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Execução de débitos de pequeno valor:

análise pós-Emenda Constitucional nº 37

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4. Síntese do texto

A leitura aqui realizada vem resolver o problema crucial que é pretender transformar-se a execução de débitos judiciais de pequeno valor contra a fazenda, numa especial modalidade de execução por quantia certa contra devedor solvente, o que implicaria na possibilidade de se realizar a penhora de bens públicos, especialmente dinheiro da conta única, por ser fácil de localizar, que independente neste caso ser bem fungível, também é um bem público, que o Estado usa para atender às necessidades da coletividade, como todo bem público, e aqui neste caso é irrelevante se o juízo denominar de "apreensão", "bloqueio" etc, pois nada mais seria que uma penhora, como vêm constando nos mandados recebidos pelo ente público.

Como destacamos em texto anterior, antes de tudo, a natureza jurídica da Penhora como ato de constrição sobre o bem e que o prepara para a expropriação pelo Estado-Juiz é incompatível com a natureza dos bens públicos, e mesmo plenamente vigente a regra do § 3ª do Art. 100 da CF, não afasta esta impenhorabilidade e inalienabilidade dos bens públicos. Pois o ATO DA PENHORA, ou outro assemelhado, não é apenas um procedimento que visa garantir a execução, mas é um ato que o fim precípuo é identificar o bem que será EXPROPRIADO pelo Estado-Juiz, identificado mediante a invasão do patrimônio do executado, de forma a satisfazer os créditos do exeqüente, regra geral mediante a alienação judicial do bem.

Logo, fica evidente, que o ato da penhora ou outro assemelhado, sendo apenas preparatório e em sendo admitido contra a Fazenda Pública, se estará ipso facto permitindo a expropriação e alienação de bens públicos. Decorrentes desta lógica teria um caso em que seria de se questionar se os bens públicos podem ser expropriados e alienados, ainda que pelo Estado-Juiz ?.Somos forçados a concluir que não. Com efeito, mesmo com a EC/30, e como demonstramos da Leitura da EC/37, não existe qualquer norma no ordenamento jurídico-constitucional que tenha revogado o artigo 67 do Código Civil que, após o artigo 66, ter definido os bens públicos, expressa que "Os bens que trata o artigo antecedente só perderão a inalienabilidade, que lhes é peculiar nos casos e forma que a lei prescrever". Por isso que o art. 648, I do CPC, decreta expressamente que são absolutamente impenhoráveis os bens inalienáveis, sendo evidente que os bens públicos dado a sua afetação à satisfação dos interesses da comunidade são inalienáveis pelo administrador que não pode dispor deles, senão na forma prevista em lei, temos que eles são também ABSOLUTAMENTE IMPENHORÁVEIS, INAPREENSÍVEIS ETC, pelo Estado-Juiz, pois isto implicaria um caso em que o poder judiciário poderia realizar a expropriação de bens do poder executivo, e, portanto da coletividade que ele representa.

As regras de direito processual não podem violar ou serem interpretadas de forma a violar as regras muito específicas e particulares do direito administrativo, ou que regem o atuar da administração pública e, portanto, as especiais regras sobre a gerência e natureza jurídica dos bens a que o administrador está obrigado e bem gerir como dever-função na salvaguarda do interesse público, ainda mais que não existe regra constitucional que o ampare, e que pelo contrário, há regra constitucional que justamente apresenta o modo como deve ser realizada a execução, compatível com a natureza dos bens públicos.

Portanto, a penhora de bens públicos ou qualquer outro ato de constrição sobre estes bens é incompatível com as regras do direito administrativo-constitucional, que ditam a sua inalienabilidade, que alcançam o próprio estado-juiz que não pode realizar a expropriação de bens públicos, posto isto viola regras básicas de compatibilidade entre os dois ramos do direito público.

Logo, a nossa interpretação, além de salvaguardar os termos da Emenda 37, afastando a violação direta e literal do § 4º. do Art. 100, e, ainda, dos arts. 86 e 87 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, evita a NULIDADE DA PENHORA, APREENSÃO, BLOQUEIO etc de bens públicos de qualquer natureza, para satisfação de débitos judiciais de qualquer valor, por que incompatível com a natureza dos bens públicos, estabelece uma interpretação que torna íntegra e indene de dúvidas o procedimento legalmente previsto, para a quitação dos débitos judiciais de pequeno valor, expresso no § 3º. do art. 100 da CF, que deve realizar-se por meio de requerimento administrativo, precatório judiciário, uma vez inexistente qualquer forma de impugnação judicial, a ser realizado pelo Presidente do Tribunal, após solicitado pelo juízo exeqüente, e dirigido ao titular do poder executivo, para que assim, realize o pagamento devido.


5. Bibliografia consultada

BARROS, Humberto Gomes de Barros: Execução Contra a Fazenda Pública. In 1º. Congresso Brasileiro de Advocacia Pública. Advocacia e Sociedade. Ano 2. n° II, IBAP. São Paulo : Max Limonad. 1998.

DIAS, Luiz Cláudio Portinho." A Questão da Dispensa do Precatório nas Execuções Contra a Fazenda Pública.". In FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de & NUZZI NETO, José. Temas de Direito Constitucional. Estudos em homenagem ao advogado público André Franco Montoro. Rio de Janeiro: Esplanada.2000.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução Civil. 4 ed. São Paulo : Malheiros. 1994.

_________Fundamentos do processo civil moderno, Tomo I e II, 4 ed, São Paulo: Malheiros, 1998.

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MEIRELLES, Hely Lopes.Direito Administrativo Brasileiro, 19ª Ed.São Paulo: Malheiros, 1994.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de.Curso de direito administrativo, 10 ed. São Paulo: Malheiros, 1998.

ROCHA, Ibraim.Clamor de um advogado público: execução de débitos de pequeno valor contra a fazenda pública, art. 100, § 3º urgência de uma medida provisória e sua possibilidade art. 246 da CF. In: Síntese Jornal,v.4, n.49, mar., 2001.p. 11 – 14 / In:LTR, v.65, n.7,jul.,2001,p. 801-805;

________Penhora de bens públicos na execução de débitos judiciais de pequeno valor ?, In Síntese Jornal, ano 4, 52, Porto Alegre: Síntese.2001; 4.12 –4.13 ; In.L&C. Revista de direito e administração pública.Ano IV, 37, Brasília: Consulex, Julho 2001;

SANTOS, Moacir Amaral dos.Primeiras linhas de direito processual civil, 3º. vol, São Paulo:Saraiva, 1985.

THEODORO JUNIOR, Humberto. Processo de execução, 20 ed, São Paulo: Leud, 2000.


Notas

1. Confira Clamor de um advogado público: execução de débitos de pequeno valor contra a fazenda pública, art. 100, § 3º urgência de uma medida provisória e sua possibilidade art. 246 da CF. In: Síntese Jornal,v.4, n.49, mar., 2001.p. 11 – 14 / In:LTR, v.65, n.7,jul.,2001,p. 801-805; Penhora de bens públicos na execução de débitos judiciais de pequeno valor ?, In Síntese Jornal, ano 4, 52, Porto Alegre: Síntese.2001; 4.12 –4.13 ; In.L&C. Revista de direito e administração pública.Ano IV, 37, Brasília: Consulex, Julho 2001;

2. Art. 128. As demandas judiciais que tiverem por objeto o reajuste ou a concessão de benefícios regulados nesta Lei cujos valor de execução não forem superiores a R$ 5.180,25(cinco mil, cento e oitenta reais e vinte e cinco centavos), por autor poderão, por opção de cada um dos exequentes, ser quitadas no prazo de sessenta dias após a intimação do trânsito em julgado da decisão, sem necessidade da expedição de precatório. (Redação dada pela Lei n° 10.099, de 19.12.00) (grifo nosso)

3. Premissas estas que apresentei no texto Penhora de bens públicos na execução de débitos judiciais de pequeno valor ?, In Síntese Jornal, ano 4, 52, Porto Alegre: Síntese.2001; 4.12 –4.13 ; In.L&C. Revista de direito e administração pública.Ano IV, 37, Brasília:Consulex, Julho 2001; onde aponto a impossibilidade de formas de apreensão direta do patrimônio público, dada a sua inalienabillidade e impenhorabilidade.

4. Regimento Interno do TST: Capítulo III-Da Execução contra a Fazenda Pública-Art. 408 - A execução por quantia certa, fundada em decisão proferida contra a Fazenda Pública, far-se-á mediante precatório de requisição de pagamento das somas devidas em moeda corrente;§ 1º - Em se tratando de condenação da Fazenda Pública -Federal, o precatório será dirigido ao Presidente do TST;§ 2º - Nas condenações da Fazenda Pública Estadual ou do Distrito Federal, o precatório será dirigido ao órgão competente da Pessoa Jurídica de Direito Público condenada, conforme o caso;§ 3º - Recaindo a condenação sobre a Fazenda Pública Municipal, o precatório será dirigido ao Prefeito Municipal;§ 4º - Quando se tratar de condenação de Autarquia ou Fundação instituída pelo Poder Público, o precatório será dirigido à respectiva entidade condenada ou ao órgão competente centralizador das requisições de pagamento; Art. 409 - Nas execuções processadas pelas Juntas de Conciliação e Julgamento ou por Juízo de Direito investido de jurisdição trabalhista, o precatório será encaminhado ao presidente do TRT da jurisdição, que o dirigirá mediante ofício, à autoridade competente ou entidade requisitada;410- No âmbito do Tribunal, o procedimento alusivo ao precatório constará de ato expedido pelo Presidente do Tribunal.

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Sobre o autor
Ibraim José das Mercês Rocha

advogado, procurador do Estado do Pará, mestre em Direito pela UFPA, secretário do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública no Pará, ex-diretor do departamento jurídico do Instituto de Terras do Pará (ITERPA)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROCHA, Ibraim José Mercês. Execução de débitos de pequeno valor:: análise pós-Emenda Constitucional nº 37. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 57, 1 jul. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3035. Acesso em: 25 abr. 2024.

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