Conflitos da comoriência

Direito sucessório

29/10/2014 às 14:30
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O conteúdo deste artigo visa demonstrar quais as consequências da presunção da comoriência para o direito sucessório.

Comoriência, segundo o dicionário da língua portuguesa, significa “morte simultânea de duas ou mais pessoas.”; logo comoriente é aquele que morre juntamente com outra pessoa.

Nesse sentido, o fenômeno jurídico da comoriência ocorre quando duas ou mais pessoas morrem ao mesmo tempo, ou quando não é possível saber qual delas morreu primeiro. Para o direito é como se as pessoas tivessem morrido ao mesmo tempo.

O artigo 8º do Código Civil Brasileiro estabelece que: “Se dois ou mais indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar se algum dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão simultaneamente mortos”.

O conflito para o direito sucessório está na hipótese em que havendo falecido o autor da herança, necessária é a identificação correta do momento da morte dos envolvidos, pois, se um herdeiro faleceu segundos após o autor da herança, herdará este os seus bens. Mas, se não sabido o momento exato da morte e entender-se pela comoriência, não herdará os bens, pois não existe sucessão entre comorientes.

Segundo Maria Berenice Dias:

“Não havendo a possibilidade de saber quem é herdeiro de quem, a lei presume que as mortes foram concomitantes. Desaparece o vinculo sucessório entre ambos. Com isso, um não herda do outro e os bens de cada um passam aos seus respectivos herdeiros.”.

Exemplificando, se “A” e “B”, casados, morrerem num acidente e forem considerados comorientes por não terem conseguido identificar a pré-morte de um deles, não poderão ser considerados herdeiros entre si.

Portanto, tendo em vista que o direito sucessório depende do conhecimento de quem morreu primeiro, a questão da comoriência torna-se um conflito jurídico, onde surgem diversas indagações, como: Haverá sucessão entre os comorientes? Quem faleceu primeiro? A partilha dos bens de qual dos falecidos deve ser realizada em primeiro lugar?

Vejamos o que discorre Maria Helena Diniz acerca do assunto:

“A comoriência terá grande repercussão na transmissão de direitos sucessórios, pois, se os comorientes são herdeiros uns dos outros, não há transferência de direitos; um não sucederá ao outro, sendo chamados à sucessão os seus herdeiros ante a presunção juris tantum de que faleceram ao mesmo tempo. Se dúvida houver no sentido de saber quem faleceu primeiro, o magistrado aplicará o art. 8.º do CC/2002 (LGL\2002\400), caso em que, então, não haverá transmissão de direitos entre as pessoas que morreram na mesma ocasião.”

Segundo o pensamento da doutrinadora Maria Helena Diniz, a dúvida surge apenas quando não for possível apurar quem pré-morreu a quem. Pois, no caso de comoriência não haverá transferência de bens entre os comorientes.

Ainda, segundo exemplifica Carlos Roberto Gonçalves, “se um casal morre em acidente sem deixar descendentes ou ascendentes e sem se saber qual morreu primeiro, um não herda do doutro. Assim, os colaterais da mulher ficarão com a meação dela, enquanto os colaterais do marido ficarão com a meação dele.”.

Vejamos o julgado abaixo:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO OBRIGATÓRIO -DPVAT. INDENIZAÇÃO POR MORTE. IRRESIGNAÇÃO ENVOLVENDO A COTA PARTE DEVIDA À AUTORA. DE CUJUS QUE TINHA QUATRO FILHOS, SENDO QUE UM DELES TAMBÉM VEIO A ÓBITO NO ACIDENTE DE TRÂNSITO. HIPÓTESE DE COMORIÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO SUCESSÓRIO ENTRE OS COMORIENTES. INDENIZAÇÃO QUE DEVE SER RATEADA ENTRE OS TRÊS FILHOS. SENTENÇA MANTIDA, POR FUNDAMENTO DIVERSO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Na hipótese de comoriência, com o passamento de pai e filho no mesmo acidente, não se sabendo quem faleceu primeiro, presume-se que os óbitos foram simultâneos, fazendo com que, entre os extintos, não se saiba quem é herdeiro de quem. Diante de tal cenário, tem-se como ausente o vínculo sucessório entre ambos, devendo o patrimônio que cada um possuía ser transferido para os seus respectivos herdeiros, como se entre os comorientes não houvesse relação de parentesco.

(AC 20120299484 SC 2012.029948-4, 4ª Câmara de Direito Civil, Rel. Desembargador Jorge Luis Costa Beber, julgado em 28/08/2013).

Diante do exposto, conclui-se que a consequência da presunção de comoriência é que não se dá a transmissão dos direitos hereditários de um para outro comoriente, como se não houvesse nenhuma relação sucessória entre eles.

Bibliografia consultada:

Jus Brasil – consulta jurisprudencial

FILHO, Claudemir Rodrigues Dias. Comoriência: Ponderações Jurídicas e Tanatológicas. DTR\2011\1447: Revista dos Tribunais, 2011. Vol. 907

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Sucessões. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, pág. 286.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005. vol. 6.

GOLÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 8ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2014. Vol. 7.

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Sobre o autor
Alex Carvalho Rocha

Aluno da 8ª etapa do curso de Direito da Universidade de Ribeirão Preto "UNAERP" - Faculdade de Direito "Laudo de Camargo".

Informações sobre o texto

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