Conceito de impossibilidade absoluta de acesso ao Judiciário

Considerações sobre a Orientação Jurisprudencial (OJ)-SDI1-375

27/11/2014 às 09:58
Leia nesta página:

O objetivo do autor é elaborar algumas breves considerações sobre a OJ-SDI1-375. O cerne da discussão é o conceito de impossibilidade absoluta de acesso ao Poder Judiciário.

Neste artigo, o autor, ao analisar o texto da Orientação Jurisprudencial-SDI1-375, esclarece o conceito de "impossibilidade absoluta de acesso ao Judiciário", referido no texto da OJ.

Em abril de 2010, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) publicou Orientação Jurisprudencial (OJ) acerca do prazo de prescrição qüinqüenal durante a suspensão do contrato de trabalho:

"OJ-SDI1-375 AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. PRESCRIÇÃO. CONTAGEM (DJe divulgado em 19, 20 e 22.04.2010)

A suspensão do contrato de trabalho, em virtude da percepção do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, não impede a fluência da prescrição quinquenal, ressalvada a hipótese de absoluta impossibilidade de acesso ao Judiciário".

Segundo a OJ-SDI1-375, a fluência do prazo não é obstada nos casos em que há suspensão do contrato de trabalho por motivo de recebimento de auxílio-doença e em razão de aposentadoria por invalidez. Esse entendimento, contudo, não é válido, caso o empregado esteja absolutamente impossibilitado de recorrer ao Poder Judiciário.

O texto da Orientação, que contém disposição de natureza não vinculante, deve ser dividido em duas partes. Nestas, de maneira implícita, são abordados dois binômios do direito trabalhista: suspensão do contrato de trabalho/interrupção do contrato de trabalho e prescrição bienal/prescrição qüinqüenal. Em regra, a definição de um dos termos do binômio é feita mediante diferenciação em relação ao outro, o que torna razoável esta explicação preliminar.

O primeiro dos binômios é constituído pelos conceitos de suspensão e de interrupção do contrato de trabalho, os quais, embora juridicamente próximos tem significados, causas e efeitos distintos. Na interrupção, a paralisação da execução do contrato de trabalho não obsta o pagamento de salário e a contagem de tempo de serviço. Na suspensão, por sua vez, a ausência provisória da prestação não proporciona esses benefícios ao empregado. A suspensão é, portanto, a cessão temporária e integral dos principais efeitos do contrato de trabalho (GARCIA).

O segundo dos binômios é composto pelos conceitos de prescrição qüinqüenal e de prescrição bienal, ambos fundamentais para o direito material e processual do trabalho. A primeira relaciona-se a fatos ocorridos durante a vigência do contrato de trabalho. O empregado lesado, portanto, pode pleitear judicialmente, dentro do prazo de cinco anos, reparação por dano decorrente da execução do contrato de trabalho. A prescrição bienal, diferentemente, está condicionada ao término do contrato de trabalho. Nesse caso, a pretensão do trabalhador prescreve no período dois anos após o término do contrato (GARCIA).

Na OJ-SDI1-375, há disposições acerca de duas situações nas quais ocorre a suspensão do contrato de trabalho: recebimento de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez. Em ambos os casos, o empregado é impossibilitado de prestar os serviços inerentes ao seu contrato de trabalho, em razão de incapacidade transitória.

A OJ-SDI1-375, no entanto, dispõe que, nesses casos, o prazo prescricional de cinco anos, contados, retroativamente, do ajuizamento da ação, continua, como regra, a correr normalmente, exceto se houver total impossibilidade de acesso ao Judiciário. Esse entendimento, apesar de não ser pacífico, já predominava nas decisões dos Tribunais.

A OJ não especifica as características dessa absoluta impossibilidade de acesso ao Judiciário. O entendimento mais razoável é que ela decorra diretamente da situação do trabalhador. Se esta impede a prestação dos serviços habituais do trabalhador, pode, igualmente, obstar seu acesso ao Judiciário.

A limitação de acesso ao Judiciário, dessa forma, não foi qualificada na OJ Ela pode ter, portanto, razões desvinculadas da situação do empregado, embora igualmente passíveis de inviabilizar o acesso ao Poder Judiciário. A posição mais adequada, contudo, é aquela de características mais restritivas, nas quais se aplica subsidiariamente as normas do direito civil. Assim, a “absoluta impossibilidade” deve ser interpretada em conformidade com o art. 198, I, do Código Civil, dispositivo que impede a fluência do prazo prescricional contra absolutamente incapazes.

A situação que motivou, nos casos de aposentadoria compulsória e de recebimento de auxílio-doença, a paralisação dos serviços, caso acarrete, concomitantemente, a incapacidade absoluta do trabalhador, suspende o prazo prescricional, desde que o estado de limitação do empregado seja comprovado por perícia médica. Se a doença ou a deficiência do trabalhador causar, portanto, relevante comprometimento mental ou da capacidade de expressão, não há fluência do prazo qüinqüenal, pois, nesse caso, o empregado sofreu verdadeira capitis diminutio, o que inviabiliza a prática dos atos da vida civil e, consequentemente, os efeitos decorrentes desta.

A OJ-SDI1-375 contém, portanto, duas disposições relevantes. A primeira constitui a regra; a segunda, a exceção:

a) O prazo da prescrição qüinqüenal não deixa de correr em casos de suspensão do contrato de trabalho, mesmo nos casos de aposentadoria por invalidez e de enfermidade beneficiada por auxílio-doença;

b) Se, nesses dois casos, o trabalhador regredir à situação de absolutamente incapaz, a prescrição qüinqüenal é obstada, enquanto perdurar a incapacidade (art. 198, I, do CC).

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Referências:

GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa, Curso de Direito Trabalho, Editora Método, São Paulo, 2009.

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Sobre o autor
Mauro Kiithi Arima Junior

Bacharel em Direito e Relações Internacionais pela USP. Especialista em Direito Político, Administrativo e Financeiro pela FD USP. Especialista em Política Internacional pela FESPSP. Mestre em Direito Internacional pela USP. Doutor em Direito Internacional pela USP. Advogado, professor e consultor jurídico.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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