Aposentadoria especial em atividade de risco para servidor público

01/12/2014 às 11:48
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O artigo discorre sobre a possibilidade (e requisitos) da concessão de aposentadoria especial pelo desempenho de atividade de risco por servidor público do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS).

Palavras-chave: Aposentadoria especial. Atividade de risco. Regime Próprio de Previdência Social. Requisitos.

Sumário: 1 – Introdução. 2 – Desenvolvimento. 2.1 – Das razões para a previsão da aposentadoria por atividade especial. 2.2 - Aposentadoria especial por desempenho de atividade de risco no Regime Próprio de Previdência Social (RPPS). 2.3 – Análise da jurisprudência.  3 – Conclusão. 4 - Bibliografia.

1 - INTRODUÇÃO

            O estudo abordará a possibilidade e os requisitos para que o servidor público, inserido no Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), obtenha a aposentadoria especial quando “exerçam atividades de risco” (art. 40, § 4º, II, da CF/88).

            Examinaremos a previsão desse direito à luz da Constituição Federal e da legislação infraconstitucional, não descuidando de informar o leitor acerca do Projeto de Lei Complementar em curso no Poder Legislativo acerca do tema analisado.

            Após a revisão da legislação pertinente, passaremos a discorrer acerca dos atuais requisitos para que o servidor público do RPPS possa obter a concessão desse jubilamento.

            No desfecho, exporemos ao leitor algumas decisões judiciais que venham a contribuir para a exata compreensão do assunto proposto neste artigo.

           

2 - DESENVOLVIMENTO

2.1 – Das razões para a previsão da aposentadoria por atividade especial

O que motivou o legislador a prever a aposentadoria especial (que nada mais é do que uma espécie[1] da aposentadoria por tempo de contribuição) foi o reconhecimento do direito de contagem diferenciada (privilegiada) do tempo para o jubilamento pela razão de que algumas atividades sujeitam esses trabalhadores a um desgaste maior.

Dessa forma, mediante um tratamento diferenciado (se comparado ao trabalho exercido em condições ordinárias), o trabalhador “compensa” a redução da vida laborativa por força da exposição permanente e habitual à agentes nocivos à saúde.

A contagem – aparentemente - privilegiada nada mais faz, a bem da verdade, senão aplicar o princípio constitucional da isonomia, uma vez que “a igualdade também não corresponde à ausência de diferenciação. O seu primado também deve sugerir reconhecimento de certas diferenças[2]”.

A previsão desse tratamento privilegiado (contagem reduzida), dentro do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), não é nova, pois previsto já na Lei 3.807/60.

Muito oportuna a sábias lições do ex-Ministro da Previdência Social, Reinhold Stephanes:

À luz da ética, é inadmissível o dano causado à saúde do trabalhador pelo exercício do trabalho. Aliás, trabalho seguro e salubre é um dos direitos sociais fundamentais garantidos pela Constituição Federal, que estabelece ainda que esse direito de cidadania será garantido pelo Estado, mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos.

(...)

O que foi feito até agora representa o primeiro passo para interromper uma situação próxima de um assassinato legalizado, na qual trabalhadores exercem atividades em condições especiais em troca de uma aposentadoria mais cedo e uma sobrevida curta[3]

2.2 - Aposentadoria especial por desempenho de atividade de risco no Regime Próprio de Previdência Social (RPPS)

            A aposentadoria especial para o servidor público do RPPS está prevista no art. 40, § 4º, I a III, da CF/88, abaixo transcrito:

Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003)

(...)

§ 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)

I portadores de deficiência; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)

II que exerçam atividades de risco; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)

III cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)

           

            Foi a Emenda Constitucional nº 47, de 2005, que incluiu a previsão de aposentadoria com “requisitos e critérios diferenciados” para os servidores públicos que “exerçam atividades de risco”.

            Isso porque a redação anterior do § 4º era esta:

§ 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados os casos de atividades exercidas exclusivamente sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidos em lei complementar. (Redação da EC 20/98)

Muito embora possa se dizer que as “atividades de risco” já estavam previstas na hipótese em que o trabalho é exercido sob condições especiais que prejudiquem “a integridade física”, mais recomendado, de fato, o destaque (como fez a EC 47/05) em hipótese autônoma (“atividades de risco”).

Na Lei do RGPS (Lei 8.213/91), art. 57, caput, não há previsão de aposentadoria especial para “atividades de risco”, mas apenas para aquelas “condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física”.

E, aí, faz surgir o forte argumento no sentido de que a periculosidade (por não ser uma exposição certa e pelo fato do dano não ser efetivo nem progressivo) não deva ser incluída juntamente com as hipóteses versadas no caput do art. 57 da Lei 8.213/91 (“prejudiquem a saúde ou a integridade física”).    

Após o Decreto nº 2.172 (Anexo IV), de 05.03.1997, foram listados apenas os agentes considerados nocivos ao trabalhador, quais sejam: químicos, físicos ou biológicos. Não há, portanto, nenhuma menção à periculosidade. No mesmo sentido a doutrina de Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Junior:

Desde que a lista do anexo do D. 2.171/97 foi editada, não há mais referência a agentes perigosos e penosos. Com efeito, encontramos no elenco do anexo IV do D. 3.048/99 apenas agentes insalubres (físicos, químicos e biológicos)[4].

Em sentido contrário é a sempre lembrada súmula 198 do TFR[5] e o conteúdo da decisão proferida em sede de recurso representativo de matéria repetitiva (RESP 1306113), em 14.11.12, Primeira Seção, do STJ[6], de onde se extrai que o rol de agentes nocivos do Decreto n. 2.172/97 é meramente exemplificativo.

O jurista João Ernesto de Aragonés Vianna destaca:

Não obstante a afirmação do decreto no sentido de ser exaustivo o rol de agentes nocivos, a jurisprudência tem entendido que a relação é meramente enunciativa[7].

Ocorre que, até a presente data, não foi definido, por meio de Lei Complementar, quais são os critérios para que o servidor público (no RPPS) possa se aposentar em condições especiais quando desempenha atividade de risco.

O que há, até agora, é o Projeto de Lei Complementar n. 554/10[8].

Nesse Projeto de Lei Complementar, que visa a regulamentar o art. 40, § 4º, II, da CF/88, é considerado como atividade de risco:

Art. 2º Para os efeitos desta Lei Complementar, considera-se atividade que
exponha o servidor a risco contínuo:

I – a de polícia, relativa às ações de segurança pública, para a preservação da
ordem pública ou da incolumidade das pessoas e do patrimônio público, exercida pelos servidores referidos nos incisos I a IV do art. 144 da Constituição; ou

II – a exercida no controle prisional, carcerário ou penitenciário e na escolta de
preso.

            É de se frisar que o servidor público policial já goza de uma aposentadoria em condições especiais, conforme LC 51/85, e com redação dada pela LC 144/14, abaixo transcrita:

Art. 1o O servidor público policial será aposentado: (Redação dada pela Lei Complementar n° 144, de 2014)

I - compulsoriamente, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição, aos 65 (sessenta e cinco) anos de idade, qualquer que seja a natureza dos serviços prestados; (Redação dada pela Lei Complementar n° 144, de 2014)

II - voluntariamente, com proventos integrais, independentemente da idade:       (Redação dada pela Lei Complementar n° 144, de 2014)

a) após 30 (trinta) anos de contribuição, desde que conte, pelo menos, 20 (vinte) anos de exercício em cargo de natureza estritamente policial, se homem; (Incluído pela Lei Complementar n° 144, de 2014)

b) após 25 (vinte e cinco) anos de contribuição, desde que conte, pelo menos, 15 (quinze) anos de exercício em cargo de natureza estritamente policial, se mulher. (Incluído pela Lei Complementar n° 144, de 2014)

Art. 2º - Subsiste a eficácia dos atos de aposentadoria expedidos com base nas Leis nºs. 3.313, de 14 de novembro de 1957, e 4.878, de 3 de dezembro de 1965, após a promulgação da Emenda Constitucional nº 1 de 17 de outubro de 1969.

         A questão agora é saber quais serão os outros servidores públicos que farão jus à aposentadoria especial por desempenho de atividade em situação de risco.

         Na ausência de regulamentação por meio da Lei Complementar exigida – e não cumprida – no § 4º do art. 40 da CF/88, a questão ainda permanece sem resposta segura. 

         O STF, por meio da súmula vinculante n. 33 (28.10.14), já definiu o quanto segue:

Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, § 4º, inciso III da Constituição Federal, até a edição de lei complementar específica.

         Algumas categorias de servidores públicos, como a dos Oficiais de Justiça, já ingressaram com Mandado de Injunção Coletivo para se valer, até a edição da Lei Complementar exigida no art. 40, § 4º, da CF/88, da mesma legislação aplicável aos policiais (LC 144/14).

         Isso porque, argumentam nesse Mandado de Injunção Coletivo, que, por receberem gratificação para trabalho externo e terem autorização legal para uso de porte de arma (art. 6º da Lei 10.826/03), o desempenho da atividade também é de risco, nos mesmos moldes (ou semelhante) daquela exercida pelo policial.  

         O STF ainda não concluiu o julgamento desse importante Mandado de Injunção Coletivo[9] (que terá reflexos para outras carreiras, como, por exemplo, de Auditoria da Receita Federal do Brasil e Auditoria-Fiscal do Trabalho), estando a ação constitucional com vista desde o dia 22.10.14 com o Min. Luiz Fux.

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         A tendência, contudo, é que, na mesma linha da súmula vinculante 33, a Corte Suprema remeta a disciplina da aposentadoria por desempenho de atividade de risco (art. 40, § 4º, II, da CF/88) também para o RGPS, ou seja: o art. 57 da Lei 8.213/91.

         Desse modo, a definição se a atividade é mesmo de risco será feita pela administração pública no caso concreto, e não por mero enquadramento da atividade por categoria profissional (caso pontual dos policiais).

         Já existe um ato normativo que estabelece instruções para o reconhecimento de tempo especial para os servidores públicos do RPPS. Trata-se da Instrução Normativa n. 1, de 22 de julho de 2010, do Secretário de Políticas de Previdência Social.

         Merece transcrição a seguir o art. 2º, por meio do qual se tem que a reconhecimento da atividade especial será feita à luz do caso concreto:

Art. 2º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais obedecerão ao disposto na legislação em vigor na época do exercício das atribuições do servidor público.

 § 1º O reconhecimento de tempo de serviço público exercido sob condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física pelos regimes próprios dependerá de comprovação do exercício de atribuições do cargo público de modo permanente, não ocasional nem intermitente, nessas condições.

§ 2º Não será admitida a comprovação de tempo de serviço público sob condições especiais por meio de prova exclusivamente testemunhal ou com base no mero recebimento de adicional de insalubridade ou equivalente.

         Percebe-se, pois, que, repetindo o que consta no art. 57, § 3º, da Lei 8.213/91, exige-se também a habitualidade e a permanência.

         A habitualidade, então, pode ser conceituada como a certeza de sujeição do indivíduo aos agentes nocivos nos dias de trabalho[10]. Por sua vez, segundo a doutrina de Marcelo Leonardo Tavares, “considera-se trabalho permanente aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço”[11].

         A aposentadoria especial representa a conjugação da exposição a agentes nocivos e que se dê de forma habitual e permanente.

           

2.3 – Análise da jurisprudência

         Na ausência de Lei Complementar para disciplinar a aposentadoria especial para os servidores públicos do RPPS que exercem atividade de risco, a análise da jurisprudência ganha especial relevo.

         No precedente abaixo, por exemplo, o STF assentou que se deve analisar o caso concreto para a concessão da aposentadoria especial do servidor público:

AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE INJUNÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL DO SERVIDOR PÚBLICO. ART. 40, § 4º, III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APLICAÇÃO INTEGRATIVA DO ART. 57 DA LEI 8.213/1991. PRECEDENTES. ANÁLISE DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO PARA CONCESSÃO DA APOSENTADORIA ESPECIAL. INCUMBÊNCIA DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. I - A concessão de aposentadoria aos servidores públicos em razão de atividade exercida exclusivamente sob condições que prejudiquem a saúde ou a integridade física deve ser concretamente analisada pela Administração Pública mediante a aplicação integrativa do art. 57 da Lei 8.213/91, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social. II – Cabe à autoridade administrativa responsável pela apreciação do pedido de aposentadoria especial verificar o preenchimento ou não das condições de fato e de direito exigidas para a concessão de tal pleito. III - Agravo regimental a que se nega provimento. (STF, MI 5037 AgR, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 17/10/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-222 DIVULG 08-11-2013 PUBLIC 11-11-2013)

         Já no Mandado de Injunção abaixo, o STF entendeu que não se pode mesclar a disciplina específica da LC 51/85 (policial) com a do art. 57 da Lei 8.213/91 (RGPS):

AGRAVO REGIMENTAL NO MANDADO DE INJUNÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL DE POLICIAL. ATIVIDADE DE RISCO. ART. 40, § 4º, INC. II, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LEI COMPLEMENTAR N. 51/1985. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO LEGISLATIVA. 1. A Lei Complementar n. 51/1985, que trata da aposentadoria especial dos policiais, foi recepcionada pela Constituição da República de 1988 (ADI 3.817/DF). 2. O reconhecimento da existência e da aplicabilidade de norma infraconstitucional regulamentadora do direito constitucional pleiteado evidencia o não cabimento do mandado de injunção, por inexistir omissão legislativa inviabilizadora do exercício de direito constitucionalmente assegurado. 3. Impossibilidade de conjugação do sistema da Lei Complementar n. 51/1985 com o do art. 57 da Lei n. 8.213/91, para com isso, cogitar-se de idade mínima para aposentação. Precedentes. 4. Agravo regimental ao qual se nega provimento. (STF, MI 4528 AgR, Relator(a):  Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 13/06/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-150 DIVULG 31-07-2012 PUBLIC 01-08-2012)

         Não obstante a possibilidade de utilização da Lei 8.213/91 para disciplinar precariamente o direito ao jubilamento por tempo especial, o STF, em contrapartida, não permite a conversão de tempo especial em comum. A propósito:

ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. SERVIDOR PÚBLICO. CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM. PERÍODO POSTERIOR À LEI 8.112/90. ILEGITIMIDADE. PRECEDENTES. 1. Segundo a jurisprudência do STF, é incabível a pretensão de servidor público à conversão de tempo especial em comum, para fins de aposentadoria, após o advento da Lei 8.112/90, já que, para isso, seria indispensável a regulamentação do art. 40, § 4º, da Constituição Federal (ARE 724.221-AgR, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, DJe de 4/4/2013; e RE 563.562-ED, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, DJe de 1/7/2011). 2. A Súmula Vinculante 33 garantiu aos servidores públicos o direito de aposentadoria especial, mas não tratou da matéria relativa à conversão do tempo de serviço especial em comum. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF, ARE 793144 ED-segundos, Relator(a):  Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 30/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-199 DIVULG 10-10-2014 PUBLIC 13-10-2014)

         O uso de arma de fogo, para o desempenho da atividade laboral, tem sido um forte indicativo de que essa atividade é periculosa (e, portanto, dando ensejo à atividade especial), a saber:

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO. ATIVIDADE ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL VIGILANTE. PORTE DE ARMA DE FOGO. RECONHECIMENTO. CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA. (...) 4. A atividade de vigilante é considerada perigosa e enquadrada como especial por categoria profissional, por analogia à função de guarda, até 28-04-1995 e posterior a essa data, comprovado o porte de arma de fogo, em face da periculosidade advinda do risco de vida a que se sujeita o obreiro. (...) (TRF4, AC 5013495-77.2010.404.7000, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão (auxílio Lugon) Taís Schilling Ferraz, juntado aos autos em 16/10/2014)

                O manuseio de arma de fogo é forte elemento de prova a indicar a periculosidade (atividade de risco) de determinada atividade.

 PREVIDENCIÁRIO. CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL. VIGILANTE. USO DE ARMA DE FOGO. PERICULOSIDADE PRESUMIDA. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE. POSSIBILIDADE. PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO PROVIDO. (...) 3.Em se tratando de vigilante armado, basta a comprovação de que a atividade era desenvolvida com o porte de arma de fogo, o que pode ser feito por qualquer meio de prova admitido em direito. Isto porque, neste caso, a periculosidade é presumida. Não se trata do extinto enquadramento por categoria, mas apenas do reconhecimento da periculosidade do trabalho com porte de arma de fogo. 4. Assim, equivocou-se a turma de origem ao exigir laudo pericial no período posterior a 12-4-1996, embora tenha afirmado existir formulário. 5. Julgamento de acordo com o art. 46 da Lei 9.099/95. 6. Pedido de uniformização provido para, reafirmando o entendimento de que a simples comprovação do trabalho exercido por vigilante com porte de arma de fogo enseja a contagem de tempo especial porque a periculosidade, neste caso, é presumida, reconhecer o tempo de serviço especial no período de 12-4-1996 a 5-3-1997. Os reflexos serão apurados no primeiro grau, quando do cumprimento da sentença.Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais dar provimento ao pedido de uniformização, nos termos do voto-ementa do Relator. (TNU, PEDILEF 05182762620104058300, JUIZ FEDERAL GLÁUCIO FERREIRA MACIEL GONÇALVES, TNU, DOU 25/04/2014 SEÇÃO 1, PÁGINAS 88/193.)

3 - CONCLUSÃO

         Pela inércia do Legislador, tornou-se inviável, por longo período, a concessão de aposentadoria especial ao servidor público.

         Contudo, o STF, inicialmente pelo julgamento dos Mandados de Injunção 721 e 758 (Min. Marco Aurélio, DJe de 30/11/2007 e DJe de 26/09/2008), e recentemente por força da súmula vinculante 33, tratou de assegurar o exercício desse direito constitucional até a edição da Lei Complementar reclamada no art. 40, § 4º, da CF/88, observando-se, para tanto, a Lei 8.213/91 naquilo que for possível.

         Com relação às hipóteses de atividade de risco (art. 40, § 4º, II, da CF/88), não há uma expressa definição, pelo STF, de quais categorias se incluem nessa situação, nem se a regra subsidiária será do RGPS ou dos policiais (LC 144/14).

         A Emenda Constitucional n. 47, de 2005, que acertadamente previu a possibilidade de aposentadoria especial para o servidor público que exerce atividade de risco, ainda carece de uma regulamentação. É no bojo do Projeto de Lei Complementar n. 554/10 que a questão será debatida no Congresso Nacional.

         E, enquanto o legislador não cumpre o seu papel Constitucional, o Poder Judiciário segue proferindo diversas decisões no afã de assegurar esse direito constitucional há anos sonegado dos servidores públicos.  

4 - BIBLIOGRAFIA:

GONÇALVES, Ionas Deda. Direito Previdenciário. São Paulo: Ed. Saraiva, 4ª edição, 2012.

FACHIN, Luiz Edson. Teoria crítica do direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.

LEITÃO, André Stuart. Aposentadoria Especial. São Paulo: Quartier Latin, 2007.

ROCHA, Daniel Machado da; BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 9ª. ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, ESMAFE, 2009.

STEPHANES, Reinhold. Aposentadoria Especial: Um novo conceito. Síntese Trabalhista nº 116 – fev⁄99.

TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário: regime geral de previdência social e regras constitucionais dos regimes próprios de previdência social. 13. ed. Niterói, RJ: Impetus, 2011.

VIANNA, João Ernesto de Aragonés. Curso de Direito Previdenicário. São Paulo: 5ª edição, Editora Atlas, 2012.


[1] Daniel Machado da; BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 9ª. ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, ESMAFE, 2009, p. 257.

[2] FACHIN, Luiz Edson. Teoria crítica do direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 294.

[3] STEPHANES, Reinhold. Aposentadoria Especial: Um novo conceito. Síntese Trabalhista nº 116 – fev⁄99, p.24.

[4] Daniel Machado da; BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Obra já citada, p. 261.

[5] Requisitos - Aposentadoria Especial - Perícia Judicial - Atividade Perigosa, Insalubre ou Penosa - Inscrição em Regulamento.    Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em regulamento.

[6] RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE ELETRICIDADE. SUPRESSÃO PELO DECRETO 2.172/1997 (ANEXO IV). ARTS. 57 E 58 DA LEI 8.213/1991. ROL DE ATIVIDADES E AGENTES NOCIVOS. CARÁTER EXEMPLIFICATIVO. AGENTES PREJUDICIAIS NÃO PREVISTOS. REQUISITOS PARA CARACTERIZAÇÃO. SUPORTE TÉCNICO MÉDICO E JURÍDICO. EXPOSIÇÃO PERMANENTE, NÃO OCASIONAL NEM INTERMITENTE (ART.57, § 3º, DA LEI 8.213/1991). 1. Trata-se de Recurso Especial interposto pela autarquia previdenciária com o escopo de prevalecer a tese de que a supressão do agente eletricidade do rol de agentes nocivos pelo Decreto 2.172/1997 (Anexo IV) culmina na impossibilidade de configuração como tempo especial (arts. 57 e 58 da Lei 8.213/1991) de tal hipótese a partir da vigência do citado ato normativo.2. À luz da interpretação sistemática, as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991). Precedentes do STJ. 3. No caso concreto, o Tribunal de origem embasou-se em elementos técnicos (laudo pericial) e na legislação trabalhista para reputar como especial o trabalho exercido pelo recorrido, por consequência da exposição habitual à eletricidade, o que está de acordo com o entendimento fixado pelo STJ. 4. Recurso Especial não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (REsp 1306113/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/11/2012, DJe 07/03/2013)

[7] VIANNA, João Ernesto de Aragonés. Curso de Direito Previdenciário. São Paulo: 5ª edição, Editora Atlas, 2012, p. 528.

[8] Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=466677. Acesso em: 26.11.14.

[9] MI 833/DF. rel. Min. Cármen Lúcia, 22.10.2014, noticiado o Informativo n. 764 do STF.

[10] LEITÃO, André Stuart. Aposentadoria Especial. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 137.

[11] TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário. 7.ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2005, p. 188.

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Sobre o autor
Juliano de Angelis

Procurador Federal. Responsável pela Procuradoria Seccional Federal em Canoas (RS). Ex-sócio da sociedade Bellini, Ferreira, Portal Advogados Associados. Pós-graduando em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera-Uniderp/REDE LFG.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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