Introdução
Esse tema considerado polêmico por toda a comunidade jurídica nacional, gerando sérias divergências nas vias judiciais, vislumbrando discussão quanto o verdadeiro sentido das normas, além de interpretação e posicionamento que melhor se coadunam com o paradigma do Estado Democrático de Direito.
O Ministério Público em atuação direta na investigação criminal age de forma autocrática e contrária às suas próprias funções institucionais, gerando violação aos princípios e garantias individuais previstos na Constituição.
Em primeiro lugar, sabe-se que o Ministério Público pode investigar, assim como a imprensa pode e investiga, e o particular também.
A Constituição Federal de 1988 atribuiu ao Ministério Público uma importante relevância no Ordenamento Jurídico Constitucional brasileiro, sendo que lhe assegurou a titularidade exclusiva da ação penal pública (art. 129, I), e lhe atribuiu o poder de expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva (art. 129, VI); requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial (art. 129, IX).
Porém, é necessário frisar que o pilar do Estado Democrático de Direito é a proteção jurídico-constitucional individual como garantia fundamental.
Interpretação Constitucional
A Constituição possui a sua força normativa dependente grandemente da atualidade de suas normas, devendo sempre acompanhar a dinâmica da sociedade, preservando, para tanto, seus valores fundamentais.
A interpretação constitucional, nesse contexto, deve estar sempre atrelada à realidade social, não sendo possível uma visão historicista de seu conteúdo, uma vez que existiria o risco de produzir decisões estranhas ao paradigma atual.
A constituição do Estado, considerada sua lei fundamental, seria, então, a organização dos seus elementos essenciais: um sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras, que regula a forma do Estado, a forma de seu governo, o modo de aquisição e o exercício do poder, o estabelecimento de seus órgãos, os limites de sua ação, os direitos fundamentais do homem e as respectivas garantias. Em síntese, a constituição é o conjunto de normas que organiza os elementos constituintes do Estado. (SILVA, José Afonso, 2006).
A Constituição Federal é suprema, não sendo possível que normas inferiores a contrariem. Nesse sentido, as interpretações realizadas não podem ser adversas a real intenção do legislador constituinte. Além disso, deve ser concebida por uma conexão de sentido, um conjunto de valores. Assim, é necessário realizar uma conjunção do sentido sociológico, político e jurídico do texto constitucional.
a Constituição é o conjunto de normas pertinentes à organização do poder, à distribuição da competência, ao exercício da autoridade, à forma de governo, aos direitos da pessoa humana, tanto individuais como sociais. (BONAVIDE, Paulo. 2005)
Lênio Luiz Streck ensina que concretizar a hermenêutica jurídica nada mais é do que realizar um processo de compreensão do Direito, e para tanto devemos desconfiar do mundo e de suas certezas. O fato de a Constituição Federal de 1988 ter conferido ao Ministério Público a função e atribuição de exercer o controle externo da atividade policial, isso, não faz da Polícia uma instituição subordinada, nem atribui à referida Instituição a função de conduzir as investigações criminais, sendo que o legislador constitucional, apenas, explicitou o que se encontra inserido nas funções da instituição, já incumbida de zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, devendo para tanto promover as medidas necessárias.
Batochio, em seu artigo “Ponta do iceberg, Considerações sobre a investigação criminal pelo MP”, pondera acerca da correta interpretação que deve ser realizada do texto constitucional.
Da dicção do art. 144 da Constituição Federal a única leitura exegética possível é que compete à polícia judiciária a função investigatória, através da realização de diligências prévias e da colheita de elementos probatórios sobre fatos que constituem crime em tese.
Ao Parquet, titular privativo da ação penal pública, nos termos do art. 129 da Carta Magna, que disciplina suas funções institucionais, compete promover o inquérito civil público (inc. III), exercer o controle externo da atividade policial (inc. IV) e requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial. O regramento é explícito et in claris cessat interpretatio!
Estes, precisamente estes, os limites constitucionais das competências, das atribuições institucionais, da polícia judiciária de um lado, e do Ministério Público de outro. Quaisquer outras funções que se pretenda deferir-lhes, através de leis infraconstitucionais, acima ou a latere das opções axiológicas da Charta Magna, se operam fora da ordem constitucional, em desabrida afronta à soberania do povo brasileiro estratificada na Lei Máxima.
É que, como consabido, a regra suprema não pode ser lida de acordo com lei subalterna, mas esta é que deve ser interpretada a partir do texto da Constituição, consoante pontificou o Ministro do STF, Sepúlveda Pertence: “As leis é que se devem interpretar conforme a Constituição e não ao contrário. (RT 680/416)”. Assim, se a Constituição, que é o lineamento do sistema processual penal, estabelece limites funcionais dos órgãos estatais da persecução, é precisamente dentro desses lindes que se deve pautar a atividade de cada um. (BATOCHIO, 2006)
(...)
Na esfera criminal, quis o Legislador Máximo a atribuição do Ministério Público em matéria de investigação penal se limitar à faculdade de requisitar a instauração de inquérito, bem como de diligências em seu bojo. Igualmente dispôs competir ao Parquet à fiscalização externa das atividades policiais, o que se não confunde com a direção do inquérito policial, atribuição exclusiva da polícia judiciária (ressalvadas as exceções constitucionais). Di-Ic incontrastavelmente, a Lex Legum.
Como se vê, não lhe é dado – à luz da ordem constitucional – promover, presidir, comandar, conduzir, chefiar, segundo seus próprios critérios, investigação criminal, tarefa esta expressamente atribuída à polícia judiciária. (BATOCHIO, 2006).
Os princípios constitucionais do contraditório e do devido processo legal devem desta maneira, ser rigorosamente observados para que seja válido todo o procedimento processual instaurado para satisfação do jus puniendi do Estado, sendo, deste modo, incompreensível, e não mais do que inconstitucional, permitir que o mesmo órgão legitimado da acusação seja, também, o detentor dos poderes para produção do conteúdo probatório, base da ação penal.
Os Tribunais têm firmado entendimento de que as provas produzidas unilateralmente pela parte acusatória são desprovidas de qualquer valor, pois acarretam flagrante desequilíbrio processual, evidenciando a impossibilidade do acúmulo das funções de investigar e acusar:
No processo penal, como órgão promovente da ação penal pública, o Ministério Público é parte, cabendo-lhe a função de acusar.
Investigar e apurar infrações penais e sua autoria é atribuição policial. (C.F. arts. 144, §§ 1º e 4º; C.P.P., art. 4º).
(BRASIL. TRF 3ª REGIÃO, REL. DES. JOSÉ KALLÁS, HABEAS CORPUS nº 90.03.37634-4).
Ou ainda:
O Ministério Público é o guardião da Ordem Jurídica, mas, separando a Constituição Federal as funções constitucionais e entregando, expressamente as de investigação criminal e, em certas hipóteses, a outros órgãos, a Polícia Judiciária, não tem o Parquet legitimidade para proceder à investigação preparatória da ação penal, já que a ele também se confere o poder de requerer o arquivamento da documentação dos fatos, situação que o tornaria ao mesmo tempo o autor e o juiz da demanda, em verdadeiro sistema inquisitório vedado pela Carta da República.
(BRASIL. TJRJ, HC nº 597/01-RJ, REL. DES. VALMIR DE OLIVEIRA SILVA, 15/05/2001)
PENAL - CRIME DE estelionato - ART. 171, CAPUT, DO CP - MINISTÉRIO PÚBLICO - PODER DE INVESTIGAR - LEGALIDADE - PRELIMINARES REJEITADAS - AUTORIA E MATERIALIDADE - COMPROVAÇÃO - SENTENÇA MANTIDA - VOTO VENCIDO PARCIALMENTE. Apresenta-se competente o Ministério Público para conduzir diligências investigatórias, restando afastada a alegada nulidade. Afasta-se a alegada nulidade da sentença quando não comprovados os vícios apontados. A obtenção para si ou para outrem de vantagem ilícita em prejuízo alheio, por induzir ou manter alguém em erro mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento, impõe ao denunciado a condenação pelo crime de estelionato previsto no art. 171 do CP.V.V.: A Constituição da República, em seu art. 129 - onde trata das funções do Ministério Público - determina àquele órgão a atribuição de 'promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses' (inciso III); O texto constitucional, no art. 144, § 4º, ao tratar das polícias civis, dá-lhes a incumbência de 'ressalvada a competência da União, as funções e polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares. Não há previsão legal para que o órgão ministerial promova colheita de prova destinada à 'opinio delicti'. Ao exercer tal atividade, o Ministério Público estará exorbitando sua atribuição constitucional, já que não lhe foi dada legitimidade para produzir o inquérito penal; o inquérito penal, destinado à formação da 'opinio delicti' do titular da ação penal, é prerrogativa da autoridade policial. Por determinação constitucional.
(...) (BRASIL. TJMG, Apelação Criminal n° 1.0701.03.055888-9/001, REL. DÊS. WALTER PINTO DA ROCHA18/04/2007)
O Ministro Nelson Jobim, no julgado STF, RHC 81326 / DF, de 01/08/2003 e Sepúlveda Pertence, no julgado do STF, RE nº 427349/GO, de 19/12/2006, manifestaram o mesmo entendimento.
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. MINISTÉRIO PÚBLICO. INQUÉRITO ADMINISTRATIVO. NÚCLEO DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL E CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL/DF. PORTARIA. PUBLICIDADE. ATOS DE INVESTIGAÇÃO. INQUIRIÇÃO. ILEGITIMIDADE. 1. PORTARIA. PUBLICIDADE A Portaria que criou o Núcleo de Investigação Criminal e Controle Externo da Atividade Policial no âmbito do Ministério Público do Distrito Federal, no que tange a publicidade, não foi examinada no STJ. Enfrentar a matéria neste Tribunal ensejaria supressão de instância. Precedentes. 2. INQUIRIÇÃO DE AUTORIDADE ADMINISTRATIVA. ILEGITIMIDADE. A Constituição Federal dotou o Ministério Público do poder de requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial (CF, art. 129, VIII). A norma constitucional não contemplou a possibilidade do parquet realizar e presidir inquérito policial. Não cabe, portanto, aos seus membros inquirir diretamente pessoas suspeitas de autoria de crime. Mas requisitar diligência nesse sentido à autoridade policial. Precedentes. O recorrente é delegado de polícia e, portanto, autoridade administrativa. Seus atos estão sujeitos aos órgãos hierárquicos próprios da Corporação, Chefia de Polícia, Corregedoria. Recurso conhecido e provido. (BRAIL. STF – 2ª Turma, RHC 81326 / DF, REL. DÊS. NELSON JOBIM, DJ 01-08-2003, PP-00142, EMENT VOL-02117-42 PP-08973).
Ministério Público
O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127 da Constituição Federal de 1988).
Na doutrina existem aqueles que o incluem no Poder Judiciário, embora seja órgão não jurisdicional, mas sempre independente do Poder Executivo. Contudo, a maioria o tem como órgão do Poder Executivo, uma vez que faz executar as Leis através do Judiciário, embora reconheçam suas funções autônomas, independentes, próprias e constitucionais, com parcela da soberania do Estado.
É, deste modo, incontestável dizer que o Ministério Público constitui órgão constitucional, possuindo um título na Constituição do Brasil, sendo que, a Instituição está estruturada de acordo com a Lei nº 8.625 de 12/02/1993, já devidamente adaptada à Constituição Federal de 1988 e pelas Leis Estaduais. Inclusive o Ministério Público da União regido pela Lei Complementar nº 75, de 20/05/1993.
A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 127 dispõe ser o Ministério Público uma instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, sendo que a Lei nº 8.625/93 corrobora com essa afirmação quando reproduz o inteiro teor do citado artigo constitucional em seu artigo 1º. Enquanto órgão do Estado e integrante do poder público possui como função constitucional defender a ordem jurídica e não tão somente interesses acusatórios.
Julio Fabbrini Mirabete, em sua obra Processo Penal de 2005, 17ª edição, cita um dizer de Geraldo Ataliba que serve para melhor esclarecermos quanto à posição do Ministério Público, in verbis:
(...) pode-se concluir que o Ministério Público faz parte do Poder Estatal que, como se viu, é UNO, sem, contudo, integrar ou ligar-se a qualquer um dos três Poderes públicos. Dada a posição adotada pela Constituição de 1988, que o alçou de vez e em última instância, como função independente. A Carta Magna assim quis e determinou, por vislumbrar, como já o faziam diversos publicistas, que o Ministério Público exerce a defesa ‘não do Estado, mas da sociedade.
. O Parquet não possuía o mesmo enfoque dado pela Carta de 1988, perceba-se que a Constituição de 1891 nada mencionou sobre Ministério Público, a não ser para dizer que um dos membros do Supremo Tribunal Federal seria designado Procurador-Geral da República, entretanto a Lei 1.030, de 1890 já o organizava como instituição. A Constituição de 1934, não avançou muito, o considerou como órgão de cooperação nas atividades governamentais. A Constituição de 1946, por sua vez, reservou-lhe um título autônomo e a de 1967 o incluía numa seção do capítulo do Poder Judiciário e a sua Emenda 1/69 o situou entre os órgãos do Poder Executivo.
A Constituição de 1988, todavia, lhe dá o relevo de “instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis” (art. 127).
Persistiria, deste modo, a divergência doutrinária quanto a posição do Ministério Público no cenário da Teoria dos 3 (três) poderes.
Corroborando com o posicionamento, ora citado de Julio Mirabete, José Afonso da Silva, em sua obra Curso de Direito Constitucional Positivo menciona as palavras de Marques,
(...) não é aceitável a tese de que alguns que querem ver na instituição um quarto poder do Estado, porque suas atribuições, mesmo ampliadas aos níveis acima apontados, são ontologicamente de natureza executiva, sendo, pois, uma instituição vinculada ao Poder Executivo, funcionalmente independente, cujos membros integram a categoria dos agentes políticos e, como tal, hão de atuar. (SILVA, 2006)
A legislação atual buscou ampliar as funções e a importância do Ministério Público para a sociedade, veja-se o artigo 257 do Código de Processo Penal que dispõe ser sua responsabilidade a promoção e fiscalização da execução da Lei.
Art. 257. O Ministério Público promoverá e fiscalizará a execução da lei. (Código de Processo Penal)
A Constituição Federal o transformou em verdadeiro defensor da sociedade, elencando em seu artigo 129 suas funções institucionais:
I – promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;
II – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;
III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;
IV – promover a ação de inconstitucionalidade ou representação para fins de intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos nesta Constituição;
V – defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas;
VI – expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva;
VII – exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior;
VIII – requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais;
IX – exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas.
O Ministério Público, como se pode inferir do texto constitucional, é o titular da ação penal pública, ou seja, figura no pólo ativo da pretensão punitiva do Estado quando esta é levada a juízo, sendo que, deste modo, o Estado tem no Parquet o órgão a que delega as funções destinadas a tornar efetivo o direito de punir, como bem dispõe o artigo 24 do Código de Processo Penal. Compete ao Órgão provocar a atividade jurisdicional para que se manifeste acerca da pretensão punitiva do Estado, expressada pela denúncia.
É pacífica a posição da doutrina quanto embora, o Ministério Público possa acompanhar inquéritos policiais, não pode interferir em tais procedimentos; muito menos avocar para si a presidência dos mesmos, sem contrariar o expresso texto legal do artigo 4º do Código de Processo Penal e no artigo 144, § 4º da Constituição Federal; e, principalmente requisitar, diretamente, providências (exceção à instauração do inquérito policial), sem espancar dispositivos processuais penais e relegar o Juiz a uma posição inferior.
Persiste, na doutrina, a indagação a respeito da existência de um instrumento normativo que, com base no inc. IX do art. 129 da Constituição, pudesse atribuir ao Ministério Público, funções investigativas criminais.
Somente a Lei, é evidente. O princípio da reserva legal o impõe. E o § 5º do art. 128 da Constituição reforça o entendimento, quando estabelece que as atribuições do MP serão estabelecidas em lei – observe-se lei complementar.(GRINOVER, 2004)
A ilustre professora, também, tece comentários acerca da invocação da Lei Orgânica do Ministério Público – LOMP em vigor, a fim de justificar funções investigativas para o MP, sendo incisiva em afirmar que tal atitude não possuiria qualquer fundamento, e explica:
As referidas atribuições ligam-se ao exercício da ação civil pública, outra função institucional do MP, nos termos do art. 129, III, da Constituição. Só lei complementar, que atribuísse expressa e especificamente funções investigativas penais ao órgão ministerial, teria condão de configurar o instrumento normativo idôneo para atribuir outras funções ao MP, não contempladas nos incs. I a VIII do art. 129, com base na previsão residual do inc. IX.
Sem a lei complementar acima referida, o MP não pode exercer funções investigativas penais. Por via de conseqüência, são flagrantemente inconstitucionais e desprovidas de eficácia os atos normativos editados no âmbito do MP, instituindo e regulando a investigação penal pelos membros do Parquet. (GRINOVER, 2004)
Investigação Criminal
A lei defere a determinados órgãos, responsáveis pela segurança pública, a competência para a investigação da existência dos crimes comuns, em geral, e da respectiva autoria.
O ordenamento pátrio vigente, em seu texto processual penal prevê uma etapa preliminar para a apuração da infração penal e da respectiva autoria delitiva.
A polícia judiciária recebeu tratamento diferenciado pela Constituição Federal de 1988, que em seu Capítulo Terceiro, Título V (Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas):
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio
Pelo texto legal pode-se classificar, de modo geral, a estrutura dos órgãos encarregados de prestar segurança pública, em polícias ostensivas ou preventivas e polícias judiciárias ou de investigação.
Assim, somem-se as funções descritas ao previsto no §1º, II, do art. 144 da Constituição Federal de 1988.
§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a:
I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;
II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência;
III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras;
IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.
Há também na doutrina quem faça a distinção entre polícia administrativa e polícia judiciária. Bandeira de Mello assevera:
(...) o que efetivamente aparta Polícia Administrativa de Polícia Judiciária é que a primeira se predispõe unicamente a impedir ou paralisar atividades anti-sociais enquanto a segunda se preordena à responsabilização dos violadores da ordem jurídica. (BANDEIRA DE MELLO, 2003).
Julio Fabbrini Mirabete, quanto ao tema explicita que a Polícia, em especial a judiciária, seria:
(...) uma instituição de direito público, destinada a manter e a recobrar, junto à sociedade e na medida dos recursos de que dispõe, a paz pública ou a segurança individual. (MIRABETE, Julio Fabbrini. 2005).
A responsabilidade da direção do inquérito policial fica a cargo da autoridade policial (art.4º do Código de Processo Penal), sendo entendido pelo Delegado de Polícia de carreira. Pelo art. 144 da Constituição Federal, a apuração das infrações penais e o exercício da Polícia Judiciária são exclusivos da Polícia Civil e da Polícia Federal, cada uma no seu âmbito institucional, sendo certo que deverá ser respeitada e cumprida a vontade constitucional.
Portanto, a Constituição Federal previu a expressa exclusividade dos atos de investigação criminal a Polícia Judiciária, não permitindo que tais atos sejam promovidos pelo Ministério Público.
Importante se faz destacar que existem diferentes modalidades de ação penal, o que influi, diretamente, no procedimento a ser adotado para a instauração do competente Inquérito Policial, Sendo que se tratando de Ação Penal Pública, ele deve ser instaurado de ofício pela autoridade policial (Delegado de polícia estadual ou federal), a partir do conhecimento da existência do cometimento do fato delituoso.
Contrariamente o que ocorre quando a Ação Penal é Pública Condicionada à manifestação da vítima ou seus representantes legais ou requisição do Ministro da Justiça ou mesmo se tratar de Ação Penal Privada, hipóteses em que o Inquérito somente poderá ser instaurado a partir da manifestação do interessado. (Termos do artigo 5° do Código de Processo Penal).
Desta maneira, pode-se concluir que a investigação se iniciará de ofício ou através de manifestação da parte interessada, sendo que, não obstante, nos ditames do artigo 5° do Código de Processo Penal, em seu §3° existe a alusão quanto à notitia criminis, informação sobre a ocorrência de um fato criminoso, que pode ser oferecida por qualquer pessoa do povo e pode ser feita quando do conhecimento pessoal do fato pela autoridade policial.
Portanto, o Inquérito Policial, é um procedimento policial tendente a apurar os indícios de autoria e materialidade, tendo como destinatário imediato o Ministério Público (Ações Penais Públicas) ou o Ofendido (Ações Penais Privadas) e como destinatário mediato o Juiz. Para Mirabete (2005), trata-se de uma instrução provisória, preparatória, informativa, em que se colhem elementos por vezes difíceis de obter na instrução judiciária, como auto de flagrante, exames periciais, etc. Ressaltando-se ser de competência da Polícia Judiciária sob a direção da autoridade policial, o Delegado de Polícia de carreira (Delegado de Polícia Natural).
A investigação criminal é ato exclusivo da Polícia Judiciária, conforme previsão constitucional, não permitindo que tais atos sejam promovidos pelo Ministério Público. Nestes termos preceitua a vigente Constituição Federal, em seu art. 144, § 4º, que:
às Polícias Civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de Polícia Judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.
Pode-se afirmar que a atividade investigatória criminal, formalizada no inquérito policial, só pode, ser presidido por Delegado de Polícia Natural, por força de expressa diretriz constitucional, ressaltando-se a absoluta inexistência de subordinação hierárquica entre Delegados de Polícia e Promotores de Justiça.
Como ensina Luiz Alberto Machado (1997):
...É superada a discussão de que o inquérito policial é uma mera coleta de informações que servirá de base para a denúncia do Ministério Público. A atividade policial não é uma atividade subordinada; é uma atividade antecipada, mas não uma atividade subordinada. É uma atividade tão importante em termos constitucionais, em termos de respeito dos direitos e garantias individuais, como a atividade do Ministério Público, como a atividade da Magistratura. Jurisdição, que é o poder de dizer o Direito, é também da Administração Pública, principalmente da autoridade policial. Dizer definitivamente o direito, que é a jurisdição em sentido estrito, é a jurisdição do Poder Judiciário; mas, desde o momento de baixar uma portaria, a autoridade policial está exercendo uma atividade jurisdicional ampla, vinculada ao princípio da legalidade na sua face criminal. (MACHADO, 1997).
O inquérito policial pode ser instaurado de ofício mediante portaria da autoridade policial e pela lavratura do flagrante, e mediante representação do ofendido, por requisição do Ministério Público e por requerimento da vítima. Assim, é a partir da ciência da conduta criminosa através notícia criminis que a Autoridade Policial dá inicio às investigações.
A abertura do Inquérito Policial, deste modo, dependerá da ação penal competente, uma vez que na hipótese de crime que se apura mediante ação penal pública, a abertura é obrigatória, pois a autoridade policial deverá instaurá-lo, de ofício, assim que tenha notícia da prática da infração, sendo que o inquérito será também indisponível (uma vez instaurado regularmente, não poderá a autoridade policial arquivar os autos). (Código de Processo Penal)
Ao término da investigação policial o Ministério Público terá formado a sua opinio delicti e poderá oferecer a denúncia ou decidir pelo arquivamento, ou seja, a não propositura da ação penal. O arquivamento é realizado através de uma decisão judicial que, acolhendo as razões do Ministério Público, encerra as investigações do fato delituoso.
A Constituição Federal dispôs que o Ministério Público possui a função de exercer o controle externo das atividades policiais, in verbis:
Art. 129 da CF -VII - exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior.
Art. 128. O Ministério Público abrange: (...) §5º - Leis complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros (... )
O texto constitucional já preconiza a necessidade de uma lei complementar elaborada pelos Estados e União definindo as atribuições, organização e o seu Estatuto.
A Investigação Criminal pelo Ministério Público
O tema é, sem dúvida, controverso, comportando várias visões a respeito, mas a Constituição Federal de 1988 foi expressa ao dispor as funções da polícia – para investigar e servir de órgão auxiliar do Poder Judiciário, na atribuição de apurar a ocorrência e autoria de crimes e contravenções penais - e do Ministério Público.
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I - polícia federal;
IV - polícias civis;
§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a:
IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.
§ 4º - às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.
A Constituição Federal/1988 garantiu ao Parquet a titularidade da ação penal pública, não obstante o inciso III do artigo 129 do referido diploma legal, prevê a possibilidade de elaboração de inquérito civil, mas não o criminal.
Ao Ministério Público, ademais das atribuições ora elencadas, fora conferida a função de agente de controle externo da atividade policial, sendo que, em relação às investigações de práticas delituosas, pode promover a requisição de diligências investigatórias e provocar a instauração do inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais, nos termos do que dispõem os incisos VII e VIII do art. 129 da Constituição Federal de 1988, normas que se encontram em harmonia com o que previsto quanto às atribuições das polícias federal e civil (Constituição Federal, artigo. 144 e parágrafos).
Ressalte-se não ser possível proceder à leitura ampliativa dos aludidos incisos do art. 129 da Carta Magna, sob pena de se chegar a conflito com o texto constitucional sobre o papel investigatório das polícias, transmudando-se o inquérito policial em inquérito ministerial.
O jurista José Afonso da Silva proferiu um parecer sobre o assunto, assim se manifestando:
Controle externo é atividade de fiscalização, vistoria, inspeção e vigilância que uma instituição exerce em relação à outra. Não se trata de poder hierárquico e de dominação, pelo qual se permita interferir na atividade da instituição controlada, porque isto seria controle interno.
rquico e de dominaçap, pelo qual se permita interferir na atividade pr474747474747474747474747474747474747474747474747474747474747474747474747474747474747474747474747474747474747474747
O controle interno é que tem a conotação de poder de dominar, regular, guiar ou restringir. Isso se vê da própria Constituição. O controle externo mais rigoroso que ela apresenta é também rigorosamente conceituado como fiscalização, quando, no art. 70, estatui que a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União (...) será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, enquanto o controle interno de cada Poder importa em avaliações, comprovação de legitimidade, perquirições da eficácia e da eficiência (art. 74). (SILVA: 1996, p. 19)
Portanto, a atribuição de ser agente de controle externo de atividades que interfiram com a organização, as garantias, direitos e deveres das polícias civis não pode ser objeto de ato administrativo do Ministério Público.
Nesse sentido, a Constituição reservou à polícia civil estadual um campo de atividade exclusiva (art.144 §4º) que não pode ser invadido por norma infraconstitucional e por disposições de ato administrativo. Sendo que sobre as atividades policiais José Afonso da Silva assim diz:
(...) Uma delas é a de realização do inquérito policial, que constitui o cerne da atividade de Polícia Judiciária, que não comporta o controle do Ministério Público, porque tal controle ainda pertence ao Poder Judiciário. Outra é que também à polícia civil, Polícia Judiciária se reservou a função de apuração das infrações penais, o que vale dizer o poder investigatório, sendo, pois, de nítido desrespeito à Constituição normas que atribuam a Órgão do Ministério Público a faculdade de promover diretamente investigações como o fez o art. 26 do Ato 98/96. (SILVA, 1996)
Sobre a matéria em foco, assim se manifestou Ferreira Filho:
Realmente, na pureza do sistema a lei obriga, não estando o indivíduo adstrito a fazer o deixar de fazer senão o que esta determina (art. 5º, II, CF). Dessa forma, o regulamento seria abusivo e, conseqüentemente, inválido se criasse direitos ou obrigações novas, não estabelecidas pela lei, se ampliasse, restringisse ou modificasse direitos ou obrigações, se ordenasse ou proibisse o que a lei não ordena nem proíbe, se facultasse ou proibisse diversamente do que a lei estabelece, se extinguisse ou anulasse direitos ou obrigações. (FERREIRA FILHO, 1992, p. 154)
Na mesma linha de pensamento, assim se expôs Cretella Junior:
Não se confunde o regulamento com a lei, de modo algum podendo aquele ultrapassar os limites a esta conferidos. Se o regulamento se afasta da lei, é inconstitucional. Jamais, podendo, portanto, ser exercido contra legem, desenvolve-se, isto sim, de acordo com os princípios legais, dentro da lei visto que a norma jurídica o limita e o condiciona. Não pode o regulamento alterar a lei, nem criar obrigações para os cidadãos que somente estão sujeitos aos encargos constantes da própria disposição legislativa. (CRETELLA JUNIOR, 1991, p. 2898)
O controle externo exercido pelo Parquet se dá sobre a principal atividade da polícia, qual seja, a investigação, através de acompanhamento e requisição de diligências, dentre outras funções, sem, contudo, trazer para si a competência de conduzi-lo e ou instaurá-lo. Caso seja o Ministério Público rsponsável pela investigação, quem seria o responsável pelo controle externo? Ou teríamos apenas controle interno, visto que o Parquet investigaria e exerceria o auto controle?
Logo, conclui-se que o Ministério Público deve atuar tão somente no exercício do controle externo, como forma de preservar a sistemática da Constituição Federal, se restringido a realizar requisições e jamais tomando para si a competência conferida à polícia judiciária.
O Conselho Nacional do Ministério Público, no entanto, aprovou a Resolução nº 13 com o pretexto de regulamentar o art. 8º da Lei Complementar nº 75/93 e o art. 26 da Lei nº 8.625/93, disciplinando os poderes investigatórios do órgão ministerial.
Art. 8º Para o exercício de suas atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência:
I - notificar testemunhas e requisitar sua condução coercitiva, no caso de ausência injustificada;
II - requisitar informações, exames, perícias e documentos de autoridades da Administração Pública direta ou indireta;
III - requisitar da Administração Pública serviços temporários de seus servidores e meios materiais necessários para a realização de atividades específicas;
IV - requisitar informações e documentos a entidades privadas;
V - realizar inspeções e diligências investigatórias;
VI - ter livre acesso a qualquer local público ou privado, respeitadas as normas constitucionais pertinentes à inviolabilidade do domicílio;
VII - expedir notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar;
VIII - ter acesso incondicional a qualquer banco de dados de caráter público ou relativo a serviço de relevância pública;
IX - requisitar o auxílio de força policial.
§ 1º O membro do Ministério Público será civil e criminalmente responsável pelo uso indevido das informações e documentos que requisitar; a ação penal, na hipótese, poderá ser proposta também pelo ofendido, subsidiariamente, na forma da lei processual penal.
§ 2º Nenhuma autoridade poderá opor ao Ministério Público, sob qualquer pretexto, a exceção de sigilo, sem prejuízo da subsistência do caráter sigiloso da informação, do registro, do dado ou do documento que lhe seja fornecido.
§ 3º A falta injustificada e o retardamento indevido do cumprimento das requisições do Ministério Público implicarão a responsabilidade de quem lhe der causa.
§ 4º As correspondências, notificações, requisições e intimações do Ministério Público quando tiverem como destinatário o Presidente da República, o Vice-Presidente da República, membro do Congresso Nacional, Ministro do Supremo Tribunal Federal, Ministro de Estado, Ministro de Tribunal Superior, Ministro do Tribunal de Contas da União ou chefe de missão diplomática de caráter permanente serão encaminhadas e levadas a efeito pelo Procurador-Geral da República ou outro órgão do Ministério Público a quem essa atribuição seja delegada, cabendo às autoridades mencionadas fixar data, hora e local em que puderem ser ouvidas, se for o caso.
§ 5º As requisições do Ministério Público serão feitas fixando-se prazo razoável de até dez dias úteis para atendimento, prorrogável mediante solicitação justificada.
Art. 26. No exercício de suas funções, o Ministério Público poderá:
I - instaurar inquéritos civis e outras medidas e procedimentos administrativos pertinentes e, para instruí-los:
a) expedir notificações para colher depoimento ou esclarecimentos e, em caso de não comparecimento injustificado, requisitar condução coercitiva, inclusive pela Polícia Civil ou Militar, ressalvadas as prerrogativas previstas em lei;
b) requisitar informações, exames periciais e documentos de autoridades federais, estaduais e municipais, bem como dos órgãos e entidades da administração direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
c) promover inspeções e diligências investigatórias junto às autoridades, órgãos e entidades a que se refere a alínea anterior;
II - requisitar informações e documentos a entidades privadas, para instruir procedimentos ou processo em que oficie;
III - requisitar à autoridade competente a instauração de sindicância ou procedimento administrativo cabível;
IV - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial e de inquérito policial militar, observado o disposto no art. 129, inciso VIII, da Constituição Federal, podendo acompanhá-los;
V - praticar atos administrativos executórios, de caráter preparatório;
VI - dar publicidade dos procedimentos administrativos não disciplinares que instaurar e das medidas adotadas;
VII - sugerir ao Poder competente a edição de normas e a alteração da legislação em vigor, bem como a adoção de medidas propostas, destinadas à prevenção e controle da criminalidade;
VIII - manifestar-se em qualquer fase dos processos, acolhendo solicitação do juiz, da parte ou por sua iniciativa, quando entender existente interesse em causa que justifique a intervenção.
A inconstitucionalidade da Resolução é inquestionável, visto que viola o art. 22, inciso I da Constituição Federal, haja vista que no caso em questão, a partir da Resolução, pretende o Ministério Público ampliar seus limites conferindo-lhe poderes investigatórios, estando contrário ao texto constitucional, e ainda na pendência de exame da matéria pela Suprema Corte.
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho.
Deste modo, somente uma lei complementar, que atribuísse expressa e especificamente função investigativa penal ao órgão ministerial teria o condão de configurar o instrumento normativo idôneo para atribuir-lhe referidas funções não contempladas nos incisos I a VIII do art. 129, com base na previsão residual do inciso IX.
Conclusão
A Constituição Federal é o texto que se assemelharia ao modo de ser do Estado. Sendo, que tenderia a assegurar, a todos, direitos e garantias fundamentais, além de sua proteção, tendo em vista a manutenção da ordem e dos preceitos do Estado Democrático de Direito.
Nesse sentido, a Constituição, em seu texto definiu as atribuições da Polícia Judiciária e do Ministério Público quanto à investigação criminal, sendo que para tanto atribuiu àquele a função precípua de instaurar e conduzir o inquérito policial, a fim de apurar os indícios de autoria e materialidade do ato típico e ilícito.
Ao Ministério Público, deste modo, cabe, tomando ciência da prática de um delito, requisitar a instauração da investigação criminal pela polícia judiciária, podendo realizar um controle externo da atividade policial, requisitando diligências e, ao final, deve formar sua opinião, optando por denunciar ou não eventual pessoa apontada como autora, e considerando os elementos materiais colhidos. Note-se que, quando a polícia judiciária elabora e conduz a investigação criminal, é supervisionada pelo Ministério Público e pelo Juiz de direito quando de deferimentos ou indeferimentos de diligências e ou atos da autoridade policial, por provocação das partes.
Ressalte-se, ainda, que em sede de investigação criminal promovido pela Polícia Judiciária, o advogado possui a prerrogativa de consultar os autos do inquérito, especialmente, quando seu cliente já se encontre indiciado. Mas, o mesmo não ocorreria em investigação sigilosa em transcurso na sede do Ministério Público, pois nem mesmo ciência de que ela está ocorrendo haveria.
Permitir, assim, que o Órgão Ministerial detenha tamanha atribuição seria garantir-lhe o poder de invadir a seara da intimidade do investigado, obtendo dados a seu respeito, sendo, no entanto, que tal poder não prescindiria de comprovação da real necessidade da referida invasão, nem tão pouco haveria o controle do judiciário ou qualquer outra forma de fiscalização, haja vista poder ser realizado em seu âmbito, sem a necessidade de provocação do suscitado poder, salvo medidas previstas em lei, como por exemplo, a quebra de sigilo telefônico.
Deste modo, é inconcebível que se atribua a um só órgão poderes sem quaisquer limites, associado ao fato de que a condução da investigação e a instrução probatória, realizada pelo mesmo órgão munido da titularidade da ação penal pública comprometeria a sua imparcialidade, enquanto garantidor da ordem e dos interesses da sociedade. Além, de atingir os princípios garantidores de um procedimento processual dentro do liame do devido processo legal, colocando em disparidade as partes envolvidas. Não refutando-se do fato de tornar o processo judicial desarmônico e, também, inconstitucional, em razão da violação dos princípios constitucionais processuais. Sendo, deste modo, que a investigação criminal deve continuar a ser de competência exclusiva da polícia judiciária.
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