Brasil: o berço do tráfico de mulheres e da exploração sexual

01/06/2014 às 00:24
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O tráfico de pessoas é uma forma de a sociedade moderna perpetuar a prática da escravatura. Todos os dias pessoas são vítimas deste comércio que tem como objetivo a exploração sexual, o trabalho escravo, a comercialização de crianças e órgãos.

RESUMO

O tráfico de pessoas é uma forma de a sociedade moderna perpetuar a prática da escravatura. Atualmente, há inúmeras organizações criminosas especializadas neste tipo de crime. Todos os dias mulheres, homens e crianças são vítimas deste comércio que tem como objetivo a exploração sexual, o trabalho escravo, a adoção/comercialização de crianças e a venda de órgãos. Vulneráveis aos traficantes, destaque-se o aspecto de que grande parte, ou quiçá a totalidade destas vítimas serem acometidas pela pobreza, sem escolaridade, são iludidos  no almejo de uma perspectiva de vida melhor. Destarte, quando chegam ao seu destino percebem que foram vítimas de organizações inescrupulosas, motivadas pelo lucro, às mantêm como mercadorias. O tráfico de pessoas perpetua a violação e coerção dos direitos humanos fazendo-se necessário, incontinenti, ser banido do ról dos crimes cometidos contra a dignidade da pessoa humana.

Palavras chave: Tráfico de pessoas. Exploração sexual. Aliciamento. Mulheres.

  1 INTRODUÇÃO

A realidade sóciocultural que estrutura o comércio de seres humanos, cada vez mais precoce, não se fundamenta unicamente no contexto atual. Desde os primórdios, o tráfico de pessoas é uma constante na história da humanidade, a principiar da Grécia Antiga - onde meninas na faixa etária de cinco anos eram comercializadas como escravas e compelidas a prestar “favores sexuais” a seus donos - a exploração sexual é caracterizada como configuração comercial. Trata-se de uma prática ilícita, execrável e preocupante, haja vista a proeminente violação de direitos e garantias fundamentais, logo, exige-se um enfrentamento que responsabilize conjuntamente o agressor, a própria sociedade, o mercado propulsor e, igualitariamente, o Estado.

É preciso insistir também na indagação: Até que ponto o Estado, a coletividade e a família estão sendo complacentes quanto a este evento factual que majora corriqueiramente? Indubitável é que na sociedade contemporânea torna-se inadmissível a perpetuação de um mercado desumano e degradante como este.

Cumpre destacarmos que o tráfico de mulheres, adolescentes, como também crianças, envolve em seu bojo um contexto de gênero e exploração, esta última, por sua vez, distingue-se pela obtenção de lucro, seja este financeiro ou de outra espécie. Outrossim, a exploração sexual abarca quatro modalidades correlatas, quais sejam: o turismo sexual, o  tráfico,  a pornografia e a prostituição.

Esta tipificação está intrínseca às redes de falsificação de documentos, contrabando ilegal de imigrantes, drogas, armas, lavagem de dinheiro, pedofilia entre outras atividades ilícitas.

É sobremodo importante assinalar que o Brasil está comprometido com o combate a esse delito e vem desenvolvendo, desde 2002, parcerias com outros países e organismos internacionais como, por exemplo, podemos citar o Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. A proteção aos direitos garantidos constitucionalmente deve ser uma constante em todas as relações humanas, políticas e sociais, ora no ordenamento interno, ora no internacional.

2  O TRÁFICO DE SERES HUMANOS

            No intento de discorrer a respeito do tráfico de pessoas, mister se faz ressaltar que tomaremos por base as normativas internacionais dispostas nos termos do Protocolo de Palermo, art.2°, alínea a, onde define que:

[...] o tráfico de pessoas é o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou a recolha de pessoas, pela ameaça de recursos, à força ou a outras formas de coação, por rapto, por fraude, e engano, abuso de autoridade ou de uma situação de vulnerabilidade, ou através da oferta ou aceitação de pagamentos, ou de vantagens para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre uma outra para fins de exploração.

Em assonância, visando ampliar os conceitos que estão abarcados no tráfico, Leal (2001, p.04) define exploração sexual como:

[...] uma violência sexual que se realiza nas relações de produção e mercado (consumo, oferta e excedente) através da venda dos serviços sexuais de crianças e adolescentes pelas redes de comercialização do sexo, pelos pais ou similares, ou pela via de trabalho autônomo. Esta prática é determinada não apenas pela violência estrutural (pano de fundo) como pela violência social e interpessoal. É resultado, também, das transformações ocorridas nos sistemas de valores arbitrados nas relações sociais, especialmente o patriarcalismo, o racismo, e a apartação social, antítese da idéia de emancipação das liberdades econômicas/culturais e das sexualidades humanas.

a) Escravidão no Brasil

Conforme registros encontrados na literatura nacional, no Brasil, a escravidão teve início em meados do século XVI, atrelado ao movimento de colonização. Primeiramente, com o escambo de quinquilharias os portugueses utilizavam-se da mão-de-obra indígena e também das riquezas aqui encontradas. Entretanto, os índios mantinham uma cultura totalmente conflitante com o trabalho severo e compulsório imposto pelos europeus.

Saciadas as curiosidades dos mesmos e na recusa de continuarem o “acordo” que mantinham, a primeira forma de escravidão foi aqui impetrada, a escravidão indígena, que era utilizada no corte e transporte do pau-brasil. Com o passar do tempo a mão-de-obra indígena foi ficando cada vez mais escassa.

Em período histórico posterior, este processo de escravatura e trabalho forçado era basilarmente destinado aos africanos, haja vista que os mesmos eram apenas e tão somente tidos como mercadorias. Eles eram um objeto valioso para seus traficantes e, comercializados como animais eram obrigados a fazer todo e qualquer tipo de serviço imposto por seus donos.

Cumpre destacarmos que este tipo de transação comercial era muito lucrativa para os traficantes de escravos, vez que estes faziam prisioneiros nas tribos africanas e depois os vendiam. A base de preço de cada escravo era medida por seu porte físico, sua estrutura óssea bem como por sua arcada dentária.

Eram utilizados principalmente na exploração do pau-brasil, na cultura do café, trabalhos domésticos e na agricultura canavieira. O argumento à época justificável para tal prática era a necessidade de enriquecimento dos senhores.

Esta conduta perpetuou-se predominantemente como exploração de mão-de-obra por todo o período colonial e império.

Com a descoberta de ouro em Minas Gerais, exigiu-se que fosse deslocada mão-de-obra escrava como força produtiva na extração de minérios. Assim, deslocou-se também o eixo de interesse do tráfico negreiro que antes era destinado ao litoral brasileiro e passou a fomentar o mercado no interior do país.

A partir de 1800 o movimento abolicionista começou a ganhar força em virtude de jornais e associações. Somente após a promulgação da abolição da escravatura pela Lei Áurea, assinada em 13 de maio, no ano de 1888, é que findou o período de barbárie sofrida por esta etnia.

Desse teor, cabe citar lição de Mello (2005):

Pode-se afirmar que a abolição não foi fruto da sensibilidade ou da preocupação social dos governantes da época (no caso, a princesa Isabel), mas sim evento que se consolidou a partir de pressões originárias da Inglaterra. A Europa vivia o período da 1ª Revolução Industrial, e novos mercados eram estratégicos para o escoamento de máquinas e processos industriais.

Todavia, apesar da lei libertadora, distintos estilos de perpetuar o trabalho escravo foram até hoje reiterados em nosso país.

b) Período recente

            Um dos episódios mais recentes em nosso país atrelado ao trabalho tido como escravo foi na década de 1970, mais precisamente na fase da ditadura militar. Com a ocupação da Amazônia, o governo incentivou a implantação de empreendimentos agropecuários com a abertura de fazendas na região. Estes incentivos davam-se por meio da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM), que foi extinta em decorrência de graves denúncias de desvios de verbas públicas, por iniciativa do então presidente Fernando Henrique Cardoso.

            Nesta época foram registrados inúmeros casos de trabalhadores que eram condicionados à escravidão laboral, onde trabalhavam até a morte e não tinham nenhuma alimentação fornecida. No contexto atual, encontramos alguns registros de trabalho em condição análoga à escravidão em canaviais paulistas, mas devemos registrar que em decorrência da informatização no processo de colheita, até mesmo neste setor há uma considerável redução nos casos autuados. 

Insta destacarmos que ainda hoje o Brasil é tido pela comunidade internacional como o país campeão em trabalho escravo. Todavia, não condiz com a realidade esta afirmativa, e por sua vez, tal rótulo tem o condão de prejudicar a imagem do país, impondo também restrições éticas e econômicas nem sempre justas.

É possível encontrarmos meios de escravidão humana desde os primeiros registros históricos da humanidade. Diversos povos, dentro de sua cultura, utilizaram-se da escravidão humana como forma de suprir as necessidades laborais.

Para que possamos posteriormente entender o instituto da escravidão, necessário se faz, que de forma sucinta, abordemos os aspectos evolutivos deste. Registre-se, inicialmente, que não é objeto deste estudo esgotar o tema, apenas e tão somente auxiliar a compreensão do fenômeno com informações didáticas para a real compreensão do termo escravidão.

Assim, com base nos estudos que tinham por fundamento a origem da escravidão, alguns historiadores chegaram a conclusão que mulheres e crianças caracterizam a primeira forma de escravidão, servindo aos homens na produção dos meios de subsistência e abrigo. Todavia, em decorrência do surgimento do pastoralismo, também se fez necessário que fosse implantado um suplemento maior de mão-de-obra (FINLEY, 1991).

O instituto da escravidão perpetua-se desde a antiguidade, quando a vítima era o vencido nas guerras, e, usualmente, o ser humano era tido como objeto de negociação. Grandes guerreiros, conquistadores, apropriavam-se tanto das riquezas das terras tomadas, como também das mulheres e dos homens, em especial dos jovens, ora para a satisfação dos ímpetos sexuais, ora para realização de trabalhos forçados e escambos. A compra e venda de indivíduos passou a ser considerada prática comum nas sociedades ancestrais, onde certas camadas sociais não eram consideradas detentoras de direitos e, portanto, tratadas como mercadorias e propriedades de seus senhores.

c) Tráfico de pessoas

 O Brasil ateve sua participação com o comércio do tráfico de negros para a prática laboral em minas, plantações de cana-de-açúcar, cacau, café, construções, como também afazeres domésticos. Entretanto, um aspecto que merece proeminência é o fato de que embora seu curto prazo de descobrimento, nosso país desvirtuou sua condição de importador a exportador de seres humanos, sobretudo mulheres.

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Mas, todavia, é na Tailândia que encontramos uma das piores realidades da problemática do tráfico, pois crianças podem ser comercializadas legalmente pelos “mascates”. Nesse sentido, roborando o assunto, Nogueira (2000, s.p) nos lembra:

O que acontece na Tailândia é que as crianças do sexo feminino podem ser legalmente vendidas pelos pais. Assim, naquele país existe a figura de uma espécie de mascate, o tipo de comerciante que percorria o interior brasileiro, geralmente a cavalo, vendendo artigos encontrados somente nas cidades maiores. Só que, na Tailândia, a geografia se inverte: o mascate compra as crianças no interior do país, para serem revendidas nos prostíbulos das cidades maiores. Então, uma menina de seis, oito ou 10 anos é vendida numa transação que provoca dor e choro da própria criança, de sua mãe, de seu pai ou dos avós, mas que assim mesmo se realiza pois a família, por exemplo, quer trocar o aparelho de TV branco e preto por um colorido, etc. (1º Congresso Mundial contra a Exploração Sexual e Comercial de Crianças e Adolescentes, Estocolmo,1996).    

            O tráfico de seres humanos é uma prática que se sofisticou através dos tempos, possibilitando a consolidação de redes internacionais especializadas neste tipo de delinquência. Como se depreende, em virtude de um processo de globalização extremamente veloz, pode um mesmo país ser ponto de partida, chegada ou servir de elo entre nações no tráfico.

Segundo estimativas das Organizações das Nações Unidas (ONU), esta é a terceira forma de crime mais rentável, ficando atrás somente do tráfico de drogas e armas. Com fulcro no relatório, esta modalidade criminal movimenta cerca de R$ 31,6 bilhões de dólares anuais, decorrentes do aliciamento de pelo menos dois milhões de mulheres no mundo todo. Os países industrializados obtemperam por metade dessa soma (15,5 bilhões de dólares), ficando o resto com Ásia (9,7 bilhões de dólares), países do Leste Europeu (3,4 bilhões de dólares), Oriente Médio (1,5 bilhão de dólares), América Latina (1,3 bilhão de dólares) e África (159 milhões de dólares). Estima-se que o lucro das redes criminosas com o trabalho de cada ser humano transportado ilegalmente de um país para outro chegue a 13 mil dólares por ano, podendo chegar a 30 mil dólares no tráfico internacional, segundo estimativas do escritório da Nações Unidas contra Drogas e Crime (UNODC).

2.1 ASPECTOS SOCIAIS

O desejo de escapar da miséria que aflige grande parte da população brasileira faz com que o anúncio de trabalho em outras regiões e países, seja visto como ponto de obtenção de uma vida mais digna através de uma pseudo-estabilidade financeira. Dentre as principais causas do tráfico, podemos enfatizar: pobreza, ausência de oportunidades de trabalho, violência doméstica, turismo sexual, discriminação de gênero emigração indocumentada, leis deficientes.

Nesta ânsia, mulheres são enganadas e passam a ser exploradas como mercadorias na indústria do sexo. Mesmo as mulheres sendo um maior percentual, há inúmeros casos de crianças e adolescentes que são oferecidas por seus pais ofuscados com uma promessa de melhorarem de vida. Todas estas pessoas são submetidas a regimes análogos à escravidão, sendo via exploração sexual, trabalhos sob condições abusivas, mendicância forçada e servidão involuntária de órgãos para transplantes.

O retorno ao seu país de origem torna-se uma utopia, visto que os traficantes retêm seus passaportes e outros documentos, criam dívidas permanentes além da coação de denunciá-las em alguma prática ilegal, para evitar que estas vítimas possam recorrer às Embaixadas e à justiça.

A ONU reconhece que cerca de quatro milhões de pessoas desaparecem anualmente, sobressaindo-se mulheres e crianças do sexo feminino. Aproximadamente setenta e cinco mil brasileiras encontram-se aliciadas no mercado do sexo europeu. Os dados demonstram que as “saídas” de mulheres são especialmente direcionadas para as fronteiras com países da América do Sul, Japão e Europa.

O aditamento exorbitante da prostituição e do tráfico de mulheres é mais uma sequela da crise capitalista, consumista e egocêntrica que aflige o mundo, vez que a deficiência de direitos ou a ignóbil aplicabilidade dos escassos que a massa mais pobre consegue alcançar, torna-se fator desencadeador de problemas de ordem sócioeconômicas, englobados por condições de habitação degradantes, violência doméstica, desigualdade de oportunidades e de renda perante o mercado de trabalho e preconceito social.

A pobreza do país e o rótulo vinculado à mulher brasileira, tida como exótica e concupiscente corroboram para a proliferação de um dos crimes mais sérios da atualidade que é a exploração sexual. Falsos anúncios, convites de casamento, catálogos fotográficos enviados pelo correio, promessas infundadas de trabalho altamente remunerado, contato direto/indireto com traficantes por intermédio de parentes, conhecidos ou amigos, são algumas das formas de abordagem para aliciamento das vítimas.

2.2 PERFIL

A perpetuação do comércio sexual no Brasil é fruto de um processo histórico de desigualdades sociais e injustiças. Com o desígnio de desempenhar um mapeamento no que concerne ao perfil das vítimas do tráfico e dos aliciadores, algumas instituições nacionais e internacionais concretizaram uma vasta pesquisa para auxiliar no desenvolvimento de ações de combate e prevenção dessa atividade ilícita.

Segundo estudo divulgado pela PESTRAF (Pesquisa sobre o Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial no Brasil), organizada pelas pesquisadoras Maria Lúcia Leal e Maria de Fátima Leal, coordenada pelo CECRIA – Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes, o Brasil é apontado como país originário da maioria das pessoas traficadas. Juntamente com o Ministério da Justiça (MJ) o Escritório das Nações Unidas Contra Drogas e Crime (UNODC), analisou 36 processos judiciais e inquéritos policiais nos Estados do Ceará, Goiás, Rio de Janeiro e São Paulo. As informações coletadas não surpreenderam ao assinalar que a pluralidade dos traficantes é caracterizada pelo sexo masculino. No entanto, observou-se que há igualmente uma alta presença de mulheres (43,7% dos indiciados por tráfico) que agem, sobretudo, no recrutamento das vítimas. Apontadores adjacentes a esses foram também observados em outros estudos, que aquilatou em 41% a participação feminina entre traficantes.

A pesquisa revelou ainda que o maior índice de vítimas é do sexo feminino, afrodescendentes, com idade abarcada entre os 15 e os 30 anos, solteira, com baixo nível de escolaridade, desempregada, exercendo atividades informais ou empregada no setor terciário, residente em locais periféricos das cidades, habitam com a família, têm filhos. Habitualmente padeceram de algum tipo de violência intrafamiliar (abuso sexual, estupro, atentado violento ao pudor, gravidez precoce, corrupção de menores, negligência, abandono, maus tratos, violência física e psicológica) e extrafamiliar (na rua, nas escolas, nos abrigos, redes de exploração sexual, concomitante ao uso de drogas, etc.), o que desencadeia uma vulnerabilidade destas defronte à malícia dos aliciadores.

Por sua vez, o levantamento MJ-UNODC revela que sumariamente os aliciadores homens, encontram-se na faixa etária de 30 anos, casados, com grau de escolaridade variável entre o nível médio e o superior, predominantemente brasileiros que se dizem empresários, atuando no ramo de casas de shows, bares, casas de encontros associados a um conjunto de negócios escusos, isto é, lavagem de dinheiro, drogas, contrabando, entre outros. No que concerne às mulheres aliciadoras, o fato de serem mais velhas ilusoriamente lhes afere credibilidade e autoridade para induzir as vítimas a aceitar as propostas advindas do exterior.

Insta salientar que no que tange à relação entre aliciador e vítima, nos casos em que estas já atuam como profissionais do sexo, várias são enviadas simultaneamente e geralmente não há qualquer ligação anterior com o aliciador.  Em casos de tráfico isolado, normalmente as vítimas não são prostitutas e necessariamente prevalecem relações de amizade e/ou parentesco com os aliciadores. Este fator aumenta a confiança em falsas promessas de emprego no exterior.

            Ainda que determinadas mulheres tenham ciência prévia de que o local de trabalho seja em shows eróticos ou como prostitutas, apenas ao atingirem seu destino é que descobrem que permanecerão em cárcere privado, padecerão de maus tratos, e ademais, serão coagidas a entregar grande percentual de todos os seus proveitos laborais aos “empregadores”. Registre-se ainda que, de modo geral, as vítimas deste mercado negro ficam instaladas em recintos repugnantes, vivem na clandestinidade e submetem-se a trabalhar em condições miseráveis.

            Por derradeiro, em relatório do I Seminário Internacional sobre Tráfico de Seres Humanos, LEAL e HAZEU (2.000) explanam de forma concisa:

Muitos acreditam que as mulheres foram aliciadas por serem prostitutas e, logo, carregariam uma parcela de culpa pela sua situação. Uma visão absolutamente equivocada do ponto de vista legal, uma vez que, em nenhum momento, a legislação menciona a conduta da vítima como relevante para o crime de tráfico.

 2.3 ROTAS DO TRÁFICO

O negócio da prostituição assumiu tamanha magnitude, que obrigou os governos internacionais a adotarem medidas imperativas. Turismo sexual, noivas vendidas por correspondência, prostituição em bordéis, pornografia e serviços sexuais forçados podem ser exemplos do que está conexo diretamente com o tráfico de mulheres.

As rotas do tráfico interno no Brasil atendem a demanda de atividades econômicas onde se encontra grande aglomeração de homens, como garimpos, construções de grande porte, estradas, hidrelétricas, etc. No entanto, é válido ressaltar que decorrente da multiplicação de “matéria-prima” de baixo custo ou até mesmo gratuita, há uma proliferação da escravidão humana.

No que tange às regiões Norte, Centro Oeste e à região Sul, sumariamente o meio de transporte mais utilizado nos casos de circulação via terrestre, são os táxis. Já as rotas que tem como ponto de partida via fluvial intercalado ao transporte terrestre temos destacadamente os estados das regiões Norte, principalmente o Pará e Nordeste com destino a países da América Latina bem como Europa.

Na região Norte, a prática mais comum é a da exploração sexual fluvial. Crianças e adolescentes prostituem-se em chalanas, barcos e bares na beira-rio. Já em regiões litorâneas, especialmente no Nordeste brasileiro, meninas inserem-se na vida da prostituição desde crianças. Decorrente do alto número de turistas estrangeiros, sendo que muitos destes procuram o Brasil mais pela beleza humana do que a natural, durante todo o dia e, mormente à noite, há grande quantidade de meninas e mulheres em busca de dinheiro e quiçá a possibilidade de serem convidadas para viajar a outros países, com promessas de falso matrimônio, emprego de bailarinas em casas noturnas, etc.

            Já na região sul do país, as vítimas são em sua maioria levadas para regiões de fronteira do Mercosul.

            No que diz respeito ao tráfico externo, a Espanha possui o maior percentual de mulheres brasileiras aliciadas no mercado sexual. Entretanto, cumpre-nos assinalar que há consideráveis números que reportam a países como Guiana Francesa e Suriname. A via aérea é a mais utilizada seguida pela via marítima.

2.4 EFEITO E COMBATE 

Há uma propensa dificuldade no combate à prostituição e à exploração de meninas no que tange às distintas realidades encontradas no Brasil, pois há desde jovens que vivem nas ruas, garimpos, sem qualquer estrutura familiar, até o chamado turismo sexual nas cidades do litoral, o turismo sexual fluvial, o abuso sexual dentro da própria família e a exploração em prostíbulos.

Neste aspecto, o Código Penal Brasileiro, reza nos arts. 227 a 231, que “quem induzir, atrair alguém à prostituição” ou ainda “que facilite ou impeça que alguém a abandone será punido”, e, por conseguinte, afirma ser crime promover ou facilitar a entrada no país de mulheres para prostituição, ou a saída para o estrangeiro com a mesma finalidade.

Atualmente busca-se maior aplicabilidade de ações incrementadas por diversas esferas da sociedade, voltadas a desmantelar as redes nacionais e internacionais de traficantes de mulheres e meninas, o combate ao turismo sexual por intermédio de apoio à criação de mecanismos de punição de agências que comercializam o sexo, e o fortalecimento do aparelho jurídico-policial.

Com papel primordial nesta batalha, a imprensa e a mídia em geral, tem a função não somente de informar, veiculando campanhas e programas, mas ao mesmo tempo promover debates e destarte, prover a possibilidade de uma ampla gama da população brasileira interagir e descobrir os fatos que levam ao acréscimo galopante do crime, pois, a conscientização é a principal ferramenta de ação impeditiva e a duelo à vulnerabilização que acomete as vítimas.

Portanto, mister se faz a estruturação de medidas governamentais de inclusão e justiça social e imbuídas para proscrever a impunidade, que é sentimento constante na população brasileira. Por meio de trabalhos educativos conseguiremos alertar a juventude sobre os perigos que acometerão a sua integridade física e dignidade quando se tornam vítimas desta máfia. Todas as classes sociais necessitam compartilhar de políticas de enfrentamento, à vista disso, alcançaremos sem delongas, resultados imediatos e permanentes e, quem sabe em médio prazo consigamos extirpar essa conduta que pode ser considerada como um dos mais desprezíveis crimes cometidos contra a humanidade.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O tráfico de seres humanos é um problema globalizado que demanda respostas análogas à sua dimensão para acautelar e controlar tanto a oferta, quanto a demanda da exploração sexual. É de suma importância que leis severas sejam criadas para alicerçar a luta defronte esta prática, mas, no entanto, que a certeza da aplicabilidade e execução das mesmas seja inexorável.

Para reprimirmos o desenvolvimento desta, é basilar que abracemos ações predispostas a impedir e/ou limitar, tanto qualitativa quanto quantitativamente a prosperação dos índices de vítimas traficadas para estes fins. Ressalte-se que a maior parcela destas se encontra em posição vulnerável, ora decorrente de sua condição social, ora da situação psicológica.

A retomada da valorização do ser humano agregados a pacotes de políticas públicas com o intuito da inserção das camadas mais excluídas sejam elas pela via racial, sexual ou social, são programas amortizadores dentro do paradigma da exploração, haja vista que estas vítimas não sofrem traumas físicos e psicológicos exclusivamente durante o período em que permanecem expostas aos traficantes, mas, de igual forma, continuam desprezadas por uma sociedade individualista, preconceituosa que ignora os que não conseguiram se amoldar nos patamares estabelecidos.

Ademais, o Estado deve avocar para si o suprimento no fornecimento básico em termos de educação, formação profissional e, no caso das pessoas que já se tornaram vítimas, o repatriamento destas. Destarte, que o foco seja imediatamente alterado, pois permanecendo direcionado unicamente ao efeito e negligenciando as causas, tornar-se-á inviável qualquer programa de prevenção, depreciação e, consequentemente a penalização dos traficantes, o que implica em maior insegurança pública perante este aspecto.

Em análise última, que a sociedade em geral juntamente com a mídia e o Estado, vinculem forças para respaldar e fomentar medidas que promovam a efetiva liberdade, a justiça social, a ruptura dos padrões que ensejam às desigualdades sócioeconômicas e primordialmente que protejam a dignidade da pessoa humana.

            

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial: dos crimes contra a pessoa a dos crimes contra o sentimento religioso e contra o respeito aos mortos (arts. 121 a 212). 8 ed. de acordo com a Lei n. 11.464/2007. – São Paulo: Saraiva, 2008. 2 v.

CASELLA, Paulo B. ARAÚJO, Nadia de. Integração Jurídica Interamericana. São Paulo: LTr, 1.998.

COLARES, Marcos. Diagnóstico sobre o Tráfico de Seres Humanos. São Paulo, Rio  de Janeiro, Ceará e Goiás.  Secretaria Nacional de Justiça. Brasília: 2.004.

DEL´MORO, Florisbal de Souza. Curso de Direito Internacional Público. 2ª edição, Rio de Janeiro, RJ : Forense, 2006.

FINLEY, Moses I. Escravidão antiga e ideologia moderna. Tradução de Norberto Luiz Guarinello. Rio de Janeiro: Graal, 1991.

LEAL, Maria de Fátima. HAZEU, Marcel. Relatório do I Seminário Internacional sobre Tráfico de seres Humanos. Brasília: PESTRAF/CECRIA, 2.000.

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MELLO. Solange Quintão Vaz de. Trabalho escravo no Brasil: a nova face de um antigo dilema. Universidade Presbiteriana Mackenzie. 2005. Disponível em: <http://www.tst.gov.br/Ssedoc/PaginadaBiblioteca/teses/solangequintaovazdemello.pdf>. Acesso em 26 ago. 2011.

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SIQUEIRA, Priscila. Tráfico de Mulheres. São Paulo: SMM, 2.004.

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Sobre a autora
Danielly Ferlin Silvestrini

Advogada. Pós graduada em Direito Empresarial. Pós graduanda em Direito Tributário.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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