O pensamento de Nicolau Maquiavel

Leia nesta página:

Maquiavel inovou ao afastar a ética e a religião da política, apresentando um racionalismo e realismo únicos. O príncipe deve agir de acordo com a necessidade, não apenas com a moral social.

O significado do pensamento de Nicolau Maquiavel não foi adequadamente compreendido em toda a história. Mais do que a proposição de ruptura entre política e moral, o autor foi capaz de lançar mão de um racionalismo e realismo únicos, apresentando uma inovação nos escritos de natureza política, afastando-se da ética e da religião. O autor florentino, foi eleito conselheiro de tiranos, deificado e visto como mártir da liberdade. Foram trezentas e noventa e cinco referências a ele pertencentes, apenas no século XVII – peças de teatro, poesia e toda a literatura da época.

Maquiavel parece ter o mérito de abandonar a compreensão medieval da cosmogonia do poder político e espiritual presentes nos livros atribuídos a Dionísio. Conseguiu abandonar a superstição, adotando estilo e pensamento voltados ao meio antropocentrista de conceber o mundo e substituir o mito do homem assinalando que a virtude humana faz a política e constitui os impérios. Ademais, passa ser, após os escritos do autor, a liberdade a nova religiosidade, uma vez que a janela das possibilidades (antes restrita pelo temor) se abre quase que por completo. Eis aí o surgimento do homem demiurgo político e criador, o príncipe!

O que parece ser o objetivo do livro é traçar um retrato das adversidades que os príncipes (ou soberanos) precisam enfrentar. Para Nicolau, o universo humano é cíclico, de modo que tudo se repete. Isso quer dizer que, o caminho da imitação pode ser usado como guia para evitar erros que podem arruinar os poderosos. Fica evidente a concepção utilitarista da história: saber a história é acumular exemplos, para poder imitar. No entanto, o autor entendia que adversidades aconteceriam porque a natureza do homem era má e volúvel, mostrava-se avesso ao essencialismo grego, que via na natureza humana uma tendência à excelência moral, destoando da interpretação de Rousseau (da bondade do homem) e assemelhando-se à interpretaçao de Max Weber. Um bom governante deveria estar atento a esses conselhos e manter uma relação equilibrada entre a virtú (A capacidade do ator político agir adequadamente ao momento em questão. Não se pode confundir com a virtude cristã) e a fortuna (algo que pode ser representado como a sorte, uma força que não pode ser dominada inteiramente pelo homem).

Ronda também o escrito de Maquiavel o pessimismo antropológico, uma vez que não existe instância alguma isenta de problemas ou que não possa ser atingida por algum mal. A utopia registrada por diversos autores da época que abandonada pelo autor florentino, de modo que este consegue observar de forma autônoma e racional a realidade política. Também é ele que traz a primeira noção de “dever-ser”, assinalando a contradição existente entre o desejo do bem e a necessidade de recorrer ao mal: “tamanha diferença se encontra entre o modo como se vive e o modo como se deveria viver”

Na vida particular, o pensador combateu a corrupção, a degeneração das repúblicas, a perda dos costumes e a incapacidade de atuação dos políticos. Erigiu a força e a coragem do agente político em usar todos os meios necessários para a eficácia da ação, inclusive os maus como “virtú”, aconselhando como moral a seguir aquela que traz resultados e eficácia política, que não recua ante a malícia dos meios. Em outras palavras, o príncipe deveria agir de acordo com a necessidade, não sendo apenas bom, mas usando do mal quando necessário. Não havia imoralidade no seu texto, mas a colocação da ação política (construída pela soma da virtú e da fortuna) em primeiro plano, como uma área de ação autônoma levando a um rompimento com a moral social. A conduta moral e a ideia de virtude como valor para bem viver na sociedade não poderiam ser limitadores da prática política. A soberania do príncipe dependeria de sua prudência e coragem para romper com a conduta social vigente, a qual seria incapaz de mudar a natureza dos defeitos humanos.

Maquiavel considerava que a força do poder estava na capacidade legisladora do príncipe, e não num poder que emanava de um ser supremo. O pensador era incisivo em afirmar que haviam vícios que seriam virtudes, não devendo temer o príncipe que deseje se manter no poder, nem esconder seus defeitos, se isso fosse indispensável para salvar o Estado.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Texto originalmente reproduzido no Jornal Gazeta de Bento Gonçalves em 26/03/2013.

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos