O tema Criminologia e reforma penal não pode começar por indicações técnicas de mudanças normativas da legislação penal, propostas com fundamento em disfunções identificadas por critérios de eficiência ou de efetividade do controle do crime e da criminalidade – como costuma fazer a Criminologia tradicional no papel de ciência auxiliar do Direito Penal. A abordagem do tema exige definir Criminologia crítica e, assim, esclarecer a natureza da política criminal proposta; segundo, um projeto de reforma penal proposto pela Criminologia crítica deve ser a realização de um programa de política criminal alternativa inspirado no conceito de Direito Penal mínimo, como objetivo imediato, e orientado pela ideia de abolição do sistema penal.
O sistema penal – constituído pela lei, polícia, justiça e prisão – é o aparelho repressivo do moderno Estado capitalista, garantidor de relações sociais desiguais de produção/distribuição material, responsáveis pela violência estrutural da marginalização, do desemprego, dos baixos salários, da falta de moradia, do ensino precário, da mortalidade precoce, do menor abandonado etc. De fato, a ordem social desigual é assegurada pela seletividade do sistema de justiça criminal nos níveis de definição legal de aplicação judicial e de execução penal , assim estruturado no lugar da definição legal seletiva de bens jurídicos próprios das relações de propriedade e de poder das elites econômicas e políticas dominantes (lei penal); em segundo lugar, a estigmatização judicial seletiva de indivíduos das classes sociais subalternas, em especial dos marginalizados do mercado de trabalho (justiça penal); em terceiro lugar, a repressão penal seletiva de indivíduos sem utilidade no processo de produção de mais-valia e de reprodução ampliada do capital (prisão).
A Criminologia crítica sabe que cárceres melhores não existem – e, por isso, propõe a abolição do sistema carcerário –, mas também sabe outras coisas: que toda melhora das condições de vida do cárcere deve ser estimulada, que é necessário distinguir entre cárceres melhores e piores , que não é possível apostar na hipótese de quanto pior, melhor . Por tudo isso, o objetivo imediato é com a maximização dos substitutivos penais, das hipóteses de regime aberto, dos mecanismos de diversão e de todas as indispensáveis mudanças humanistas do cárcere.
As propostas de reforma da legislação penal o Direito Penal mínimo contém princípios que definem os fundamentos do programa de política criminal da Criminologia crítica organizados em duas categorias principais: a) princípios jurídicos; b) princípios políticos.
Considerando esses princípios, o programa de reforma penal da Criminologia crítica propõe mudanças em duas direções principais: a) no sistema de justiça criminal um programa de descriminalização e de despenalização radicais; b) no sistema carcerário um programa de descarcerização radical, com a máxima humanização das condições de vida no cárcere.
Os substitutivos penais ou de extinção da punibilidade devem ser redefinidas na direção da mais ampla despenalização concreta, com o objetivo de evitar os efeitos negativos do cárcere, com ênfase nos seguintes institutos jurídicos: a) o perdão judicial ; b) a conciliação ; c) a transação penal ; d) a suspensão condicional da pena ; e) a prescrição mediante redução dos prazos de prescrição da pretensão punitiva, desconsideração das causas de interrupção da prescrição retroativa.
BIBLIOGRAFIA
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