O absolutismo da liberdade de imprensa

28/05/2014 às 07:44
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O conflito entre a liberdade de imprensa e o direito à privacidade dos cidadãos deve ser resolvido observando-se os princípios fundamentais da CF/88.

Esta semana a imprensa está debatendo de maneira mais ou menos intensa a decisão judicial que impediu a Rede Globo de seguir explorando o caso Suzane Richthofen. Condenada por ter participado da morte dos pais, Suzane está cumprindo pena desde 2006. Os defensores da Rede Globo alegam que a Justiça cerceou a liberdade de imprensa. Omitem, porém, que Suzane tem direito à privacidade garantida pela CF/88.

Há três princípios em conflito nesta questão. A liberdade de imprensa (art. 220 e seguintes da CF/88), a garantia à privacidade atribuída a todos os cidadãos sem distinção (art. 5, X, da CF/88) e a obrigação do Estado de garantir a integridade física e psicológica dos detentos (art. 5º, XLIX, da CF/88).

Quando princípios constitucionais entram em conflito é preciso estabelecer uma hierarquia entre os mesmos. Isto deve ser feito levando-se em conta o sistema constitucional e os princípios fundamentais que orientam a República. O art. 1º, III, da CF/88 garante a dignidade da pessoa humana. O art. 3º, da CF/88, prescreve que a promoção do bem de todos sem qualquer distinção como um dos objetivos do Brasil.

A pessoa humana cujo bem estar deve ser perseguido pela CF/88 é neste caso, sem dúvida alguma, Suzane Richthofen. Esta moça já foi processada, condenada e está cumprindo pena. A dívida dela com a sociedade brasileira está a ser resgatada na forma da Lei e a Rede Globo (uma pessoa jurídica que visa lucro) não tem o direito de utilizá-la para fins sensacionalistas. Corretíssima, portanto, a decisão judicial que resguardou os direitos da pessoa humana Suzane contra a empresa Rede Globo.

A liberdade de imprensa não é absoluta, nem deve ser. Cabe ao Estado, além disto, resguardar a pessoa do detento, cuja imagem não deve ser explorada pelas empresas de comunicação.

Ao solucionar a questão, além de resolver o conflito de normas com base nos princípios da CF/88, o Juiz poderia ter feito outra pergunta. Porque a Rede Globo escolheu dar máxima visibilidade a Suzane Richthofen e não um outro detento qualquer? O Brasil tem milhares de pessoas presas, mas a Globo só se interessa por alguns deles. Porque a empresa condena todos os demais detentos ao esquecimento e não pode fazer o mesmo com Suzane Richthofen?

A imprensa é livre e visa lucro. Mas neste caso a ganância pelo lucro pode estar se sobrepondo ao interesse de informar. É cediço que a Rede Globo tem perdido audiência. Este é um fato notado pelos próprios jornalistas. Nesse contexto, a retomada do caso Suzane Richthofen pode ser apenas uma estratégia vil empregada pelo clã Marinho para tentar recuperar a audiência e maximizar seus lucros.

O que a sociedade brasileira e a ré ganham com isto? Nada além da violação da CF/88 e a degradação humana.

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Sobre o autor
Fábio de Oliveira Ribeiro

Advogado em Osasco (SP)

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