Crianças e adolescentes em Guiné-Bissau.

Como garantir-lhes os direitos presentes na Convenção Internacional dos Direitos da Criança?

Leia nesta página:

É possível afirmar que uma efetiva construção do Direito da Criança e do Adolescente, pautado na Doutrina da Proteção Integral, constituir-se-á como um instrumento indispensável às crianças e adolescentes de Guiné-Bissau?

Primeiramente, lançamos uma pergunta que nos perturba frente a realidade de Guiné-Bissau: É possível afirmar que uma efetiva construção do Direito da Criança e do Adolescente, pautado na Doutrina da Proteção Integral, constituir-se-á como um instrumento indispensável às crianças e adolescentes deste país da  África, marcadas pelo descaso e  pela violência?

Na Guiné-Bissau existem uma série de questões violadoras à concepção/ constituição do ser criança, citem-se:  crianças mendigando pelas ruas sem irem à escola, conhecidas como as crianças “talibés”; os casamentos forçados de meninas e a mutilação genital. Tais violências apresentam-se como incompatíveis com o Estado  Democrático de Direito da Guiné-Bissau, a partir da sua independência política de Portugal, em 1973.

O presente artigo visa, portanto, questionar se é possível a proposição de um caminho, no sentido de analisarmos se é viávell a construção de uma proteção integral para as crianças e adolescentes na Guiné-Bissau.

Destacamos que nesse país crianças e adolescentes não são considerados sujeitos portadores de direitos, antes são tratados como coisas. Para tanto, basta olharmos a legislação vigente, que os categoriza como “menores”, nomenclatura esta  não mais usada por países que já construíram o conceito de crianças e adolescente como sujeitos de direitos, uma vez que o termo “menor”, específica indicação direta do menorismo, afasta a ideia da necessária proteção da infância e adolescência, uma vez que urge compreendê-los como seres peculiares em fase de desenvolvimento.

 Nesse sentido faz-se imprescindível pensar nos elementos necessários para a  construção dessa proteção, destacando que Guiné-Bissau é um Estado membro da ONU, que ratificou a Convenção Internacional dos Direitos da Criança.

A legislação interna vigente até os dias atuais nessa matéria é da Era Colonial, o Estatuto da Assistência Jurisdicional dos Menores de Ultramar, de 1971. Tal situação é de grande ambiguidade, uma vez que a ONU impõe aos Estados membros que a ratificaram, a criação de mecanismos internos para a promoção, proteção e defesa desses direitos. Partindo desta circunstância, e tendo como pano de fundo a doutrina freiriana, cuja matriz tem como escopo o paradoxo da opressão.

A ideia da proteção especial da população infanto-juvenil encontra seu marco na Declaração de Genebra de 1924, que já determinava a necessidade de se garantir à criança uma proteção especial; seguida pela Declaração Universal de Direitos Humanos das Nações Unidas de 1948 - Paris - que previa o direito a cuidados e assistências especiais à infância. Outro documento que podemos citar é a Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959, , representando princípios e não obrigações para os Estados signatários.

           Já a Convenção Americana de Direitos Humanos ou Pacto de San José, ratificada pelo Governo brasileiro em 1992, estabelece que todas as crianças têm direito às medidas de proteção que a sua condição de menor exige, por parte da família, da sociedade e do Estado (art. 19).

           As Regras de Beijyng - Resolução nº 40.33 da Assembléia Geral da ONU de 29 de novembro de 1985, estabelecem normas mínimas para a administração da Justiça da Infância e da Juventude (fazendo-se uma leitura cuidadosa dessas determinação percebe-se o quanto influenciaram o Estatuto da Criança e do Adolescente).  As Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinqüência Juvenil (Diretrizes de Riad) e as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Proteção dos Jovens Privados de Liberdade, ambos documentos aprovados na Assembléia Geral da ONU de 1990.

           Neste conjunto de documentos internacionais merece destaque a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, aprovada por unanimidade pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em sua sessão de 20 de novembro de 1989, a qual consagra a Doutrina da Proteção Integral. Segundo tal doutrina, as crianças  - compreendidos todos os seres humanos com idade inferior a 18 anos - merecem direitos especiais os quais devem ser resguardados por se encontrarem num processo de desenvolvimento e assim merecedoras de prioridade absoluta.

Para finalizarmos, entendemos que este tema merece destaque pela sua atualidade pois, infelizmente,  as violências que são aplicadas contra crianças e adolescentes guineenses não  são  violações que ocorriam em uma passado distante, antes, estão presentes no dia-a-dia de milhares de meninos e meninas que sofrem em silêncio ou são amargamente silenciadas. A mobilização social, com destaque o trabalho  realizados pelos Organismos Não-Governamentais de sensibilização em torno das práticas violadoras têm sido muitíssimo relevante, inclusive,  mostrando ao mundo o que acontece em Guiné-Bissau.

O grito necessário

O que faz a violência?

Rouba-nos da nossa dignidade.

Quebra com os paradigmas da evolução.

Sim, torna-nos bestas.

Para a violência

Não há clemência.

É o único discurso, prática

para qual não existe tolerância.

Não podemos tolerar a barbárie!

É imperiosa uma nova visão sobre humanidade.

É imperioso que nos agreguemos num único grito:

“Basta de violência”!!

(Josiane Rose Petry Veronese)

Referências:

GUINE-BISSAU. Constituição da República da Guine-Bissau. Assembleia Nacional Popular, 1996. http://www.didinho.org/Constituicaodarepublicadaguinebissau.htm. Acesso em 4 de abril de 2014.

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GUINE-BISSAU. Código Civil. Decreto-Lei nº 47.344, de 25 de Novembro de 1966. http://www.fdbissau.org/PDF_files/cod[1]-leg-ultimaversao.pdf. Acesso em 4 de abril de 2014.

GUINE-BISSAU. Assembleia Nacional Popular. Lei 12/08/2011. http://www.anpguinebissau.org/. Acesso em 4 de abril de 2014.

GUINE-BISSAU. Lei 02/08/2013. http://www.gbissau.com/?p=4453. Acesso em 4 de abril de 2014.

PEREIRA, Tânia da Silva. Direito da Criança e do Adolescente: uma proposta interdisciplinar. Rio de Janeiro: Renovar, 1996.

ROURE, Glacy Q. de. Vidas silenciadas – A violência com crianças e adolescentes. Campinas: Editora da Universidade   Estadual de Campinas – Unicamp, 1996.

SANTOS, Hélio de Oliveira. Crianças espancadas. Campinas: Papirus, 1998.

Sites pesquisados:

http://www.gaznot.com/?link=details_actu&id=802&titre=Sociedade. Acesso em 2 de junho de 2014.

http://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10127.htm. Acesso em 2 de junho de 2014.

http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/belem.htmAcesso em 2 de junho de 2014.

http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/sanjose.htm. Acesso em 2 de junho de 2014.

https://www.google.com.br/search?q=Guiné-Bissau.+Assembleia+Nacional+Popular.+Lei+12%2F08%2F2011.&oq=Guiné-Bissau.+Assembleia+Nacional+Popular.+Lei+12%2F08%2F2011.&aqs=chrome..69i57.2033j0j7. Acesso 3 de junho de 2014.

 
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Sobre as autoras
Josiane Rose Petry Veronese

Professora Titular da disciplina Direito da Criança e do Adolescente, da Universidade Federal de Santa Catarina, na graduação e nos Programas de Mestrado e Doutorado em Direito. Doutora em Direito. Pós-doutorado na Faculdade de Serviço Social da PUC/RS. Coordenadora do Curso de Direito da UFSC. Coordenadora do NEJUSCA – Núcleo de Estudos Jurídicos e Sociais da Criança e do Adolescente e sub-coordenadora do Núcleo de Pesquisa Direito e Fraternidade CCJ/UFSC. Autora de vários livros e artigos na área do Direito da Criança e do Adolescente.

Nancy Crisálida Pessoa da Fonseca da Silva Monteiro Djata

Mestranda em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina. Inspetora Coordenadora do BCN-INTERPOL-Bissau . Pesquisadora do Núcleo de Estudos Jurídicos e Sociais da Criança e do Adolescente – Nejusca e do Núcleo de Pesquisa Direito e Fraternidade CCJ/UFSC.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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