Pela Constituição de 1988, todos temos direito à Liberdade, à Igualdade, à Segurança, à Propriedade e à Vida. Liberdade de Estado conquistada na Independência, e de direitos civis e religiosos após a Proclamação. Quanto ao direito de Igualdade, não poderia ter sido melhor explicado por ninguém mais que o estadista e Senador Rui Barbosa, em “Oração aos Moços”, ao afirmar:
”A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente os desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. Os mais são desvarios da inveja, do orgulho ou da loucura. Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. Os apetites humanos conceberam inverter a norma universal da criação, pretendendo, não dar a cada um, na razão do que vale, mas atribuir o mesmo a todos, como se todos se equivalessem”.
Por sua vez, o direito à Segurança, uma visão a ser concretizada na busca de uma sociedade com menos desigualdades.
O direito à Propriedade, rural ou urbana, é uma garantia do Estado, e é buscado nos programas de reforma agrária e social. Todo aquele que detém uma propriedade, uma terra, precisa cumprir a função social desta, sob risco de perdê-la, para estes programas de reforma. O ponto chave neste particular, é que aquele que detém uma propriedade, tem também o direito de ser indenizado por justos valores, caso cedam estas áreas para o governo.
O professor Plínio Corrêa de Oliveira, no Livro Reforma Agrária – Questão de Consciência (1960), já evidenciava o risco de um atentado ao Direito de Propriedade, caso houvesse a implantação do socialismo no país. Em suas palavras:
“Se é lícito ao homem apropriar-se dos bens que existem sem dono na natureza, e consumi-los, pelo mesmo motivo lhe é permitido apropriar-se desses bens, já não mais para consumir, mas para fazer deles instrumentos de trabalho. [...] Notamos, portanto, que está na natureza racional e livre do homem o fundamento do direito de propriedade, em seus vários aspectos.”
O Código Florestal de 2012 (Lei federal 12.651/2012), em seu segundo artigo, deixa claro que “As florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação nativa, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem”.
Ao ter estipulado o instrumento da Reserva Florestal Legal (RL), com o objetivo de garantir a oferta de produtos florestais à sociedade, madeira, lenha, biomassa, frutos e sementes etc., o Código de 2012 exigiu aos proprietários de terra, a consecução de atividades relacionadas ao uso florestal racional, impondo a obrigação por fazer, na manutenção destas áreas, em detrimento da vontade particular e a livre iniciativa de cada fazendeiro ou proprietário rural, se quisesse cultivar a terra com milho, soja, lavouras anuais, pastagens com criação de animais, etc. Basta verificar o inciso III do artigo 3º, que conceitua a Reserva Legal como:
“Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada nos termos do art. 12, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa.”
A sociedade de forma geral, entende que a RL tem apenas o objetivo preservacionista. Mas o fato é que a ideia sempre foi garantir a oferta de produtos madeireiros, pois por todos conhecido, o processo de desmatamento e conversão de matas em lavouras, poderia contribuir com a diminuição destas ofertas. Considerando a dimensão continental do país, com cerca de 850 milhões de hectares, e destes ainda cerca de 50% cobertos por matas virgens e devolutas, acaba por ser um risco insignificante (sem contar obviamente, com a oferta de produtos florestais plantados).
O ponto que se quer alcançar é a reflexão sobre se, se és um proprietário rural, e tendes o dever de preservar ou restaurar parte de sua área com Reservas florestais, não poderias também ter o direito de ser indenizado por não poder usufruir destas áreas com outras alternativas de uso econômicos no setor rural? Não seria justo que esta indenização fosse equivalente às perdas por não estar utilizando as áreas em projetos de curto prazo ou mais rentáveis, até mesmo por ser uma as exigências do cumprimento da função social econômica da propriedade? Ora, se esta função social abarca também a preservação ambiental, fato é que para tanto, também foi implementado no código outro instrumento, o das Áreas de Preservação Permanente (APP), exclusivamente para esta função, conceituada ainda no inciso II do mesmo artigo:
“Área de Preservação Permanente - APP: área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.”
No caso das RLs, possuem a função ecológica de forma a complementar à função econômica. Os legisladores em 2012 eximiram as pequenas propriedades desta obrigação, e agora o agricultor só precisa declarar o remanescente de mata, nas áreas consolidadas, desonerando-se da responsabilidade de constituir a RL, que ainda permanece para as médias e grandes propriedades, em porcentagens de 20% ou mais das áreas. São para estes casos, principalmente, que se impõe a reflexão sobre o direito à indenizações.
Outra lei federal, a Lei da Mata Atlântica (Lei federal 11.428/2006), que entende que os remanescentes deste bioma são um patrimônio nacional, acabou por interferir no Código florestal, pois não permite o uso sustentável das florestas em estágios médios e avançados. Assim, entende-se que esta lei onera também todos os produtores rurais que detenham áreas de mata atlântica, pois não recebem nada pelos serviços ambientais prestados à sociedade, à título de indenização.
Neste contexto, os programas de PSA – Pagamentos por Serviços Ambientais – tem se tornado cada vez mais discutidos e valorizados. Iniciativas de sucesso em Minas Gerais e em Botucatu estão se consolidando, e o grande gargalo é de onde vai sair o dinheiro dos programas. No caso mineiro, por fontes internacionais (da ONG The Nature Conservancy, TNC), e no caso paulista, vem de uma parceria entre prefeitura e Sabesp.
Desde 2012 o Paraná já dispõe de leis para o pagamento por serviços ambientais, pelo Programa Bioclima. Porem, questões estaduais com a adequação ambiental dos proprietários rurais quanto ao Código Florestal (também de 2012), vem atrasando o processo, pois o PSA paranaense exige o Sisleg, que por sua vez já foi revogado, sendo que o que está em vigor agora é o Sicar para o cadastro ambiental a nível federal. São questões burocráticas, mas que não deixam de tirar o brilho destas expectativas.
A questão final é a seguinte: quanto se deve pagar pelo serviço ambiental? A valoração mínima poderia ser feita considerando a disposição a pagar pelo poder público, que atribuiu no Estatuto da Terra e no Salário Mínimo, os limites do cumprimento da função social de cada propriedade rural. No Paraná, o módulo fiscal da propriedade varia entre 5 a 20ha, e o SM paranaense atual é de R$983,40. Ao dividir ao SM pela área do imóvel, encontramos valores em torno de R$0,005 a R$0,020 por metro quadrado, que multiplicados por hectares de área verde remanescente da propriedade, permitiria o pagamento mensal de valores proporcionais à responsabilidade socioambiental de cada agricultor.