O efeito translativo nos recursos

09/12/2014 às 15:36
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RECURSOS. EFEITOS. QUESTÕES DE ORDEM PÚBLICA. APRECIAÇÃO EX OFFICIO PELO JUÍZO AD QUEM. EFEITO TRANSLATIVO. PRINCÍPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL. PRINCÍPIO DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO E DA CELERIDADE. POSSIBILIDADE.

1. INTRODUÇÃO

                               As questões de ordem pública e sua apreciação em grau de recurso, de ofício pelo juízo ad quem, é tema recorrente na doutrina e jurisprudência pátria, merecendo sempre reflexão acadêmica, mormente considerando a entronização no sistema jurídico-constitucional do princípio da razoável duração do processo e da celeridade e a necessidade de conformação deste princípio como mandamento interpretativo de todo o sistema recursal.

                               Este ensaio tem como escopo examinar o efeito translativo dos recursos, perscrutando sobre a limitação da cognição em grau recursal. Tem o objetivo, ainda, de analisar a importância da atividade judicial na apreciação das questões de ordem pública, como primados da economia processual, evitando o trânsito em julgado de sentença nula e, de consequência, rescindível, passível portanto de ser objeto de outro processo.

                              

2. O EFEITO TRANSLATIVO

                        Ao sermos indagados sobre quais os efeitos dos recursos, pensamos, imediatamente, no efeito devolutivo, ínsito a todo recurso, ou, no dizer de Teresa Arruda Alvim Wambier, co-natural aos recursos[1]. Por meio deste efeito devolve-se ao juízo ad quem a apreciação da matéria ventilada no recurso. Ensina Kazuo Watanabe, que “a cognição pode ser vista em dois planos distintos: horizontal (extensão, amplitude) e vertical (profundidade)”[2].

                        No plano recursal, tal asserção é também aplicável, tendo o efeito devolutivo, por esta razão, dimensão horizontal e vertical, limitando a cognição recursal. Destaca Teresa Arruda Alvim Wambier:

É que este efeito pode ser visto sob duas óticas: uma que privilegia a dimensão horizontal (extensão) e outra, a dimensão vertical(profundidade). Entende-se, nesta perspectiva, a dimensão horizontal como aquilo que tenha sido pelo recorrente, efetivamente impugnado na decisão recorrida. A dimensão vertical abrange aquilo que é devolvido ‘por tabela’, indiretamente, não como fruto direto da atividade do recorrente.

É por isso que parte da doutrina prefere identificar o efeito devolutivo dos recursos, já que se trata de fenômeno decorrente do princípio dispositivo, exclusivamente àquilo que antes designamos de dimensão horizontal do efeito devolutivo.

Efetivamente, só nesta dimensão é que se vê, com clareza, a limitação da atividade do órgão jurisdicional como resultado da iniciativa do recorrente, que, ao impugnar a decisão o faz de maneira que o órgão ad quem fique adstrito àquilo que foi atacado e requerido nas razões de recurso[3].

                               A apreciação do recurso, portanto, pelo efeito devolutivo, estaria limitada pelas razões recursais, com aplicação direita do princípio congruência (arts. 128, 459 e 460 do Código de Processo Civil), com possibilidade, contudo, de análise de todos os fundamentos jurídicos disponíveis, não estando o julgador atrelado as alegações das partes. Como explica José Roberto dos Santos Bedaque, no que tange a apelação, “se quisermos traçar um paralelo, a extensão do efeito devolutivo refere-se ao pedido formulado na apelação; já a profundidade diz respeito aos fundamentos do recurso”[4].

                               Entretanto, por vezes, o julgador poderá se deparar com questões de ordem pública, que não foram deduzidas no recurso. Nestas hipóteses, Nelson Nery Junior defende que, em razão do princípio inquisitório, haverá a translação destas questões, “não por força do texto atual do art. 516 do CPC, que hoje é norma desprovida de eficácia, mas pelo sistema do CPC, já que não são alcançadas pela preclusão (v.g. arts. 267, § 3º, e 301, § 4º, CPC).”[5] Esclarece, ainda, o referido doutrinador:

O poder dado pela lei ao juiz para, na instância recursal, examinar de ofício as questões de ordem pública não arguidas pelas partes não se insere no conceito de efeito devolutivo em sentido estrito, já que isso se dá pela atuação do princípio inquisitório e não pela sua antítese, que é o princípio dispositivo, de que é corolário o efeito devolutivo dos recursos. Mesmo porque, efeito devolutivo pressupõe ato comissivo de interposição do recurso, não podendo ser caracterizado quando há omissão da parte ou interessado sobre determinada questão não referida nas razões ou contra-razões do recurso[6].

                               É o chamado efeito translativo dos recursos. Por meio deste efeito, a mera interposição do recurso, transfere ao juízo recursal as questões de ordem pública, desde que ultrapassado os requisitos de admissibilidade e cabimento do recurso.

                               O efeito translativo dos recursos é acolhido pela maioria da doutrina e jurisprudência pátrias, uma vez que não seria razoável admitir o prosseguimento de processo judicial ou mesmo seu trânsito em julgado, quando este estiver passível de nulidade, que pode ser objeto de rescisão judicial.                 Aceitar tal situação seria atentar contra o princípio da razoável duração do processo e da celeridade, previstos no art. 5º, LXXVIII, da Constituição[7], bem como afrontar o princípio da economia processual, norteador de todo o sistema processual, já que as nulidades absolutas maculam irremediavelmente o processo[8], podendo ser alegadas de ofício pelo juiz, não sendo atingidas pela preclusão (cf. art. 245, parágrafo único, do CPC).

                               Sobre a preclusão, frisa Fredie Didier Jr que “parece haver uma confusão entre a possibilidade de conhecimento ex officio de tais questões, fato indiscutível, com a possibilidade de decidir de novo questões já decididas, mesmo as que poderiam ter sido conhecidas de ofício. São coisas diversas: a cognoscibilidade ex officio de tais questões significa, tão-somente, que elas podem ser examinadas pelo Judiciário sem a provocação das partes, o que torna irrelevante o momento em que são apreciadas. Não há preclusão para exame das questões, enquanto pendente o processo, mas há preclusão para o reexame”[9].

                               Interessante pontuar que José Roberto dos Santos Bedaque afirma que “o exame de ofício de questões de ordem pública, especialmente as de natureza processual, deve ser precedido de plena participação das partes. Embora possa o juiz conhecer das questões independentemente de provocação, deve, antes de proferir a decisão a respeito, submetê-las à manifestação das partes”[10]. Fundamenta esta necessidade no direito a ampla defesa e contraditório, previstos pela Constituição, entretanto, a doutrina e jurisprudência pátria não têm caminhado nesta trilha, e estas questões são decididas sem necessidade de manifestação prévia das partes.

                               A adoção do efeito translativo dos recursos tem provocado intensa manifestação da doutrina e jurisprudência, que tem propagado que, ultrapassados os pressupostos de admissibilidade e cabimento, poderá o juízo ad quem manifestar-se sobre a questão.

Assim, se o recurso for intempestivo não pode o Tribunal, por exemplo, analisar uma questão de ordem pública, já que neste caso, a matéria sequer chegou a ser devolvida. De se notar, também, que vem sendo admitido o efeito translativo nos embargos infringentes[11]. Igualmente, como ressalta Teresa Arruda Alvim Wambier, “o tribunal, desde que se trata de conhecer matéria de ordem pública cuja constatação possa ser feita icto oculi, pode extinguir o processo com base no art. 267, em julgando um agravo, em que a matéria não tenha sido ventilada[12]”. O tema é pacífico quando se trata dos recursos nas instâncias ordinárias, como se vê do seguinte julgado:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. COISA JULGADA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. EFEITO TRANSLATIVO. APLICABILIDADE AOS RECURSOS ORDINÁRIOS.

1. Hipótese em que a parte agravante alega impossibilidade de análise, pela instância de origem, da questão relacionada à coisa julgada em face de supressão de instância.

2. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que as instâncias ordinárias podem conhecer ex officio de matéria de ordem pública, em respeito ao efeito translativo dos recursos ordinários e ao princípio da economia processual, possibilitando, inclusive, a extinção do feito principal sem resolução do mérito.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no REsp 1306712/PR, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/08/2014, DJe 10/09/2014)                      

De se destacar que nos recursos de fundamentação vinculada, como os embargos de declaração, recurso especial e extraordinário, mesmo se considerando que eles exigem a alegação de determinadas matérias expressas na legislação, para seu trânsito, o efeito translativo é admitido na doutrina. A jurisprudência é uníssona no sentido de sua admissibilidade nos embargos de declaração.

Contudo, no que tange ao recurso especial, o que se vê da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é que, após admitir o efeito translativo no recurso especial, depois de ultrapassado o juízo de admissibilidade e cabimento do recurso, esta posição vem sendo mitigada, pois vem se consolidando entendimento no sentido de que a matéria de ordem pública deve estar prequestionada, já que é exigido, pelo art. 105, III, da Constituição, que se julgue na via do especial as causas decididas. De consequência, se não houve decisão por parte do Tribunal a quo, não poderia haver apreciação por parte do Superior Tribunal de Justiça. Confiram-se:

AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. EXISTÊNCIA DE COISA JULGADA. PREQUESTIONAMENTO. AUSENTE.

1. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que o requisito do prequestionamento, que viabiliza a abertura desta instância especial, aplica-se mesmo às matérias de ordem pública.

2. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

(AgRg nos EDcl no REsp 1320863/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/10/2014, DJe 31/10/2014)

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. JUIZ DA CAUSA. ALEGAÇÃO DE IMPEDIMENTO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 282/STF.

1. É inadmissível o recurso especial quanto a matéria suscitada, ainda que de ordem de pública, não tenha sido objeto de debate no acórdão recorrido nem, a respeito, tenham sido opostos embargos de declaração. Incidência da Súmula n. 282/STF.

2. Agravo regimental desprovido.

(AgRg no REsp 1259151/SC, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/10/2014, DJe 09/10/2014)

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                               A solução não me parece consentânea com os princípios da razoável duração do processo e da celeridade, além da economia processual. Necessária, neste caso, a conformação destes princípios, interpretando-se a exigência constitucional de causas decididas apenas para a admissibilidade e cabimento do recurso. É prestigiar interpretação que confira maior efetividade a Constituição, prestigiando estes direitos fundamentais. Transcrevo, a este respeito, ensinamento de Marcia Zollinger:

Desta forma, a interpretação de acordo com a Constituição, quando aplicada aos textos normativo-processuais, significa que o juiz não pode se furtar de extrair das técnicas processuais a interpretação que confira eficácia ótima ao direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva. Ademais, quando o conflito envolver bens jusfundamentais, as normas processuais devem ser interpretadas com vistas em possibilitar a realização do direito fundamental prevalente no caso concreto na maior medida possível, atentando, igualmente, à menor restrição possível do direito fundamental contraposto, numa aplicação fundamentada do princípio da proporcionalidade.

O juiz, portanto, em razão da vinculação direta aos direitos fundamentais, possui também o dever de conferir proteção aos bens jusfundamentais na prestação da tutela jurisdicional. Assim, pode-se afirmar que o juiz tem a obrigação de optar pela interpretação da lei processual (por exemplo) que confira maior efetividade ao direito fundamental[13].

                               É, pois, mais razoável a posição que antes prevalecia no Superior Tribunal de Justiça, que condicionava a apreciação das questões de ordem pública apenas à admissibilidade e cabimento do recurso especial, sem, contudo, exigir o prequestionamento da questão de ordem pública[14]. Entretanto, a exigência de que a matéria tenha sido decidida é que tem vigorado, inclusive no âmbito do Supremo Tribunal Federal, como reproduzido na ementa a seguir:

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PENAL. CRIME DE DESACATO. ARTIGO 331 DO CÓDIGO PENAL. SUPOSTA QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA. AUSÊNCIA DO NECESSÁRIO PREQUESTIONAMENTO. PRECEDENTES DA CORTE. 1. O prequestionamento da questão constitucional é requisito indispensável à admissão do recurso extraordinário. 2. A Súmula 282 do STF dispõe, verbis: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada”. 3. A matéria de ordem pública, conquanto cognoscível de oficio pelo juiz ou Tribunal em qualquer tempo e grau de jurisdição (art. 267, § 3º, do CPC), não prescinde do requisito do prequestionamento em sede de Recurso Extraordinário. Precedentes: AI 539.558-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, DJe 30/11/2011, e AI 733.846-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, DJe 19/6/2009. (...)
(RE 801065 AgR, Relator(a):  Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 13/05/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-102 DIVULG 28-05-2014 PUBLIC 29-05-2014)

Outro tema que merece destaque é a possibilidade do exame da questão de ordem pública afetar ponto que não foi objeto de impugnação, no caso de recurso de apelação que não impugne todos os capítulos da sentença.  O mestre Barbosa Moreira destaca:

O objeto da cognição no grau superior é delimitado pelo âmbito do recurso, embora não tenha o órgão ad quem, necessariamente, de cingir-se à análise dos fundamentos invocados pelo recorrente, ou às questões suscitadas por ele e pelo recorrido: isso depende da disciplina legal adotada em cada caso e variável de um para outro recurso. O que o órgão ad quem não pode fazer é ultrapassar os marcos postos pelo recorrente: assim como, no julgamento de primeiro grau, se tem de decidir a lide nos limites em que foi deduzida (art. 128) e não é possível conceder à parte mais do que pedira (art. 460), analogicamente se passam as coisas no julgamento do recurso[15].

                               Da leitura deste excerto, vê-se que o pensamento de Barbosa Moreira indica a impossibilidade do julgamento de apelação influenciar ponto não impugnado.  José Roberto dos Santos Bedaque[16] não aceita que no recurso de apelação, ao se reconhecer questão de ordem pública, se possa atingir pedido que já teria sido objeto de aceitação pelas partes.

                               Com efeito, os capítulos da sentença são unidades autônomas do decisório da sentença, como conceitua Dinamarco[17], podendo subsistir de maneira independente, o que justifica a possibilidade de recurso de apelação apenas quanto a uma destas unidades. Diante desta possibilidade, como visto, existe corrente doutrinária entendendo que a parte não recorrida está sob manto da coisa julgada e outra entendendo que a coisa julgada fica diferida à apreciação do recurso[18].

                               A parte a posição destes eminentes juristas, mais razoável, evitando-se inclusive a esdrúxula hipótese de duas sentenças no mesmo processo, admitir que, no caso de questão de ordem pública, o efeito translativo dos recursos pode influir no capítulo que não foi objeto de recurso, sem que haja reformatio in pejus ou mesmo violação do princípio da congruência.

                               Eduardo de Albuquerque Parente compila, com maestria, os fundamentos para aplicação do efeito translativo afirmando:

“...adota-se no presente ensaio a posição de que os capítulos da sentença não impugnados se sujeitos à confirmação pelo tribunal de que estejam presentes os pressupostos processuais e as condições da ação. Isto porque, em resumo (a) tais matérias são de ordem pública no sentido da administração do exercício da jurisdição, diferenciando-se das de direito material; (b) a norma é dirigida ao juiz; (c) tais matérias apresentam-se no plano vertical de cognição pelo tribunal, não se sujeitando à disposição pelas partes; (d) não há violação à vedação à reformatio in pejus, pois esta se atrela ao aspecto da extensão do apelo; e (e) prescinde de haver ou não dependência entre pedidos[19].

                               De se notar que tal entendimento, não parece estar encontrando ressonância na jurisprudência, tendo o Supremo Tribunal Federal assim decidido:

EMENTAS: 1. INTERVENÇÃO DE TERCEIRO. Ação cautelar. Processo eleitoral. Pleito anulado. Candidato que participou da eleição anulada, em que foi derrotada a chapa que encabeçara. Intervenção indeferida. Falta de interesse jurídico. A título de assistente, ou de recorrente interessado, não se admite intervenção de terceiro que apresente mero interesse de fato, capaz de ser atingido pela decisão da causa. 2. RECURSO. Especial. Eleitoral. Ação de investigação judicial eleitoral. Captação ilegal de sufrágio. Sentença que cassou o prefeito e absolveu o vice-prefeito, cuja diplomação determinou. Recurso apenas do prefeito. Improvimento pelo TRE, com cassação simultânea e oficial do diploma do vice-prefeito. Alegação de matéria de ordem pública. Acórdão confirmado pelo TSE, sob fundamento de operância do efeito translativo do recurso ordinário. Inadmissibilidade. Trânsito em julgado do capítulo decisório que absolveu o vice-prefeito. Matéria não devolvida pelo recurso do prefeito. Restabelecimento da sentença até o julgamento do recurso extraordinário já admitido. Liminar concedida. Ação cautelar julgada procedente. Ofensa à coisa julgada. Interpretação do art. 5º, XXXVI, da CF, e dos arts. 2º, 262, 467, 509 e 515, todos do CPC. Sob pena de ofensa à garantia constitucional da coisa julgada, não pode tribunal eleitoral, sob invocação do chamado efeito translativo do recurso, no âmbito de cognição do que foi interposto apenas pelo prefeito, cujo diploma foi cassado, por captação ilegal de sufrágio, cassar de ofício o diploma do vice-prefeito absolvido por capítulo decisório da sentença que, não impugnado por ninguém, transitou em julgado.
(AC 112, Relator(a):  Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 01/12/2004, DJ 04-02-2005 PP-00007 EMENT VOL-02178-01 PP-00001 RF v. 101, n. 379, 2005, p. 242-249 RTJ VOL-00193-02 PP-00431)

O Supremo Tribunal Federal adotou então a corrente que entende que há coisa julgada no capítulo da sentença não impugnado, na trilha do escólio de Barbosa Moreira e José Roberto dos Santos Bedaque, entre outros.

                              

4.  DA CONCLUSÃO

                               Este breve artigo, sem pretensão de esgotar o tema, buscou demonstrar as inúmeras discussões que existem sobre a admissibilidade do efeito translativo e a possibilidade das questões de ordem pública serem apreciadas de ofício em grau recursal.

                               Como visto, são questões complexas já foram objeto de vários julgamentos, que demonstram a admissibilidade do efeito translativo nas instâncias ordinárias, bem como a alteração da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, no que tange a exigência de prequestionamento para análise das questões de ordem pública, o que afasta, por consequência, a admissibilidade do efeito translativo no recurso especial.

                               De igual maneira, demonstrou-se que o Supremo Tribunal Federal também rechaça a aplicabilidade do efeito translativo no recurso extraordinário, exigindo prequestionamento da matéria.

                               Entretanto, pela aplicação dos princípios da razoável duração do processo e da celeridade, além da economia processual, entende-se que o efeito translativo dos recursos deveria ser aceito em todas as instâncias recursais, sejam elas ordinárias ou extraordinárias, evitando-se desta forma o trânsito em julgado de sentença nula, rescindível, e evitando-se novo processo agora com esta discussão.

BIBLIOGRAFIA

BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Os elementos objetivos da demanda à luz do contraditório. Causa de pedir e pedido no processo civil (questões polêmicas). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Capítulos da sentença. 1ª ed. 2ª tiragem. São Paulo: Malheiros Editores, 2004.

DIDIER Jr, Fredie. Pressupostos processuais e condições da ação: o juízo de admissibilidade do processo. São Paulo: Saraiva, 2005.

MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao código de processo civil, Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973, vol. V: arts. 476 a 565. 11 ed. rev. e atul. Rio de Janeiro: Forense, 2003.

NERY JUNIOR, Nelson. Princípios fundamentais – teoria geral dos recursos. 4ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998.

PARENTE, Eduardo de Albuquerque. Os recursos e as matérias de ordem públicas. Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e de outros meios de impugnação às decisões judiciais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 111-144 – (Série aspectos polêmicos e atuais dos recursos; v. 7).

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. 5ª. ed. rev., atul. e ampl.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004.

________________________Os agravos no CPC brasileiro. 4ª ed. rev., atual. e ampl. De acordo com a Lei 11.187/2005. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.

_____________________________ Omissão judicial e embargos de declaração. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.

ZOLLINGER, Marcia. Proteção processual dos direitos fundamentais. Bahia: Editora JusPodium, 2006.


[1] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Omissão judicial e embargos de declaração. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 184.

[2] WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil.3ª Ed. rev.atual. São Paulo: Perfil, 2005, p. 127.

[3] In, op. cit, p. 186-187.

[4] BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Os elementos objetivos da demanda à luz do contraditório. Causa de pedir e pedido no processo civil (questões polêmicas). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 44.

[5] NERY JUNIOR, Nelson. Princípios fundamentais – teoria geral dos recursos. 4ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 411.

[6] In, op. cit.,p. 411-412.

[7] Art. 5º (...) LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

[8] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. 5ª. ed. rev., atul. e ampl.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 233.

[9] DIDIER Jr, Fredie. Pressupostos processuais e condições da ação: o juízo de admissibilidade do processo. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 87.

[10]  In, op. cit., p. 39.

[11] EDcl no AgRg no AgRg nos EDcl nos EDcl no REsp 1258627/PE, Rel. Ministra MARILZA MAYNARD (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/SE), SEXTA TURMA, julgado em 19/08/2014, DJe 02/09/2014.

[12] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 4ª ed. rev., atual. e ampl. De acordo com a Lei 11.187/2005. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005 p. 340.

[13] ZOLLINGER, Marcia. Proteção processual dos direitos fundamentais. Bahia: Editora JusPodium, 2006, p.159.

[14] Cf. AgRg no AREsp 38.097/MS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 02/02/2012, DJe 13/02/2012.

[15] MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao código de processo civil, Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973, vol. V: arts. 476 a 565. 11 ed. rev. e atul. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 354

[16] Cf. obra citada.

[17] DINAMARCO, Cândido Rangel. Capítulos da sentença. 1ª ed. 2ª tiragem. São Paulo: Malheiros Editores, 2004, p. 35.

[18] Cf. PARENTE, Eduardo de Albuquerque. Os recursos e as matérias de ordem públicas. Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e de outros meios de impugnação às decisões judiciais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 111-144 – (Série aspectos polêmicos e atuais dos recursos; v. 7).

[19] In. op. cit., p. 133.

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Sobre a autora
Carolina Lemos de Faria

Graduada em Direito pela Universidade Federal de Goiás. Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Universidade Federal de Goiás. Procuradora Federal.

Informações sobre o texto

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