O Fundo das Nações Unidas para a Infância - Unicef divulgou no último dia 04 o estudo Hidden in Plain Sight (Escondidos à Plena Vista, em livre tradução), sobre homicídios de crianças e adolescentes em 190 países. Os dados sobre o Brasil são impressionantes, com o país figurando na segunda colocação em números absolutos de mortos e com a sexta pior taxa de homicídios nesse segmento populacional. Porém, além das conclusões diretas sobre assassinatos de crianças e adolescentes, a análise dos números conduz à constatação de um quadro ainda pior, sobre a alarmante taxa de homicídios brasileira na população acima dos 20 anos.
De acordo com os dados do Unicef, em 2012, ano a que se refere o estudo, foram vitimados no Brasil 11 mil crianças e adolescentes, assim considerados os com idade de zero até 19 anos, o que corresponde à taxa de 17 homicídios por 100 mil habitantes nessa faixa etária, ali também apontada. Naquele ano, a população brasileira, de acordo com indicadores do IBGE, somava 193.946.866 habitantes, o que, aplicando-se a fórmula de cálculo da taxa de homicídios (número de vítimas X 100.000 ÷ população), conduz à conclusão de que, em 2012, a população de crianças e adolescentes no Brasil era de 64.705.882.
Para o mesmo ano, o Mapa da Violência, estudo com conotação oficial utilizado no Brasil, registrou seu número recorde de assassinatos, com 56.337 vítimas, resultando na taxa geral de 29,05 mortos por 100 mil habitantes (também recorde). Assim, se os dados do Unicef estão corretos - e presume-se que estejam -, do número total de homicídios praticados no Brasil em 2012, 11 mil foram de crianças e adolescentes e o restante (45.337) de pessoas com vinte anos ou mais.
Por outro lado, tomando-se o total da população e a fração correspondente a crianças e adolescentes - revelada pelos dados do Unicef -, havia em 2012 no Brasil 129.241.004 pessoas com idade igual ou superior a 20 anos. E é aí que surge o dado mais preocupante, pois foi nesse universo que foram cometidos todos os demais homicídios, ou seja, dentre a população adulta, foram assassinadas 45.337 pessoas. Consequentemente, à época, a taxa de homicídios nessa faixa etária alcançou espantosas 35,08 ocorrências por 100 mil habitantes.
A grave realidade evidenciada pelo cotejo dos dados do IBGE, do Mapa da Violência e do Unicef para o ano de 2012 pode ser assim traduzida:
QUANTIDADE |
NÚMERO DE HOMICÍDIOS |
TAXA (por 100 mil) |
|
População total |
193.946.886 |
56.337 |
29,04 |
Crianças e adolescentes |
64.705.882 |
11.000 |
17,00 |
Adultos (≥ 20 anos) |
129.241.004 |
45.337 |
35,08 |
O quadro agora retratado pelo Unicef sobre os homicídios de jovens é gravíssimo, sem nenhuma dúvida. Ver o fim de vidas que apenas deveriam estar começando é sempre inaceitável. Porém, a conclusão oculta nos mesmos números é ainda pior, evidenciando que a epidemia homicida no Brasil atinge os adultos de forma cruel, numa taxa três vezes e meia superior ao máximo aceitável pela ONU (de 10 por 100 mil).
Logo, apesar do impacto da violência contra os mais novos, é premente que a situação seja compreendida em sua inteireza, e não considerando estatísticas parciais, isolando segmentos populacionais. A gravidade do quadro é generalizada e é assim que ele precisa ser combatido. A infecção homicida não é isolada, mas de verdadeira sepsemia.