A evolução do trabalho humano e o surgimento do Direito do Trabalho

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Este trabalho tem por objetivo apresentar a evolução do trabalho humano desenvolvida ao longo do período histórico e sua contribuição para o surgimento do Direito do Trabalho no mundo Ocidental e Oriental.

1 INTRODUÇÃO

A história do trabalho humano teve sua origem quando o ser humano buscou satisfazer suas necessidades biológicas de sobrevivência. Na economia de subsistência, o trabalhador decidia o que produzir, como produzir, quando e a que ritmo, era dono do seu tempo.

Não existia separação entre o espaço familiar e o trabalho, optavam pela duração e a intensidade do trabalho, de acordo com as necessidades de produção.

À medida que as necessidades foram sendo satisfeitas, ampliaram-se, contribuindo para a criação de novas relações, que passaram a determinar a condição histórica do trabalho.

Pois bem, o sistema capitalista reduziu a atividade vital humana, ou seja, o trabalho em emprego, e, no contexto atual, tirou da grande maioria da humanidade até mesmo esta forma reduzida e exploradora através da qual homens e mulheres produziam suas vidas.

O trabalho humano desenvolvido ao longo da história da humanidade é de tamanha importância que a filósofa Hannah Arendt em sua obra A Condição Humana visa esclarecer as estruturas que condicionam a experiência humana ou as constantes desta experiência. O caminho escolhido por ela foi o de investigar o sentido e os modos das atividades humanas e suas respectivas dignidades.

Destaca-se também que o Direito do Trabalho exige um acompanhamento contínuo às evoluções na sociedade no que tange as relações trabalhistas, pois a cada momento surge uma situação inovadora, a qual nem sempre existe respostas em códigos, leis e na Constituição Federal, razão pela qual o Direito do Trabalho deverá fazer uso de princípios, analogias, direito comparado, jurisprudência e juízos de valores. E assim a Justiça do Trabalho fará valer suas imposições através do uso de interpretações flexíveis conjugadas com o que dispõe a lei, tendo uma aplicação mais moderna e dinâmica.

O Objetivo Geral deste trabalho é diagnosticar as causas do surgimento do Direito do Trabalho. E os objetivos específicos são: verificar a essência do Trabalho Humano na visão crítica dos filósofos Hannah Arendt, John Locke e Karl Marx; descrever a evolução histórica do trabalho humano; identificar as transformações que o Direito do Trabalho trouxe para a Sociedade; e sugerir algumas perspectivas para o Direito do Trabalho no futuro.

Apontam-se no Primeiro Capítulo as disposições doutrinárias de Hannah Arendt, John Locke e Karl Marx, todos com uma visão crítica diversificada sobre a essência do Trabalho Humano, sua valorização e proporções. Neste capítulo, os pensamentos de cada filósofo serão abordados de forma fracionada. A exposição deste Capítulo se faz muito necessária, pois revela que a preocupação em se definir o significado e as origens filosóficas da atividade enquanto Trabalho Humano, bem como suas consequências e interdisciplinaridades com outros setores, já eram tratadas bem antes de se haver uma solidificação do Direito do Trabalho.

No Segundo Capítulo discorre-se uma visão ampla sobre a evolução do trabalho humano desde a pré-história até os dias de hoje, identificando o trabalho de subsistência, de caça e pesca na pré-história; a escravidão na Idade Antiga; na Idade Medieval o feudalismo; E por fim, a evolução do trabalho humano do Século XV até a Idade Contemporânea. Destacando-se que a medida que os ideais dos seres humanos iam mudando, a forma de sobrevivência e produção também iam acompanhando essa modernização do pensamento, como prova disto está o inevitável  surgimento do Capitalismo, impulsionado também pela eclosão das revoluções industriais e tecnológicas.

No Terceiro Capítulo será dada ênfase as causas do surgimento do Direito do Trabalho e suas transformações na sociedade, fazendo uma abordagem sobre o fenômeno jurídico da “Flexibilização do Direito do Trabalho”. E no Quarto Capítulo serão apontadas algumas perspectivas para o Direito do Trabalho.

A posição defendida neste trabalho é a de que os vícios e as consequências da liberdade econômica e do liberalismo político, maquinismo, as lutas de classes com as consequentes rebeliões sociais, desigualdade econômica e social, e a exploração da mão de obra contribuíram para o surgimento do Direito do Trabalho, com o propósito de que nas relações entre os empregados e os empregadores haja equilíbrio e justiça através da regulamentação dos direitos e deveres entre eles.

No entanto, na medida em que o Direito do Trabalho tenta equilibrar as relações trabalhistas, o crescimento exacerbado do capitalismo, da globalização, da internacionalização do trabalho, avanços tecnológicos, telecomunicações, entre outras condições, acabam por tornar inoperante o reconhecimento dos direitos trabalhistas, uma vez que vem prevalecendo os empregos informais, robotização de mão de obra, desvalorização do trabalho humano, etc.

E no intuito de que sejam amenizados os impactos destas perspectivas para o Direito do Trabalho é que se busca a aplicação de uma Flexibilização do Direito do Trabalho de forma moderada, qual seja a adaptação da legislação às crescentes necessidades da economia.

Diante do exposto, pode-se destacar a imensa relevância social e científica da problemática desenvolvida neste trabalho científico, que terá a intenção de contribuir com a reflexão e discussão em torno do mencionado assunto, a fim de que se chegue a conclusão de que o trabalho humano evoluiu de forma tão rápida e sistemática  que necessitou de normas que regulamentassem as atividades laborais, daí a importância do surgimento do Direito do Trabalho, e como a evolução destas atividades não param, indica-se que, a Flexibilização do Direito do Trabalho é uma das formas de se tentar evoluir e acompanhar o Direito do Trabalho.

2 O TRABALHO HUMANO NA VISÃO CRÍTICA DOS FILÓSOFOS

2.1. HANNAH ARENDT

Hannah Arendt identifica três conceitos fundamentais em: A Condição Humana, que constituem a gênese da sua antropologia filosófica – o labor, o trabalho e a ação. A estas três atividades correspondem três condições humanas: vida, pertencer ao mundo e pluralidade[1].

A condição humana de Arendt diz respeito às formas de vida que o homem impõe a si mesmo para sobreviver. São condições que tendem a suprir a existência do homem. As condições variam de acordo com o lugar e o momento histórico do qual o homem é parte.[2]

Considera ainda uma distinção entre duas esferas da vida humana: a esfera privada que corresponde as atividades do trabalho e labor; e a esfera pública que corresponde a atividade da ação.

Para ela o labor é a atividade que corresponde ao processo biológico do corpo humano em que o crescimento espontâneo e eventual declínio têm relação com as necessidades vitais produzidas e introduzidas pelo labor no processo da vida. A condição humana do labor é a própria vida.

Já o trabalho é a atividade correspondente ao artificialismo da existência humana, existência não obrigatoriamente contida no eterno ciclo vital da espécie. O trabalho, segundo Arendt, produz um mundo artificial de coisas, diferente de qualquer ambiente natural.

É pertinente dizer que para a Hannah, o trabalho não é intrínseco, constitutivo, da espécie humana, em outras palavras, o trabalho não é a essência do homem. O trabalho é uma atividade que o homem impôs à sua própria espécie, ou seja, é  o resultado de um processo cultural.

Para Hannah Arendt o acúmulo de riqueza não teria sido aproveitado na produção de bens duráveis. O que ocorreu é que a perda do mundo, que havia sido a marca do processo de desapropriação, passou a determinar o modo de vida desde então.

Em sua visão crítica de avaliar a humanidade e suas relações Hannah percebeu que a população tinha sido arremessada a um estado de miséria em que o que contava era só a manutenção da vida. O traço característico dessa situação, que consiste na valorização estrita dos bens que servem para serem consumidos imediatamente no processo vital, impregnou o modo de ser de toda a experiência moderna.

Hannah Arendt indica que tal situação acarretou uma disposição nova do conjunto das atividades do homem. O labor, atividade pela qual a vida é sustentada, foi considerado tradicionalmente a menos nobre das atividades humanas. No labor está se entretido apenas com a dimensão biológica do humano e é por esse motivo que seu agente é chamado de "animal laborans"[3].

O prestígio dado à figura do "homo faber" na modernidade acarretou o enorme desenvolvimento técnico, primeiramente o critério que determinou esse desenvolvimento fez com que se promovesse a produção de coisas que eram acrescentadas ao mundo. Ele se justificava na medida em que dele resultavam produtos. No momento seguinte, a força contida neste processo, a sua própria produtividade, foi de tal forma impactante que sua importância passou a ser maior que a de seus produtos.

A fenomenologia da "vita" ativa de Hannah Arendt inicia-se com a distinção entre as atividades do labor e do trabalho. As distinções feitas na consideração da "vita" ativa baseiam-se na maior ou menor aparência das várias outras atividades - na sua visibilidade. O labor é a mais obscura das atividades. Os bens que dele resultam são também os menos duráveis. O que se obtém no processo do labor deve ser logo consumido. Bens de consumo não adentram o domínio do mundo, pois não têm a necessidade de durabilidade.

O trabalho, diferentemente, constitui o mundo. Ele objetiva a produção de bens duráveis. A obra de arte constitui o caso extremo e mais puro do empreendimento do trabalho exatamente porque dela se espera uma durabilidade indefinida. É possível que o trabalho possa ser feito no isolamento. O que importa é que a coisa criada no isolamento necessita ganhar visibilidade e que exista um público que a reconheça.

O “trabalho” é atividade de transformar coisas naturais em coisas artificiais, por exemplo, uma madeira da árvore retirada para construir casas, camas, armários, objetos em geral. É pertinente dizer que para a Hannah, o trabalho não é intrínseco, constitutivo, da espécie humana, em outras palavras, o trabalho não é a essência do homem. O trabalho é uma atividade que o homem impôs à sua própria espécie, ou seja, é o resultado de um processo cultural.

Hannah Arendt identifica três formas dicotômicas de trabalho: o improdutivo e produtivo; o qualificado e não qualificado; o intelectual e manual.

Hannah tem a intenção de mostrar a fraqueza do pensamento de Karl Marx, para isso ela diz que o conceito de trabalho usado por Marx, é um conceito comum de sua época: trabalho é trabalho produtivo. Segundo a autora esse conceito de trabalho produtivo, isto é, trabalho que produz objetos, matéria; eclodiu das mãos dos fisiocratas.

Marx, um dos maiores filósofos sobre o tema trabalho, tentou constantemente reinterpretar o trabalho à imagem da atividade da fabricação — novamente à custa da atividade política.

Hannah retirou esta distinção entre trabalho [labor] e obra [trabalho] de uma observação casual de Locke, que fala do “trabalho de nosso corpo e da obra de nossas mãos”.

Com o avanço do processo de industrialização haveria de designar algum nome para todo aquele trabalho que não estava ligado ao trabalho industrial, daí nasceu o trabalho intelectual em contraposição ao trabalho manual.

Tanto o trabalho intelectual quanto o manual fazem uso das mãos quando colocados em prática. O intelectual precisa das mãos para escrever seu pensamento. Nesse sentido o trabalho intelectual também é trabalho manual.

É dessa forma que o trabalho intelectual é integrado dentro do conceito “trabalho” da revolução industrial. A ideologia que atravessa os tempos modernos é a seguinte: Qualquer coisa que se faça tem que ser necessariamente produtivo, tudo deve ser transformado em mercadoria.

A força de trabalho é aquilo que o homem possui por natureza, só cessa com a morte. Diferente do produto, a força de trabalho não acaba quando o produto termina de ser produzido. Portanto, a força de trabalho é aquilo que Hannah Arendt entende por “labor”. Para ela uma mesa pode durar anos e o pão dura, quando muito, dois dias. O trabalho é força gasta para produzir a mesa. O labor é a força dispendida para produzir o pão.

Em suma, o homem se torna dependente daquilo que produz. E para a autora, torna-se dependente é tornar-se condicionado.

Não é possível, dentro dos termos de Arendt, existir trabalho sem labor, ainda que seja possível o inverso. Ao passo que o labor produz a matéria para incorporá-la ao organismo, o trabalho a produz para que esta seja usada na produção de outros objetos e na materialização do abstrato.

Outra distinção entre trabalho e labor consiste em que, enquanto o labor exige o consumo rápido ou imediato, o trabalho não. A lógica do trabalho é a durabilidade dos objetos. Sua durabilidade permite a acumulação e estoque dos objetos.

Ao trabalhar, os homens produzem as necessidades vitais que devem alimentar o processo vital do corpo humano, o que significa que a atividade do trabalho nunca chega a um fim enquanto durar a vida; ela é infinitamente repetitiva.

 Diferentemente da atividade da fabricação, cujo fim é atingido quando o objeto está terminado, pronto para ser adicionado ao mundo comum das coisas e dos objetos, a atividade do trabalho se move sempre no mesmo círculo prescrito pelo organismo vivo, e o fim de suas fadigas e penas só chega com o fim.

Em outras palavras, o trabalho produz bens de consumo, e trabalhar e consumir são apenas dois estágios do sempre-recorrente ciclo da vida biológica.

O trabalho, diferentemente de todas as outras atividades humanas, permanece sob o signo da necessidade, a “necessidade de subsistir”, como Locke costumava dizer, ou a “eterna necessidade imposta pela natureza”, nas palavras de Marx. Portanto, a verdadeira meta da revolução em Marx não é meramente a emancipação das classes trabalhadora ou operária, mas a emancipação do homem em relação ao trabalho.

Esta emancipação, para Arendt, na medida em que é mesmo possível, não se dá com a emancipação política (a igualdade de todas as classes de cidadãos), mas através da tecnologia, ou seja, o consumo, enquanto um estágio do movimento cíclico do organismo vivo, também é em certo sentido trabalhoso.

Os bens de consumo, o resultado imediato do processo de trabalho, são as menos duráveis das coisas tangíveis. Depois de uma breve permanência no mundo, retornam ao processo natural que os forneceu, seja através da absorção no processo vital do animal humano, seja por deterioração;

Mas, enquanto o trabalho, no sentido de produção de qualquer coisa durável  é bastante “improdutivo” e fútil, ele é altamente produtivo em um outro sentido. A potência de trabalho do homem é tal que ele produz mais bens de consumo do que é necessário para sua própria sobrevivência e a de sua família.

Esta abundância, por assim dizer, natural do processo de trabalho permitiu aos homens escravizar ou explorar seus semelhantes, liberando-se assim do fardo da vida; e embora esta liberação dos poucos tenha sido alcançada sempre pelo uso da força por uma classe dominante, nunca teria sido possível sem essa fertilidade inerente ao próprio trabalho humano.

Para Hannah os homens sempre são seres condicionados, pois além das condições nas quais a vida é dada ao homem na Terra e, até certo ponto, os homens constantemente criam as suas próprias condições que a despeito de sua variabilidade e sua origem humana, possuem a mesma força condicionante das coisas naturais.

Arendt diz que parece ser da natureza das condições da vida que a única vantagem possível da fertilidade da humana força de trabalho consista em sua capacidade de prover as necessidades da vida de mais de um homem ou de uma família.

O trabalho, aprisionado no movimento cíclico do processo biológico, não tem, propriamente falando, nem um começo nem um fim[4] — apenas pausas, intervalos entre a exaustão e a regeneração. A ação, embora possa ter um começo definido, nunca, tem um fim previsível.

Esta grande confiabilidade da obra se reflete no fato de que o processo de fabricação, ao contrário da ação, não é irreversível: toda coisa produzida por mãos humanas pode ser destruída por elas.

Sozinho com a sua imagem do futuro produto, o “homo faber” é livre para produzir, e sozinho novamente ante a obra de suas mãos, ele é livre para destruir. Ele torna-se senhor e mestre da própria natureza na medida em que viola e parcialmente destrói o que lhe foi dado[5].

Do ponto de vista do ”homo faber” [6], o homem é um “fabricante de ferramentas”. É claro que as ferramentas e utensílios são empregados também no processo de trabalho, mas estes utensílios assumem um caráter e uma função diferentes quando são usados para trabalhar, eles servem para aliviar a carga e mecanizar o trabalho do trabalhador, enquanto que as ferramentas da fabricação são projetadas e inventadas para a fabricação das coisas.

Ademais, todo processo de fabricação produz coisas que duram consideravelmente mais que o processo que as trouxe à existência, enquanto que em um processo de trabalho, que gera esses bens de “curta duração”, as ferramentas e instrumentos que são usados são as únicas coisas que sobrevivem ao próprio processo de trabalho.

Eles são as coisas de uso para o trabalho e, como tais, não resultam da própria atividade do trabalho. O que domina o trabalho com o próprio corpo, e incidentalmente todos os processos de fabricação realizados no modo do trabalho, não é nem o esforço propositado nem o próprio produto, mas o movimento do processo e o ritmo que ele impõe aos trabalhadores.

Os utensílios do trabalho são tragados por este ritmo em que o corpo e a ferramenta giram no mesmo movimento repetitivo — até no uso das máquinas, que são mais bem ajustadas à execução do trabalho, devido a seu movimento, não é mais o movimento do corpo que determina o movimento do utensílio, mas o movimento das máquinas que compele os movimentos do corpo e, em um estágio mais avançado, o substitui completamente.

Hannah diz ser bastante significativo que se o homem deve ser “ajustado” à máquina ou se a máquina deve ser ajustada à natureza do homem nunca tenha sido levantada a respeito dos meros instrumentos e ferramentas. E a razão disto é que todas as ferramentas da manufatura permanecem a serviço da mão, ao passo que as máquinas realmente exigem que o trabalhador as sirva, ajuste o ritmo natural do seu corpo ao movimento mecânico delas.

Em seus estudos, Hannah revela ainda que o animal laborans, compelido pelas necessidades do corpo, não usa este corpo livremente como o homo faber utiliza as mãos que são os instrumentos primordiais. Para ela, o fato de que a escravidão e o banimento no isolamento do lar constituíam a condição social de todos os trabalhadores antes da era moderna deve-se basicamente à própria condição humana. Dizia também, que a escravidão era a condição social das classes trabalhadoras, porque se acreditava que ela era a condição natural da própria vida.

Hannah defendia que o aperfeiçoamento dos nossos instrumentos de trabalho (robôs mudos com os quais o homo faber ocorreu em auxílio do animal laborans, em contraposição aos instrumentos humanos dotados de falas; como o escravo doméstico dos antigos, em que o homem de ação tinha que subjugar e oprimir sempre que desejava libertar o animal laborans de sua servidão), tornou o duplo labor da vida, o esforço de sua manutenção e a dor de gerá-la.

Hannah argumenta que vivemos numa sociedade de operários, porque somente o labor tem possibilidade de produzir a abuncância; e transformamos o trabalho em labor. A fabricação é o trabalho do homo faber, e consiste segundo Hannah, na reificação.

Hannah ainda afirma que os utensílios e instrumentos do homo faber, dos quais advém a noção de instrumentalidade, determinam o trabalho e a fabricação. É em atenção ao produto final que as ferramentas são projetadas e os utensílios são inventados, e é o produto final que organiza o próprio processo de trabalho, determina a necessidade de especialistas, a quantidade de cooperação, o número de auxiliares e etc.

2.2 JOHN LOCKE

John Locke era um contratualista que defendia a propriedade como sendo um direito natural conquistado antes da instituição do estado social, através do trabalho do homem. Para ele, propriedade é sinônimo de vida, liberdade e bens[7].

Com a intenção de superar a doutrina hobbesiana, Locke esforçou-se por criar um direito de propriedade ainda no estado de natureza, que concedesse aos particulares um modo de se defenderem contra os abusos provocados pelo poder.

Diante do fato de tudo pertencer aos homens em comunidade e atento à hipótese de que tudo fora disposto para utilização da humanidade, deveria haver uma maneira a fim de que qualquer um pudesse se apropriar das frutas, dos animais e até da terra, tornando-os parte de seu domínio privado e contribuindo para o seu sustento.

Foi então que Locke atribuiu ao trabalho a conquista dos bens ou, em outras palavras, sempre que se retirar um objeto do estado de natureza e a ele acrescentar seu trabalho, tal objeto torna-se sua propriedade. Nas palavras de Lo>(...) ainda que a terra e todas as criaturas inferiores pertençam em comum a todos os homens, cada um guarda a propriedade de sua própria pessoa; sobre esta ninguém tem qualquer direito, exceto ela. Podemos dizer que o trabalho de seu corpo e a obra produzida por suas mãos são propriedade sua. Sempre que ele tira um objeto do estado em que a natureza o colocou e deixou, mistura nisso o seu trabalho e a isso acrescenta algo que lhe pertence, por isso o tornando sua propriedade. Ao remover este objeto do estado comum em que a natureza o colocou, através do seu trabalho adiciona-lhe algo que exclui o direito comum dos outros homens[8].

Essa é uma característica importante do pensamento de John Locke, à valorização do trabalho como forma de aquisição da propriedade. O trabalho desenvolvido pelo homem é para o filósofo uma propriedade inquestionável do trabalhador e, assim, somente ele pode ter direito ao que o trabalho lhe acrescentou.[9]

Bobbio salienta que Locke considerou a aquisição da propriedade particular como um processo de individuação, em que busca justificá-la com a aplicação à coisa daquilo que é inconfundivelmente individual: a energia despendida para apossar-se de algo, ou para valorizar essa coisa individualmente[10].

Outro fundamento importante para fazer do trabalho a justificação da propriedade é a valorização gerada nos bens. Destarte, em relação às terras, por exemplo, verifica-se que o fato gerador da propriedade é a tomada de uma parte qualquer dos bens e sua transformação para algo diferente do existente no estado natural. Este trabalho valorizará a terra, pois segundo Lo>É o trabalho, portanto, que atribui a maior parte do valor à terra, sem o qual ele dificilmente valeria alguma coisa; é a ele que devemos a maior parte de todos os produtos úteis da terra; por tudo isso a palha, farelo e pão desse acre de trigo valem mais do que o produto de um acre de uma terra igualmente boa, mas abandonada, sendo o valor daquele o efeito do trabalho (...)[11].

Locke elaborou uma teoria política da apropriação, que afirma e justifica um direito individual natural à propriedade. Assim, classificou a riqueza (bens), a vida e a liberdade como desejos naturais dos homens para cuja preservação instituem os governos.

Locke remove os limites da lei da natureza ao direito natural do indivíduo à propriedade através de sua concepção do homem com o indivíduo proprietário de sua capacidade de trabalho. A apropriação da natureza pelo trabalho humano é legitimada por dois postulados: os homens têm direito à conservação de suas vidas e o trabalho de um homem é propriedade sua[12].

O que Locke queria, partindo da constatação do nascimento de uma sociedade em que o trabalho deveria ser comprado e utilizado de forma "livre", era fundar um estado em que as diferenças fossem legitimamente justificadas. Além disso, o que o pensador propunha era a criação de um Estado em que a propriedade conquistada de forma "justa" e "responsável" fosse protegida.

    Locke afirmou que na natureza, tudo seria de todos. O que faria algo ser possuído individualmente é o trabalho. É pelo trabalho que se possui algo e somente assim é que a propriedade privada seria justificada. Entretanto, no estado de natureza o limite das posses é estabelecido pela capacidade e pela utilidade em consumi-las. Para ultrapassar esse limite é que a moeda teria sido criada, diz Locke, possibilitando que o acúmulo de riquezas deixasse de ser algo injusto, passando a ser a expressão de uma grande capacidade de trabalho que, no final das contas, beneficiaria não só o indivíduo possuidor, mas toda sociedade.

    Locke afirma que é "pela obra das mãos e pelo trabalho do corpo" que conseguimos construir nossa posição na sociedade. Para justificar as riquezas e fraquezas individuais, bem como a diferença que entre as pessoas na sociedade, o filósofo inglês viu na capacidade de trabalho o ponto sobre o qual a sociedade se constrói[13].

2.3 KARL MARX

Karl Heinrich Marx (1818-1883) foi um dos principais teóricos sobre o tema trabalho. Foi um estudioso sobre as relações econômicas que procurou desvendar os conceitos universais por trás da atividade econômica. Defendia o sistema capitalista como um modo de produção historicamente transitório cujas contradições internas o levariam à queda, sendo inevitavelmente substituído.

              Marx, sem dúvida, foi um cientista econômico e político que desenvolveu um modelo que explica a historicidade humana, com grande contribuição nos âmbitos filosóficos, econômicos, políticos, sociais e históricos. Assim destacam-se como suas principais obras: 1844 Manuscritos Econômico-Filosóficos. (Publicado em 1932); O Capital (Publicado em 1867) possui 3 volumes; 1845 A Ideologia Alemã (publicado em 1932); 1848 Manifesto do Partido Comunista, entre outros.

Constata-se nos estudos do grande pensador a existência de uma feroz exploração do trabalho humano, o que por certo o ajudou a apresentar conceitos como Mais Valia, Capital Constante, Modo de produção capitalista, Acumulação primitiva, materialismo histórico, entre outros.

Ao identificar a forma como os homens produzem seus meios de vida, Marx conclui que os homens estabelecem relações sociais baseadas nas condições materiais de sua existência. E que ao estudar a sociedade teve como ponto de partida as relações sociais que os homens estabelecem para utilizar os meios de produção e transformar a natureza. Quanto a isto, Marx afirma que:

A forma pela qual os homens produzem seus meios de vida depende sobretudo da natureza dos meios de vida já encontrados e que eles precisam reproduzir. Não se deve, porém, considerar tal modo de produção de um único ponto de vista, ou seja, a reprodução da existência física dos indivíduos. Trata-se muito mais de uma forma determinada de atividade dos indivíduos, de uma forma determinada de manifestar sua vida, um modo de vida determinado. [...] O que os indivíduos são, por conseguinte, depende das condições materiais de sua produção[14]

No que se refere a divisão do trabalho, Érika Oliveira destaca que, Marx considera esta divisão não só como um meio para se alcançar a produção de mercadorias, mas também como uma divisão de tarefas entre os indivíduos e ainda nas relações de propriedade. E que a luta de classes surgiu em meio a guerra de forças entre as forças produtivas e as relações de produção[15].

O trabalho, por consequência, é o que permite ao homem construir seu mundo objetivo e a si mesmo enquanto indivíduo, buscando a satisfação de suas necessidades. Nesse aspecto, para Marx, as ações humanas não têm por base uma natureza pronta, imutável, mas se referem a um homem ativo na construção de si mesmo, da natureza e da História.

 Nesse mesmo contexto, a estudiosa Kátia Santos revela que:

“O conceito filosófico de trabalho formulado por Karl Marx abarca ontologicamente o todo da existência do homem. Não se trata de uma atividade determinada, como no sentido econômico, mas a práxis fundamental e específica da espécie humana, na qual há uma união essencial entre homem e objetividade. Assim, Marx entende que o caráter de uma espécie qualquer reside no tipo de atividade vital que ela exerce, de forma que o traço distintivo da humanidade seria o fato de o homem fazer de sua atividade vital um projeto de sua vontade e de sua consciência. Dessa forma, enquanto o animal é idêntico à sua atividade vital e sua produção não vai além do que necessita imediatamente para si e para sua prole, o homem, por meio do trabalho, procede à construção prática de um mundo objetivo, através da manipulação da natureza inorgânica. Isso é, para Marx, a afirmação do homem enquanto ser genérico consciente”[16].

Desse modo, Marx revela que a atividade consciente é uma característica da espécie humana, e é essa capacidade que diferencia a atividade produtiva humana da mera atividade animal. Por isso, Marx afirma em sua obra A Ideologia Alemã:

Pode-se distinguir os homens dos animais pela consciência, pela religião ou por tudo o que se queira. No entanto, eles próprios começam a se distinguir dos animais logo que começam a produzir seus meios de existência, e esse salto é condicionado por sua constituição corporal. Ao produzirem seus meios de existência, os homens produzem, indiretamente, sua própria vida material.[17]

Marx afirmava que a burguesia detinha um poder de exploração sobre a classe proletariado, e que esta relação de exploração acontecia sob a forma da propriedade privada dos meios de produção. Desta forma, o trabalhador se via obrigado a vender sua força de trabalho ao empresário capitalista. Neste contexto, a força de trabalho se torna uma mercadoria, vendida ao empresário por um salário.

A força de trabalho ao ser negociada como mercadoria promove a completa separação do trabalhador dos meios de produção, alienando o homem de sua essência, que é o trabalho.

O fato de o operário não ter o domínio do processo de produção e não se beneficiar do produto de seu trabalho promovem a alienação.

Tal reflexão remete ao problema do trabalho alienado. Na medida em que a atividade humana é livre, já que o homem é autoconsciente e capaz de fazer de sua própria vida o objeto de suas ações, o trabalho alienado significa uma desumanização. Pela alienação do trabalho, o indivíduo perde a característica de agente ativo em face da natureza e do mundo humanamente criado. No ato de alienação há, segundo Marx, três aspectos.

O primeiro é a relação do trabalhador com o produto do trabalho como um objeto estranho, que o domina. Nesse tipo de relação com o mundo sensorial, os objetos produzidos lhe são estranhos e hostis. O segundo é a relação do trabalho com o ato de produção, isto é, do trabalhador com sua própria atividade, enquanto algo estranho e não pertencente a ele mesmo. Nesse caso, é uma atividade que envolve sofrimento em função da posição de passividade do indivíduo trabalhador, da sua impotência diante de um processo voltado contra si.

O terceiro aspecto do trabalho alienado, mais complexo, é a transformação do modo de vida da espécie humana em um meio de subsistência individual. Nesse caso, a atividade vital humana aparece como simples meio para a satisfação da necessidade de manter a existência física do trabalhador.

Embora, na condição de ser autoconsciente, o homem devesse tomar as rédeas de sua vida, o que ocorre é a transformação de toda a atividade vital em um meio para busca da sobrevivência. A própria vida genérica ativa se torna apenas um meio e não o fim de toda a atividade humana.

De acordo com isso, Marx afirma que o que é verdadeiro quanto à relação do homem com seu trabalho, também o é quanto à sua relação com outros homens. Assim, cada indivíduo é alienado por outros e todos são igualmente alienados da vida humana, uma vez que cada um encara o semelhante conforme os padrões e relações em que se encontra como trabalhador.

Como explica Marx, o fundo de reserva de capital deveria exaurir-se, em função da necessidade do capitalista de consumir mercadorias. Se tal reserva não se esgota, é porque o trabalho acrescenta um fruto anual ao capital, o qual pode então ser consumido, sem que o capitalista se torne pobre.

O trabalhador produz, além disso, o fundo do qual se retira seu pagamento, já que só recebe depois que o valor de sua força de trabalho é realizado em mercadoria e mais-valia. Portanto, o salário é uma parte do produto, reproduzido pelo próprio operário e não um pagamento com recursos do capital.

Portanto, se por um lado a alienação é o ponto de partida do processo de produção, pois nela se dá a separação entre o trabalho e seu produto, entre as condições objetivas e a força subjetiva da criação de valor. Por outro, também é o resultado da produção, na medida em que esse ponto de partida acaba produzindo-se e reproduzindo-se permanentemente, eternizando-se como consequência da produção capitalista.

3 A EVOLUÇÃO DO TRABALHO HUMANO NA HISTÓRIA ORIENTAL E OCIDENTAL

3.1 A DIVISÃO DA HISTÓRIA DA HUMANIDADE EM PERÍODOS

   

PRÉ-HISTÓRIA

Das origens do homem até

c. 4000 a.C

IDADE ANTIGA

De c. 4000 a.C. a 476

IDADE MÉDIA

De 476 a 1453

Século XV

IDADE MODERNA

De 1453 a 1789

IDADE

CONTEMPORÂ-NEA

De 1789 aos dias atuais

Idade da Pedra:

Paleolítico;

Mesolítico;

Neolítico.

Idade dos Metais:

Cobre, Bronze e Ferro

Antiguidade Oriental;

Clássica e Tardia

Alta Idade             Média;

Baixa Idade Média: Plena e Tardia.

Transição

Séculos XVI ao XVIII

Séculos

XIX ao

XXI

Simples Cooperação

*Trabalho              escravo

*Estratificação social

*Economia Agrária;

*Servidão;

*Corporações de ofício.

*Economia Comercial;

*I Revolução

Industrial;

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*Revolução Francesa

Economia Industrial;

II Revol.

Industrial;

III Revol. Industrial.

         

Fonte: Wikipedia – Cronologia da Humanidade[18]

3.2 O TRABALHO HUMANO NA PRÉ-HISTÓRIA

3.2.1 Idade da Pedra

3.2.1.1 Paleolítico

Também conhecido como Idade da Pedra Lascada, é a primeira fase da Idade da Pedra. Vai de 2 milhões a.C (época aproximada em que o homem fabricou o primeiro utensílio) até 10.000 a.C (início do Período Neolítico).

Este período da Pré-História se caracteriza pela fabricação de ferramentas (machados, lanças, cajados, facas, etc.) e outros objetos de pedra, ossos e madeira. A vida neste período baseava-se na caça de animais, pesca e coleta de alimentos (frutos, folhas e raízes). E foi neste período que o Homo erectus (homem em pé) produziu e controlou o fogo[19].

 Os homens deste período eram nômades, ou seja, se deslocavam constantemente de um local para outro em busca de água e alimentos.

A economia na fase do Paleolítico era de subsistência, ou seja, não acumulavam nem produziam para o comércio, mas apenas para a sobrevivência do grupo. Os bens de produção do grupo (ferramentas, utensílios e outros objetos) eram de propriedade coletiva[20].

Os homens se organizavam em pequenos grupos, cuja liderança era do mais forte e experiente.

3.2.1.2 Mesolítico

Teve início há, aproximadamente, 10 mil anos atrás e terminou com o desenvolvimento da agricultura. Foi possível também esquentar e iluminar a moradia, além de possibilitar o consumo de alimentos e carne cozida ou assada.

Domesticação dos animais: possibilitou garantir uma reserva de alimento para o momento que houvesse necessidade, eliminando a dependência da caça. 

Desenvolvimento da agricultura: com este avanço, o homem da Pré-história deixou de ser nômade para ser sedentário. Diminuindo a dependência da natureza, a agricultura garantiu maior quantidade de alimentos.

Ao que tudo indica, as primeiras espécies cultivadas foram as dos cereais: aveia, trigo e cevada, além de abóbora e feijão[21].

Divisão de trabalho por sexo: os homens ficaram responsáveis pelo sustento da família e segurança do local, enquanto às mulheres cabiam as funções de cuidar dos filhos e da organização da habitação. Esta divisão de trabalho melhorou a organização social na Pré-história, favorecendo o desenvolvimento das famílias.

3.2.1.3 Neolítico

Também conhecido como Idade da Pedra Polida foi a fase da pré-história que ocorreu entre 12 mil e 4 mil a.C. O início deste período é marcado com o fim das glaciações e termina com o desenvolvimento da escrita na Suméria.

Neste período, o desenvolvimento da técnica de polimento das pedras permitiu a elaboração de artefatos mais resistentes, o que levou a um aumento na produção agrícola.

 Em decorrência do desenvolvimento da agricultura e domesticação dos animais (cabras, bois, porcos, cavalos e aves), o ser humano deixou de ser nômade (sem moradia fixa) para tornar-se sedentário (com moradia fixa)[22].

Segundo o historiador Gilberto Cotrim, neste período “a necessidade de controlar a agricultura e a criação de animais levou à divisão do trabalho e à especialização de funções entre os membros da aldeia”[23].

Com o aumento da produção ocorreu a geração de excedentes. Além de armazenarem para os períodos de maior necessidade, os homens começaram a trocar estes produtos com outras comunidades. Foi o início da economia de trocas e do desenvolvimento da arte cerâmica.

              Os homens ficaram encarregados da caça, pesca e segurança (função militar de proteção). As mulheres ficaram com as tarefas de cuidar dos filhos, da agricultura e do preparo dos alimentos[24].

3.2.2 Idade dos Metais

O período da Idade dos Metais é a última fase da Pré-história. De curta duração, este período vai de 6, 5 mil anos atrás até o surgimento da escrita.

Foi um período muito importante, pois foi marcada pela utilização dos metais, permitindo produção de instrumentos resistentes e de formas variadas.

A Idade dos Metais se divide em três etapas:

Idade do cobre: primeiro metal a ser fundido, que foi lentamente substituindo o uso de pedras.

Idade do bronze: a partir da mistura da liga do cobre com o estanho se produzia o bronze, que tinha a finalidade fabricar espadas, capacetes, martelos, lanças, facas, machados e esculturas[25]. Desenvolvido nas primeiras cidades, onde crescia divisão social do trabalho e produção mercantil (comércio).

Idade do ferro: a fabricação destes objetos de metais teve uma grande influência na agricultura, aumentando a produção. O arado de metal, enxada e outras ferramentas agrícolas rústicas foram criadas, facilitando assim o trabalho no campo.

Segundo o historiador Gilberto Cotrim as vantagens do metal justificavam todo o penoso trabalho exigido pela metalurgia, portanto tratava-se de um trabalho complexo, que exigia pessoas especializadas e com disponibilidade de tempo, e por isso a metalurgia só pôde se desenvolver em comunidades voltadas para a produção de excedentes alimentares, pois o trabalhador metalúrgico, não podendo produzir para comer, contava com os alimentos excedentes de agricultores, pecuaristas ou pescadores[26].

Para Arnold Toynbee, antes da invenção da metalurgia não havia trabalhador especialista em tempo integral, que podia ganhar a vida inteiramente pela troca, sem tomar parte direta no trabalho básico da comunidade, que era suprir-se de alimentos[27].

Assim, nasceu o progresso das técnicas agrícolas, as colheitas tornaram-se mais abundantes, o que favoreceu o aumento da população[28] e o desenvolvimento das armas resistentes.

3.3 O TRABALHO HUMANO NA IDADE ANTIGA

A Idade Antiga está ligada ao Oriente. Lá aparecem as primeiras civilizações, sobretudo na chamada "Zona do Crescente Fértil", que atraiu, pelas possibilidades agrícolas, os primeiros habitantes do Egito, Palestina, Irã e Fenícia Mesopotâmia. Abrange, também, as chamadas civilizações clássicas, Grécia e Roma, Ocidente. Vai do aparecimento da escrita (3500 a.C.) até a Queda do Império Romano Ocidental em 476[29].

Entre as civilizações mais conhecidas da História Antiga estão: a civilização do Egito Antigo, a Mesopotâmica, o povo Hebreu, os fenícios, os persas, os chineses, os hindus, os cretenses, os gregos, os macedônicos e os romanos[30].

3.3.1 Os povos da Mesopotâmia

A estrutura produtiva mesopotâmica inseria-se no modo de produção asiático, tendo a agricultura como atividade principal e a população submetida ao sistema de servidão coletiva. Como as terras pertenciam aos deuses, os seus representantes administravam essas terras e dominavam camponeses, artesãos (padeiros, oleiros, tecelões, ferreiros), soldados e serviçais menores, obrigados a produzir, defender e a trabalhar nas obras públicas[31].

Uma aristocracia de governantes, sacerdotes e funcionários públicos, através do Estado, controlava a construção de reservatórios de água, diques, canais de irrigação, estradas e depósitos de alimentos, além de impor tributos sobre quase tudo o que era produzido. Também contava com a mão de obra escrava[32], constituída dos vencidos nas guerras. Nos celeiros públicos, conhecidos os estoques, definia-se o critério de distribuição dos excedentes agrícolas obtidos da população.

O artesanato e o comércio mesopotâmicos atingiram um alto grau de desenvolvimento, com seus negociantes organizando caravanas[33] que iam da Arábia à Índia, buscando ou levando produtos, como lã, tecidos, cevada e minerais, entre outras mercadorias. A intensidade das atividades econômicas da Mesopotâmia chegou a transformar muitas de suas cidades em grandes entrepostos comerciais.

3.3.2 Civilização Hebraica

Antes da unificação hebraica, a economia foi preponderantemente pastoril e agrária. Às margens do rio Jordão, cultivavam-se coletivamente cereais, videiras, figueiras e oliveiras e o resultado era revertido para a tribo. A partir do governo de rei Saul, com a centralização política, a terra converteu-se em propriedade privada, concentrada nas mãos de uma aristocracia ligada ao Estado.

No governo de Salomão os hebreus passaram a desenvolver uma grande economia através do comércio regional[34]. Na sociedade hebraica, os camponeses, pastores e escravos formavam a maior parte da população e estavam submetidos a vários tributos pagos em impostos[35] e em trabalho, incluindo-se o serviço militar. Acima dessa base social, achavam-se burocratas e comerciantes, e no topo da hierarquia, formando a elite mais poderosa e privilegiada, estavam os proprietários de terras, os sacerdotes, a cúpula administrativa e a família real.

Viviam cercados por desertos e montanhas. Tinham que criar seus campos, para depois trabalhar sobre eles arando, semeando e colhendo frutos. Os homens passavam o dia no campo e nas atividades artesanais. As mulheres deveriam ser laboriosas e contribuir para o crescimento da população. A perda da terra constituía para o hebreu antigo o fim da principal fonte de subsistência[36].

3.3.3 Sociedade Egípcia

A população camponesa submetida ao poder do faraó devia pagar os impostos sob forma de produtos ou trabalho, constituindo o que se chamava de servidão coletiva. Dessa forma, o Estado se apropriava dos excedentes da produção, utilizando mão de obra gratuita para construir depósitos armazenagem e uma ampla burocracia estatal para cobrar impostos.

Na produção agrícola destacavam-se o trigo, a cevada, o algodão, o papiro, o linho e na criação de animais, cabras, carneiros e gansos, além da intensa pesca no rio Nilo. Também foram desenvolvidas várias atividades artesanais, bem como a produção de tecidos e vidros e a construção de navios[37].

A sociedade egípcia estruturava-se da seguinte forma: acima de todos estava o faraó e sua ampla família; logo abaixo na escala hierárquica vinha a aristocracia privilegiada constituída por sacerdotes, funcionários do Estado e nobres. Entre os burocratas destacavam-se os escribas, funcionários responsáveis pela contabilidade e supervisão da organização administrativa. Na base da sociedade egípcia, estavam os soldados, camponeses, artesãos e o grupo pouco numeroso de escravos, os quais, quase sempre eram prisioneiros de guerra[38].

Os camponeses trabalhavam como servos nas terras do Estado e recebiam pouco pela função que exerciam. Da mesma forma, os artesãos tinham uma vida bastante simples e trabalhavam nas construções e oficinas.

               As atividades dos camponeses dependiam do calendário do rio Nilo. Por exemplo: espalhar o limo, arar, semear, irrigar, no outono; após a cheia, na primavera, colher e separar os grãos de palha, armazenar, consertar os canais; no inverno, construção de monumentos ou conservação de canais públicos[39].

Usavam como instrumento o arado de madeira puxado por bois. Para enterrar sementes, contavam com a ajuda de porcos e ovelhas, que pisoteavam o solo.

3.3.4 Sociedade Grega

Na evolução da Grécia antiga encontra-se os povos indo-europeus, estes grupos se dividiam em genos, que eram famílias coletivas constituídas por um grande número de pessoas sob a liderança de um patriarca.

Cada geno constituía uma única economia, social, política e religiosa da sociedade grega. Esses pequenos agrupamentos conseguiam isoladamente assegurar sua sobrevivência com uma economia natural e coletivista. Os meios de produção (terra, sementes) assim como os bens produzidos (alimentos, objetos), pertenciam a todos os indivíduos, ou seja, a propriedade não tinha caráter particular[40].

O crescimento populacional e o aumento de consumo contribuíram para a dissolução dos genos no final dos tempos homéricos, entretanto a produção continuava limitada, pois haviam poucas terras férteis e as técnicas de produção eram bastante rudimentares.

Em Esparta a estrutura social era assim: espartanos – únicos detentores da cidadania, com direitos políticos; periecos – livres, dedicavam-se ao comércio e ao artesanato, tarefas desprezadas pelos espartanos; e os hilotas – servos pertencentes ao Estado cedidos aos espartanos juntamente com a terra na qual trabalhavam e constituíam a maioria.

Sobre Atenas, no que tange ao período pós-homérico, a escassez de terras férteis e o aumento populacional impulsionaram algumas cidades a estabelecer colônias com fins comerciais e de povoamento em vários pontos do Mediterrâneo.

O comércio entre essas áreas baseava-se nas exportações de azeite, vinho e peças de artesanato gregas e na importação de artigos como trigo, metais preciosos, cobre, ferro e madeira das regiões mediterrânicas. Essa expansão atenuou os problemas agrários internos, enriqueceu cidades.

A sociedade ateniense se subdividia, a partir do século VII a.C., em: Eupátridas – cidadãos de Atenas; Metecos – estrangeiros. Estavam proibidos de adquirir terras, mas podiam se dedicar ao comercio e ao artesanato. Pagavam impostos e eram obrigados a prestar serviço militar; e Escravos – prisioneiros de guerra, sem direitos políticos, depois se transformaram na base da produção agrária. Atuaram em todos os ofícios, e muitos chegaram até a alcançar a liberdade, mas não a cidadania[41].

Com exceção de algumas planícies férteis, o solo grego é pobre, árido, e as chuvas são raras. Entretanto, o trabalho da terra mereceu a atenção dos gregos, que se dedicaram ao cultivo da oliveira e videira[42].

Para os gregos, o ato de trabalhar era algo humilhante e desprezível. O trabalho era visto como um castigo, como algo que acabaria com a imagem do ser humano e do cidadão.

Quanto as mulheres havia uma diferença, pois as de Esparta tinham maior liberdade e tinham que dar continuidade à administração familiar e urbana; já as de Atenas, ficavam reclusas em casa até o fim da vida. As necessidades da vida obrigavam as mulheres das classes inferiores a cuidar de barracas no mercado ou a trabalhar nos campos.

Eles representavam a maioria absoluta da população e alguns possuíam trabalho especializado (artesãos, pintores, atores). Os que tinham educação mais refinada eram professores dos filhos dos ricos. Porém, a maioria era enviada às minas de chumbo ou pedreiras; rastejavam em galerias baixas e mal ventiladas, cavavam de joelhos ou deitados durante 10 a 12 horas/dia[43].

A relação entre o custo dos escravos e o custo dos outros tipos de trabalhadores, juntamente com o progresso tecnológico e a necessidade de trabalhadores sempre mais motivados, impulsionou gradativamente a libertação dos escravos e a sua substituição por novas relações de servidão e por trabalhadores assalariados.

3.3.5 Sociedade Romana

No período monárquico, a sociedade romana se dividia em três classes: patrícios – cidadãos de Roma, possuidores de terra e gado; plebeus – constituía-se por uma população de imigrantes (comerciantes, artesãos, camponeses), que não tinham direitos de cidadãos; clientes – indivíduos subordinados a alguma família patrícia, cumpridores de obrigações diversas em troca de auxilio econômico e proteção social; escravos – população recrutada entre os derrotados de guerra. Eram considerados instrumentos de trabalho, sem nenhum direito político.

O escravismo durante a Monarquia não possuiu grande significação, ganhando importância somente com a expansão territorial do período republicano.

Durante a Monarquia, surgiram condições para a sua instalação, tendo o escravismo se transformado, logo a seguir, no modo de produção predominante, em detrimento de todas as outras formas de trabalho produtivo[44].

Roma enquanto República sofreu muitas mudanças sociais, que tiveram como uma das causas à ruína do pequeno lavrador, impossibilitado de concorrer com a produção de latifúndios trabalhados por escravos; o aumento da escravidão; o êxodo rural; o surgimento de novas classes: camada senatorial, classe eqüestre (mercadores, banqueiros), clientes e proletários.

Após suas conquistas no Oriente, Roma atraiu muitos intelectuais e mercadores gregos, também foram trazidos escravos gregos. Em 326 a.C. , aboliu-se a submissão servil por dívidas, o que tornou a mão de obra escrava de importância vital para a produtividade rural da elite romana.

Segundo o autor Luis Carlos Ribeiro[45], em Roma permaneceu a divisão entre a arte de governar e o trabalho braçal, e o império era fundado na escravidão, o trabalho braçal era visto como degradante e destinado aos povos dominados, tidos como seres inferiores. Trabalhar para o cidadão romano era negar o tempo livre e o lazer.

A economia era voltada à produção de alimentos e de matéria prima para as manufaturas, havendo um comércio intenso nas várias rotas que se estabeleceram para levar à Itália, produtos vindos de todo o império. Exemplo: da Espanha chegavam alimentos como peixe e carnes salgadas, vinho, azeite; da África vinha o minério de ferro, prata, ouro e sal; da China, as especiarias, seda e porcelana.

A crise do escravismo foi ocasionada pelo fim das guerras de conquistas e que fez escassear o número de prisioneiros, tornou-se então, um obstáculo à produção, baseada na escravidão[46]. Os proprietários foram então obrigados a arrendar suas terras a camponeses, que se sujeitavam a pagar quaisquer tributos que lhes fossem cobrados. Substituía-se o escravismo pela servidão rural.

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3.4 O TRABALHO HUMANO NA IDADE MEDIEVAL

3.4.1 Alta Idade Média

A partir do século V, com a queda do Império Romano do Ocidente, que se acelerou o processo de formação do mundo feudal, tendo inicio a Alta Idade Média. As tendências desse período têm suas raízes no colapso do mundo escravista romano cujo desfecho foi a ocupação de Roma pelos Bárbaros Hérulos, em 476.

Após 476, com a ruína de Roma e o fim do escravismo, a população deixou as cidades, buscando a sobrevivência no campo. A agricultura, praticada nas vilas, constituiu a base de uma economia autossuficiente[47], cujos desdobramentos conduziriam à formação do mundo agrário-feudal.

Aqui surgiu o trabalho de estrutura familiar, diferente daquele em que prevalecia o trabalho escravo. A escravidão não foi substituída pelo regime livre, e sim pela servidão, onde as pessoas continuavam sem liberdade, presas a terra, porém sem terem a propriedade da terra. Era uma situação intermediária entre o escravo e o operário da era capitalista.

O modo de produção feudal tinha por base a economia agrária, não comercial, autossuficiente, quase amonetária. A propriedade feudal pertencia a uma camada privilegiada composta pelos senhores feudais, altos dignitários da Igreja e o longínquos descendentes dos chefes tribais germânicos.

A principal unidade econômica de produção era o feudo, que se dividia em três partes distintas: a propriedade privada do senhor, chamada manso senhorial, no interior da qual se erigia um castelo fortificado; o manso servil, que correspondia à porção de terras arrendadas aos camponeses e era dividido em lotes denominados tenências; e ainda o manso comunal, constituído por terras coletivas usadas tanto pelo senhor como pelos servos.

Devido ao caráter expropriador do sistema feudal o servo não se sentia estimulado a aumentar a produção com inovações tecnológicas, pois isso significaria produzir mais para o senhor. Por esse motivo, o desenvolvimento técnico do período foi irrelevante, de cera maneira limitando a produtividade. A principal técnica adotada foi a agricultura dos três campos (rotação de culturas), que evitava o esgotamento do solo, mantendo a fertilidade da terra.

A divisão era a seguinte: de um lado os senhores, cuja riqueza provinha da posse territorial e do trabalho servil; de outro, os servos, vinculados a terra e sem possibilidades de ascender socialmente, sem mobilidade (sociedade estamental).

 A sociedade feudal era composta de dois grupos sociais com status fixo: os senhores feudais e os servos. Os servos eram constituídos pela maioria da população camponesa, viviam presos a terra e sofrendo intensa exploração. Eram obrigados a prestar serviços ao senhor e a pagar-lhe diversos tributos pela utilização das terras, de equipamentos e instalações do feudo[48].

O doutrinador Cláudio Vicentino[49] cita como principais obrigações servis: corvéia - trabalho gratuito nas terras do senhor em alguns dias da semana; talha – porcentagem da produção das tenências; banalidade – tributo cobrado pelo uso de instrumentos ou bens do senhor; capitação – imposto pago por cada membro da família servil; tostão de Pedro – imposto pago à Igreja; Mão morta – tributo cobrado na transferência do lote de um servo falecido a seus herdeiros; albergagem – obrigação de alojamento e fornecimento de produtos ao senhor e sua comitiva quando viajavam.

Havia também a relação de direitos recíprocos, em que o vassalo jurava fidelidade ao suserano, comprometendo-se a acompanhá-lo nas guerras, assim como o suserano jurava proteção ao vassalo.

A jornada de trabalho se iniciava ao nascer do sol e só se encerrava no crepúsculo[50]. A nobreza e o clero constituíam as classes governantes, controlavam a terra e o poder que dela provinha. A Igreja prestava ajuda espiritual, enquanto a nobreza, proteção militar. Em troca, exigiam pagamento das classes trabalhadoras, em forma de cultivo de terras.

3.4.2 Baixa Idade Média

É o período da Idade Média que se estende do século XI ao século XV. Esse período se divide em duas fases, a primeira é a de expansão, e a segunda é a de depressão. Esta última, se caracteriza pelo momento histórico de crise do modo de produção feudal e das relações econômicas, sociais e culturais a ele relacionadas, isto é, a derrocada do mundo medieval.

3.4.2.1 Plena Idade Média

São deste período as cruzadas no Oriente contra os muçulmanos. No início do século XI, houve um aumento demográfico devido a avanços técnicos e à diminuição das invasões.

No entanto, nas limitações do modo de produção feudal a produção servil era limitada, não aumentando com a demanda de consumo, devido às variadas formas de tributação e às técnicas rudimentares. Assim, os senhores feudais tiveram que expulsar o excedente populacional de suas terras.

Muitas destas pessoas expulsas estabeleceram-se em aldeias ou em antigos centros urbanos, convertendo-os em mercados latentes, em incipientes pólos comerciais.

Os comerciantes vendiam os produtos trazidos da China (sedas e produtos medicinais), da Índia (especiarias como pimenta, cravo, canela), etc. em feiras, onde circulava grande quantidade de moedas de diferentes lugares, que eram trocadas pelos chamados cambistas. Foi essa a origem dos banqueiros.

O dinheiro passou a ser a medida universal do valor das mercadorias. À medida que os servos foram se emancipando, organizaram o trabalho urbano, tornando-se padeiros, sapateiros, tecelões etc..

Essas especialidades eram agrupadas em corporações de ofícios, associações profissionais de defesa mútua, destinadas a proteger seus interesses e lutar contra a aristocracia, organizando as relações entre eles, o público e o mercado, estipulando preços que fossem justos e não prejudiciais entre eles mesmos (semelhança com os valores do cooperativismo moderno e economia solidária)[51].

As corporações dividiam-se em: aprendiz, oficial e mestre, sendo que somente este último podia montar sua própria oficina de trabalho[52].

O desenvolvimento do comércio e do artesanato reativou a vida urbana e contribuiu para formação de uma nova classe social, a burguesia. As cidades que não estavam sob o poder de um senhor eram chamadas de burgos[53].

O progresso das cidades e o uso do dinheiro possibilitaram aos artesãos abandonar o trabalho servil na agricultura e viver o seu ofício, não mais para satisfazer suas necessidades apenas, mas para atender à demanda.

3.4.2.2 Fim da Idade Média

A partir do século XIV até a primeira metade do século XV surgiram os problemas que levaram a Idade Média a ruína, dentre eles: a diminuição do nível de produtividade de alimentos devido as terras de boa qualidade tornarem-se cada vez mais raras; as grandes perdas agrícolas em decorrência de condições climáticas desfavoráveis e de técnicas inadequadas de cultivo, o que ocasionou escassez alimentar em diversas regiões; a contaminação da peste negra; revolta dos camponeses e da burguesia contra a exploração da nobreza feudal; a divisão da Igreja entre dois papas, etc[54].

A depressão generalizada na Europa Ocidental deu lugar ao surgimento do capitalismo, com a expansão comercial, patrocinada pelos reis e financiada ou apoiada pela burguesia emergente do rápido crescimento das relações comerciais[55].

A expansão marítima do século XV apresentou-se como solução para o renascimento comercial e urbano, tendo como agentes a burguesia e o Estado fortalecido[56].

O aparecimento das monarquias nacionais, principalmente na França e Inglaterra, foi um fator decisivo para o declínio do feudalismo, pois os reis desses países conseguiram diminuir cada vez mais o poder dos nobres (o fim do sistema feudal fez com que descentralizasse o poder dos senhores feudais).

No final da Idade Média, com a intensificação do comércio, a mobilidade hierárquica de grande parte das corporações tornou-se menor. O enriquecimento de uma parcela dos mestres levou-os a adquirir o controle e a exclusividade daquelas atividades artesanais para si e suas famílias.

A crescente exploração da mão de obra assalariada possibilitou que muitos proprietários de oficinas capitalizassem recursos suficientes para deixarem de ser mestres e se tornarem exclusivamente empregadores burgueses.

Surgiu assim, a transformação da relação social senhor x servo para outra: burguês x proletário (marca do capitalismo).

3.5 O TRABALHO HUMANO NO SÉCULO XV

Na sua fase pré-inicial, recebeu o nome de pré-capitalismo, porque nessa fase as relações de produção ainda não foram totalmente assalariadas (séculos XII e XV). Depois surgiu a denominação: Capitalismo comercial, fase em que começaram a existir relações de trabalho e produção assalariadas (séculos XV ao XVIII).

Neste período houve uma crescente centralização do poder nas mãos dos reis e a consequente formação das monarquias nacionais. Esse processo estava associado à expansão do comércio e à ascensão da burguesia.

O declínio do sistema feudal contribuiu para o surgimento do sistema capitalista. O desenvolvimento do comércio ligado às grandes navegações, a descoberta de novos continentes e a formação do sistema colonial ocasionaram a expansão deste novo sistema.

Com o renascimento comercial e urbano, o aparecimento da burguesia e a formação das monarquias nacionais, a cultura europeia sofreu alterações. No plano econômico, o renascimento comercial reativou o intercâmbio cultural entre o Ocidente e Oriente. As cidades italianas monopolizavam o comércio de especiarias com o Oriente, estimulando o intercâmbio cultural através dos contatos com as civilizações bizantina e sarracena[57].

Entre os produtos mais procurados pelo comércio europeu estavam as especiarias (cravo, canela, pimenta, noz-moscada, gengibre) e os artigos de luxo (porcelanas, tecidos finos de seda, marfim, perfumes) que tinham procedência Oriental (Ásia e África). A Europa sentia falta de gêneros alimentícios e de matérias-primas, e estas necessidades só poderiam ser satisfeitas com a ampliação de mercados fora do continente europeu[58].

Inicia-se também o período das grandes descobertas de novas terras, das Américas. Os ingleses, italianos, franceses etc, tiveram grande destaque nessas descobertas. Os descobridores, ao mesmo tempo que levavam para a Europa a riqueza local, determinavam as colônias que adquirissem bens das respectivas matrizes.

Essa modalidade de exploração colonial foi ampliada à medida que o trabalho na colônia e na própria matriz passou a ser executado com a mão de obra escrava negra, obtida a baixíssimo preço na África.

O crescimento do mercado não só conviveu por algum tempo com antigas formas de servidão, como fez renascer a escravidão de novo tipo: o trabalho compulsório dos africanos nas colônias da América[59].

Para as elites que comandavam a implantação desse sistema, o trabalho livre era o ideal. Essa é a concepção burguesa da liberdade individual do homem: ele é livre para usar a força de seu corpo como uma máquina natural e para escolher de modo soberano o que deseja para si mesmo. Se ao escravo na América não era dada a oportunidade da escolha, ao trabalhador europeu era concedido o direito soberano da liberdade.

Havia uma crescente importância social da burguesia, esta que era composta por comerciantes, financistas e industriais. Este crescimento fez surgir uma crise social no campo, que afetou as relações servis, o que contribuiu para o aparecimento do trabalho assalariado.

Ocorreu aqui, a separação entre o trabalhador e a propriedade dos meios de produção[60]. Essa separação criou dois tipos de homens livres: o trabalhador livre assalariado, que vivia exclusivamente de seu trabalho, e o capitalista, proprietário dos meios de produção.

O novo conceito dado ao trabalhador possuía uma dupla face: de um lado, o trabalho como fruto da vontade e de objetivos determinados; de outro, o trabalho mecânico e subordinado a uma vontade exterior (o trabalho dos indivíduos que não possuem os meios de produção).

3.6 O TRABALHO HUMANO NA IDADE MODERNA

O fenômeno acelerador da crise do regime artesanal foi a inovação tecnológica, designada Revolução Industrial, o que proporcionou a substituição da ferramenta manual pela máquina.

O triunfo da Revolução Francesa também exaltou a liberdade individual exarada pelo preâmbulo da Constituição de 1791 da França. O novo regime consagrou a liberdade para o exercício das profissões, artes ou ofícios, e para as livres contratações[61].

Com o desvio da inicial finalidade das corporações de ofício e a conseqüente exploração de aprendizes e companheiros que dificilmente chegavam à maestria, nasceram as compagnonnage, composta de companheiros que se reuniam em defesa de seus interesses para acirrar a luta entre mestres e companheiros. Daí o embrião do atual paralelismo sindical. A decadência das corporações de ofício se iniciava.

Em 1789, as corporações de ofício foram extintas com a Revolução Francesa e em 1791 a Lei Chapelier proibia seu restabelecimento e demais coalizões. Nasce à lei do mercado, o liberalismo, sem intervenção estatal nas relações contratuais[62].

Esta lei dispunha em seu artigo 7º que, todo homem é livre para dedicar-se ao trabalho, profissão, arte ou oficio que achar conveniente, porém estará obrigado a prover-se de uma licença, a pagar os impostos de acordo com as tarifas seguintes e a conformar-se com os regulamentos da polícia que existam ou que se expeçam no futuro[63].

A industrialização da segunda metade do século XVIII iniciou-se com a mecanização do setor têxtil, cuja produção tinha amplos mercados nas colônias, inglesas ou não.

Entre as principais invenções mecânicas do período, destacam-se a máquina de fiar (James Hargreaves), o tear hidráulico (Richard Arkwright), e o tear mecânico (Edmund Cartwright). Todos esses teares proporcionaram o aumento da produção e diminuíram a necessidade de mão de obra[64].

Na Inglaterra havia as melhores condições para o desenvolvimento da indústria. Em 1773 James Watt aperfeiçoou uma máquina que conseguia manter as válvulas, os cilindros e o êmbolo resfriados, proporcionando assim, o funcionamento das máquinas produtivas por largas jornadas[65].   

A nova máquina a vapor passou a ser aplicada em todos os seguimentos industriais e de transportes possíveis. A produção e a comercialização dos bens e mercadorias foram enormes.

Enquanto no plano econômico e político o capitalismo burguês industrial se cristalizava, as condições sociais daqueles que trabalhavam pioravam progressivamente. A inexistência de normas de tutela colocava a parte mais frágil da relação capital e trabalho em uma desvantagem.

Diante da ausência de terras para cultivo, os moradores do campo migraram para as cidades em busca de emprego nas fábricas. Mas, como a oferta de trabalho era muito grande, os industriais ofereciam salários extremamente baixos, o que lhes proporcionavam lucros[66].

As jornadas não tinham limite e os salários eram baixos. As condições de trabalho eram péssimas, pois o novo maquinário era muito perigoso. Os acidentados no trabalho não conseguiam provar a culpa do empregador e não percebiam qualquer indenização.

As mulheres e crianças dividiam com os homens os postos de trabalho. O trabalho e a jornada não tinham diferenciação, mas crianças e mulheres ganhavam um salário bem inferior[67]. Substituía-se o trabalho do homem pelo do menor e das mulheres. Prevalecia a lei do mercado onde o empregador ditava as regras e a jornada era de 16 horas e a exploração da mão de obra infantil chegou a níveis alarmantes[68].

O que estava em jogo era o fim da autonomia do trabalho artesanal e a reunião e domesticação dos trabalhadores na fábrica. A divisão do trabalho defendida por Adam Smith teria a função de destruir o saber-fazer do artesão, subordinando-o à nova tecnologia da maquinofatura.

O uso do tempo que não fosse de forma útil e produtiva, conforme o imposto na fábrica passou a ser visto como preguiça e degeneração[69]. Só o trabalho produtivo, fundado na máxima utilização do tempo, dignificava o homem.

Para o sistema fabril, o trabalho produtivo tinha por fim gerar uma riqueza que não deveria ser apropriada pelo trabalhador. E apesar do trabalhador ser livre e de a máquina ser anunciada como a que libertaria o homem do esforço físico, as máquinas serviram tanto para o aumento da produtividade como para impor a disciplina do tempo e do trabalho, com o objetivo de controlar as formas de resistência operárias por meio de ameaça ao desemprego.

A primeira norma a regular o contrato de trabalho somente apareceu no Código Civil Francês de 1804 e ainda colocava o trabalho no mesmo patamar da locação de coisas e animais. O patronato impunha as condições contratuais e os obreiros apenas aderiam. A contratação era considerada individual.

O espírito da época era o do liberalismo individualista da Revolução Francesa, que acabara com os privilégios patrimoniais da Monarquia e do Clero. Os revolucionários burgueses embora tivessem recebido apoio dos trabalhadores, chamados proletários, impediam que os mesmos negociassem coletivamente as condições de trabalho.

Com o passar do tempo as condições do trabalho humano foram melhorando, fato comprovado pela não admissão de menor de 10 anos (1800), redução da jornada de trabalho (1802), medidas de higiene de trabalho (1800), Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948) entre outras mudanças fantásticas[70].

3.7 O TRABALHO HUMANO NA IDADE CONTEMPORÂNEA

Na evolução histórica do processo de trabalho, passou-se da cooperação simples à manufatura, e depois evoluiu para a grande indústria. Surgiram nas fábricas, no início do século XX, esforços direcionados para a racionalização do trabalho, em cuja defesa Taylor é um dos nomes em evidência.  Assim, a sociedade de mercado transformou o trabalho na fonte de todos os valores do homem.

O trabalho tornou-se nesta era uma atividade compulsiva e incessante, a servidão tornou-se liberdade e a liberdade, servidão; ou seja, a aceitação voluntária de um sofrimento, sem outro sentido senão ele próprio.

Nesta fase foi deflagrada a II Revolução Industrial, impulsionada pela descoberta da energia elétrica que permitiu o processo industrial sofresse uma enorme aceleração. A introdução dos motores elétricos industriais implicou em tecnologias nunca pensadas.

A alteração das máquinas favoreceu a mudança dos processos produtivos. O auge dessa revolução aconteceu com as novas técnicas de produção. Frederick Taylor em 1910 introduziu na indústria a chamada organização científica do trabalho, através da fragmentação das tarefas, cronometrou os tempos para cada operação e estabeleceu os espaços da atividade e movimento para o trabalhador médio.

A fábrica era para produzir muito e rápido, daí a valorização da disciplina e da chefia autoritária que conseguia tirar a produção planejada a cada dia. Houve a consolidação do movimento sindical, a greve e as conquistas dos direitos sociais. Essa organização do trabalho acabou por levar o nome de seu criador: Taylorismo[71].

A linha de montagem não era idéia nova, mas a sua difusão mais elaborada, organizada com o taylorismo, foi obra de Henry Ford. Essas duas formas de organização de produção são conhecidas como fordismo e taylorismo.

Com o advento da III Revolução Industrial fundada na inovação tecnológica, que fornece a ferramenta para o enxugamento das empresas, introduzindo novas formas de organização do trabalho e de seu gerenciamento, a empresa industrial convencional passou a ser coisa do passado.

Por outra parte, a tecnologia teve a magia de alterar os parâmetros da competitividade, permitindo a expansão dos mercados, daí a globalização e a prevalência da Lex mercadoria dos mercados mundiais.

Tudo isso em função das inovações tecnológicas que ditam o processo de melhoria contínua e requisitam uma qualificação profissional esmerada. E em 1789 houve uma revolução tecnológica mais intensa que invadiu todos os segmentos da sociedade moderna inaugurada com a República da Revolução Francesa.

Na empresa à medida que a inovação tecnológica era introduzida na produção, por meio de máquinas ou equipamentos, havia um descarte de pessoal desproporcional[72]. Os ganhos de produtividade foram impressionantes.

Outra característica marcante foi a descentralização da produção. O padrão da grande empresa representativo da II Revolução Industrial é abandonado. O novo padrão é a concentração no foco da empresa. As atividades-meios são repassadas para terceiros, teoricamente mais especializados, portanto mais competentes no que fazem. A descentralização ainda que não visasse a redução de pessoal, acabou sendo assim.

 A precarização foi uma conseqüência através do que se convencionou chamar de prestação de serviços pela pessoa jurídica. Esse enxugamento empresarial teve como reflexo a redução das estruturas, dos níveis hierárquicos e de decisão nas organizações.   Desse modo muita gente capacitada ficou sem trabalho.

Houve também as novas formas de organização de trabalho. Primeiro é feita a venda do produto que o cliente quer, e em seguida, sua fabricação. Com isso os estoques foram racionalizados, a matéria prima passou a chegar na hora de aplicá-la. A produção passou a ser iniciada após a venda de determinado produto de tal modelo. Depois, inicia-se a produção pós-venda, em que se recebe o capital antecipadamente, aqui o cliente é quem financia tudo. Estas técnicas são denominadas de Toyotismo.

No entanto, os profissionais acabaram sobrando, a multifunção e polivalência são intensificadas. Os grupos definem tarefas, programam qualificação, férias e rodízios. Está inaugurado o trabalho imaterial.

Neste momento surge a divisão do trabalho, em que o trabalhador se vê especializado e dividido, obrigado a acompanhar as novas exigências da produção; e as especializações de trabalho que consistem na aplicação dos trabalhadores a máquinas e operações determinadas[73].

As funções foram enriquecidas e o trabalhador além de aportar no seu posto de trabalho a sofisticação, deve se adaptar a uma nova linguagem, a trabalhar em conjunto com colegas em outra parte do mundo no desenvolvimento dos produtos e mercados locais, o que foi possível graças ao computador, satélite etc.

3.8 O TRABALHO HUMANO NA HISTÓRIA BRASILEIRA

A partir de 1570 a importação de escravos africanos começou a ser incentivada, e a Coroa passou a tomar medidas legislativas para impedir as mortes e a escravidão desenfreada dos índios. No entanto, somente em 1758, a Coroa determinou a libertação definitiva dos indígenas.

O negro africano, desenraizado de seu meio e separado arbitrariamente de sua família, chega ao território brasileiro obrigado a submeter-se ao sistema social e econômico que lhe era imposto. Suas habilidades já eram conhecidas, sobretudo no tocante à capacidade produtiva e à força física para o trabalho.

A propriedade de escravos era legalmente permitida e constituía sinal de poder e riqueza. Situação bem diferente é vista nos dias atuais, onde manter o trabalhador em condições análogas a de escravo constitui crime, devidamente tipificado e apenado pelo artigo 149 do Código Penal Brasileiro.

O trabalho escravo era maciçamente usado em todas as atividades econômicas desenvolvidas ao longo do período colonial e imperial: nos engenhos de açúcar, nas regiões produtoras de fumo, na exploração de materiais preciosos e no plantio e cultivo do café.

Em 1871, o governo imperial propôs a chamada Lei do Ventre Livre, que declarava livres os filhos de mulher escrava nascidos após aquela data[74], os quais ficariam em poder dos senhores de suas mães até a idade de oito anos. A partir daí, os senhores podiam optar entre receber do Estado uma indenização ou utilizar os serviços do menor até que ele completasse 21 anos.

Em 1885, foi aprovada a Lei dos Sexagenários, que concedia liberdade aos escravos maiores de sessenta anos e estabelecia normas para a libertação gradual de todos os escravos, mediante indenização.

A abolição da escravatura foi, enfim, aprovada em 13 de maio de 1888[75], pela princesa Isabel, que se encontrava na regência do trono. O ex-escravo tornou-se juridicamente dono de si mesmo, podendo negociar sua força de trabalho, responsabilizando-se pelo sustento próprio e de sua família.

Após a evidência do trabalho escravo e do segmento do trabalho agrícola cafeeiro no Brasil, surge outro período o qual foi marcado pelo surgimento das estradas, ferrovias o que contribuiu para o crescimento de uma grande classe de trabalhadores, estes ligados ao aparecimento das indústrias.

E por aí não para, no Brasil a cada período, acaba nascendo sempre uma nova categoria de trabalhadores, seja na agricultura, no comércio, na área tecnológica, no setor intelectual etc.

Assim, percebe-se que existem vários campos onde o trabalhador pode operar, como empregado doméstico, aprendiz, vendedor, secretária, motoqueiro, dentre outros, sempre com obediência ao que estabelece a CLT e/ou outras leis específicas, bem como a Constituição Federal.

Ressalta-se que existe uma categoria a qual recentemente recebeu regulamentação jurídica própria, que é a dos que trabalham à distância (teletrabalho, home office ou anywhere office), subordinados e controlados pelos seus superiores, trata-se da lei lei 12.551, de 15 de dezembro de 2011, que alterou o art. 6º da Consolidação das Leis do Trabalho[76].

No entanto, destaca-se que os escravos ganharam a liberdade, mas não ganharam as condições para o exercício dessa liberdade. Assim, esses “libertos” continuaram se submetendo a formas de trabalho que podem ser tecnicamente consideradas servis.

 Verifica-se isto quando são submetidos a horas de trabalho exaustivas sem o seu devido pagamento; quando trabalham em condições insalubres ou perigosas e não recebem o adicional equivalente; quando não possuem sua Carteira de Trabalho assinada pelo empregador, dentre outros direitos que são descumpridos pelos empresários, patrões, chefes, em geral os empregadores.

Existem muitos estudiosos dentre eles Solange Mello[77] que assevera que escravismo ainda vigora até os dias de hoje só que camufladamente, pois o analfabetismo, o desconhecimento dos seus direitos, a falta de perspectiva para o futuro e de oportunidade de trabalho alienam o indivíduo ocioso e necessitado, fazendo com que ele fique sem opções e se sujeite as imposições dos mais favorecidos e poderosos. Esta é a chamada Escravidão Contemporânea.

Nos dias atuais a humanidade está passando por uma Revolução Tecnológica, que tem na globalização da economia um de seus efeitos. Da mesma forma que a economia está submetida a novas percepções (leis de mercado, internacionalização da moeda) e que a empresa experimenta mutações estruturais – transnacionalização da atividade econômica, horizontalização do processo industrial (contratação de empresas especializadas em determinados segmentos do respectivo empreendimento), terceirização da produção –, as relações de trabalho também passam por profundas inovações, em razão da microeletrônica, dos círculos integrados de telecomunicação e da robótica.

4 O SURGIMENTO DO DIREITO DO TRABALHO

O Direito do Trabalho nasce como reação aos acontecimentos da Revolução Industrial, para fixar controles para o sistema econômico e conferir medidas de civilidade. É produto da reação da classe trabalhadora ocorrida no século XIX contra a utilização sem limites do trabalho humano[78].

O direito comum com suas regras privadas de mercado não mais atendia aos anseios da classe trabalhadora, oprimida diante da explosão do mercado de trabalho ocorrido em virtude da descoberta da máquina a vapor, de tear, da luz e da conseqüente revolução industrial. E a prática de que contrato faz lei entre as partes colocava o trabalhador em posição inferior, que em face da necessidade, acabava por aceitar qualquer tipo de cláusula contratual, submetendo-se as condições desumanas e degradantes.

Daí a necessidade de um novo sistema legislativo protecionista, intervencionista, em que o Estado deixasse a sua apatia, sua inércia e tomasse um papel paternalista, intervencionista, com o intuito de impedir a exploração do homem pelo homem de forma vil.

Desta forma nasce o Direito do Trabalho com função tutelar, econômica, política, coordenadora e social. Tutelar, porque visa proteger o trabalhador e reger o contrato mínimo de trabalho. Econômico em face da sua necessidade de realizar valores, injetar capital no mercado e democratizar o acesso as riquezas. Coordenadora porque visa harmonizar os naturais conflitos entre capital e trabalho. Política, pois toda medida estatal coletiva atinge a toda população e tem interesse público. E Social, pois visa a melhoria da condição social do trabalhador[79].

A história do Direito do Trabalho se divide em quatro períodos[80]: a Formação - que surgiu na Inglaterra, com a primeira lei tutelar, intitulada Ato da Moral e da Saúde, em que essa lei proibia o trabalho de menores à noite e por duração superior a 12 horas diárias. Em 1813 se proibiu na França o trabalho de menores nas minas; em 1839 na Alemanha, teve inicio a edição de normas sobre trabalho da mulher e do menor. E em 1824, na Inglaterra a coalizão deixa de ser crime.

No segundo período: a Intensificação (1848 a 1890) – os acontecimentos mais importantes foram o Manifesto Comunista de Marx e Engels e a implantação da primeira forma de seguro social na Alemanha, em 1883, no governo de Bismarck.

O terceiro período: a Consolidação (1890 - 1919) é marcada pela publicação da Encíclica Papal Rerum Novarum, de Leão XIII, preconizando o salário justo. E neste período em Berlim também houve uma conferência sobre o Direito do Trabalho.

E no quarto período: a Autonomia (de 1919 aos dias atuais) caracteriza-se pela criação da Organização Internacional do Trabalho, das Constituições do México (1919) e da Alemanha (1919)[81]. A ação internacional desenvolve um bom trabalho de universalização do Direito do Trabalho. O Tratado de Versailles (1919) desempenha papel importante: em seu artigo 427 não admite que o trabalho seja mercadoria, assegura jornada de 8 horas, igualdade de salário para trabalhadores de igual valor, repouso semanal, inspeção do trabalho, salário mínimo etc.

Já no Brasil, de 1500 até 1888, o quadro legislativo referente ao trabalho registra, em 1830, uma lei que regulou o contrato sobre prestação de serviços dirigida a brasileiros e estrangeiros. Em 1837, há uma normativa sobre contratos de prestação de serviços entre colonos dispondo sobre justas causas de ambas as partes. De 1850 é o Código Comercial, contendo preceitos referentes ao aviso prévio.

De 1888 à Revolução de 1930, os diplomas legislativos de maior relevância são: em 1903, a lei sobre sindicalização dos profissionais da agricultura; de 1907, lei sobre sindicalização dos trabalhadores urbanos; de 1919, temos uma lei sobre acidente de trabalho; de 1923 é a Lei Elói Chaves, disciplinando a estabilidade no emprego conferida aos ferroviários que constassem 10 ou mais anos de serviço junto ao mesmo empregador; em 1930 cria-se o Ministério do Trabalho[82]. Esse é o marco do aparecimento do Direito do Trabalho no Brasil apresentado pela doutrina, embora anteriormente já existisse um ambiente propício ao seu surgimento, em face da legislação que o antecedeu.

Em 1943, temos o diploma mais importante para a disciplina, que é a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Há quem diga que essa legislação adveio da vontade do Estado, enquanto outros afirmam a existência de movimentos operários reivindicando a intervenção legislativa sobre a matéria. As agitações dos trabalhadores, em 1919, manifestadas por meio de greves nos grandes centros do país confirmam essa última posição[83].

4.1 AS CAUSAS DO SURGIMENTO DO DIREITO DO TRABALHO E SUAS TRANSFORMAÇÕES NA SOCIEDADE

São as principais causas do surgimento do Direito do Trabalho no contexto mundial: os vícios e as consequências da liberdade econômica e do liberalismo político, o maquinismo, a concentração de massas humanas e de capitais, as lutas de classes com as consequentes rebeliões sociais com destaques para os ludistas ou cartistas na Inglaterra, as revoluções de 1848 e 1871, na França, e 1848, na Alemanha, livres acordos entre grupos econômicos e profissionais regulando as relações entre patrões e operários, mais tarde, reconhecidos pelo Estado como lei, a Encíclica Rerum Novarum, de Leão XIII, a guerra (1914 - 1918), cujo fim em 1919 conferiu ao Direito do Trabalho posição definitiva nos ordenamentos jurídicos nacionais e internacionais[84].

A Revolução Industrial acarretou mudanças no setor produtivo e deu origem à classe operária, transformando as relações sociais. As relações de trabalho guiadas pelas corporações de ofício foram substituídas por uma regulamentação autônoma. Surgiu assim, uma liberdade econômica sem limites, com opressão dos mais fracos.

O emprego generalizado de mulheres e menores suplantou o trabalho dos homens. Os mais fracos suportavam salários ínfimos, jornadas desumanas e condições de higiene degradantes, com graves riscos de acidente.

A lei de bronze considerava o trabalho uma mercadoria, cujo preço era determinado pela concorrência que tendia a fixá-lo no custo da produção e a estabilizá-lo a um nível próximo ao mínimo de subsistência. Analisando a referida lei, Marx desenvolveu uma doutrina que contribuiu para que o trabalhador tivesse uma consciência coletiva e tomasse conhecimento da sua força.

O Estado se portava como simples observador dos acontecimentos e, por isso, transformou-se em um instrumento de opressão contra os menos favorecidos, colaborando para a dissociação entre capital e trabalho. O conflito entre coletivo e individual ameaçava a estrutura da sociedade e sua estabilidade. Surge daí a necessidade de um ordenamento jurídico com um sentido mais justo de equilíbrio.

As relações de trabalho foram-se insurgindo contra os princípios liberais e reclamando modificações. O cunho humanitário da intervenção estatal refletiu-se no aparecimento do Direito do Trabalho de praticamente todos os povos. E foram os aprendizes, os menores e os acidentados que provocaram grande parte da legislação laboral, de caráter mais humanitário do que jurídico.

Com o surgimento do Direito do Trabalho a vida social e laboral do trabalhador mudou positivamente, pois este passou a possuir uma série de direitos garantidos constitucionalmente ou por leis especiais. O trabalho humano se transformou numa atividade prazerosa, digna, respeitada e desejada por todos, já que o Estado, por meio do Poder Judiciário, garante a regulamentação e o cumprimento dos direitos e deveres dos sujeitos envolvidos numa relação laboral, empregado x empregador.

De fato que atualmente, os trabalhadores possuem jornadas de trabalho compatíveis com suas funções, que atendem ao princípio da dignidade humana; descansos intra e interjornada; salários dignos; licenças; férias; décimo terceiro; aviso prévio etc.

O Direito do Trabalho surge no século XIX na Europa em um momento marcado pela desigualdade econômica e social, fenômeno que tornou necessária a intervenção do Estado por meio de uma legislação predominantemente imperativa, de força cogente, insuscetível de renúncia pelas partes[85].

No Brasil, houve a ocorrência de influências internas e externas que contribuíram para o surgimento do Direito do Trabalho, quais foram internamente: o movimento operário de que participaram imigrantes com inspirações anarquistas, caracterizado por inúmeras greves em fins de 1800 e inicio de 1900; o surto industrial efeito da primeira Guerra Mundial, com a elevação do número de fábricas e de operário e a política trabalhista de Getúlio Vargas.

E externamente o que contribuiu foram às influências vindas de outros países e que exerceram alguma pressão no sentido de levar o Brasil a elaborar leis trabalhistas, em especial as transformações que ocorriam na Europa e a crescente elaboração legislativa de proteção ao trabalhador em muitos países. Também pesou o compromisso internacional assumido pelo Brasil ao ingressar na Organização Internacional do Trabalho, criada pelo Tratado de Versailles, propondo-se a observar normas trabalhistas[86].

A Constituição de 1891 garantiu o livre exercício de qualquer profissão e assegurou a liberdade de associação. Em 1934 houve a primeira Constituição Federal que elevou os direitos trabalhistas ao status constitucional dos artigos 120 e 121. Em 1936 houve a instituição do salário mínimo[87].

Em 1943 a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é compilada. Em 2004 houve a Emenda Constitucional nº 45 que ampliou a competência da Justiça do Trabalho para envolver também aí as relações de trabalho. E desde então o Direito do Trabalho vem sofrendo modificações, e regendo os direitos e deveres envolvidos numa relação de trabalho.

4.2 AS ALTERAÇÕES DAS RELAÇÕES DE TRABALHO E A FLEXIBILIZAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO

Os fenômenos da globalização, inovações tecnológicas e competitividade provocaram as indispensáveis mudanças nas relações de trabalho. O avanço da tecnologia, por exemplo, exigiu uma maior qualificação profissional, além dos altos custos oriundos dos direitos e garantias trabalhistas, que regem a relação de emprego[88] e agravaram a redução dos postos de trabalho em diversos segmentos econômicos, chegando causar a ilusão de uma próxima sociedade sem trabalho.

Além disso, a criação de diversos e variados grupos econômicos força a privatização das estatais, e refletem na criação do infinito mercado terceirizado e informatizado, provocando o desemprego ou subemprego[89]. Não existe dúvida de que a precariedade da condição de trabalho tende a gerar desequilíbrio e desestruturação do sistema produtivo, comprometendo o desenvolvimento econômico e social.

Nessa linha de raciocínio, o processo de globalização deve ser analisado sob a ótica positiva e negativa. Positiva, pois a tendência é ocorrer ampliação do mercado de trabalho, com crescimento econômico e geração de novos empregos, refletindo, inclusive, na privatização de estatais. Negativa, pois as estatísticas revelam que as multinacionais pouco geram empregos formais, haja vista o grande investimento em tecnologia de ponta, cujo planejamento abrange corte da mão de obra para diminuir o custo, robotizando para aumentar a produção e lucro em curto prazo.

Tratava-se da chamada crise do ramo juslaborativo que acentuou a desregulação, informalização e desorganização do mercado de trabalho[90], provocada pela revolução da informática, telemática, nanotecnologia, a robotização, quebras de barreiras alfandegárias com a mundialização da economia, avanço nos meios de comunicação, a divisão mundial do comércio e a crise imobiliária e econômica americana[91].

E a partir deste momento buscava-se um ideal modelo de Direito do Trabalho, com regras reflexíveis, aberto a mudanças, adaptável à nova situação econômica mundial e de cada empresa.

A transmutação da economia mundial e o consequente enfraquecimento da política interna de cada país, dos altos índices de desemprego mundial e de subempregos, fez-se necessário a adoção de medidas que harmonizassem os interesses empresariais com as necessidades profissionais, justificando a flexibilização de determinados preceitos rígidos ou de criação de regras alternativas para justificar a manutenção da saúde da empresa e da fonte de emprego[92].

Segundo Rosita Nassar[93], a flexibilização das normas trabalhistas faz parte integrante de um processo maior de flexibilização do mercado de trabalho, consistente em um conjunto de medidas destinadas a dotar o Direito do Trabalho de novos mecanismos capazes de compatibilizá-los com as mutações decorrentes de fatores de ordem econômica, tecnológica ou de natureza diversa. Isso quer dizer que a flexibilização compreende estratégias politicas, econômicas, sociais e jurídicas.

Para a doutrinadora Vólia Cassar[94], a flexibilização é um direito do patrão, mas deve ser utilizada com cautela e apenas em caso de real e comprovada necessidade de recuperação da empresa. Daí porque os princípios da lealdade, razoabilidade, transparência, necessidade, devem vigorar em todo o processo, sob a supervisão sindical, com base na Lei nº 11.101/00, artigo 50, III.

A maioria da população trabalha na informalidade ou em relações empregatícias mascaradas pelo serviço autônomo, estagiário, profissional representado por pessoa jurídica, para tentar o empresariado sobreviver ao alto custo dos descontos feitos na folha de salários.

Esse desrespeito do mínimo existencial garantido ao trabalhador aumenta a necessidade de ponderação entre a flexibilização da legislação, que traduz a redução de direitos absolutos e universais. Sendo, portanto, inegável que nos dias atuais ainda persiste a crise nas relações de trabalho.

Sobre este tema da flexibilização, o professor Francisco Meton defende em sua obra “Elementos de direito do trabalho e processo trabalhista” que:

As propostas de reforma trabalhista tendem a enxugar a CLT, mantendo um regulamento mínimo, porém preservando os direitos históricos. No direito coletivo, propõe-se o fim da unicidade sindical, do imposto sindical, a inclusão das centrais sindicais no sistema sindical e, no processo, a sua simplificação.[95]

O professor também conceitua a flexibilização no direito do trabalho como sendo:

 ... uma das consequências mais acentuadas da globalização nas relações de trabalho, cuja dinâmica é cada vez mais diversificada, em virtude do avanço da tecnológica em todos os quadrantes, que vem triturando os postos de trabalho e exigindo mais qualificação profissional[96].

Com isso surgem os discursos de flexibilização das leis trabalhistas, sob tendências menos radical, que é a de adaptação da legislação às crescentes necessidades da economia. No entanto, cresce em dimensão a categoria dos direitos fundamentais do trabalho.

A flexibilização se manifesta de duas maneiras: a adaptação, que é a versão moderada, e desregulamentação, a forma mais radical. Consiste no afastamento de certos empecilhos para permitir modalidades contratuais adequadas ao mercado, bem como a inserção de cláusulas dinâmicas nos contratos. No Brasil está em uso a adaptação[97].

Trata-se de precarização do trabalho, levada a efeito pelo Neoliberalismo, sob o argumento de compatibilizar a preservar a sobrevivência das empresas com o mínimo de garantias dos trabalhadores.

A doutrinadora Alice Monteiro[98] trata a flexibilização como sinônimo de desregulamentação normativa, e a divide em normativa e de novo tipo. A normativa equivale à flexibilização heterônoma imposta unilateralmente pelo Estado. Já a de novo tipo é equivalente a flexibilização autônoma, a qual pressupõe a substituição das garantias legais pelas garantias convencionais, com primazia da negociação coletiva.

Para Vólia Cassar[99], o Brasil adotou a flexibilização legal e a sindical ou negociada sindicalmente. Sendo a legal quando a própria lei prever as exceções ou autorizar redução de direitos. E a sindical quando as normas coletivas autorizarem a diminuição de direitos.

A flexibilização se manifestou na França sob a forma de redução do grau de sindicalização; na Itália, na forma de crescimento do trabalho por conta própria; nos EUA, na forma de trabalho doméstico. Na Espanha e na Argentina, a precarização do trabalho chegou ao extremo.

Daí o Ministro Orlando Teixeira haver prenunciado as seguintes conseqüências maléficas: aumentos e diminuições acelerados na procura de mão de obra; redução de número de empregados com garantia de emprego; desníveis acentuados de remuneração e de qualificação; decadência dos sindicatos tradicionais e encolhimento do poder político da classe trabalhadora[100].

A Constituição Federal de 1988 abriu vários precedentes de flexibilização, ao permitir, por negociação coletiva ou acordo coletivo, a compensação de horários e a redução da jornada (artigo 7º, XIII); a redução de salários (artigo 7º, VI); e jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva (artigo 7º, XIV)[101].

Entretanto, a lei tem autorizado outras hipóteses de flexibilização, seja mediante opção do empregado, apenas com a chancela sindical, como ocorre no contrato por tempo parcial (artigo 58-A, § 2º, da CLT) e a suspensão do contrato para realização de curso (artigo 476-A da CLT), seja pela redução ou revogação de benesses, como ocorreu com a natureza salarial de algumas utilidades (artigo 458, § 2º, da CLT); a redução do FGTS para os aprendizes (artigo 15, §7º, da Lei nº 8.036/90); e ainda, a possibilidade de descontos no salário em virtude de empréstimo bancário (Lei nº 10.820/03)[102].

Já desregulamentação, que é a forma mais radical da flexibilização, consiste na abolição da legislação protetora do trabalho, permitindo a livre manifestação de vontade para regular a relação de trabalho por meio da negociação coletiva de trabalho – Contrato Coletivo, Convenção e Acordos Coletivos de Trabalho e pelo Contrato Individual de Trabalho. Com isso, restaria resgatada a autonomia da vontade das partes[103].

5 AS PERSPECTIVAS PARA O DIREITO DO TRABALHO NO SÉCULO XXI

Como perspectivas para o direito do trabalho no século XXI espera-se um futuro com mercados de trabalho ambiciosos, avassaladores, tendo por um lado, os donos do poder diretivo (empresários, patrões, etc.); e por outro, aqueles que por diversos fatores, até mesmo pela estrutura do sistema capitalista, devem obediência e subordinação ao seu superior, em detrimento de ser remunerado pelo seu trabalho, o que, porém na maioria das vezes não é valorado da maneira mais justa.

A cada período o Direito do Trabalho evolui de uma maneira estrondosa, em que ele aprende a se superar com a dificuldade e diversidade de problemas nas relações trabalhistas ocasionadas pela modernização, globalização, socialização, o crescimento populacional, o status financeiro de cada trabalhador que vem evoluindo de classe, a qualificação de uns que estão se tornando muito bem preparados, tão bem preparados que em determinadas empresas o empregador não tem lugar para ele, pois não tem como pagar pela sua mão de obra, trabalho intelectual.

Assim, quando o mercado não tem condição de absorver os trabalhadores, seja pela falta de formação profissional especializada, seja pela desvalorização do profissional qualificado, estes aderem ao mercado informal ou mesmo realizam outro labor diferente daquele para o qual se preparou por muito tempo.

De outro ângulo, o Direito do Trabalho é tão complexo que em algumas situações só há como entendê-lo quando relacionado com fatores sociais, econômicos, culturais e políticos[104], o que se pode verificar quando um operário do ramo de construções ganha razoavelmente bem, mesmo sem ter se qualificado com cursos técnicos para tal, isso acontece porque muitos se desiludiram com esta profissão pelo fato dela não estar sendo valorizada numa certa época.

Pode-se também relacionar o Direito do Trabalho com os Direitos Humanos ao falar do desemprego e da precarização do trabalho, pois um trabalhador deve ser remunerado justamente, ter um trabalho decente e ter seus direitos respeitados, principalmente o da dignidade da pessoa humana[105].

No Brasil e no resto do mundo, existe uma crescente exploração de mão de obra a qual reduz o trabalhador a condição análoga a de escravo, tendo grupo de risco crianças, mulheres, estrangeiros e pessoas carentes[106].

Então, diante de tantas injustiças que ocorrem no Estado Brasileiro, o estudo do Direito do Trabalho deve sim pegar como parâmetro o Direito Comparado desde que seja para aprimorar e aperfeiçoar o direito brasileiro, não se abstraindo de nenhum modo da realidade. O dinamismo da realidade trabalhista faz com que a atualização da legislação trabalhista deva ser permanente, para assegurar sua eficácia[107].

Na prática cotidiana, a empresa também deverá dar sua contribuição para o melhor desempenho das relações trabalhistas, ao construir um novo modelo de empresas, propiciando relações de trabalho pautadas no respeito, na ética, na igualdade das relações de gênero, raça etc.

Outro ponto importante que merece ser aprofundado são as transformações que a globalização da economia e da informática trouxe para o plano do direito laboral, impondo a adoção do trabalho a tempo parcial, do banco de horas e a ampliação de hipóteses de celebração de contratos por prazo determinado, em atividades de qualquer natureza, como aconteceu no Direito brasileiro, pela Lei nº 9.601/98[108].

No que tange a esta desregulamentação analisa-se o art. 876, CLT, o qual diz que as decisões passadas em julgado ou das quais não tenha havido recurso com efeito suspensivo; os acordos, quando não cumpridos; os termos de ajuste de conduta firmados perante o Ministério Público do Trabalho e os termos de conciliação feitos perante as Comissões de Conciliação Prévia serão executados conforme o que revela a própria CLT.    

Dentre as novas tendências do Século enquadra-se: o teletrabalho, o destaque das mulheres exercendo funções que antes eram de cunho masculino, o trabalho do menor aprendiz, a terceirização que vem ganhando nova interpretação, o grupo econômico, o sobreaviso nas mais diversas áreas, os trabalhos desenvolvidos no domicílio do obreiro através de comandos ou feitos pela internet com o apoio da informática (caso que foi alvo de manifestação do TST recentemente), os subcontratos, os trabalhos que acompanham o desenvolvimento da era tecnológica (robótica), entre outros.

A grande tendência que se constata hoje, em relação ao trabalho em domicílio é que o avanço da tecnologia o torna cada vez mais amplo, propiciando uma nova mentalidade, permitindo o trabalho parcialmente domiciliar, no qual, graças à utilização de equipamentos de informática, profissionais podem intercalar o trabalho em casa com aquele realizado nas dependências internas da empresa, beneficiando-se, ainda que de forma parcial, das vantagens advindas do trabalho em domicílio[109].

As perspectivas na área trabalhista são os contratos de trabalho e as relações laborais mais variadas possíveis que nunca deixarão de surgir, e reagindo de outro ângulo a Justiça do Trabalho sempre atenta em busca de soluções para todos os conflitos, fazendo uso da flexibilização do direito, dos conceitos doutrinários e de jurisprudências baseadas em princípios e costumes.

A jurisprudência é a grande questão, pois ela é um olhar mais crítico, atual e condensador das novas lides complexas, razão pela qual os magistrados e ministros se veem na missão de regularizar, tentar resolver ou apaziguar com coerência e justiça o conflito fazendo uso dos princípios, costumes, etc., e quando então já pacificadas servirá de consultas para outros casos semelhantes.

Isso se dá porque o Direito do Trabalho mundialmente é muito dinâmico e os responsáveis por isto é o advogado ao defender seu cliente que às vezes vem com uma tese nova e que revoluciona o direito do trabalho; o juiz ou ministro em sua decisão, ou mesmo um colegiado ou uma nova lei.

6 CONCLUSÃO

Ao longo desta exposição pode-se constatar que o trabalho sempre existiu na trajetória histórica do homem, porém em cada época ele se mostrou de forma peculiar, adaptada as necessidades do homem e aos tipos de ferramentas que o ambiente lhe propiciava, além de estar sempre conexo com o tipo de mentalidade do homem e de acordo com os meios que o mercado oferecia.

Este estudo mostra também que primeiramente o homem precisou trabalhar para se manter vivo, depois o trabalho virou coisa de quem tinha menos ou nenhuma posse, e posteriormente o trabalho se tornou uma maneira de ascensão social.

Mas de qualquer forma o trabalho sempre foi importante na vida do homem, desde o início dos tempos até os dias de hoje. Ele foi evoluindo de forma tão complexa que necessitou de uma legislação para regulamentar e organizar a relação entre patrão (empregador) e operário (empregado). E esta evolução não parou nem mesmo agora no século XXI, pois atualmente se verifica constantes casos nas relações trabalhistas que os códigos, CLT ou jurisprudências ainda não têm as respostas para eles.

Por conta disso, a legislação deve estar em permanente mudança para que o direito do trabalho continue vinculado às suas origens, para assegurar a real proteção ao empregado prejudicado, a dignidade humana do trabalhador, os direitos e deveres do empregador, favorecendo o equilíbrio entre as cobranças obrigacionais nas partes envolvidas no âmbito laboral.

O bom é que cada vez mais se percebe que o Direito do Trabalho está sempre se atualizando, não deixando nada a desejar, pois além de ser a Justiça mais célere brasileira, ela é muito séria e moderna.

E diante deste dinamismo trabalhista pode-se afirmar que o direito do trabalho surgiu do instrumento social, mas também teve influência da estrutura econômica, pois como já mencionado, o direito do trabalho segui os passos da humanidade e é apenas o reflexo da realidade de hoje e das relações trabalhistas de amanhã.

E este amanhã se concretiza com uma série de pensamentos refletindo o futuro do trabalho humano e principalmente as perspectivas do Direito do Trabalho, pois os avanços tecnológicos das Revoluções Industriais e o surgimento de novas tendências fizeram com que a vida humana em seu trabalho cotidiano moldasse e flexibilizasse os entendimentos e aplicações das normas relacionadas ao Direito do Trabalho.

Dessa forma, o Direito do Trabalho se vê obrigado a fazer uso dos princípios constitucionais, dos princípios propriamente ditos do Direito do Trabalho, dos costumes, do Direito Comparado etc. Tendo ainda como alternativa a interpretação e entendimento da doutrina e dos magistrados ao analisarem um caso concreto, sobretudo baseado nos ditames da lei.

Um fenômeno que vem ganhando destaque nos tempos atuais é o da Flexibilização do Direito do Trabalho, que pressupõe a manutenção da intervenção estatal nas relações de trabalho fixando condições mínimas de trabalho, sem as quais seria impossível se manter uma atividade laboral saudável.

A flexibilização por se tratar de um direito do empregador deve ser utilizada com cautela, apenas em caso de real necessidade de recuperação da empresa, pois quando se impõe a flexibilização deve haver a ponderação entre a redução de direitos trabalhistas para a manutenção da saúde da empresa e a preservação de direitos absolutos e universais do trabalhador.

Algumas tendências modernas na área trabalhista, conforme já dito, é o trabalho em domicílio, entre outras, que se encontra diretamente ligado ao avanço da tecnologia e compreende as várias formas de prestação de serviço com a utilização de equipamentos tecnológicos, os quais favorecem o trabalho à distância, cuja conexão é muitas vezes feita exclusivamente através do computador, modificando noções clássicas de espaço e unindo nacionalidades.

Diante da tendência de o exercício da atividade econômica distanciar-se cada vez mais do modelo de concentração em grandes fábricas, a aglutinação de trabalhadores no mesmo local de trabalho vem constituindo fato cada vez menos frequente.

A nova tecnologia foge da linha clássica, que evocava imagens de siderurgias poluentes ou de máquinas barulhentas. Em compasso com a ciência, a moderna tecnologia faz surgir novas modalidades de trabalho e o aprimoramento das atividades laborais, com ampliação do trabalho especializado, do trabalho técnico e do trabalho intelectual.

Ao trabalhador em domicílio, no Brasil, conforme o art. 6º da Consolidação das Leis do Trabalho é aplicável à legislação do trabalhador comum, sendo-lhe conferidos todos os direitos inerentes aos trabalhadores em geral, desde que presentes na relação os requisitos referidos nos arts. 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho. E este trabalhador também pode ser autônomo.

Esta é uma realidade também presente na atualidade, vez que o desemprego tem jogado grande massa de trabalhadores no trabalho informal realizado em casa.

Ao mesmo tempo, alerta-se para os riscos inerentes à possibilidade de utilização de mão de obra infantil, especialmente, em vista do problema da exploração desses menores trabalhadores e da condição peculiar de ser esse um tipo de trabalho concentrado no âmbito familiar.

Assim, conclui-se pela perpétua evolução e aperfeiçoamento do Direito do Trabalho na medida em que o trabalho humano vai se ramificando e inovando, e tendo a certeza de que o Direito do Trabalho nunca será estático e acabado por si só em leis positivas, sendo a sua extensão bem mais abrangente, complexa, analítica e dinâmica, contribuindo para a paz social e o direito de igualdade e de justiça entre as relações trabalhistas.

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Sobre a autora
Priscila de Oliveira Ribeiro Leal

Advogada. Graduada em Direito pelo Instituto de Ciências Jurídicas e Sociais Prof. Camillo Filho - ICF. Pós graduada em Direito e Processo do Trabalho pelo Centro de Ensino Unificado de Teresina – CEUT.<br><br><br><br>

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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