Dos prazos diferenciados da Fazenda Pública, Ministério Público e Defensoria Pública

29/05/2014 às 07:58
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Discorre acerca do prazos privilegiados da Fazenda Pública, Ministério Público e Defensoria Pública.

1 INTRODUÇÃO

Este artigo abordará o estudo dos prazos privilegiados do Ministério Público, Defensoria Pública e Fazenda Pública e sua relação com o princípio da Isonomia, analisando a orientação legislativa, doutrinária e visitando as recentes reformas que o Código de Processo Civil.

2 DOS PRAZOS DIFERENCIADOS DA FAZENDA PÚBLICA, MINISTÉRIO PÚBLICO E DEFENSORIA PÚBLICA

 

O princípio da isonomia sendo tão importante como é, está presente nas mais variadas disciplinas do direito e com o processual civil não seria diferente. Para os prazos da Fazenda Pública, Ministério Público e Defensoria Pública observa-se uma amostra da já comentada isonomia material, visto que estes tem beneficio especial de prazo.

Como princípio da isonomia, que está presente em todos os campos do Direito, aparece com muita força no campo processual, há vários exemplos capazes de permitir a exata compreensão do fenômeno. Desta forma observa-se o art. 508 do Código de Processo Civil, que garante que o prazo de que se dispõe para interpor recursos é idêntico ao de que dispõe a parte contrária para impugnar o recurso interposto, ou também o disposto no art. 454 do mesmo Código, que assegura que cada parte disporá de vinte minutos que podem, ser prorrogáveis por mais dez a critério do juiz, para apresentar suas alegações orais na audiência de instrução e julgamento. (CÂMARA, 2008, p. 31)

Vários são os artigos que afirmam a igualdade de prazo para se pronunciar, afinal se uma parte tem tempo determinado, a parte contrária merece o mesmo tempo.

No entanto, estes exemplos mostram apenas uma das faces do princípio da isonomia, a que determina tratamento igual à pessoas iguais. O interessante é reconhecer exemplos em que a lei determine, em obediência ao princípio da isonomia, que pessoas diferentes recebam tratamento diferenciado, exatamente em razão de suas diferenças, e como forma de equilibrar o processo. Como é o caso da aplicação do princípio no art. 188 do Código de Processo Civil, que cria o benefício de prazo para a Fazenda Pública e para o Ministério Público, que têm prazo em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer. (CÂMARA, 2008, p. 31)

Muito se discute acerca da constitucionalidade desse dispositivo, entendendo alguns que o mesmo afronta a garantia da isonomia, enquanto a doutrina dominante vê no dispositivo uma aplicação do referido princípio constitucional.

Há que se lembrar o que Aristóteles disse sobre a isonomia, tratando os iguais igualmente e os desiguais na medida de sua desigualdade, tentando diminuir as diferenças de tratamento que venham a surgir devido à estas diferenças, o que dá à Fazenda Pública a legitimidade para algumas prerrogativas em face dos particulares, porém sempre pautadas sobre a razoabilidade desta diferenciação. (SOUZA, p. 7, 2011)

No conceito de Fazenda Pública, englobam-se a União, os Estados, Distrito Federal, os Territórios e os Municípios, bem como as respectivas autarquias. (THEODORO JUNIOR, 2008, p. )

As sociedades de economia mista e as empresas públicas, todavia, não se beneficiam dos favores do art. 188, porque seu regime jurídico é de direito privado, integrando apenas a administração pública indireta. (THEODORO JUNIOR, 2008)

Ou seja, fica incluído apenas as pessoas jurídicas de direito público usufruirão do benefício quando se fizer necessário.

                                                        

3 ORIENTAÇÃO LEGISLATIVA E DOUTRINÁRIA

Segundo decidiu o Supremo Tribunal Federal ao deferir a liminar na medida cautelar requerida na Adin 1910, a igualdade da partes é imanente ao procedural due process of Law; quando uma da partes é o estado, a jurisprudência tem transigido com alguns favores legais que tem sido julgados não arbitrários por visarem a compensar dificuldades da defesa em juízo das entidades publicas; se, ao contrario, defasafia medida da razoabilidade ou da proporcionalidade caracterizam privilégios constitucional parece ser esse o caso na parte em que a nova medida provisória insiste, quanto ao prazo da decadência da ação rescisória, no favorecimento unilateral das entidade estatais, aparentemente não explicável por diferenças reais entre as partes e que, somadas outras vantagens processuais da fazendo pública, agrava a consequência perversa de retardar sem limites a satisfação do direito do particular já reconhecido em juízo. (NERY JUNIOR, 2009, p. 101)

Então, já havia se discutido e concedendo benefício à Fazenda Pública a tempo, visto que ficou reconhecida a necessidade de dar este privilégio em razão da enorme quantidade de processos que a Fazenda Pública enfrenta.

No caminho da efetivação do due processo of law, que tem particular relevo na construção sempre inacabada do estado de direito democrático, a tendência é de ser a da gradativa superação dos privilégios processuais do estado, a custa da melhoria de suas instituições de defesa em juízo e nunca dada ampliação deles e da criação de outros como se tem observado no Brasil. (NERY JUNIOR, 2009, p. 101)

Passemos a analisar o Código de Processo Civil art. 188. Poderia parecer a primeira vista que as prerrogativas processuais conseguidas, por exemplo, a fazenda publica e ao ministério público, ou seja, prazo em dobro para recorrer em quádruplo para responder,  infringiriam o principio constitucional da igualdade. (NERY JUNIOR, 2009, p. 101)

Theodor Júnior julga ser devido às enormes dificuldades de ordem burocrática que se notam no funcionamento dos serviços jurídicos da Administração Pública, manda o art. 188 que sejam computados em quádruplo o prazo para contestar e em dobro para recorrer, quando a parte for a Fazenda Pública ou o Ministério Pública. (THEODORO JUNIOR, 2008)

Ao pensar com base na isonomia formal, pode parecer inconstitucionalidade conceder qualquer tipo de prazo a mais a uma parte e não dar o mesmo tratamento à parte contrária, mas não é o que ocorre no caso da Fazenda Pública e Ministério Público.

Pois o que a principio constitucional quer significar é proteção da igualdade substancial, e não a isonomia formal. Essa igualdade real, explicada e demonstrada cientificamente pelo direito constitucional e também pelo direito processual civil, está servindo de fundamento básico para a recente corrente política jus filosófica denominada no Brasil de aplicação alternativa do direito ou justiça alternativa, desenvolvida por setores da magistratura do Rio Grande do Sul que vê na igualdade substancial um instrumento para busca da segurança e do justo. (NERY JUNIOR, 2009, p. 101)

Busca-se a isonomia material que vai além da simples normas, obervando as implicações sociais, visto que seria perda de muito tempo da Fazenda Pública se utilizasse o prazo normal e tudo o que afeta a Fazenda Pública, afeta também a sociedade em geral, já que ela existe para atender as necessidades da sociedade.

Há que se lembrar o que Aristóteles disse sobre a isonomia, tratando os iguais igualmente e os desiguais na medida de sua desigualdade, tentando diminuir as diferenças de tratamento que venham a surgir devido à estas diferenças, o que dá à Fazenda Pública a legitimidade para algumas prerrogativas em face dos particulares, porém sempre pautadas sobre a razoabilidade desta diferenciação. (SOUZA, p. 7, 2011)

Poucas vezes há formação de litisconsórcios ativo em ação motiva em face da Fazenda Pública, em que cada um dos setores tem situação funcional diferente, pleiteando o mesmo ou diferente beneficio funcionais. Como no sistema processual vigente não há mais o litisconsórcio recusável, a Fazenda Publica, ré, terá de apresentar sua contestação controvertendo um a um dos fatos afirmados na peça. Em ações desse tipo, com mais de uma centena de autores, a fazenda teria dificuldades materiais devendo levantar a situação funcional de cada litigante para poder apresentar sua resposta. Não teria, por óbvio, condições de defender-se completamente do pedido do prazo normal de 15 dias, dado pelo CPC, vendo cerceada na prática sua defesa. (NERY JUNIOR, 2009, p. 101)

Fala o art. comentado em prazo para contestar, o que, segundo Theodoro Junior APUD Barbosa Moreira, não inclui todas as respostas que a Fazenda possa produzir, por se tratar de norma "especialíssima". No entanto, reconhece-se que a reconvenção goza de prazo ampliado, visto que deve ser produzida em conjunto com a contestação. Já a exceção terá de ser produzida pela Fazenda no prazo normal das partes. (THEODORO JUNIOR, 2008)

A Fazenda Pública tem esses tratamentos diferenciados a fim de garantir que o bem comum seja garantido, pressupostos estes considerados justos e necessários à consecução da justiça e limitados pelo princípio da legalidade e do interesse público. (SOUZA, p. 5, 2011)

Os prazos dilatados para algumas manifestações em juízo, como preceitua o art. 188 do CPC que confere prazo em quádruplo para apresentar resposta em juízo, inclusive para reconvir, apresentar exceções ou impugnar o valor da causa, e em dobro para recorrer devem ser analisados sob a luz do princípio da razoabilidade. Para tanto, deve-se argüir se a conferência de prazo nos parâmetros legais dilatados realmente se coaduna com a realidade atual. (SOUZA, p. 5, 2011)

Certamente, a complexidade da máquina estatal demanda mais tempo para a elaboração das peças interpostas em juízo. Ao conhecer a realidade dos órgãos públicos, torna-se evidente que o volume de trabalho somado muitas vezes à falta de servidores dificulta a atuação da Fazenda Pública em juízo, o que transmite, segundo nosso entendimento, a necessidade real da dilação destes prazos, mesmo porque já inseridos na gestão dos processos pelos procuradores competentes em cada ente federativo. (SOUZA, p. 5, 2011)

Fenômeno semelhante ocorre no âmbito do Ministério Público. Instituição destinada a defesa, em juízo, do interesse público e dos interesses sociais e individuais indisponíveis da sociedade ( CF 127; CPC 81 e 82) o Parquet enfrenta dificuldades para preparar uma defesa ou elaborar um recurso em virtude da imensa carga de serviços que lhes são devidos. Normalmente são pouco curadores que atuam na esfera civil do ministério publico. (NERY JUNIOR, 2009, p. 103)

Aos olhos de Theodoro Júnior, este é caso de tratamento desigual dispensado pelo Código de Processo Civil a pessoas desiguais, e que tem por fim assegurar a igualdade substancial, o que se encontra no art. 82, I, do CPC, segundo o qual o Ministério Público deve intervir obrigatoriamente nos processos em que haja interesse de incapaz envolvido. Tal norma tem por fim assegurar aos incapazes a garantia de igualdade substancial, já que não se pode pretender afirmar que exista igualdade material entre capazes e incapazes.  (THEODORO JUNIOR, 2008)

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Como se pode notar, seria impossível ao Ministério Público dar conta de todas as ações se o prazo não fosse diferenciado, fora que o Ministério Público age em função do interesse público, e com a quantidade grande de processos, ele não poderia exercer sua função de fiscal da lei.

E o motivo determinante para se encaminhar a solução dessa desigualdade é justamente esse. Como o Ministério Público sempre atua em virtude da existência de interesse público quer seja parte quer fiscal da lei, quer no processo civil quer no penal, consulta ao interesse público o exercício de sua atividade mais ampla e melhor maneira possível. (NERY JUNIOR, 2009, p. 103)

Ainda que se argumente somente com a quantidade de serviço, de modo a justificar aumento nos quadros do Ministério Público a solução deve ser encaminhada no sentido de prerrogativa de prazo. Enquanto o advogado pode selecionar as causas que quer patrocinar, conhecendo, do principio ao fim, todos os processo que são ao seu cargo, podendo recusar causas quando não tiver disponibilidade de tempo, o Ministério Público não tem esse arbítrio: terá de, obrigatoriamente, funcionar em todas as causas, que lhe estiverem afetas. (NERY JUNIOR, 2009, p. 104)

Como fiscal da lei, o Ministério Público não tem a liberdade de escolher em que ações irá atuar, tem quer dar assistência a todas, e como a grande demanda já difícil, imagine sem o beneficio de prazo. 

Para driblar todos esses inconvenientes, a lei concede a Fazenda Pública e ao Ministério Público o beneficio de prazo em quádruplo para responder. Antes de caracterizar ofensa ao principio constitucional da igualdade de partes, o benefício de prazo vem constituir-se como afirmação e efetivação do principio, traduzindo-se como medida de equidade, pois trata partes desiguais desigualmente, atuando em prol da igualdade substancial ou material. (NERY JUNIOR, 2009, p. 105)

A concessão de beneficio de prazo no processo é de tradição do direito brasileiro. Especificamente quanto ao beneficio de prazo para a Fazenda Estadual, a primazia em adotá-lo foi do CPC de Minas Gerais, presente no art. 147 parágrafo único, repetindo preceito do processo federal que concedia o beneficio apenas para Fazenda Federal. Dessas duas disposições, inspirou-se o CPC de 1939, ao dispor sobre o beneficio de prazo para a Fazenda Pública no art. 32. (NERY JUNIOR, 2009, p. 105)

 Os códigos estaduais, em sua maioria, dispunham sobre prazos judiciais atribuindo ao juiz o poder de dilatar prazo de acordo com a necessidade de cada caso concreto. (NERY JUNIOR, 2009, p. 105)

Antes, só era dado o prazo para a Fazenda Federal e o estado de Minas Gerais, modificou a situação ao acrescentar em seu código o benefício para a Fazenda Estadual também.

Tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais é a substância do principio da isonomia. A desigualdade do beneficio da norma do CPC art. 188 em relação ao litigante comum estaria no interesse maior que a Fazenda Pública e Ministério Público representam no processo. Os direitos defendidos pela Fazenda são direitos públicos, vale dizer, de toda coletividade, sendo, portanto, metaindividuais. O mesmo pode se dizer do ministério publico, que defende no processo interesses publico sócias e individuais indisponíveis, encontrados na Constituição art.127 e no CPC art. 81 e 82. (NERY JUNIOR, 2009, p. 106)

Assim, quem litiga coma fazenda publica ou com o ministério publico não está enfrentando um outro particular, ma sim o próprio povo, razão bastante para o legislador beneficiar aquelas duas entidades com prazos especiais atendendo o principio da igualdade real das partes no processo. (NERY JUNIOR, 2009, p. 106)

O que se deve discordar em razão dos princípios supramencionados. O beneficio de prazo do CPC 188 se aplica ao Ministério Público, quer seja ele parte, quer fiscal da lei. (NERY JUNIOR, 2009, p. 107)

O termo parte constante da norma sob exame deve ser entendido com seu qualitativo necessário: parte contestante ou parte recorrente. O que é preciso para incidir o benefício e que a Fazenda ou Ministério Público seja autor, réu ou interveniente, como, por exemplo, no exercício do recurso de terceiro prejudicado (PCP 499). Nem teria sentido interpretar-se a regra de modo restritivo, quando o Código legitimou o Parquet a recorrer, qualquer que seja o motivo de sua intervenção no processo civil CPC 499 § 2º). Este, aliás, foi o fundamento utilizado pelo STF para acolher dois recursos extraordinários interpostos pelo Ministério Público de São Paulo, com o objetivo de fazer valer a prerrogativa também nos casos em que oficiou como fiscal da lei. (NERY JUNIOR, 2009, p. 107)

Desde a Constituição de 1969 art. 153, parágrafo 1º, no qual o principio já vinha adotado, a doutrina dominante se posicionava no sentido do que do que vem sendo afirmado. Dizendo não haver ofensa ao mandamento constitucional da igualdade conceder-se a prerrogativa e não privilegio de prazo ao ministério publico e da fazenda publica no processo civil. (NERY JUNIOR, 2009, p. 106)

A lei 7871/89 acrescentou o parágrafo 5°ao art. 5° da Lei nº 1060/50, concedendo ao defensor público, ou quem exerça cargo equivalente, o prazo em dobro para praticar atos processuais e a prerrogativa de ser intimado pessoalmente de todos os atos processuais. (NERY JUNIOR, 2009, p. 106)

Além da Fazenda Pública e do Ministério Público, a Defensoria Pública também ganha o benefício de prazo.

Esse prazo em dobro se aplica sempre ao defensor público sendo irrelevante indagar-se a respeito da condição econômica ou processual da parte por ele assistida. Mesmo que a assistência judiciária não tenha o cargo de defensor publico, contra com procuradores que exercem cargos equivalentes, sendo-lhes contado o prazo em dobro, no entanto há entendimento do STJ no sentido de restringir a aplicação do art. 5° parágrafo 5°, da lei 1060/50 apenas as instâncias ordinárias, não se aplicando ao recurso especial e ao recurso extraordinário, pois não teria sentido que, a cada decisão dessa corte, fosse expedida carta de ordem para intimar-se pessoalmente o defensor público, domiciliado nas mais diversas unidades da federação. (NERY JUNIOR, 2009, p. 106-107)

Quanto à intimação do defensor publico, mesmo que se trate de ato misto, ou seja, material e processual, não há como deixar de aplicar o prazo em dobro de que trata o artigo 5° parágrafo 5° da Lei, porque a purgação de mora, por exemplo, produz efeito na esfera contratual, mas se realiza no processo, razão porque incide a regra processual do beneficio de prazo. (NERY JUNIOR, 2009, p. 107)

O Defensor Público terá prazo em dobro, e quando não tiver quem exerça essa função os procuradores que estiverem fazendo as vezes de Defensoria Pública poderão usufruir do prazo.

Este prazo especial é criado pela lei por causa da organização burocrática que envolve o Ministério Público e a Fazenda. Não há nada de inconstitucional haja vista que isonomia é de outra forma, também, tratar desigualmente os desiguais. Fazenda Pública no texto é a pessoa jurídica de direito público e as autarquias autorizadas. (MACHADO, 2008, p. 180)

Interessante o que Rui Barbosa fala da Isonomia, em sua Oração aos Moços:

A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são  desvarios da inveja, do orgulho, ou da loucura. Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. Os apetites humanos conceberam inverter a norma universal da criação, pretendendo, não dar a cada um, na razão do que vale, mas atribuir o mesmo a todos, como se todos se equivalessem. (SOUZA, p. 7, 2011)

4 PROJETO DE LEI DO SENADO N.º 166/2010 - NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

O Projeto de Lei do Senado n.º 166/2010, que atualmente teve sua redação final aprovada pela Câmara de Deputados, tem como principal intuito a busca pelo maior acesso à Justiça e uma maior efetividade do processo, que deve significa uma busca por maior celeridade na entrega da prestação jurisdicional a quem possuir o direito material em disputa. (RODRIGUES, p. 4, 2010)

O projeto também tem o intuito de possibilitar uma maior concretização dos valores e direitos consagrados na Constituição da República, a partir do reposicionamento do instituto do processo como um instrumento de resolução de conflitos, e não como fim em si mesmo. (RODRIGUES, p. 4, 2010)

Esta reforma do Código de Processo Civil, busca dar mais celeridade aos processos diminuindo a burocracia, aumentando a efetividade do judiciário, afinal, são muitos os processos que estão parados, desnecessariamente, esperando a burocracia ser resolvida.

O fundamento para a concessão de prazos processuais diferenciados para a Fazenda Pública está nas dificuldades que enfrenta devido à sua enorme estrutura burocrática, o que é ainda mais evidente em âmbito federal. (RODRIGUES, p. 7, 2010)

Esta característica das pessoas jurídicas de direito público em várias vezes causa demora na coleta e no tráfego de documentos, informações e provas, por diferentes órgãos e instâncias, imprescindíveis para uma defesa judicial eficaz. (RODRIGUES, p. 7, 2010)

A falta de celeridade se encontra principalmente na esfera federal, onde a fim de não cometer erros, há uma verificação extensa das atividades, documentos e afins. A mudança da lei vem atacando logo este ponto.

Observe-se a redação do artigo 95 do Anteprojeto de novo Código de Processo Civil:

 

Art. 95. A União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público gozarão de prazo em dobro para todas as suas manifestações processuais, cuja contagem terá início a partir da vista pessoal dos autos, mediante carga ou remessa. (RODRIGUES, p. 7, 2010)

 

Continuou o mesmo, o princípio da eventualidade. Observado no artigo 336 do PLS n. 166/2010:

Art. 336. Incumbe ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito com que impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir.

Este dispositivo acima apresenta redação praticamente idêntica à do atual artigo 300 do Código de Processo Civil. Apesar de haver a alteração da palavra “compete” por “incumbe”, o que não levou a nenhuma mudança significativa ao texto, foram mantidos os mesmos contornos da contestação e do princípio da eventualidade, o qual serve de base. (RODRIGUES, p. 8, 2010)

Assim, segundo o princípio da eventualidade, o réu deve transferir a sua defesa na contestação, ainda que certo de que bastará esta ou aquela preliminar para pôr termo à ação, já que, eventualmente, a preliminar poderá ser repelida, e já não lhe será mais possível aditar a defesa. (RODRIGUES, p. 8, 2010)

Se por um lado a manutenção da contestação no que diz respeito ao momento de apresentação de toda a matéria de defesa por parte do réu apresenta-se como medida irretocável e adequada com a busca de uma maior celeridade processual, entende-se, no entanto, que a extinção do prazo em quádruplo para apresentação de contestação pelos entes públicos, que está prevista no artigo 188 do Código de Processo Civil, pode trazer sérios prejuízos ao erário. (RODRIGUES, p. 8, 2010)

As procuradorias fazendárias, além da grande quantidade de trabalho a que estão sujeitas, dependem de informações e documentos que são distribuídos pelos órgãos da Administração Pública para a elaboração da defesa judicial do Ente Público. (LOPES, PEGORETTI JUNIOR, p. 2, 2011)

Desta forma, a redução do prazo para a Fazenda contestar as ações judiciais, com certeza, em muitos casos, criará risco à qualidade de sua defesa, o que pode inviabilizar o princípio da eventualidade, previsto no art. 300, do atual Código de Processo Civil, ou seja, a apresentação de toda matéria defensória na contestação. (LOPES, PEGORETTI JUNIOR, p. 2, 2011)

O anteprojeto do novo Código de Processo Civil, Projeto de Lei do Senado PLS nº 166/10, traz alterações processuais não muito favoráveis à Fazenda Pública. (LOPES, PEGORETTI JUNIOR, p. 2,)

A mudança de prazos em quádruplo para prazos em dobro é imensa, e se for considerado a quantidade de processos que a Fazenda Pública está envolvida, não é claro até que ponto, será benéfica, esta mudança, a população.

Nesta disputas entre interesses que para Rodrigues (p. 8, 2010), inicialmente, se mostram como antagônicos, nota-se que de um lado está a busca pela maior celeridade e efetividade do processo civil e, do outro lado, o tratamento processual diferenciado dispensado à Fazenda Pública para que esta tenha condições de elaborar uma defesa eficaz, o anteprojeto deu privilégio ao primeiro.

Não há dúvidas de que ao reduzir o prazo para o oferecimento de contestação pelo Poder Público, o dispositivo contido no artigo 95 do novo Código de Processo Civil concederá uma maior celeridade naqueles procedimentos. (RODRIGUES, p. 8, 2010)

Acontece que esta maior agilidade na tramitação será benéfica apenas para aquele processo que terá como parte um ente político. Mesmo que se considere como uma perda de tempo o atual prazo mais dilatado para contestar, no qual o processo permanece parado, não tem como se confirmar que a redução deste prazo traga como consequência necessária a maior celeridade em outras ações ou mesmo do Poder Judiciário como um todo, tal como, para Rodrigues deverá ocorrer em virtude da limitação das hipóteses de reexame necessário, que também está prevista no Projeto. (RODRIGUES, p. 8, 2010)

De acordo com Rodrigues, é justamente para este fato que se deve chamar a atenção, ou seja, a limitação das hipóteses de reexame necessário pode gerar significativo ganho para todo o sistema judiciário brasileiro, sendo que a redução do prazo para a Fazenda Pública oferecer contestação será pouco contributivo para o aperfeiçoamento e maior celeridade do Poder Judiciário. (RODRIGUES, p. 8, 2010)

O artigo 186 do anteprojeto que diz que: os litisconsortes que tiverem diferentes procuradores, a Fazenda Pública, o Ministério Público e a Defensoria Pública terão prazos contados em dobro para se manifestar nos autos, altera o artigo 188 do atual Código de Processo Civil, extinguindo o prazo em quádruplo da Fazenda Pública para contestar, ficando apenas prazo em dobro para sua manifestação nos autos, que também valerá para o Ministério Público, Defensoria Pública, e litisconsortes com diferentes advogados. (LOPES, PEGORETTI JUNIOR, p. 2, 2011)

Ou seja, não só a Fazenda Pública sofrerá com as mudanças do novo código, mas também o Ministério Público e a Defensoria Pública, que sofrerão com os mesmos problemas, já citados, de celeridade em detrimento de eficaz aplicação do direito.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os prazos privilegiados do Ministério Público, Fazenda Pública e Defensoria Pública são exemplos de onde se observa a isonomia material, pois se dá prazo em quádruplo para os dois primeiros e duplo para o terceiro sem que seja afronta para o princípio da isonomia. Visto que os três por serem pessoa jurídica de direito público tem em suas mãos diariamente uma quantidade exorbitante de processos que é dever deles atender cada um deles e se algum deles for prejudicado devido ao pouco prazo das muitas ações, a sociedade em geral será prejudicada, pois eles agem sempre em prol do interesse público, seja como aplicador, fiscal ou defensor de direitos.

A mudança atual no cenário jurídico, ou seja, o Novo Código de Processo Civil veio com algumas mudanças que se viu como benéfica a respeito da celeridade, já que o intuito foi de diminuir a burocracia, mas também prejudicial com a redução do prazo da Fazenda Pública, Ministério Público e Defensoria Pública que, antes, era em quádruplo e em breve será em dobro.

Assim, entende-se que o princípio da Isonomia, a fim de realmente tratar as pessoas como iguais, tem que dar tratamento desigual a outras para que a coletividade não sofra em detrimento do direito de poucos; e que diminuição desta diferença de tratamento nem sempre é uma mudança desejável.

REFERÊNCIAS

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil Brasileiro. 14. ed. Rio de Janeiro: Lunen Juris, 2006.

LOPES, Shirley Alonso Rodrigues Silverio; PEGORETTI, Carlos Roberto. Os Prazos Processuais da Fazenda Pública. Disponível em:  <http://semanaacademica.org.br/system/files/artigos/artigo-prazosfazendapublica.pdf>. Acesso em: 16 de março de 2014.

MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. A intervenção do Ministério Público no processo civil brasileiro. 2a ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo na Constituição Federal: processo civil, penal e administrativo – 10. Ed. Ver., ampl. E atual, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.

RODRIGUES, Roberto de Aragão Ribeiro.  As Prerrogativas Processuais da Fazenda Pública no Novo Código De Processo Civil. Disponível em: <www.agu.gov.br/page/download/index/id/3412353‎>. Acesso em: 16 de março de 2014.

SOUZA, Fernando Garcia. Tutelas de Urgência e a Fazenda Pública. Disponível em: <http://www.direitorp.usp.br/arquivos/noticias/sites_eventos/3_semana_juridica_2010/papers/Fernando%20Garcia%20Souza.pdf>. Acesso em: 16 de março de 2014.

THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do Direito processual Civil e do processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Forence, 2008.

                                                                                           

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