Recurso especial e reexame fático-probatório em matéria previdenciária

15/07/2014 às 17:00
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Este texto trabalho trata sobre a inviabilidade de Utilização das via do Recurso Especial em processos relativos a benefícios previdenciários, onde a controvérsia diz respeito à reanálise de fatos e provas dos autos, nos casos de comprovação da qualidade

SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 Exposição dos fatos e direito.  3 Análise sobre o tema. 4. Considerações Finais. 5. Referências.

RESUMO: Este texto trabalho trata sobre a inviabilidade de Utilização das via do Recurso Especial em processos relativos a benefícios previdenciários, onde a controvérsia diz respeito à reanálise de fatos e provas dos autos, nos casos de comprovação da qualidade de segurado especial e valoração dos laudos periciais. Conclui então sobre a necessidade de atuação prévia junto aos Tribunais nos casos apresentados.

PALAVRAS-CHAVE: Previdenciário. Recurso Especial. Súmula 7. Segurado Especial. Benefício por incapacidade. Reexame Fático-Probatório. Necessidade de Atuação prévia.

1 Introdução.

               O Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado contra a reanálise probatória, ampliando cada vez mais o alcance do dispositivo contido na Súmula 7, que veda o reexame dos fatos e provas em grau de Recurso Especial.

               No caso de processos relativos a benefícios previdenciários, onde a controvérsia diz respeito à reanálise de fatos e provas dos autos, este entendimento está cada vez mais se consolidando, especialmente nos casos de comprovação da qualidade de segurado especial e valoração dos laudos periciais.

               Assim, é cada vez mais imperiosa uma atuação prévia da equipe dos Tribunais das Procuradorias-Regionais, tanto em orientação das unidades, como de forma a interferir efetivamente nos julgamentos, tendo em vista que provavelmente a 2ª. instância será a última e definitiva.

2 Análise do tema.

             Das decisões dos Tribunais-Regionais Federais que contrariarem tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência (art. 105, III, a, Constituição Federal) ou ainda que derem a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal (art. 105, III, a, Constituição Federal), cabe Recurso Especial, previsto no próprio artigo 105 da Constituição Federal e regulado pelos artigos 541 e seguintes do Código de Processo Civil:

Art. 541. O recurso extraordinário e o recurso especial, nos casos previstos na Constituição Federal, serão interpostos perante o presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido, em petições distintas, que conterão: (Revigorado e com redação dada pela Lei nº 8.950, de 13.12.1994)

I - a exposição do fato e do direito; (Incluído pela Lei nº 8.950, de 13.12.1994)

Il - a demonstração do cabimento do recurso interposto; (Incluído pela Lei nº 8.950, de 13.12.1994)

III - as razões do pedido de reforma da decisão recorrida. (Incluído pela Lei nº 8.950, de 13.12.1994)

Parágrafo único.  Quando o recurso fundar-se em dissídio jurisprudencial, o recorrente fará a prova da divergência mediante certidão, cópia autenticada ou pela citação do repositório de jurisprudência, oficial ou credenciado, inclusive em mídia eletrônica, em que tiver sido publicada a decisão divergente, ou ainda pela reprodução de julgado disponível na Internet, com indicação da respectiva fonte, mencionando, em qualquer caso, as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados (Redação dada pela Lei nº 11.341, de 2006).

             Ocorre que, diariamente, nos deparamos com diversas situações onde a controvérsia existente nos autos cinge-se a análise de matéria fática, como, por exemplo, a comprovação da qualidade de segurado especial e valoração dos laudos em benefícios por incapacidade.

             Dentre estas questões, apresentam-se os casos da comprovação da qualidade de segurado especial propriamente dita (Lei 8213/91, 11, VII), descaracterização do regime em razão da renda familiar (Lei 8213/91, 11, VII, §º1º) e existência de vínculo urbano em nome do autor (Lei 8213/91, 11, §9º).

             Nestes casos, desde as vias ordinárias, a Procuradoria sustenta a ausência de direito ao benefício por faltar-lhe um dos requisitos, qual seja a comprovação da qualidade de segurado especial em regime de economia familiar.

             Ocorre que, ao acionar as vias extraordinárias, os Recursos apresentados tem sido sistematicamente devolvidos, sob o fundamento do pretenso reexame de prova, vedado pela Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça.

             Chama a atenção que há reiteradas decisões que tem negado seguimento aos Recursos Especiais apresentados, quando o objeto de discussão diz respeito à comprovação da qualidade de segurado e/ou valoração dos laudos em processos de benefícios por incapacidade.

             E, finalmente, que de fato a matéria se enquadra como reexame de matéria fática, entende-se que não há recurso cabível nas situações apresentadas, conforme delineamento a seguir.

3 Análise sobre o tema.

O Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento que de que, a análise de fatos em Recurso Especial demandaria reexame do acervo fático-probatório constante dos autos, incorrendo no óbice previsto na Súmula 7 do mesmo Tribunal.

Nestes casos, enquadra na vedação os casos em que se discute a comprovação da qualidade de segurado quanto à descaracterização desta qualidade (dentro do conceito de regime de economia familiar) em razão de renda auferida por membros da família ou vínculo urbano do autor.

O STJ tem admitido apenas o processamento dos Recursos Especiais, no caso da comprovação da qualidade de segurado especial, apenas em casos restritos, como por exemplo quando parte autora utiliza-se apenas de documentos de terceiro urbano, quando esta questão está devidamente enfrentada desde a primeira instância.

À título exemplificativo podem ser destacados os acórdãos proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça, com ementa transcrita abaixo:

Comprovação da qualidade de segurado, ressalvado no caso da impossibilidade de extensão dos documentos do membro urbano.

AGARESP 201301168501. DJE:06/09/2013

Resp 1304479/SP. DJe: 19/12/2012.

Descaracterização do regime de economia familiar por renda de membro da família.

REsp 1304479/SP. DJe: 19/12/2012.

Existência de vínculo urbano em nome do autor, quando o Tribunal entende que não descaracteriza a condição de segurado especial.

AgRg/REsp 1226030/SC DJe 09/12/2013.

Para uma melhor elucidação, transcrevem-se as ementas:

EMEN: PREVIDENCIÁRIO - AGRAVO REGIMENTAL - aposentadoria-por-idade" data-type="category">APOSENTADORIA POR IDADE - RURAL - INICIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO COM PROVA TESTEMUNHAL - VÍNCULO URBANO DO MARIDO - APRESENTAÇÃO DE OUTROS DOCUMENTOS EM NOME PRÓPRIO - NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DA CONDIÇÃO DE SEGURADA ESPECIAL - PRECEDENTES. 1. Para concessão de aposentadoria rural por idade, o labor campesino deve ser demonstrado por início de prova material corroborado por prova testemunhal, ainda que de maneira descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento, pelo número de meses idêntico à carência. 2. A qualificação do marido na certidão de casamento como lavrador estende-se à esposa. No entanto, é firme a jurisprudência que estabelece a impossibilidade de estender a prova em nome do cônjuge que passa a exercer trabalho urbano, devendo ser apresentada prova material em nome próprio da demandante (Resp 1.304.479/SP, recurso submetido ao rito do 543-C do CPC). 3. Na hipótese dos autos, foram apresentados documentos tanto em nome do cônjuge quanto em relação à autora, todos próprios à demonstração do labor campesino por ela exercido, no período de carência. 4. Agravo regimental não provido.

“RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.

1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.

2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.

3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ). RECURSO ESPECIAL Nº 1.304.479 - SP (2012/0011483-1). Primeira Seção”.

PROCESSUAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL POR IDADE DE TRABALHADORA RURAL. ATIVIDADE URBANA. DESCARACTERIZAÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL. REVISÃO. SÚMULA 07/STJ.

I - Verificar se o vínculo urbano é suficiente para descaracterizar a condição de segurado especial e averiguar a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar incumbem às instâncias ordinárias à luz do óbice contido na Súmula 7/STJ. Precedente: REsp 1304479/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012, sob o regime dos recursos repetitivos. Quinta Turma.

No caso dos benefícios por incapacidade, não é outro o entendimento. Podem ser destacados os acórdãos proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça, com ementa transcrita abaixo:

Ausência de incapacidade

AGRESP - 1336269. DJE DATA:21/02/2014.

Incapacidade preexistente

AGARESP 201302944775. DJE DATA:06/12/2013.

Laudo do assistente técnico

AGARESP 201103038290. DJE DATA:02/08/2013

“EMEN: PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. QUALIDADE DE SEGURADO. MANUTENÇÃO. JUÍZO FIRMADO EM LAUDO PERICIAL. DESCONSTITUIÇÃO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. 1. Tendo o Tribunal de origem firmado seu entendimento com base em laudo pericial, desconstituir tal julgado ensejaria a reavaliação da referida prova técnica, o que é obstado pelo teor da Súmula 7/STJ. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. AGRESP 201201566188”.

“EMEN: PREVIDENCIÁRIO. Agravo Regimental. TERMO INICIAL. BENEFÍCIO. AUXILIO-ACIDENTE. JUNTADA DO LAUDO PERICIAL. AUSÊNCIA. CERTEZA. MOMENTO. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7 DO STJ. 1. Descabe ao Superior Tribunal de Justiça verificar se a recorrente já se encontrava incapacitada para o trabalho por ocasião do requerimento administrativo, sem examinar o contexto fático-probatório dos autos. Incide, na espécie, a Súmula 7/STJ. 2. Agravo Regimental não provido. AGARESP 201302944775”.

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“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ADOÇÃO DE LAUDO DO ASSISTENTE TÉCNICO. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO DO MAGISTRADO. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7 DO STJ. INOVAÇÃO RECURSAL. INADMISSÍVEL. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A aposentadoria por invalidez, prevista no art. 42 da Lei 8.213/91, deve ser concedida quando verificada a incapacidade do segurado e a impossibilidade de sua reabilitação para o exercício de outra atividade laboral que lhe garanta o sustento. 2. A adoção de laudo apresentado por assistente técnico ao invés do laudo oficial encontra-se em consonância com o princípio do livre convencimento motivado que deve nortear as decisões do juízo. 3. Os requisitos autorizadores da concessão do benefício previdenciário foram verificados por meio do contexto fático-probatório dos autos cujo reexame é vedado na via especial. Incidência da Súmula 7 do STJ. 4. No tocante aos aspectos sociais observados no momento da concessão do benefício previdenciário, tal pretensão não foi deduzida nas razões do recurso especial configurando inovação recursal, o que é inadmissível ante à preclusão consumativa. AGARESP 201103038290”.

              Em todos estes processos houve o trânsito em julgado. Atualmente, os Recursos e Agravos do art. 554/CPC sobre os temas apresentados não têm sido admitidos, culminando também no transito em julgado dos processos.

              Verifica-se que esta tendência do Superior Tribunal de Justiça está em harmonia com a celeridade processual e premente necessidade de redução da litigiosidade, trazendo para as instâncias ordinárias a análise fática sobre o caso concreto. São lições do mestre Fred Didier Jr., em Curso de Direito Processual Civil, Fred Didier Jr., vol. 1, Ed. Jus Podivm, p. 265/266:

“Considera-se questão de fato toda aquela relacionada aos pressupostos fáticos da incidência; toda questão relacionada à existência e às características do suporte fático concreto, pouco importa se, examinada pela perspectiva do objeto, é questão de fato ou questão de direito. Por exemplo: toda questão relacionada à causa de pedir será considerada questão de fato”.

              Portanto, matérias atinentes à causa de pedir em processos previdenciários, como por exemplo a comprovação da qualidade de segurado especial, desconsideração desta, ou ainda análise e valoração de laudos periciais em benefícios por incapacidade, devem ser fortemente debatidas nas instâncias ordinárias, pois, em regra, esbarram no óbice da Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça.

4. Considerações Finais.

     Enfim, diante do quadro exposto, entende-se que é o entendimento disposto na Súmula 7 é óbice intransponível para interposição dos Recursos Especiais, nos processos nos quais a controvérsia gira em torno da comprovação do requisito incapacidade, através da análise da prova pericial, como por exemplo: 1– descaracterização da qualidade de segurado especial em razão de renda de membro da família; 2 – existência de vínculo urbano em nome do autor, quando o Tribunal entende que não é suficiente para descaracterizar a condição de segurado especial.

     Da mesma forma, nos casos: 1 - ausência de incapacidade; 2 - incapacidade preexistente; 3 - utilização de laudo do assistente técnico, ressalvada a interposição da medida prevista no art. 535 do Código de Processo Civil, quando cabível.

Cumpre esclarecer que esta posição diz respeito apenas a adoção de medidas junto ao Superior Tribunal de Justiça, em grau de Recurso Especial, não importando em desistência ou abandono da tese nas vias ordinárias. Pelo contrário, nestes casos a atuação deve ser cada vez mais específica e reforçada desde o 1º. Grau.

No âmbito dos Tribunais, o ideal é que tais matérias sejam tratadas de forma prévia, com apresentação de memoriais e sustentações orais nos casos cabíveis, tendo em vista que provavelmente será a última oportunidade de interferir de fato no julgamento da demanda.

5. Referências.

               Didier Jr., Fredie. Curso de Direito Processual Civil, vol. 1, Ed. Jus Podivm. Salvador: 2014.

www.stj.jus.br/SCON

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8213cons.htm

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