Da prova emprestada trabalhista para comprovação de atividade especial

06/11/2014 às 16:20
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O texto em questão analisa a possibilidade de utilização da prova emprestada trabalhista no processo previdenciário para comprovar atividade especial

Resumo:O presente artigo tem o objetivo de analisar a legitimidade da utilização de prova emprestada trabalhista (laudo pericial de atividade insalubre) no processo previdenciário, em que se objetiva o reconhecimento de tempo especial, sob a ótica do contraditório e da diversidade de critérios previstos na legislação para comprovação da atividade especial.

Palavras-Chave: Prova Emprestada. Insalubridade. Atividade Especial. Diversidade de Partes.  Contraditório. Sistemática Distinta.


Introdução:

                        Na doutrina processual civil a chamada prova emprestada é exatamente o que o nome sugere: o “transporte” da prova produzida em um processo, para que seja utilizada em outro processo. O principal fundamento do “empréstimo” é a economia processual. Além disso, se justifica em situações em que não se teria como repetir a produção daquela prova em outro processo.

                        Marinoni conceitua a prova emprestada da seguinte maneira:

“Prova emprestada é aquela que, produzida em outro processo, é trazida para ser utilizada em processo em que surge interesse em seu uso. Trata-se de evitar, com isso, a repetição inútil de atos processuais, otimizando-se, ao máximo, as provas já produzidas perante a jurisdição, permitindo-se, por consequência, seu aproveitamento em demanda pendente. Entretanto, não é apenas a idéia de aproveitamento de atos que importa, quando se pensa em prova emprestada. Eventualmente, pode acontecer que a prova não possa mais ser colhida, por alguma circunstância, motivo mais que suficiente para autorizar, ao menos em princípio, a tomada de empréstimo da prova já realizada em outro processo” (Processo de Conhecimento, 9ª ed. Rev. E atual. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011).

Desenvolvimento:

A questão que se afigura discutível é a utilização da prova emprestada em processo no qual não figuram as mesmas partes do processo onde foi produzida. Isto em razão da necessidade de se observar a garantia do contraditório. Além disso, se questiona seja considerada prova emprestada de insalubridade na Justiça do Trabalho na seara previdenciária, permeada por princípios distintos.

                        É o que acontece quando a parte autora requer a utilização de laudo de atividade insalubre, produzido na justiça laboral, em reclamatória trabalhista ajuizada contra a empresa, no processo previdenciário, movido em face do INSS, para fins de aposentadoria especial ou reconhecimento de tempo de serviço especial.

                        Ora, a autarquia federal não participa da lide trabalhista apresentando os seus quesitos, se manifestando oportunamente sobre o laudo, como é possível, sem ofensa ao contraditório, que se considere o laudo trabalhista como prova de atividade especial?

                        Outra razão para não se admitir a prova emprestada é que os critérios para se comprovar atividade especial na legislação previdenciária diferem daqueles previstos na legislação trabalhista para atividade insalubre.

                        Na legislação previdenciária é necessária a comprovação da exposição do segurado aos agentes nocivos mediante formulários emitidos pelas empresas, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho.

                           O formulário utilizado atualmente pela legislação previdenciária é o PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário, o qual deve conter, dentre outras informações registros ambientais, resultados de monitoração biológica e dados administrativos.

                        Embora a doutrina alerte sobre a legitimidade da utilização da prova emprestada em processo com partes distintas daquele onde a mesma surgiu, diante da necessidade de observância do contraditório, o STJ a admite, sob o fundamento de que seria reduzida excessivamente a sua aplicabilidade, caso exigida a identidade de partes.

                          Leia-se a ementa do EREsp 617428 / SPEMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL2011/0288293-9:

“CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DISCRIMINATÓRIA. TERRAS DEVOLUTAS. COMPETÊNCIA INTERNA. 1ª SEÇÃO. NATUREZA DEVOLUTA DAS TERRAS. CRITÉRIO DE EXCLUSÃO.  ÔNUS DA PROVA. PROVA EMPRESTADA. IDENTIDADE DE PARTES. AUSÊNCIA. CONTRADITÓRIO.

REQUISITO ESSENCIAL. ADMISSIBILIDADE DA PROVA.

1. Ação discriminatória distribuída em 3.02.1958, do qual foram extraídos os presentes embargos de divergência em recurso especial, conclusos ao Gabinete em 29.11.2011.

2. Cuida-se de ação discriminatória de terras devolutas relativas a parcelas da antiga Fazenda Pirapó-Santo Anastácio, na região do

Pontal do Paranapanema.

3. Cinge-se a controvérsia em definir: i) a Seção do STJ competente para julgar ações discriminatórias de terras devolutas; ii) a quem compete o ônus da prova quanto ao caráter devoluto das terras; iii)se a ausência de registro imobiliário acarreta presunção de que a terra é devoluta; iv) se a prova emprestada pode ser obtida de processo no qual não figuraram as mesmas partes; e v) em que Caráter deve ser recebida a prova pericial emprestada.

4. Compete à 1ª Seção o julgamento de ações discriminatórias de terras devolutas, porquanto se trata de matéria eminentemente de direito público, concernente à delimitação do patrimônio estatal.

5. Nos termos do conceito de terras devolutas constante da Lei

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601/1850, a natureza devoluta das terras é definida pelo critério

De exclusão, de modo que ausente justo título de domínio, posse legítima ou utilização pública, fica caracterizada a área como devoluta, pertencente ao Estado-membro em que se localize, salvo as hipóteses excepcionais de domínio da União previstas na

Constituição Federal.

6. Pode-se inferir que a sistemática da discriminação de terras no Brasil, seja no âmbito administrativo, seja em sede judicial, deve obedecer ao previsto no art. 4º da Lei 6.383/76, de maneira que os ocupantes interessados devem trazer ao processo a prova de sua posse.

7. Diante da origem do instituto das terras devolutas e da sistemática estabelecida para a discriminação das terras, conclui-se que cabe ao Estado o ônus de comprovar a ausência de domínio particular, de modo que a prova da posse, seja por se tratar de prova negativa, de difícil ou impossível produção pelo Poder Público, seja por obediência aos preceitos da Lei 6.383/76.

8. De acordo com as conclusões do acórdão embargado e das

Instâncias ordinárias, o registro paroquial das terras foi feito em nome de José Antonio de Gouveia, em 14 de maio de 1856, sob a assinatura do Frei Pacífico de Monte Falco, cuja falsidade foi atestada em perícia, comprovando-se tratar-se de "grilagem" de terras. Assim, considerou-se suficientemente provada, desde a petição inicial,

Pelo Estado de São Paulo, a falsidade do "registro da posse", pelo que todos os títulos de domínio atuais dos particulares são nulos em face do vício na origem da cadeia, demonstrando-se a natureza devoluta das terras.

9. Em vista das reconhecidas vantagens da prova emprestada no processo civil, é recomendável que essa seja utilizada sempre que possível, desde que se mantenha hígida a garantia do contraditório.

No entanto, a prova emprestada não pode se restringir a processos em que figurem partes idênticas, sob pena de se reduzir excessivamente sua aplicabilidade, sem justificativa razoável para tanto.

10. Independentemente de haver identidade de partes, o

Contraditório é o requisito primordial para o aproveitamento da prova emprestada, de maneira que, assegurado às partes o contraditório sobre a prova, isto é, o direito de se insurgir contra a prova e de refutá-la adequadamente, afigura-se válido o empréstimo.

11. Embargos de divergência interpostos por WILSON RONDÓ JÚNIOR E OUTROS E PONTE BRANCA AGROPECUÁRIA S/A E OUTRO não providos.

Julgados prejudicados os embargos de divergência interpostos por DESTILARIA ALCÍDIA S/A”.

            Porém, o mesmo STJ reconhece serem distintos os critérios para concessão de adicional de insalubridade e contagem de tempo especial, em razão de serem diversas as sistemáticas da legislação previdenciária e trabalhista, do que se conclui pela inviabilidade da prova emprestada neste caso. No julgado do EARESP  207/0263025-0 foi dito que:

“o percebimento de adicional de insalubridade, por si só, não é prova conclusiva das circunstâncias especiais do labor e do  consequente direito à conversão do tempo de serviço especial para comum, tendo em vista serem diversas sistemáticas do Direito trabalhista e previdenciário”.

            Conclusão:

            De tudo o que foi exposto, conclui-se que resta inviável a utilização de prova emprestada de atividade insalubre produzida na seara trabalhista no processo previdenciário de atividade especial, seja em razão da não participação do INSS na lide promovida na Justiça Obreira, seja porque a própria sistemática da legislação trabalhista, no que se refere ao adicional de insalubridade, difere da sistemática previdenciária, pautada em regras próprias.

            Bibliografia:

            Marinoni, Luiz Guilherme. Arenhart, Sérgio Cruz. Processo de Conhecimento. 9ª Edição ver e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

Amado, Frederico. Direito Previdenciário. Salvador: Editora Juspodivum, 2013.

           

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Sobre a autora
Marina Fontoura de Andrade

Procuradora Federal

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

O texto foi elaborado com base na experiência prática de procuradora federal, sendo comum o pedido de utilização de prova emprestada para fins de aposentadoria especial.

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