos termos do art. 38, caput, última parte, da Lei 10.409/2002, ao proferir o despacho em que ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias, o Juiz designará dia e hora para o interrogatório, que se realizará dentro dos 30 (trinta) dias seguintes, se o réu estiver solto, ou em 5 (cinco) dias, se preso.

            Por outro vértice, o art. 40 da mesma Lei estabelece que ao receber a denúncia, o Juiz designará dia e hora para a audiência de instrução e julgamento, sendo certo que nesta, a teor do disposto no art. 41, proceder-se-á à oitiva das testemunhas após o interrogatório. Vale dizer: o interrogatório deverá ocorrer na audiência de instrução e julgamento.

            Com efeito, pela redação do art. 38 conclui-se que haveria uma data anterior à audiência de instrução e julgamento para a realização do interrogatório, todavia, para conciliar-se tais dispositivos é preciso concluir que a data designada para o interrogatório, por ocasião do despacho a que se refere o art. 38, deverá ser "aproveitada" para a instrução e julgamento, conforme se determinar em segundo despacho, a ser proferido por ocasião do recebimento da inicial acusatória (art. 40), já que a audiência é una e a inquirição das testemunhas será realizada após o interrogatório, na mesma audiência (art. 41).

            Melhor seria se o legislador estivesse atento e não tivesse incluído na parte final do art. 38, caput, a designação de data para o interrogatório já no primeiro instante, até porque revela-se, a nosso ver, descabida a designação de tal data se o Juiz ainda poderá rejeitar a inicial acusatória (art. 43).

            O art. 40 poderia permanecer com a redação que está, observando-se o que ficou consignado acima, no item próprio.

            A questão pertinente ao momento do interrogatório permaneceria regulada como se encontra no art. 41.

            10.2. Dependência

            Se o acusado alegar já na resposta escrita (art. 38, caput, e § 1º), ser dependente de produtos, substâncias ou drogas ilícitas, e requerer a realização do exame de dependência, é de bom tom que o magistrado aguarde a ocasião do interrogatório, oportunidade em que poderá aferir com maior eficiência e segurança da necessidade ou não de realização do exame, inclusive em razão da imediatidade.

            Não havendo alegação por parte da defesa, deverá o magistrado questionar o acusado a tal respeito, por ocasião do interrogatório.

            Verificada a necessidade de realização do exame, deverá colher a prova oral e determinar a realização da prova técnica, designando nova data para os debates e sentença, a se verificar após a realização do exame e juntada do laudo aos autos.


11. Considerações finais

            De tudo o que se viu é possível concluir que a sistemática adotada pela Nova Lei Antitóxicos é extremamente confusa, pouco técnica, e por certo irá provocar incontáveis discussões processuais, tumultuando ainda mais as Instâncias recursais.

            As discussões irão desde a aplicação ou não do procedimento estabelecido na Lei 10.409/2002 aos crimes envolvendo produtos, substâncias ou drogas ilícitas que causem dependência física ou psíquica, já que tal procedimento aplica-se aos crimes nela definidos, e ela não define nenhum crime, até outras tantas incontáveis questões altamente controvertidas, baseadas em minúcias técnicas, todas elas evitáveis em uma boa legislação.

            Estamos diante de uma Lei que, a pretexto de melhorar a antiga sistemática da Lei 6.368/76 não a revogou. Não define crimes; estabelece um procedimento que não se aplica a nenhuma hipótese, a nenhum delito; não trata de inúmeras questões inevitáveis, que permanecem regidas pela Lei 6.368/76, como as pertinentes à semi-imputabilidade e inimputabilidade, tratadas nos arts. 19 e 29 do Diploma que se pretendeu minimizar como superado.

            Além de não ajudar na prevenção e repressão dos crimes envolvendo produtos, substâncias ou drogas ilícitas que causem dependência física ou psíquica, a Nova Lei só veio tumultuar ainda mais a questão e proporcionar mais impunidade.

            Em se tratando de um Projeto que tramitou desde 1991, é inaceitável uma Lei tão ruim, péssima sob quase todos os aspectos, e pior que o texto do Projeto sancionado em parte, somente a ausência de coragem e vocação jurídica de quem não o vetou completamente.

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Sobre o autor
Renato Marcão

Membro do Ministério Público do Estado de São Paulo. Mestre em Direito. Professor convidado no curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais da Rede Luiz Flávio Gomes. Membro da Association Internationale de Droit Pénal (AIDP), do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), do Instituto de Ciências Penais (ICP) e do Instituto Brasileiro de Execução Penal (IBEP). Autor dos livros: Tóxicos (Saraiva); Curso de Execução Penal (Saraiva); Estatuto do Desarmamento (Saraiva); Crimes de Trânsito (Saraiva); Crimes Ambientais (Saraiva); Crimes contra a Dignidade Sexual (Saraiva); Prisões Cautelares, Liberdade Provisória e Medidas Cautelares Restritivas (Saraiva); dentre outros.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARCÃO, Renato. Anotações pontuais sobre a Lei nº 10.409/2002 (nova lei anti-tóxicos).: Procedimentos e instrução criminal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 54, 1 fev. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2712. Acesso em: 25 abr. 2024.

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