INTRODUÇÃO
Em conformidade com o artigo 1784 do Código Civil, com a morte da pessoa natural, os bens do falecido são transmitidos aos seus sucessores legítimos e testamentários.
Diante de todo o patrimônio do falecido é necessário a apuração de todos os bens, com a finalidade de definir o que cada um dos sucessores recebeu.
No inventário os bens da herança são descritos, inclusive as dívidas ativas e passivas do de cujus. Feito isso, o próximo passo é a partilha, que estabelece e adjudica o quinhão de cada sucessor.
INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL OU ADMINISTRATIVO
As Leis nº 11.441/2007 e 11.965/2009 alteraram a redação do artigo 982 do CPC, que passou a vigorar da seguinte forma:
Art. 982 - Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário.
§ 1º O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado comum ou advogados de cada uma delas ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.
§ 2º A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as penas da lei.
Destarte, referida alteração permitiu o inventário extrajudicial em nosso ordenamento, na qual atuam os tabeliões, sem a participação do juiz.
Trata-se de uma faculdade dos sucessores que também poderão dar continuidade no processo por via judicial para a homologação do acordo de partilha. Portanto, como ensina Misael Montenegro Filho, “o procedimento de inventário e de partilha extrajudiciais não fere o direito de ação (afastando a possibilidade do ingresso da ação declaratória de inconstitucionalidade, por esse fundamento), vez que não se qualifica como obrigação, mas como faculdade conferida aos herdeiros do de cujus, que podem rejeitar a instauração do processo de inventário no seu modo tradicional, preferindo realizar a divisão do patrimônio do autor da herança em cartório, através da escritura pública, de forma simplificada, sem as angústias que cercam a tramitação dos processos de inventário, sobretudo pelo aspecto do tempo de duração”.
Para a sua utilização é necessário observar alguns requisitos:
Todos interessados deverão ser maiores e capazes. Os emancipados equiparam-se aos maiores.
Basta que um dos participantes seja incapaz para inviabilizar esta modalidade, o que torna obrigatória a via judicial.
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A sucessão não pode ser testamentária, tem de ser legítima.
Os interessados devem estar em concordância quanto aos termos do inventário e da partilha.
É obrigatória a participação do cônjuge sobrevivente, qualquer seja o regime de união.
Todos os interessados deverão comparecer a presença do tabelião, assistidas por advogado (comum o não) ou de defensor público.
Não há vedação que os interessados se façam a representar por procurador, constituído por instrumento público e com poderes especiais para o ato.
A nenhum dos interessados será permitido firmar a escritura pública de partilha sem a assistência advocatícia (seja por advogado único, por advogados que representem os interessados ou ainda por um defensor público), sob pena de nulidade do ato. Tal exigência afasta a arguição de violação ao artigo 1º do EOAB, que investe o advogado de capacidade postulatória.
A Lei 11.441/2007 é aplicada mesmo nos casos em que o óbito ocorreu antes de sua entrada em vigor.
Cabe salientar, que as regras materiais a respeito da sucessão hereditária serão aquelas em vigor na data de abertura da sucessão (da morte do inventariado, conforme dispõe o artigo 1787 do Código Civil).
Há a possibilidade de fazer numa só escritura a cessão de transferência de direitos hereditários, seguida da partilha.
Importante notar que a escritura pública de partilha, qualificada como documento público, constitui-se como título hábil a garantir a transferência patrimonial em favor do herdeiro beneficiado pela divisão, devendo ser levada ao Cartório de Imóveis competente (no caso de a divisão ter recaído sobre bem imóvel), ao Departamento de Trânsito (na hipótese de a divisão ter recaído em automóvel) etc., sendo possível assim o registro e a transferência definitiva, após a satisfação das obrigações fiscais.
Isto posto, tem-se que a escritura é título executivo extrajudicial, que possibilita a instauração de execução forçada, especialmente na hipótese de um dos herdeiros não observar os termos da divisão, ficando na posse de bem destinado a outrem.
Os herdeiros são obrigados a recolher todos os tributos incidentes na operação, destacando-se o imposto de transmissão causa mortis, obtendo assim uma guia expedida pela Secretaria da Fazenda do Estado destinatário da exação, como condição para a formalização da partilha.
Quanto aos custos da operação, o supracitado autor entende que o valor correspondente à lavratura da escritura deve ser menor do que o das custas e emolumentos judiciais. Ele segue exemplificando: “No Estado de São Paulo, por força da Lei nº 11.608/2003, a taxa judiciária resultante do processo de inventário com monte no valor entre R$ 50.000,00 a R$ 500.000,00 representa a quantia de R$ 1.393,00 (um mil trezentos e noventa e três reais)”.
Na escritura constará a identificação de todos os comunheiros e todos os bens comuns, atribuindo-se o valor e a quota ideal com que cada interessado irá concorrer na partilha, e por fim elabora-se uma folha de pagamento para cada um deles com a descrição dos bens que formarão o respectivo quinhão.
Quando houver sucessor único não haverá partilha, mas apenas inventário.
No inventário extrajudicial, em qualquer caso, seja único ou vários os sucessores, não haverá formal de partilha para ser levado ao registro imobiliário. A própria escritura pública será um título para o ato registral, e o tabelião deverá fornecer aos interessados o competente traslado.
Diferentemente do inventário judicial, não há a figura do inventariante, tudo é resolvido por contato direto entre o tabelião, interessados e advogado, sendo um simples e único ato notarial.
O tabelião será escolhido pelos interessados, sem a vinculação ao último domicílio do de cujus ou local do óbito, à situação de bens ou ao domicílio dos sucessores, respeitado somente a sede funcional do tabelião que possui somente atribuição para lavrar atos de seu ofício dentro de sua circunscrição territorial.
Como bem lembrado por Montenegro Filho, a formalização da partilha extrajudicial não impede o cabimento de ações judiciais por parte dos herdeiros ou de terceiros prejudicados, com fundamento nas regras de direito material, podendo ser denunciada a nulidade da escritura, por vício de consentimento, principalmente decorrente de erro, dolo, simulação, ignorância, coação, estado de perigo, lesão e fraude contra credores.
O inventário extrajudicial não é exclusivo dos brasileiros ou estrangeiros residentes ou domiciliados no país, os que não vivem também poderão realizar o inventário e a partilha dos bens situados no Brasil, respeitadas as exigências do artigo 982 do Código de Processo Civil.
Os brasileiros que vivem no estrangeiro e pretendam fazer o inventário e partilha, poderão recorrer ao cônsul brasileiro, com a assistência de advogado inscrito na OAB, que exercerá a função de tabelionato (artigo 18 da Lei de introdução ao Código Civil).
RESOLUÇÃO nº 35/2007 DO CNJ
Com o intuito de pacificar questões relativas à cobrança de custas para lavratura das escrituras de partilha, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução nº 35/2007.
De acordo com esta resolução, mostra-se possível a promoção do inventário extrajudicial pelos cessionários de direitos hereditários, mesmo no caso de cessão de parte do acervo, desde que todos os herdeiros se façam presentes e concordem.
Como regra, não é exigida a participação do cônjuge do herdeiro na escritura. Porém, existindo renúncia ou alguma forma de partilha que importe transmissão de direitos, mostrar-se-á necessária a intervenção do cônjuge do herdeiro. Contudo, caso trate-se de um casamento sob o regime de separação absoluta de bens, tal medida não será exigida.
Em caso de união estável, a sucessão poderá ser promovida por inventário e partilha extrajudiciais, desde que haja, por óbvio, consenso de todos os herdeiros. Oportuno dizer que a própria união estável pode ser reconhecida por esta via, que se prestará inclusive para estabelecer a meação do companheiro sobrevivente.
O artigo 25 da Resolução ora em apreço admite o uso de escritura pública para os casos de sobrepartilha (hipótese em que os herdeiros, após o encerramento do inventário, descobrem algum bem que não foi inventariado), ainda que referente a sucessão processada em juízo, mesmo que a seu tempo houvesse herdeiro menor, hoje maior e capaz.
Para que haja perfeição da escritura de inventário e partilha extrajudiciais, a Resolução determina algumas providências:
Art. 20. As partes e respectivos cônjuges devem estar, na escritura, nomeados e qualificados (nacionalidade; profissão; idade; estado civil; regime de bens; data do casamento; pacto antenupcial e seu registro imobiliário, se houver; número do documento de identidade; número de inscrição no CPF/MF; domicílio e residência).
Art. 21. A escritura pública de inventário e partilha conterá a qualificação completa do autor da herança; o regime de bens do casamento; pacto antenupcial e seu registro imobiliário, se houver; dia e lugar em que faleceu o autor da herança; data da expedição da certidão de óbito; livro, folha, número do termo e unidade de serviço em que consta o registro do óbito; e a menção ou declaração dos herdeiros de que o autor da herança não deixou testamento e outros herdeiros, sob as penas da lei.
Art. 12. Admitem-se inventário e partilha extrajudiciais com viúvo(a) ou herdeiro(s) capazes, inclusive por emancipação, representado(s) por procuração formalizada por instrumento público com poderes especiais.
Art. 22. Na lavratura da escritura deverão ser apresentados os seguintes documentos: a) certidão de óbito do autor da herança; b) documento de identidade oficial e CPF das partes e do autor da herança; c) certidão comprobatória do vínculo de parentesco dos herdeiros; d) certidão de casamento do cônjuge sobrevivente e dos herdeiros casados e pacto antenupcial, se houver; e) certidão de propriedade de bens imóveis e direitos a eles relativos; f) documentos necessários à comprovação da titularidade dos bens móveis e direitos, se houver; g) certidão negativa de tributos; e h) Certificado de Cadastro de Imóvel Rural - CCIR, se houver imóvel rural a ser partilhado.
Art. 24. A escritura pública deverá fazer menção aos documentos apresentados.
Art. 6º A gratuidade prevista na Lei n° 11.441/07 compreende as escrituras de inventário, partilha, separação e divórcio consensuais.
Art. 7º Para a obtenção da gratuidade de que trata a Lei nº 11.441/07, basta a simples declaração dos interessados de que não possuem condições de arcar com os emolumentos, ainda que as partes estejam assistidas por advogado constituído.
Obs.: esta gratuidade do ato notarial, antes prevista de forma expressa somente para a separação e divórcio, foi expressamente assegurada também ao inventário e partilha pela Lei nº 11.965/2009, que deu nova redação ao artigo 982 e seus parágrafos.
Acerca da realização do inventário, partilha, separação consensual e divórcio consensual por escritura pública, a Corregedoria Geral de Justiça de Minas Gerais baixou o Provimento nº 164/CGJ/2007. Este provimento ressalta a possibilidade de se utilizar a via notarial mesmo quando haja processo judicial em andamento ainda não julgado por sentença. Neste caso, a escritura mencionará o juízo onde tramita o feito e o tabelião procederá à comunicação à autoridade judicial, nos trinta dias seguintes à lavratura de seu ato.