A importância do estudo de impacto ambiental como instrumento para a promoção do meio ambiente ecologicamente equilibrado

09/12/2014 às 15:47
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O estudo destina-se a demonstrar os fundamentos jurídicos do estudo de impacto ambiental, sua natureza jurídica, principais características e sua importância como instrumento de promoção do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

1. INTRODUÇÃO

Para o desenvolvimento de atividades econômicas, que inevitavelmente implicam na utilização de recursos ambientais, a legislação brasileira e estrangeira impõe aos empreendedores a apresentação de estudos sobre os impactos ambientais causados pelos negócios que desejam operar. Essa exigência de apresentação de estudos ambientais destina-se a aferir a viabilidade ambiental do negócio a ser instalado ou operado pelo empreendedor, servindo para prevenir danos ambientais e também diminuir os impactos ao meio ambiente que são naturalmente inevitáveis quando se exerce determinadas atividades econômicas.

Disso resulta a importância dos estudos de impacto ambiental para a proteção do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado previsto no art. 225 da Constituição Federal, posto que o empreendedorismo decorrente da livre iniciativa, constitucionalmente garantida na ordem econômica, deve ser compatível com a defesa do meio ambiente (art. 170, VI, da CF/88).

Neste estudo, será demonstrada a importância da existência dos estudos de impacto ambiental, com destaque para o estudo prévio de impacto ambiental; será analisada a natureza jurídica desses estudos e os seus fundamentos jurídicos, destacando-se também as suas principais características previstas na legislação nacional.

2.  FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA DOS ESTUDOS DE IMPACTO AMBIENTAL

Os estudos de impacto ambiental constituem-se em mecanismos de proteção e defesa do meio ambiente de importância internacional, sendo comumente adotados em vários países. Tamanha a importância desses instrumentos para proteção ambiental levou a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, conhecida como RIO 92, a prestigiá-los inserindo regra expressa em sua Declaração final. Nessa esteira, dispõe o Princípio nº 17 da Declaração da Conferência da ONU do Rio de Janeiro:

“Princípio 17. – A avaliação de impacto ambiental, como instrumento nacional, deve ser empreendida para atividades planejadas que possam vir a ter impacto negativo considerável sobre o meio ambiente e que dependam de uma decisão da autoridade nacional competente.”[1]

Todavia, as origens do instituto remontam ao direito americano, que segundo José Afonso da Silva, “já em 1969 exigia um Relatório de Impacto Ambiental anexo aos projetos de obras do Governo Federal que pudessem afetar a qualidade do meio ambiente”[2]. Conforme ensina também Antônio Beltrão, “o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) foi criado pelo Nacional Environmental Policy Act (NEPA), lei estadunidense de 1969, e atualmente é adotado por mais de 80 países...”[3]. Naquela época, o direito americano já trazia a preocupação de promover o desenvolvimento econômico com a preservação da qualidade ambiental.[4]

No direito brasileiro, a primeira referência a estudos ambientais como condicionantes das operações de empreendimentos utilizadores de recursos ambientais se deu com a Lei de Zoneamento Industrial (Lei 6.803/80), que dispõe sobre as diretrizes básicas para o zoneamento industrial nas áreas críticas de poluição. Esse instrumento normativo exige sejam realizados estudos especiais prévios de alternativas e avaliações de impacto, para a implantação de zonas de uso estritamente industrial de polos petroquímicos, cloroquímicos, carboquímicos e instalações nucleares.

Trata-se da primeira previsão no direito brasileiro dos estudos de impacto ambiental como ferramenta para promover uma política de preservação ambiental. Nos termos dessa Lei de Zoneamento Industrial o estudo do impacto ambiental deve preceder a instalação dessas zonas industriais.

Posteriormente, com a promulgação da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), o legislador nacional aprimorou esse mecanismo de defesa ambiental, prevendo como instrumento dessa política a avaliação de impactos ambientais (art. 9º, III, da Lei 9.638/81). Destarte, nesse diploma normativo consagrou-se a previsão da avaliação de impactos ambientais, instituto de caráter geral que abarca diversas espécies de estudos de impacto ambiental tais como o plano e projeto de controle ambiental, o relatório ambiental, o plano de manejo, o plano de recuperação de área degradada dentre outros.[5]  Neste estudo, limitar-se-á ao tratamento conferido pela legislação brasileira aos estudos de impactos ambientais.

O aprimoramento do instituto da avaliação de impactos ambientais consiste na sua definição como instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente, bem como na sua exigência não somente para os casos de zoneamento industrial como anteriormente previsto na Lei 6.803/80, mas para a aprovação de outras atividades e projetos públicos e particulares a serem executadas em áreas industriais ou não. Nessa senda, observa-se um avanço em relação à utilização restritiva dos estudos ambientais da Lei de Zoneamento Industrial.

Contudo, a Lei 6.938/91 não entrou em detalhes acerca das características, formas de exigência e procedimentos dos estudos de impacto ambiental, delegando tal atribuição ao Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA por meio do art. 8º, II, o qual se transcreve a seguir:

“Art. 8º Compete ao CONAMA: 

(...)

II - determinar, quando julgar necessário, a realização de estudos das alternativas e das possíveis conseqüências ambientais de projetos públicos ou privados, requisitando aos órgãos federais, estaduais e municipais, bem assim a entidades privadas, as informações indispensáveis para apreciação dos estudos de impacto ambiental, e respectivos relatórios, no caso de obras ou atividades de significativa degradação ambiental, especialmente nas áreas consideradas patrimônio nacional.” 

Da redação legal transcrita, depreende-se que a Lei 6.938/81 expressamente atribuiu ao CONAMA a competência para definir as hipóteses em que é exigível o estudo de impacto ambiental e respectivo relatório, fixando o CONAMA o modo e a forma de sua execução.

Em seguida, o Decreto 99.274/90 (revogando o Decreto 88.351), ao regulamentar a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, outorgou competência ao CONAMA para fixar os critérios norteadores do estudo de impacto ambiental, vinculando a exigência desses estudos ao procedimento de licenciamento ambiental (art. 17, §1º, do Decreto 99.274/90).  A partir daí, autorizou-se ao CONAMA a regulamentação dos contornos gerais do estudo de impacto ambiental por meio de resoluções.

Por fim, reconhecendo a importância dos estudos ambientais para o início de atividades que utilizem recursos ambientais, o constituinte de 88 expressamente exigiu o estudo prévio de impacto ambiental como forma de assegurar a efetividade do meio ambiente equilibrado. A previsão constitucional tem lugar no art. 225, §1º, IV, in verbis:

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

(...)

IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;”

A Constituição Federal de 1988, como se vê acima, sacramentou a importância dos estudos ambientais, sendo recepcionada a legislação anterior referente à avaliação de impactos ambientais, como forma de garantir o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Embora o texto constitucional seja restritivo, fazendo referência apenas ao estudo prévio de impacto ambiental (EIA) necessário para a instalação de obras ou atividades causadoras de significativa degradação ambiental, a limitação não elimina as demais formas de estudos ambientais existentes e outros mecanismos de avaliação de impactos ambientais.

O que importa destacar é que a previsão constitucional da exigência do estudo prévio de impacto ambiental (EIA) destaca toda importância das ferramentas de avaliação de impactos ambientais na promoção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Para José Afonso da Silva, o estudo prévio de impacto ambiental “é pressuposto constitucional da efetividade do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”.[6]

O estudo de impacto ambiental, tal como previsto na Constituição Federal e na Lei 6.938/81, tem natureza jurídica de instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente, tendo por função viabilizar ao Poder Público um fluxo de informações sobre os projetos impactantes para subsidiá-lo na tomada de decisão quanto à liberação da instalação da obra ou atividade. Segundo o escólio de Paulo Affonso Leme Machado, “as verificações e análises do Estudo de Impacto Ambiental terminam por um juízo de valor, ou seja, uma avaliação favorável ou desfavorável ao projeto. [7]

Alem da fundamentação constitucional e legal, o estudo de impacto ambiental possui apoio também dos princípios da prevenção e da precaução, pois os estudos realizados subsidiam o empreendedor com informações sobre os riscos de danos ambientais reais e potenciais decorrentes de sua atividade. Nessa toada, em Talden Farias, em obra conjunta com Francisco Seráphico e Geórgia Melo afirmam:

“O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) utiliza-se da prevenção e da precaução para avaliar a viabilidade de determinada atividade e o impacto que esta atividade causará ao meio ambiente, verificando, também, se esse impacto será significativo suficiente para causar degradação ambiental séria e/ou irreversível.

Neste particular, o princípio da prevenção exige a adoção de medidas efetivas para evitar o dano ambiental, mesmo no caso de haver apenas um simples risco de danos graves e irreversíveis ao meio ambiente, enquanto o princípio da precaução vai mais além e pressupõe que a intervenção deve ocorrer também quando existir dúvida científica acerca do risco do dano ambiental.”[8]

Tais riscos devem ser evitados ou mitigados, servindo o estudo de impacto ambiental ao Poder Público, como mecanismo de prevenção de danos ambientais não tolerados. Assim, o estudo de impacto ambiental é pressuposto constitucional da concretização do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

3. PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL

O estudo de impacto ambiental (EIA), como já afirmado, tem por escopo aferir a viabilidade ambiental dos projetos públicos ou privados a serem instalados e que demandem a utilização de recursos ambientais, causando alterações no meio ambiente. Destarte, o estudo objetiva avaliar as possíveis alterações físicas, químicas e biológicas que incidirão sobre o meio ambiente em decorrência da instalação de uma atividade ou obra. Sobre o conceito normativo de impacto ambiental, cita-se o art. 1º da Resolução 01-1986 do CONAMA:

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“Artigo 1º - Para efeito desta Resolução, considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam:

I - a saúde, a segurança e o bem-estar da população;

II - as atividades sociais e econômicas;

III - a biota;

IV - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente;

V - a qualidade dos recursos ambientais.”

Todas as atividades humanas, de modo inevitável, causam alterações no meio ambiente, tendo a legislação se preocupado apenas com os danos ambientais que por sua extensão não podem ser tolerados. Para a verificação deste custo-benefício ambiental da realização das atividades humanas é que se utiliza o instrumento do estudo de impacto ambiental - EIA.

Neste artigo, ao tratar das características principais do EIA, referir-se-á especificamente ao complexo instrumento previsto no art. 255, §1º, IV, da Constituição Federal, embora muitas de suas características sejam comuns a todas as formas de estudos ambientais, inclusive os estudos mais simplificados.

Sobre essa especificidade e complexidade do EIA em relação a outras modalidades de estudos ambientais previstas no art. 1º, III, da Resolução 237-1997, Frederico Amado ensina que:

“A avaliação de impactos ambientais ou estudos ambientais constitui um gênero, que engloba desde o famoso e complexo Estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) às modalidades mais simples, tais como o relatório ambiental, o plano e projeto de controle ambiental, o relatório ambiental preliminar, o diagnóstico ambiental, o plano de manejo, o plano de recuperação de área degradada e a análise preliminar de risco.

O Estudo de Impacto Ambiental (também conhecido como EPIA – Estudo Prévio de Impacto Ambiental) é a modalidade mais complexa, com berço constitucional, sendo incumbência do Poder Público, a fim de assegurar a efetividade do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado “exigir, na forma da lei, para a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade”.[9]

A Constituição Federal de 1988 determinou a obrigatoriedade do EIA para a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação ao meio ambiente (art. 225, 1º, IV, CF/88). A redação do dispositivo utiliza-se da expressão “na forma da lei”, para delegar ao legislador ordinário a incumbência de definir os casos em que será exigido o estudo prévio de impacto ambiental para a instalação de obra ou atividade, visto que o conceito “significativa degradação do meio ambiente” é aberto e indeterminado.

Como já exposto, os casos em que é obrigatória a exigência do EIA foram definidos pelo CONAMA, com a autorização do art. 8º, II, da Lei 6.938/81, sendo também autorizados ao CONAMA por meio do Decreto 99.274/90 a definição dos critérios norteadores do EIA para fins de licenciamento. Em que pesem as críticas de parte da doutrina acerca da obrigatoriedade do EIA ser listada em hipóteses contidas em normas administrativas do CONAMA e não por meio de lei, fato que poderia suscitar dúvidas quanto à constitucionalidade da exigência diante do princípio da legalidade, a prática jurisprudencial e doutrinária é a de admitir como possível a exigência de EIA veiculada em normas do CONAMA, já que a Lei 6.938/81 expressamente atribuiu a esse órgão competência para exigir o EIA, fixando o modo e a forma de execução desse estudo.[10]

Com essa autorização, o CONAMA editou a Resolução nº 01, de 23 de janeiro de 1986, a qual em seu art. 2º, listou em rol exemplificativo casos em que o licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente dependerão da elaboração de EIA e respectivo relatório de impacto ambiental – RIMA. Confira-se a redação do dispositivo:

“Artigo 2º - Dependerá de elaboração de estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto ambiental - RIMA, a serem submetidos à aprovação do órgão estadual competente, e do IBAMA e1n caráter supletivo, o licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente, tais como:

I - Estradas de rodagem com duas ou mais faixas de rolamento;

II - Ferrovias;

III - Portos e terminais de minério, petróleo e produtos químicos;

IV - Aeroportos, conforme definidos pelo inciso 1, artigo 48, do Decreto-Lei nº 32, de 18.11.66;

V - Oleodutos, gasodutos, minerodutos, troncos coletores e emissários de esgotos sanitários;

VI - Linhas de transmissão de energia elétrica, acima de 230KV;

VII - Obras hidráulicas para exploração de recursos hídricos, tais como: barragem para fins hidrelétricos, acima de 10MW, de saneamento ou de irrigação, abertura de canais para navegação, drenagem e irrigação, retificação de cursos d'água, abertura de barras e embocaduras, transposição de bacias, diques;

VIII - Extração de combustível fóssil (petróleo, xisto, carvão);

IX - Extração de minério, inclusive os da classe II, definidas no Código de Mineração;

X - Aterros sanitários, processamento e destino final de resíduos tóxicos ou perigosos;

Xl - Usinas de geração de eletricidade, qualquer que seja a fonte de energia primária, acima de 10MW;

XII - Complexo e unidades industriais e agro-industriais (petroquímicos, siderúrgicos, cloroquímicos, destilarias de álcool, hulha, extração e cultivo de recursos hídricos);

XIII - Distritos industriais e zonas estritamente industriais - ZEI;

XIV - Exploração econômica de madeira ou de lenha, em áreas acima de 100 hectares ou menores, quando atingir áreas significativas em termos percentuais ou de importância do ponto de vista ambiental;

XV - Projetos urbanísticos, acima de 100ha ou em áreas consideradas de relevante interesse ambiental a critério da SEMA e dos órgãos municipais e estaduais competentes;

XVI - Qualquer atividade que utilize carvão vegetal, em quantidade superior a dez toneladas por dia.”

Portanto, o EIA é obrigatório nas hipóteses do art. 2º da Resolução nº 01-1986 do CONAMA, sendo essa lista de hipóteses apenas exemplificativa, nada impedindo que existam outras atividades causadoras de significativa degradação ao meio ambiente, e que por isso demandam a exigência de EIA por parte do Poder Público por ocasião de seu licenciamento. A Constituição Federal exige o EIA para as atividades significativamente poluidoras, e caso estas não estejam listadas no art. 2º da Resolução nº 01-1986 do CONAMA, a exigência deve ser aferida no caso concreto pela autoridade competente. Contudo, no caso das atividades elencadas nesse art. 2º, a hipótese é cogente, não havendo discricionariedade para o órgão ambiental dispensar a elaboração do EIA.

A Constituição Federal estabeleceu no art. 225, §1º, IV, uma presunção relativa de que toda atividade é causadora de significativo impacto ao meio ambiente, cabendo ao proponente do projeto a demonstração de prova em contrário que o dispense da apresentação do EIA. Assim, nos casos não previstos na Resolução nº 01-1986 ou em outras normas do CONAMA, o órgão ambiental licenciador determinará se a execução do EIA deve ou não ser feita.[11] Ou seja, o órgão ambiental responsável pelo licenciamento deve justificar a sua decisão de solicitar ou não o EIA, tendo em vista que se trata da instância competente para o exigi-lo[12], sendo que esta sua decisão é tomada com base em uma discricionariedade técnica exercida pelos órgãos ambientais.

Ainda sobre a lista de atividades sujeitas ao EIA previstas no art. 2º da Resolução nº 01-1986 do CONAMA, em razão do conceito aberto e indeterminado sobre o que seja “a significativa degradação do meio ambiente” José Afonso da Silva ensina que “a Constituição não admite limitação taxativa dos casos de Estudo de Impacto Ambiental” e que “qualquer que seja a obra ou a atividade, pública ou particular, que possa apresentar riscos de degradação significativa do meio ambiente” fica sujeita à prévia elaboração do EIA.

Como a própria Constituição Federal afirma, o estudo de impacto ambiental deve ser prévio, ou seja, deve anteceder à instalação da obra ou atividade capaz de causar degradação ao meio ambiente. Sobre esse caráter prévio do EIA, destaca Paulo Affonso Leme Machado:

“O Estudo Prévio de Impacto Ambiental deve ser anterior ao licenciamento ambiental da obra ou da atividade. Esse Estudo não pode ser concomitante e nem posterior à implantação da obra ou à realização da atividade. A Constituição criou especificamente esse instituto jurídico, que tem uma diferença com o instituto já existente – o Estudo de Impacto Ambiental – EIA. O texto constitucional inseriu o termo “Prévio” para situar, sem nenhuma dúvida, o momento temporal em que ele deverá ser utilizado. Visa evitar uma prevenção falsa ou deturpada, quando o empreendimento já iniciou sua implantação ou quando os planos de localização foram elaborados sem o EIA (...).

A anterioridade da exigência do EIA não afasta a possibilidade de ser exigida, na renovação ou na revisão dos licenciamentos ambientais, a apresentação de um novo Estudo. Na essência, é o mesmo Estudo previsto pela Constituição; somente não se trata do primeiro Estudo, isto é, do anterior à implantação do empreendimento ou do início da atividade.”[13]

Para ser exigida previamente à instalação da atividade ou obra, a Resolução nº 01-1986 do CONAMA em seus artigos 2º e 3º vinculam a elaboração do EIA a um procedimento de licenciamento ambiental, necessário para a autorização do início da atividade ou obra. Dessa forma, o EIA é um componente do procedimento de licenciamento ambiental.

Vale ressaltar que o art. 10 da Lei 6.938/81 (Redação conferida pela Lei Complementar 140/2011) obriga o licenciamento ambiental de qualquer atividade ou obra que utilize recursos ambientais e que seja capaz de causar degradação ambiental. Já a utilização do EIA como etapa do licenciamento ambiental não é sempre exigível, sendo obrigatória apenas no caso das atividades que causem “significativa degradação ambiental” conforme determinação constitucional (art. 225, §1º, IV, da CF/88) e regulamentação da Resolução nº 01-1986 do CONAMA. Nesse sentido, o parágrafo único do art. 3º da Resolução 237-1997 do CONAMA autoriza o órgão ambiental competente a dispensar o EIA e a exigir outros estudos ambientais simplificados, quando verificar que atividade a ser licenciada não é potencialmente causadora de significativo impacto ambiental.

Por isso, não é qualquer atividade que utilize recursos ambientais que demandará a elaboração do EIA, mas somente as que são capazes de gerar degradação ambiental significativa, sendo que para as hipóteses do art. 2º da Resolução nº 01-1986 do CONAMA a presunção de significativo impacto ambiental é absoluta[14]. Em geral o EIA é exigido e apresentado antes da concessão da licença ambiental prévia, fase do licenciamento ambiental na qual é analisada a localização e viabilidade ambiental do projeto. Como leciona Frederico Amado, “o EIA deverá preceder à concessão da licença prévia, pois este ato administrativo aprova o projeto e declara a sua viabilidade ambiental, tendo o estudo ambiental como pressuposto lógico”.[15]

Focado no texto constitucional, o art. 3º da Resolução 237-1997 do CONAMA também definiu como obrigatório o EIA para o licenciamento ambiental de atividades causadoras de significativa degradação ambiental, tendo também exigido por consequência a elaboração do respectivo Relatório de Impacto Ambiental – RIMA. As conclusões do EIA, pois, devem estar descritas no RIMA, sendo este documento uma espécie de relatório destinado à dar conhecimento à população em geral os resultados dos estudos ambientais realizados. Destarte, o RIMA, enquanto resultado do EIA, deve ser apresentado com uma linguagem clara e acessível ao público em geral (art. 11 da Resolução nº 01-1986 do CONAMA). Como o EIA é um estudo que contém termos técnicos e linguagem científica, para sua compreensão pela população em geral deve “ser traduzido” sob a forma de relatório em uma linguagem objetiva e simples, de modo a se tornar compreensível ao público. A previsão do RIMA visa ao respeito ao princípio da informação ambiental.

Ainda dentro desse princípio da informação ambiental, a Constituição Federal determina que se dê publicidade ao estudo prévio de impacto ambiental. Logo, a gestão democrática do meio ambiente depende inevitavelmente da participação popular, viabilizada através da publicação do EIA-RIMA. José Afonso da Silva defende que “a participação popular no procedimento do estudo ambiental é uma exigência da natureza mesma do patrimônio ambiental”[16] como bem de uso comum do povo, assim como consta do art. 225 da Constituição Federal.

O art. 11, §2º, da Resolução nº 01-1986 do CONAMA prevê a possibilidade do órgão ambiental competente promover a realização de audiência pública, com a finalidade de expor ao público interessado o conteúdo do estudo em análise e de seu respectivo RIMA, solucionando dúvidas e recebendo dos cidadãos e entidades presentes as críticas e sugestões a respeito do projeto a ser desenvolvido. A audiência pública é mais um instrumento a ser utilizado para se promover a gestão democrática do meio ambiente, tendo a sua regulamentação prevista na Resolução nº 09-1987 do CONAMA. Sobre o direito à informação e sua relação com o EIA, Paulo Affonso Leme Machado destaca o seguinte:

“Dar publicidade ao Estudo, transcende o conceito de possibilitar a leitura do Estudo ao público, pois passa a ser dever do Poder Público levar o teor do Estudo ao conhecimento público. Deixar o Estudo à disposição do público não é cumprir o preceito constitucional, pois – salvo melhor juízo – o sentido da expressão ‘dará publicidade’ é publicar- ainda que em resumo – o Estudo de Impacto em órgão de comunicação adequado. A audiência pública no EPIA, ainda que não prevista expressamente pela Constituição, implicitamente está contida no texto constitucional, pois dar publicidade é partilhar a informação, por todos os meios eficazes e disponíveis.”[17]

Além disso, há ainda que se destacar que o EIA deve ser realizado por uma equipe técnica multidisciplinar, a ser custeada pelo proponente do projeto e a ele vinculada. Essa equipe técnica, na qual devem conter profissionais de diversas áreas do conhecimento, deve elaborar um estudo imparcial, sendo recomendável que seu trabalho evite simplesmente realizar a defesa técnica do empreendimento, sob pena de que em eventual omissão ou inconsistência do estudo, possa resultar na responsabilização no âmbito civil, administrativo e criminal dos elaboradores do estudo e do empreendedor (art. 14, §1º, da Lei 6.938/81; art. 82 do Decreto 6.514/08; art. 69-A da Lei 9.605/98).

Por fim, ainda com relação às características do EIA-RIMA, é preciso destacar o art. 5º da Resolução nº 01-1986 do CONAMA, importante dispositivo que trata das diretrizes do estudo de impacto ambiental:

“Artigo 5º - O estudo de impacto ambiental, além de atender à legislação, em especial os princípios e objetivos expressos na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, obedecerá às seguintes diretrizes gerais:

I - Contemplar todas as alternativas tecnológicas e de localização de projeto, confrontando-as com a hipótese de não execução do projeto;

II - Identificar e avaliar sistematicamente os impactos ambientais gerados nas fases de implantação e operação da atividade ;

III - Definir os limites da área geográfica a ser direta ou indiretamente afetada pelos impactos, denominada área de influência do projeto, considerando, em todos os casos, a bacia hidrográfica na qual se localiza;

lV - Considerar os planos e programas governamentais, propostos e em implantação na área de influência do projeto, e sua compatibilidade.

Parágrafo Único - Ao determinar a execução do estudo de impacto ambiental o órgão estadual competente, ou o IBAMA ou, quando couber, o Município, fixará as diretrizes adicionais que, pelas peculiaridades do projeto e características ambientais da área, forem julgadas necessárias, inclusive os prazos para conclusão e análise dos estudos.

Da leitura do dispositivo acima transcrito, sobressai mais uma vez a função do estudo de impacto ambiental, de subsidiar o empreendedor e o Poder Público das informações necessárias acerca da viabilidade ambiental do projeto a ser desenvolvido, bem como de informar acerca de sua compatibilidade com as políticas públicas implementadas na área geográfica a ser impactada com a atividade. Sem dúvida, a regra estipulada pelo CONAMA propicia a aplicação por meio do EIA, aos projetos e atividades potencialmente causadores de impacto ambiental, dos princípios e objetivos definidos na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente necessários à preservação da qualidade ambiental e à manutenção do equilíbrio ecológico.

4. CONCLUSÃO

Ante todo o aqui exposto, é possível concluir que o EIA-RIMA é instrumento constitucionalmente previsto e indispensável para o licenciamento ambiental das atividades ou obras que causem significativa degradação ambiental. Logo, o EIA é um instrumento de política de defesa da qualidade do meio ambiente, sendo que a sua ausência gera a nulidade absoluta do licenciamento ambiental. Outrossim, os estudos ambientais só podem substituir o EIA-RIMA se não houver significativa degradação ambiental, mediante decisão do órgão ambiental competente imbuída de discricionariedade técnica, passível de revisão pelo Poder Judiciário.

A importância do EIA está relacionada às suas informações sobre a possibilidade ambiental da execução do projeto de instalação da obra ou atividade, sendo necessário também em razão da sua capacidade de prever os danos potenciais ao meio ambiente e evitá-los por meio de medidas mitigadoras. Em relação aos impactos ambientais inevitáveis, a virtude do EIA está em propor medidas compensatórias a serem empregadas, viabilizando também um plano de monitoramento e acompanhamento dos impactos da atividade, sejam eles positivos ou negativos.

Todo o vetor da exigência do EIA-RIMA e de outros estudos ambientais conduz à prevenção dos danos e riscos ambientais não toleráveis, o que vai ao encontro da execução de uma política ambiental capaz de gerar desenvolvimento econômico sem o comprometimento da qualidade ambiental, propiciando ao Poder Público e à coletividade o cumprimento do dever de proteger o meio ambiente ecologicamente equilibrado como bem jurídico de titularidade das presentes e futuras gerações.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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[1] Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Disponível em < http://www.mma.gov.br/port/sdi/ea/documentos/convs/decl_rio92.pdf>, acesso em 27.11.2014.

[2] SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 6. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007, p. 289.

[3] BELTRÃO, Antônio F.G. Curso de Direito Ambiental. São Paulo: Editora Método, 2009, p. 109.

[4] Sobre o histórico do instituto dos estudos de impacto ambiental no Direito Comparado consultar a obra de Paulo de Bessa Antunes, Direito Ambiental, Editora Lúmen Juris.

[5] Art. 1º, III, da Resolução nº 237-1998 do CONAMA.

[6] SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 6. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007, p. 289.

[7] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro.  17ª ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 224.

[8] FARIAS, Talden; COUTINHO, Francisco Seráphico da Nóbrega; MELO, Geórgia Karência R. M. M.; Direito Ambiental. Salvador: Editora Juspodivm, 2013, p. 145.

[9] AMADO, Frederico. Direito Ambiental Esquematizado. 5.ed. São Paulo: Método, 2014, p. 207-208.

[10] A respeito das críticas acerca da inconstitucionalidade da previsão dos casos em que é exigido o EIA/RIMA por meio de resoluções do CONAMA, conferir a obra de Direito Ambiental de Paulo de Bessa Antunes.

[11] FIORILLO, Celso Antônio Pacheco Filho. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 11ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010, p. 214.

[12] FARIAS, Talden; COUTINHO, Francisco Seráphico da Nóbrega; MELO, Geórgia Karência R. M. M.; Direito Ambiental. Salvador: Editora Juspodivm, 2013.

[13] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro.  17ª ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 144-145.

[14] Sobre essa questão, há parcela da doutrina que trata essa presunção como relativa com fundamento na autorização conferida pelo parágrafo único do art. 3º da Resolução nº 237-1997 do CONAMA, a exemplo de Celso Antônio Pacheco Fiorillo e Édis Milaré.

[15] AMADO, Frederico. Direito Ambiental Esquematizado. 5.ed. São Paulo: Método, 2014, p. 208.

[16] SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 6. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007, p. 299.

[17] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro.  17ª ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 146.

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Sobre o autor
Victor Nunes Carvalho

Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Goiás. Pós-graduado em Direito Público em ênfase em Direito Ambiental pela Universidade de Brasília. Pós-graduado em Direito do Estado pela Universidade Cândido Mendes/RJ. Pós-graduado em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera-Uniderp/MS. Procurador Federal.

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