Os direitos fundamentais no ordenamento jurídico brasileiro

18/12/2014 às 10:25
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O presente estudo tem por objetivo fazer uma reflexão a respeito dos direitos fundamentais, principalmente, após a Constituição de 1988.

1 INTRODUÇÃO

Os Direitos Fundamentais são os direitos essenciais a todos os cidadãos, sendo direitos inerentes à pessoa humana. Por isso, a sua evolução e a positivação no ordenamento jurídico brasileiro são de inegável importância.

Esses direitos não foram conquistados e reconhecidos de uma só vez, havendo uma luta pela sua efetivação. Assim, os Direitos Fundamentais do Homem passaram do individual, ao coletivo e deste à categoria de direitos de solidariedade.

Entre todos os direitos positivados em um determinado ordenamento, os direitos fundamentais são os mais importantes e devem prevalecer frente aos demais, visto que todos os indivíduos merecem ter a sua dignidade respeitada e reconhecida, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal.

O ponto central do presente estudo consiste em saber fazer uma análise acerca dos direitos fundamentais no ordenamento jurídico brasileiro, a partir de um exame acerca do seu conceito, dimensões ou gerações - como alguns autores preferem denominar-, e as teorias que os fundamentam.

2 DIREITOS FUNDAMENTAIS

2.1 Noções Gerais

Os direitos fundamentais surgiram da necessidade de limitação e controle dos abusos de poder do próprio Estado e da consagração dos princípios básicos da igualdade e da legalidade. Tratam-se, assim, de um direito de proteção que visa salvaguardar os direitos dos seres humanos e não os direitos dos Estados.  

Não constitui tarefa simples a sua definição, bem como precisá-lo, posto que qualquer tentativa significa resultado insatisfatório.  Contudo, o importante é realçar que, na sua concepção tradicional, liberal-clássica, os direitos fundamentais relacionam-se diretamente com a garantia de não ingerência do Estado na esfera individual e com a consagração da dignidade humana.      

Isso ocorre devido terem por finalidade básica o respeito à dignidade do ser humano, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal, estabelecendo, com isso, as condições mínimas de vida e desenvolvimento humano.

Perez Luño (apud MORAES, G., 1997, p.23) apresenta-nos uma definição completa sobre os direitos fundamentais do homem, considerando-os:

um conjunto de faculdades e instituições que, em cada momento histórico, concretizam as exigências da dignidade, da liberdade, da solidariedade e da igualdade humana, as quais devem ser reconhecidas positivamente pelos ordenamentos jurídicos a nível nacional e internacional.

Contudo, há que se ressaltar que, apesar de constituírem direitos inerentes à própria pessoa humana, não se pode desconhecer a subordinação do indivíduo ao Estado como garantia de que eles operam dentro dos limites impostos pelo direito, posto que foram criados para reduzir a ação do Estado, não para servirem de salvaguarda de práticas ilícitas.

Moraes, A. (1998, p. 46) afirma que:

Os direitos humanos fundamentais não podem ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, nem tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito.

Os direitos e garantias fundamentais consagrados pela Constituição Federal, portanto, não são ilimitados, uma vez que encontram seus limites nos demais direitos igualmente consagrados pela Carta Magna (Princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas).

Por serem direitos inerentes à pessoa humana e por estarem em posição privilegiada em relação aos demais direitos, a doutrina apresenta como principais características dos direitos humanos a imprescritibilidade, inalienabilidade, irrenunciabilidade, inviolabilidade, universalidade, efetividade, interdependência e complementariedade.

Destarte, os referidos direitos não se perdem pelo decurso do prazo, pois a natureza humana é imutável e, por isso, são imprescritíveis. Não há possibilidade de sua transferência, vez que ninguém pode abrir mão de sua própria natureza, e não podem ser renunciados; há a impossibilidade de desrespeito por determinações infraconstitucionais, sob pena de responsabilidade.

Além disso, são tidos como universais por abranger todos os indivíduos indistintamente, devendo o Poder Público atuar no sentido de garantir a sua efetivação, não sendo suficiente com o simples reconhecimento abstrato. Por fim, os direitos humanos não podem ser interpretados isoladamente, mas de forma conjunta com a finalidade de alcance dos objetivos previstos pelo legislador constituinte.

2.2 Gerações dos Direitos Fundamentais

Modernamente, a doutrina apresenta-nos a classificação dos direitos fundamentais em primeira, segunda e terceira gerações, baseando-se na ordem histórica e cronológica em que passaram a ser constitucionalmente reconhecidos.

Todavia, mister ressaltar que alguns estudiosos são contrários ao uso do termo gerações, preferindo-se a expressão dimensões. Isso ocorre devido entenderem que o primeiro seria um desserviço à evolução da matéria, projetando uma visão fragmentada ou atomizada no tempo dos direitos humanos. Para esta corrente, todos os direitos são interdependentes, indivisíveis, devendo ser vistos em sua totalidade (ARAGÃO, 2000, p. 25).

Tal classificação ocorreu em face da evolução dos direitos fundamentais, a qual se traduz em um processo sucessivo e cumulativo, identificado pelo advento de direitos fundamentais cujo conteúdo e a ordem histórica obedecem aos postulados da Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade.

Como destaca Mello (apud MORAES, A., 1998, p.45):

Enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) – que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais – realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) – que se identificam com as liberdades reais, positivas ou concretas – acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de um essencial inexauribilidade.

Destarte, os direitos de primeira geração, também chamados de direitos negativos, têm o intuito de proteger a liberdade do indivíduo, correspondendo aos direitos individuais, políticos e à nacionalidade. São, pois, aqueles das liberdades públicas.

Essa geração dominou todo o século XIX, tendo se desenvolvido após a Revolução Francesa, onde havia o Estado Liberal, no qual predominava o não intervencionismo. Por isso, são caracterizados pelo dever de abstenção do Estado, ou seja, um dever de não atuar. Portanto, segundo a classificação quanto à prestação estatal são direitos fundamentais negativos, donde há uma situação passiva dos destinatários das normas, estando, por isso, subordinados ao Estado, o qual é soberano.

Por outro lado, a segunda geração esteve presente nas primeiras Constituições do século XX, principalmente na Constituição do México (1917) e de Weimar (1919). Esses direitos nasceram no segundo pós-guerra como direitos econômicos, sociais e culturais, representando, assim, a igualdade em grupo.

São direitos fundamentais satisfeitos por uma prestação ou fornecimento de um bem por parte do corpo estatal (MORAES, G., 1997, p. 71), sendo característicos do Estado Social e representando um status libertatis onde há uma diminuição da autoridade do Estado, com conseqüente autonomia ou liberdade dos cidadãos.

Os direitos de terceira geração, também chamados de difusos, nascem da própria sociedade e correspondem aos direitos de fraternidade ou solidariedade. Eles representam um status civitatis onde o Estado deve agir, não podendo ficar omisso, pois é feito para prestar tarefas que satisfaçam as necessidades humanas.

A respeito desses direitos Bonavides (1997, p. 523) afirma que:

(...) os direitos de terceira geração tendem a cristalizar-se neste fim de século enquanto direitos que não se destinam especificadamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta. (...) Emergiram eles da reflexão sobre temas referentes ao desenvolvimento, à paz, ao meio-ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade.

Por fim, há uma corrente que defende a existência de direitos de quarta geração, não sendo, porém, seguida por todos os doutrinadores. Tais direitos seriam resultantes do processo de globalização dos direitos fundamentais, correspondendo à fase de institucionalização do Estado Social.

Enquadram-se na quarta geração o direito à democracia, à informação e o direito ao pluralismo, e representam um status ativo, visto que o cidadão pode participar da formação da vontade política do Estado.

A Constituição de 1988 alarga o elenco dos direitos e garantias ao incluir como direitos fundamentais não apenas os direitos civis e políticos, mas também os direitos sociais.

O texto constitucional prevê expressamente a existência dessas gerações, consolidando em um único ordenamento grande parte dos direitos fundamentais, visto que o art. 5°, § 2°, da Carta Magna determina que não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. Os direitos de segunda geração são os elencados no art. 5° - direitos e deveres individuais e coletivos; os de terceira geração – direitos sociais – encontram-se nos arts. 6° a 11 e os de quarta geração nos arts. 12 a 17.

2.3 Teorias dos Direitos Fundamentais

Diversas teorias surgem com o objetivo de justificar e esclarecer o fundamento dos direitos humanos. Por meio delas, permite-se a fundamentação dos direitos inerentes à pessoa humana, determinando o sentido, o significado e o alcance dos direitos fundamentais.

Porém, destaca Canotillo (apud MORAES, G., 1997, p. 83) que:

A abordagem dos direitos fundamentais não deve, porém, ser aprisionada por teorias ou sistemas fechados, impondo-se antes uma dogmática aberta em que o pensamento zetético (= pensamento problematizante) sobreleve as exigências da dogmática pura.

As principais teorias que a doutrina identifica são a liberal, a institucionalista e a jusnaturalista, possuindo, cada uma, características que lhes são peculiares.

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A teoria jusnaturalista defende que os direitos humanos não são criações dos legisladores, tribunais ou juristas, mas decorrentes de uma ordem superior. Assim, são anteriores e superiores à vontade estatal.

A teoria liberal foi desenvolvida a partir dos valores legitimadores do Estado liberal, possuindo a idéia de participação da cidadania na formação da vontade soberana e exprimindo o pensamento de limitação da autoridade das estruturas autocráticas do poder. Ela colocou como centro de gravidade dos direitos fundamentais o seu titular e possui como característica a idéia de que a liberdade do indivíduo é ilimitada, mas a ação do Estado é repleta de limitações. Dessa forma, ela faz do indivíduo o valor primário e referencial da sociedade.

A teoria liberal tem em vista tornar mais eficaz e segura a proteção da liberdade do ser humano perante o Estado, erigindo como princípio superior dos direitos fundamentais a constitucionalidade, ao tratar a garantia da liberdade como nível constitucional. Todavia, essa teoria é criticada, pois entende que a utilização e efetivação dos direitos fundamentais dependeriam, exclusivamente, da vontade de seus destinatários, o que realmente não acontece, pois necessitam da intervenção do Poder Público.

A teoria institucional, por sua vez, nega uma dimensão subjetiva e insere os direitos fundamentais em uma instituição, colocando-os ao lado de outros bens dotados de valor constitucional, com os quais mantêm relação de condicionalidade. É nesta teoria que o conceito de direito fundamental destaca-se, menos pela subjetividade individual do que pela objetividade material e social, pois alarga a normatividade destinada à proteção desses direitos, revalorizando de certo modo o papel da lei. Isso ocorre ao transformar a lei em um instrumento positivo que não só possibilita como promove a liberdade, sendo essa uma liberdade-fim, isto é, liberdade dirigida para determinado objetivo.

2.4 Internacionalização dos Direitos Humanos

Nos tempos atuais, há uma forte tendência para a internacionalização dos direitos humanos, como forma de assegurar a proteção do ser humano nos planos nacional e internacional, em toda e qualquer circunstância. Como conseqüência disso, há o crescimento do interesse pela aplicação dos instrumentos internacionais de proteção desses direitos em nosso direito interno.

Um dos motivos desse crescimento reside no fato de a legislação internacional já se encontrar bastante avançada, necessitando, todavia, dar efetividade no plano interno, vez que ambos têm como propósito a proteção da pessoa humana. Além disso, as transformações internas dos Estados repercutem no plano internacional, e a nova realidade neste provoca mudanças na evolução interna e no ordenamento constitucional dos Estados.

A internacionalização dos direitos humanos pode ser verificada através do reconhecimento desses direitos pelas comunidades de Estados, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos; pela previsão de meios de proteção, especialmente a instituição de tribunais com jurisdição internacional ou o estabelecimento de procedimentos pertinentes e a imposição eficaz de sanções (ROTHENBURG, 2000, p.148).

Com isso, a comunidade internacional passa a reconhecer que a proteção dos direitos humanos constitui questão de legítimo interesse e preocupação internacional, o que implica na noção de que a negação desses mesmos direitos impõe a responsabilização internacional do Estado violador. Assim, há a delimitação na noção tradicional de soberania estatal, introduzindo formas de responsabilização do Estado no âmbito internacional, quando as instituições nacionais se mostram omissas ou falhas na tarefa de proteção dos direitos humanos internacionalmente assegurados.

A este respeito, observa Piovesan (2002, p. 63):

A partir do momento em que o Brasil se propõe a fundamentar suas relações com base na prevalência dos direitos humanos, está ao mesmo tempo reconhecendo a inexistência de limites e condicionamentos à noção de soberania estatal. Isto é, a soberania do Estado brasileiro fica submetida a regras jurídicas, tendo como parâmetro obrigatório a prevalência dos direitos humanos. Rompe-se com a concepção tradicional de soberania estatal absoluta, reforçando o processo de flexibilização e relativização, em prol da proteção dos direitos humanos.

Um assunto que é bastante discutido em relação à internacionalização é a hierarquia entre as normas de tratados e de direito interno, a fim de se saber quais devem ser aplicadas para proteger os direitos inerentes à pessoa humana. As soluções para a aplicação resultam de critérios valorativos e da discricionariedade dos constituintes nacionais, variando, de país a país.

No entanto, um Estado não pode deixar de cumprir suas obrigações convencionais sob a alegação de dificuldades de ordem constitucional ou interna, bem como deixar de se conformar a um tratado no qual é parte devido a seus tribunais interpretarem, no plano interno, o tratado de modo diferente do plano internacional.

A Constituição Federal de 1988 concede tratamento especial aos direitos e garantias internacionalmente consagrados ao estabelecer que os direitos fundamentais garantidos em tratados de proteção internacional em que o Brasil é parte passam a integrar direta e imediatamente o ordenamento jurídico interno, consoante o estabelecido no art. 5°, §2°.

Canotillo (apud PIOVESAN, 2002, p. 59 e 60) explica o sentido fundamental desta aplicabilidade direta afirmando que:

Os direitos, liberdades e garantias são regras e princípio jurídicos, imediatamente eficazes e actuais, por via direta da Constituição e não através da auctoritas interpositio do legislador. Não são simples norma normarum mas norma normata, isto é, não são meras normas para produção de outras normas, mas sim normas diretamente reguladoras de relações jurídico-materiais.

Insta destacar que o direito enunciado no tratado internacional poderá: reproduzir direito assegurado pela Constituição, reforçando o valor jurídico de direitos constitucionais; inovar o universo de direitos constitucionalmente previstos, ampliando seu elenco; ou contrariar preceito constitucional, o que faz com que prevaleça a norma mais favorável à proteção da vítima. Contudo, em todas as hipóteses os direitos internacionais vêm aprimorar e fortalecer o grau de proteção dos direitos consagrados internamente. (PIOVESAN, 2002, p. 120).

2.5 Proteção Jurisdicional

A Constituição Federal de 1988 destacou como princípio fundamental da ordem constitucional a dignidade da pessoa humana (art.1°, III), estabelecendo que está proibida qualquer discriminação, bem como enfatizando que todos são iguais e que fica assegurada a inviolabilidade dos direitos e garantias fundamentais.

Devido terem sido inseridos no texto constitucional, os direitos fundamentais ficaram em posição privilegiada, acima mesmo do Estado brasileiro, “pairando por sobre todos os outros direitos e garantias fundamentais, os quais só têm sentido após serem devidamente tutelados os mencionados direitos de que aqueles não podem prescindir” (PASSOS, 2005, p. 351).

A partir do momento que foram constitucionalizados, passaram de mera enunciação formal de princípios para plena positivação de direitos, a partir dos quais qualquer indivíduo poderá exigir sua tutela perante o Poder Judiciário para concretização da democracia.

O Poder Judiciário vem, dessa forma, para garantir e efetivar o pleno respeito aos direitos humanos fundamentais, sem que possa a lei excluir de sua apreciação qualquer lesão ou ameaça de direitos (art. 5°, XXXV, CF). Assim, ele possui a finalidade de preservar os referidos direitos e, mais precisamente, os princípios da legalidade e igualdade, sem os quais os demais tornam-se vagos.

Por isso, há quem defenda que só pode haver democracia com plena observância dos direitos humanos, vez que o respeito a tais direitos é basilar na construção de um verdadeiro Estado de direito democrático.

Nesse sentido, ressalva Piovesan (2002, p. 208):

Logo, é neste cenário, que o processo de democratização do Brasil se conjuga com o processo de afirmação dos direitos humanos como tema global, que se desenha a reinserção do Brasil no plano do sistema de proteção internacional dos direitos humanos.

Em decorrência da proteção jurisdicional e com a internacionalização dos direitos inerentes à pessoa humana, surgem dúvidas quanto à solução de conflitos de jurisdição internacional e nacional. Todavia, os tratados de direitos humanos atenderam à necessidade de prevenir ou evitar esses conflitos e de harmonizar a legislação nacional com as obrigações convencionais ao estabelecer deveres que implicam a interação entre suas normas e as de direito interno.

Uma das formas de compatibilização dos dispositivos convencionais e dos de direito interno é a consagração do prévio esgotamento de recursos de direito interno nos instrumentos de proteção internacional dos direitos humanos, ou seja, no dever do Estado de fornecer recursos internos eficazes e no dever correspondente do indivíduo reclamante de utilizá-los como condição de admissibilidade da petição internacional (TRINDADE, 1997, p. 35).

Destarte, para que a regra do esgotamento possa ser considerada adequada, os Estados encontram-se obrigados a organizar o seu ordenamento jurídico de modo que as supostas vítimas de violações dos direitos disponham de recursos eficazes perante as instâncias nacionais. Com isso, evita-se a obstrução de ações a tribunais para obter reparação de danos resultantes de violações dos direitos consagrados nos tratados, salvaguardado, por conseqüência, contra eventuais denegações da justiça.

Na hipótese de existência de conflito entre uma norma de direito internacional e nacional, não há mais pretensão de primazia de um ou outro. A primazia é a da norma mais favorável à vítima, ou seja, a norma mais benéfica ao titular do direito, seja ela de direito internacional ou nacional. Porém, caberá aos tribunais nacionais e a outros órgãos aplicadores do direito, no sentido de assegurar a melhor proteção possível do ser humano.

O direito internacional não pretende substituir o sistema nacional, pois constitui um direito paralelo e suplementar no sentido de que sejam superadas suas omissões e deficiências. O Estado tem a responsabilidade primária pela proteção, ao passo que a comunidade internacional tem responsabilidade subsidiária.

Na visão de Trindade (1997, p. 25):

(...) é certo que os tribunais internacionais de direitos humanos existentes – nas Cortes Européias e Interamericanas de Direitos Humanos – não “substituem” os tribunais internos, e tampouco operam como tribunais de recursos ou de cassação de decisões dos tribunais internos.

No entanto, isso não quer dizer que os atos internos dos Estados não se encontram isentos de supervisão internacional quando se trata de verificar sua conformidade com as obrigações internacionais. Caberá aos órgãos internacionais verificar a aplicação do direito interno como parte essencial ou integral da função de supervisão internacional, e elemento probatório para o exame do comportamento estatal interno de relevância internacional.

3 conclusão

Após o término deste trabalho, observamos a elaboração de um percurso pela teoria geral dos direitos fundamentais.

Em primeiro lugar fizemos uma breve exposição acerca da definição dos direitos fundamentais, observando-se que tratam-se de direito de proteção que visam salvaguardar os direitos dos seres humanos e não do Estado e tem por finalidade básica o respeito à dignidade do ser humano.

Em seguida relatamos a respeito de como se deu a evolução histórica dos direitos fundamentais, a qual se traduz em um processo sucessivo e cumulativo, identificado pelo advento de direitos fundamentais cujo conteúdo e a ordem histórica obedecem aos postulados da Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade. Em seguida, destacou que um dos principais atributos dos direitos fundamentais é a constitucionalização dos mesmos, no intuito de qualificar a garantia do cidadão.

Ademais, foi feita uma breve análise das teorias que justificam e esclarecem o fundamento dos direitos humanos, quais sejam, teoria liberal, institucionalista e jusnaturalista, apresentando as características que lhe são peculiares.  

Prosseguindo, elaborou-se uma explanação sobre a jurisdicionalização dos direitos fundamentais, verificando que o Poder Judiciário vem para garantir e efetivar o pleno respeito aos direitos humanos fundamentais, sem que possa a lei excluir de sua apreciação qualquer lesão ou ameaça de direitos (art. 5°, XXXV, CF).

REFERÊNCIAS

ARAGÃO, Selma Regina. Direitos humanos na ordem mundial. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2000.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 7 ed. São Paulo: Malheiros, 1997.

KRETZ, Andietta. Autonomia da vontade e eficácia horizontal dos direitos fundamentais. Florianópolis: Momento atual, 2005.

MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela dos direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São Paulo: Atlas, 2002.

MOARES, Guilherme Braga Pena de. Dos direitos fundamentais: contribuições para uma teoria: parte geral. São Paulo: LTr, 1997.

PASSOS, Jorge Luiz Ieski Calmon de. Direitos humanos na reforma do judiciário. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. (Coord.). Reforma do poder judiciário: primeiras reflexões sobre a Emenda Constitucional n° 42/2004. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. São Paulo: Marx Limonard, 2002.

ROTHENBURG, Walter Claudius. Direitos Fundamentais e suas características. 5 ed. rev. ampl. atual. Revista de Direitos Constitucional eIinternacional. São Paulo, ano 8, n. 30, p. 146-158, jan./março 2000.

SARMENTO, Daniel. A Vinculação dos Particulares aos Direitos Fundamentais no Direito Comparado e no Brasil. In: A nova interpretação constitucional – ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.

TRINDADE, Antonio Augusto Cançado. Instrumentos de proteção dos direitos humanos. In: Procuradoria Geral do Estado. Grupo de trabalho de direitos humanos. São Paulo: Centro de Estudo da Procuradoria Geral do Estado, 1997.

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Sobre o autor
Fabiana Neiva Nunes Azevedo

Advogada da União lotada na Procuradoria Regional da União - PRU 1ª Região, em Brasília. Foi, também, Analista do Superior Tribunal de Justiça e Procuradora da Fazenda Nacional. Pós-graduada em Direito Público e em Direito Privado pela Universidade Federal do Piauí. Graduada em Direito pelo Instituto de Ciências Jurídicas e Sociais Prof. Camillo Filho.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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