3. OBJETO:
3.1.PRODUTOS
O CDC dividiu o objeto da relação de consumo em duas categorias: os serviços, abrangendo as atividades remuneradas oferecidas no mercado de consumo e os produtos, que correspondem aos demais bens postos em circulação.
Para se identificar se o objeto de uma relação de consumo é um produto ou um serviço, basta analisar o núcleo do vínculo obrigacional entre consumidor e fornecedor. Se for uma obrigação de dar, será produto; se for uma obrigação de fazer, será serviço.
De acordo com o art. 3º, §1º do CDC, "Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial." O legislador preferiu adotar a expressão produto a bens, a qual já era comumente utilizada pelo Direito Civil. Essa inovação foi criticada por alguns juristas, inclusive por José Geraldo Brito Filomeno (1997:39), um dos autores do anteprojeto da Lei nº 8.078/90.
Trata-se de um conceito muito amplo, pois não leva em conta qualidades especiais do bem para que ele seja considerado um produto objeto de relação de consumo. Qualquer bem que circule das mãos do fornecedor para o consumidor pode ser considerado produto.
Segundo Tupinambá Miguel Castro Do Nascimento (1991:23):
Ao conceito de produto, interessa saber que é um bem com determinado conteúdo finalístico. É um bem porque, no sentido genérico, tem aptidão para satisfazer necessidades humanas e, mais do que isto, tem valor econômico e pode ser objeto de uma relação jurídica entre pessoas.
3.2. SERVIÇOS
O art. 3º, §2º do Código de Defesa do Consumidor conceitua serviço como sendo: "qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista."
Como se percebe, o legislador teve a intenção de fazer incidir o Direito do Consumidor de forma muito ampla, abrangendo os mais variados tipos de relações, em diferentes áreas do Direito, com exceção apenas das relações trabalhistas. Roberto Senise Lisboa (2001:176) expressa de forma muito clara essa idéia:
O melhor raciocínio leva à inexorável conclusão segundo a qual todas as demais áreas jurídicas, afora a trabalhista, podem conter relações que sofrem incidência do microssistema de defesa do consumidor. Pouco importa que o serviço, como atividade remunerada, seja de natureza civil, comercial ou administrativa.
A menção expressa às atividades de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária foi feita com o intuito de não deixar dúvidas quanto à aplicação do CDC a esses serviços. Apesar disso, uma parte minoritária da doutrina sustentou a inaplicabilidade da Lei nº 8.078/90 às relações bancárias, entendimento este que até provocou o questionamento da matéria pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro, perante o STF, através do ajuizamento de uma ação direta de inconstitucionalidade (ADIN n.º 2591), que ainda aguarda julgamento final.
A partir do conceito legal, nota-se que o principal elemento caracterizador de uma prestação de serviço de consumo é a sua remuneração. É preciso que haja uma contraprestação economicamente valorável para que seja possível a formação de uma relação de consumo, o que exclui do âmbito de aplicação do CDC as atividades oferecidas de forma gratuita.
Como conseqüência de se exigir que o serviço seja remunerado, a doutrina, a exemplo de Adalberto Pasqualotto (1990:134) e de Luciano Benetti Timm (2000:74), aponta também o requisito da profissionalidade (habitualidade) do prestador de serviços para que se tipifique uma relação de consumo.
Apesar de o conceito transcrito acima não mencionar expressamente, dele conclui-se que podem ser objeto de relação de consumo tanto os serviços privados, quanto os serviços públicos. A razão desse entendimento é que, para se chegar ao conceito de serviço de consumo é preciso que haja uma conexão com o conceito de fornecedor. E, como o CDC incluiu nesta hipótese as pessoas jurídicas de direito público, é possível afirmar que os serviços públicos também podem ser objeto de relação de consumo. Mas não só por isso, pois também pode haver empresas privadas prestando serviços públicos, mediante contratos de concessão Ademais, uma interpretação sistemática da Lei nº 8.078/90, a qual faz referência aos serviços públicos em alguns dispositivos (arts. 4º, VII; 6º, X e 22), também levaria à mesma conclusão.
4. CONCLUSÃO
Para que uma relação jurídica seja caracterizada como uma relação de consumo, é preciso a presença dos elementos subjetivos e de pelo menos um dos elementos objetivos mencionados acima. A falta de qualquer um desses requisitos descaracteriza a relação jurídica de consumo, afastando-a, portanto, do âmbito de aplicação do Código de Defesa do Consumidor.
Com isso, conclui-se que é indiferente o tipo contratual celebrado entre as partes para que uma dada relação jurídica seja, ou não, de consumo, pois não é o negócio jurídico em si que faz incidir as normas do CDC.
São certos elementos essenciais que fazem nascer uma relação de consumo (consumidor / fornecedor e produtos ou serviços), a qual é pressuposto para a aplicação do CDC, independentemente da espécie contratual pactuada pelas partes, como a compra e venda, o seguro, o financiamento, etc.
5. BIBLIOGRAFIA
DONATO, Maria Antonieta Zanardo. Proteção ao consumidor: conceito e extensão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993.
FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direitos do consumidor. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2000.
LISBOA, Roberto Senise. Responsabilidade Civil nas Relações de Consumo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.
NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro do. Responsabilidade Civil no Código de Defesa do Consumidor. 2ª ed. Rio de Janeiro: Aide, 1991.
PASQUALOTO, Adalberto. Os Serviços Públicos no Código de Defesa do Consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, vol. 1, p. 130-147, jan./mar. 1992.
TIMM, Luciano Benetti. A Prestação de Serviços: do Código Civil ao Código de Defesa do Consumidor. 2ª ed. Porto Alegre: Síntese, 2000.
Nota
[1] Seguindo a corrente maximalista, o Superior Tribunal de Justiça já reconheceu a existência de relação de consumo entre uma empresa que comercializa pescados e a empresa fornecedora de água, no RESP n.º 263.229 – SP, cujo inteiro teor encontra-se no anexo.