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Federalismo: uma análise sobre sua temática atual

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01/10/2002 às 00:00
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III – CONCLUSÃO

Sobre a distinção dos termos federalismo e federação, concluiu-se que o termo federalismo está vinculado às idéias e valores que exprimem uma filosofia compreensiva da adversidade na unidade. Já o termo federação significa a aplicação concreta do federalismo, a positivação na Constituição de normas que objetivam incorporação das unidades autônomas no exercício de um governo central.

Ficou estabelecido que no paradigma do Estado Democrático de Direito, o Poder Judiciário tem que cumprir simultaneamente as funções de reforçar o princípio da legalidade e a de realizar a justiça. O Supremo Tribunal Federal, como o guardião da Constituição da República, ao dirimir um conflito de competências constitucionais que possa ocorrer entre os entes da federação, terá a faculdade de aplicar o principio da subsidiariedade e da coordenação e, assim, criar um equilíbrio entre o governo federal e governos estaduais, rompendo a tradição de federalismo centrípeto que vigora no Brasil.

Determinou-se que o princípio da coordenação resulta da necessidade de coordenação entre as autoridades políticas para que possam ser aplicados simultaneamente os princípios da separação e da autonomia. Há três formas de coordenação. A primeira delas é uma coordenação autoritária que é devida às imperativas prescrições impostas aos Estados-Membros pelo governo federal. A segunda delas consiste na revisão constitucional que permite quer a transferência de competência, quer a adoção de competências comuns para as matérias que sofreram modificação no contexto histórico. A terceira e última forma de coordenação consubstancializa no denominado federalismo cooperativo ou intergovernamental que resulta da realização de acordos intergovernamentais para a aplicação de programas e financiamentos conjuntos. No federalismo cooperativo, há uma mudança dos poderes de decisão nos níveis de governo - federal e federado - em benefício de um mecanismo, mais ou menos complexo e formalizado, de negociação e acordo intergovernamental, também defendida pelo federalismo financeiro.

Conforme a análise realizada supra, os objetivos do princípio da subsidiariedade são: o de fundamentar a função subsidiária do Estado em relação à sociedade; o de indicar parâmetros de repartição de competência entre as autoridades públicas ou privadas de diversos níveis e, finalmente, o de nortear o âmbito de atuação estatal.

O princípio da subsidiariedade determina que o Estado deve desempenhar uma função subsidiária em relação aos particulares. Na sua função subsidiária, o Estado tem duas atribuições essenciais que são a de criar as condições necessárias para possibilitar a atuação do particular e a de suprir as atividades dos particulares, quando estas se tornam insuficientes ou inadequadas. Assim, o Estado não deve realizar as atividades que a iniciativa privada pode, com eficácia, desenvolver sozinha.

O princípio da subsidiariedade, no plano político, manifesta-se no princípio federativo, pois é aplicado tanto como critério de repartição de competência entre as diversas esferas federativas, como regra para a solução de conflitos de atribuições que surjam entre elas, permitindo o fortalecimento do poder local e a permanência da gestão administrativa o mais próximo possível do cidadão.

A respeito do conceito de federalismo simétrico e assimétrico, a simetria foi definida como o grau de conformidade e do que possui de comum de cada unidade política separada do sistema para com o sistema como um todo e para as outras unidades membros. Já na assimetria cada unidade política separada do sistema teria uma só característica ou um conjunto de características que diferencia seu relacionamento para com o sistema como um todo, para com a autoridade federal e para com outro Estado.

Na Constituição da República de 1988 e nas leis infraconstitucionais houve excessos e abusos no tratamento assimétrico de direito. O excesso no tratamento assimétrico de direito leva ao acomodamento e à perda de responsabilidade do beneficiário dos recursos destinados ao desenvolvimento, pois quando os recursos são concentrados e distribuídos há sempre um grau de sujeição de quem os recebe. Enquanto que o abuso no tratamento assimétrico de direito causa uma ampliação da boa situação financeira do ente federado que já a possui e complica ainda mais a situação do outro que está em dificuldade.


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Notas

1. Croisat, Maurice. El federalismo en las democracias comteporáneas. Barcelona: Hacer, 1995. p. 24-25

2. Moraes, Alexandre. Direito Constitucional. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 1998. p. 240-241

3. ramos, Dircêo Torrecillas. O Federalismo assimétrico. São Paulo: Plêiade, 1998. p. 29-32

4. baracho, José Alfredo de Oliveira. A federação e a revisão constitucional. As novas técnicas dos equilíbrios constitucionais e as relações financeiras. A cláusula federativa e a proteção da forma de Estado na Constituição de 1988. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, volume 12, número 3, jul./set. de 1994. p.32.

5. Carvalho Netto, Menelick de. O requisito essencial da imparcialidade para a decisão constitucional adequada de um caso concreto no paradigma constitucional do Estado Democrático de Direito. Revista da procuradoria Geral do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, volume 1, número 1, jan./jun. de 1999. p. 103-111. O doutrinador José Luiz Quadros de Magalhães determina que o Estado Constitucional Moderno pode ser dividido em três tipos de Estado: Estado Liberal, Estado Social ou Estado Social-Liberal e o Estado Socialista. No Estado Liberal a regra básica é a não intervenção do Estado na ordem econômica. As Constituições liberais consagram os direitos individuais e políticos. Os direitos individuais regulam condutas individuais, protegem os interesses individuais contra o Estado; o limite desses direitos é determinado pelo direito do outro. O Estado liberal possui três fases. Na primeira fase os direitos fundamentais se fundamentam na propriedade privada, principalmente na propriedade privada dos meios de produção. Assim, só os proprietários eram considerados cidadãos. Na segunda fase, os direitos fundamentais passaram a ter como alicerce a igualdade jurídica, ao invés da propriedade privada. Destarte, há uma evolução do conceito de cidadania, com a conquista do direito ao voto direto, secreto e universal, mas as mulheres continuaram sem cidadania. A eliminação da livre concorrência e da livre iniciativa e um alarmante grau de miséria e exclusão da população foram consectário da concentração de riquezas que ocorreu nesta fase. A terceira fase é uma fase de transição do Estado Liberal para o Estado Social. Nesta fase, as leis-infraconstitucionais passaram a incorporar direitos sociais e econômicos, como uma forma de atenuar as distorções sociais e econômicas e acalmar a tensão social existente. No Estado Socialista houve a instituição de uma economia e de uma sociedade socialista, com fundamentos e valores coletivos, o que provocou a ruptura com o capitalismo liberal. Neste tipo de Estado é garantida a propriedade coletiva e estatal, o que resultou no fim da propriedade privada dos meios de produção. Há uma proposital limitação dos direitos individuais e uma clara ênfase aos direitos sociais e econômicos. No Estado Social há a convivência simultânea dos princípios de Estados ortodoxos socialista e liberal. Este tipo de Estado possui duas fases que são posteriores as mencionadas no Estado Liberal. Em sua primeira fase, o Estado passa a intervir no domínio econômica, regulando a atividade econômica e, em alguns casos, exercendo-a. Torna-se assistencialista e clientelista, ou seja, socorre os excluídos do sistema social e econômico. As constituições sociais prevêem os direitos sociais e econômicos como norma fundamental, ao lado dos direitos individuais e políticos. Em sua segunda fase, o Estado Social torna-se democrático, pelo oferecimento concreto dos direitos sociais, o que permite a inclusão de grande parte população nos sistemas social e econômico. Consagra-se a tese da indivisibilidade dos direitos fundamentais, que enuncia que o exercício dos direitos fundamentais tem como condição o acesso aos direitos sociais e econômicos. (Direito Constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2000. t. 1. p. 62-77).

6. Op. cit. na nota 1 supra. p. 23.

7. Shwartz, Bernard. O federalismo Norte-Americano Atual: uma visão contemporânea. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1984. p. 21

8. Op. cit. na nota 7 supra. p. 22

9. Op. cit. na nota 7 supra, p. 22

10. Op. cit. na nota 7 supra. p. 47

11. Almeida, Fernanda Dias Meneses de. Competências da Constituição de 1988. São Paulo: Atlas, 1991. p. 48

12. Dalari, Dalmo de Abreu. O Estado Federal. São Paulo: Ática, 1986. p. 69-70

13. Op. cit. na nota 11 supra. p. 49

14. Op. cit. na nota 1 supra. p. 31-32

15. Croisat, Maurice. Op. cit. na nota 1 supra. p. 135-136

16. Op. cit. na nota 1 supra. p. 138-143

17. José alfredo de oliveira baracho também analisa o denominado federalismo intergovernamental ou cooperativo, afirmando que foram ampliadas as esferas de competência da gestão comum, a autonomia e a interdependência. Essa nova forma de divisão de poderes entre os governantes gerais, federais e regionais, com esferas coordenadas e independentes, dão uma nova visão ao federalismo. A cooperação intergovernamental assenta-se nas práticas políticas, em regra informais, que ocorrem no exterior das relações constitucionais. (A federação e a revisão constitucional. As novas técnicas dos equilíbrios constitucionais e as relações financeiras. A cláusula federativa e a proteção da forma de Estado na Constituição de 1988. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, volume 12, número 3, jul./set. de 1994. p.35)

18. baracho, José Alfredo de Oliveira. o princípio da subsidiariedade: conceito e evolução. Rio de Janeiro: Forense, 1996. p. 26-28

19. torres Silvia Faber. O princípio da subsidiariedade no direito público contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 37

20. baracho, José Alfredo de Oliveira. Op. cit. na nota 18 supra. p. 47-50

21. Op. cit. na nota 18 supra. p. 6

22. Op. cit. na nota 19 supra. p. 66

23. Op. cit. na nota 18 supra. p. 40-41

24. Op. cit. na nota 19 supra. p. 68-72

25. Op. cit. na nota 18 supra. p. 63-64

26. Op. cit. na nota 19 supra. p. 35-36

27. Op. cit. na nota 3 supra. p. 93-94

28. Op. cit. na nota 3 supra. p. 94

29. Op. cit. na nota 3 supra. p. 96-98

30. ramos, Dircêo Torrecillas. Op. cit. na nota 3 supra. p. 261-264

31. Op. cit. na nota 3 supra. p. 318-323

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Sobre a autora
Viviane Machado Caffarate

Graduada pelaa Faculdade Mineira de Direito (PUC/MG), em Belo Horizonte (MG). Analista Tributária da Receita Federal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAFFARATE, Viviane Machado. Federalismo: uma análise sobre sua temática atual. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 59, 1 out. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3249. Acesso em: 29 mar. 2024.

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