A inclusão no mercado de trabalho da pessoa com deficiência e a atuação do Ministério Públido do Trabalho

22/03/2014 às 11:47
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As políticas de inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho encontram forte amparo constitucional, na medida em que todos os indivíduos têm direito a uma vida digna, que inclui o direito ao trabalho.

A Constituição Federal de 1988 assegura que a República Federativa do Brasil tem como fundamentos a cidadania, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, além da soberania e do pluralismo político (art. 1º, CF/88). O texto constitucional informa ainda que são objetivos fundamentais da República, em síntese, construir uma sociedade livre, justa e solidária, erradicar a marginalização e a pobreza, reduzir as desigualdades sociais, promover o bem de todos, sem discriminação, além de garantir o desenvolvimento nacional (art. 3º). Ademais, é assegurada a igualdade de todos, devendo ser punida qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais (art. 5º, “caput” e incisos I, XLI).

No que tange aos direitos sociais, está expressamente previsto o direito à saúde e ao trabalho, além de ser proibida qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador com deficiência (art. 7º, “caput” e inciso XXXI). Ressalte-se ainda que a propriedade deve atender à sua função social e que a ordem econômica está fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os princípios da função social da propriedade e a busca do pleno emprego (art. 5º, XXIII e art. 170, III e VIII).

Assim, as políticas de inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho encontram forte amparo constitucional, na medida em que todos os indivíduos têm direito a uma vida digna, que inclui o direito ao trabalho.

Em âmbito internacional, destacam-se a Convenção da ONU sobre os direitos das pessoas com deficiência e seu protocolo facultativo (2007), a Convenção Interamericana para a Eliminação de todas as formas de discriminação contra as pessoas com deficiência (1999) e a Convenção nº 159 da OIT, todas no sentido de assegurar iguais oportunidades às pessoas com deficiência.

Nesse sentido, têm sido criadas políticas públicas para que haja a efetiva inclusão no mercado de trabalho das pessoas com deficiência. Cite-se, primeiramente, a previsão do art. 24, XX, da Lei 8666/93, que dispõe sobre a dispensa de licitação para a contratação de associação de pessoas com deficiência, sem fins lucrativos e idônea, por órgãos da Administração Pública, para a prestação de serviços ou fornecimento de mão de obra, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado.

Destaca-se também a previsão do art. 428, §5º da CLT, que disciplina que a idade máxima de 24 (vinte e quatro) anos para a celebração do contrato de trabalho de aprendizagem não se aplica às pessoas com deficiência. Para estas, inclusive, a contratação como aprendiz não acarreta a suspensão, ao menos pelo prazo de dois anos, do benefício de prestação continuada, assegurado pela União e pago pelo INSS (art. 21-A da Lei 8742/93).

Por outro lado, prevê a Constituição, no art. 37, VIII, que a lei deve reservar percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas com deficiência, bem como definir os critérios de sua admissão.

Todas as medidas descritas supra podem ser consideradas ações afirmativas, ou discriminações positivas, que visam à inclusão das pessoas com deficiência no mercado de trabalho.

Nesse contexto, merece ainda maior destaque, pela sua amplitude, a previsão do art. 93 da Lei 8213/91, no sentido de que todas as empresas com 100 (cem) ou mais empregados estão obrigadas a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência, na proporção ali descrita.

Trata-se de política que objetiva a ampla inclusão das pessoas com deficiência no mercado de trabalho, considerando que o dispositivo não faz qualquer restrição à atividade econômica da empresa ou às funções a serem exercidas pelo indivíduo.

A previsão é constitucional, considerando todas as normas mencionadas supra, destacando-se a cláusula de solidariedade inserta no art. 3º, I, CF/88 e que a propriedade deve atender à sua função social (art. 5, XXII, CF/88).

Tratando-se de interesse difuso, nos termos do art. 81, I, CDC (Código de Defesa do Consumidor) c/c art. 1º, IV e art. 21 da Lei 7357/1985, cabe ao Ministério Público do Trabalho (MPT), com fulcro nos arts. 127 e 129 da CF/88, atuar para que haja efetivo respeito, pelos empregadores, da cota prevista no art. 93 da Lei 8213/91.

Tal atuação deve se dar de forma mais ampla possível, especialmente a partir de um trabalho de conscientização das empresas para que tenham responsabilidade social e entendam a importância de se observar a legislação em vigor. Tal trabalho deve buscar o diálogo e a parceria, de forma a superar eventuais dificuldades existentes, como a insuficiência, por exemplo, de pessoas com deficiência ou reabilitadas pela Previdência Social que possam, na localidade, assumir o cargo disponível. Tais dificuldades devem ser contornadas mediante a busca pela aproximação dos diversos atores sociais envolvidos, como o INSS, as entidades de formação profissional e as empresas, o que pode e deve ser articulado pelo MPT. Para tanto, há uma série de instrumentos passíveis de utilização, como a realização de audiências públicas, a expedição de recomendações, o convite para a assinatura de TAC (Termo de Ajuste de Conduta), previsto no art. 5º, §6º, da Lei 7347/1985). Restando infrutíferas tais tentativas, caberá o ajuizamento de ação civil pública para a observância da previsão do art. 93 da Lei 8213/91.

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Sobre a autora
Cibele Cotta Cenachi Napoli

Procuradora Federal. Ex-Procuradora do Estado de Minas Gerais. Especialista em Direito Processual pela UNISUL. Bacharela em Direito pela UFMG

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