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Notas sobre a solidariedade passiva no novo Código Civil

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3. DAS RELAÇÕES EXTERNAS DOS DEVEDORES SOLIDÁRIOS.

A função principal da solidariedade passiva é outorgar ao credor uma maior segurança quanto ao cumprimento da obrigação, na medida em que poderá dirigir sua pretensão e, eventualmente, sua ação, contra mais de um sujeito, indistintamente, não se vendo prejudicado pela insolvência parcial ou total de qualquer dos co-obrigados.

Os riscos da insolvência são transferidos para os devedores, que continuarão obrigados pelo todo da dívida, apesar de insolvente um ou alguns deles (NCCB 283).

Entre o credor e cada um dos devedores existe uma relação jurídica; a totalidade destas conexões para o credor se pode denominar a relação externa do devedor solidário [55].

Para Carbonnier, sob o ponto de vista clássico, a essência da solidariedade, no que pertine à obrigação à dívida, decorreria de duas idéias: o objeto da obrigação é único, mas os liames obrigatórios são múltiplos [56].

Em face dos co-devedores solidários, poderá o credor exigir de qualquer deles o cumprimento da obrigação, sem que possa, o escolhido, alegar o benefício da divisão, ou fazer valer o seu direito em relação a todos [57].

Esta possibilidade resulta da distinção dos vínculos estabelecidos entre cada um dos devedores solidários e o credor, permitindo a este último perseguir o cumprimento da prestação indistintamente em face de qualquer daqueles.

Assim, diz o Novo Código Civil que "não importará renúncia da solidariedade a propositura de ação pelo credor contra um ou alguns dos devedores" (art. 275, parágrafo único).

A legislação francesa, ao disciplinar o exercício da pretensão pelo credor estabelece que "les poursuites faites contre l’un des débiteurs n’empêchent pas le créancier d’en exercer de pareilles contre les autres" (Código Civil Francês, art. 1.204).

A menção expressa à faculdade outorgada ao credor, feita pelo Code Civil decorreria, segundo Carbonnier, do fato de que no direito romano, pelo efeito extintivo da litis contestatio, em agindo contra um dos devedores ficava o credor obstado de agir contra os demais [58].

Na Itália não há qualquer disposição semelhante em seu Código Civil. Assinala Michele Giorgianni que o CC de 1942, atualmente em vigor, diferentemente do Código de 1865, deixou de repetir aquele preceito porque o mesmo "discende ormai dalla essenza della obbligazione solidale moderna" [59].

O Código Civil Português, diferentemente dos diplomas legais citados, impõe limites expressos ao exercício do direito de ação pelo credor contra os co-obrigados solidários. Se aquele exigir judicialmente a um dos co-devedores a totalidade ou parte da prestação, fica inibido de proceder judicialmente contra os demais, pelo que ao primeiro tenha exigido, exceto se houver razão atendível, como a insolvência, ou risco de insolvência do demandado, ou dificuldade, por outra causa, em obter dele a prestação (Código Civil Português, art. 519, 1).

"Se o credor tiver demandado apenas um dos devedores e tiver obtido contra ele sentença de condenação, terá em princípio de seguir com a respectiva execução, antes de poder dirigir-se aos outros condevedores", observa Antunes Varela [60]. Evita-se com o dispositivo, esclarece o autor, que o credor, tendo incomodado um dos devedores com a propositura de uma ação (condenatória ou executiva), vá depois, sem qualquer razão admissível, proceder contra os outros [61].

A existência de tantas relações jurídicas quantos sejam os devedores solidários evidencia-se no tocante às exceções (em sentido amplo) de que cada um dos sujeitos passivos pode utilizar face o credor.

Quando admoestado, poderá o devedor solidário opor ao credor exceções comuns – as quais têm seu fundamento na origem ou conteúdo comum da obrigação solidária –, bem como as que lhe sejam pessoais – fundadas em sua relação pessoal com o credor [62].

Reza o Novo Código Civil Brasileiro que as exceções pessoais a cada co-devedor não aproveitará aos demais, os quais não poderão opô-las ao credor, quando demandados pelo pagamento da dívida (NCCB, art. 281).

Em face da regra acima enunciada, a incapacidade de um dos co-devedores, o erro, o dolo ou a coação de que ele tenha sido vítima não poderá ser alegada pelos demais como meio de defesa oposto à pretensão do credor, por se constituir em exceção de natureza pessoal.

3.1. DAS RELAÇÕES INTERNAS DOS DEVEDORES SOLIDÁRIOS.

Na linguagem usual, solidarizar-se significa fazer-se responsável por um dever que no todo ou em parte é de outro, e assumir a conseqüência do referido dever. Na solidariedade passiva cada devedor assume a responsabilidade de seu próprio dever e a responsabilidade do dever dos co-devedores [63].

No campo das relações internas entre os co-devedores solidários sobressai o efeito extintivo recíproco no adimplemento da prestação.

O adimplemento – em sentido amplo – realizado por qualquer um dos devedores solidários ao credor a todos os demais aproveita, total ou parcialmente.

O NCCB presume iguais, no débito, à falta de outra estipulação diferente, as partes de todos os co-devedores solidários. De modo que, aquele que adimplir a obrigação por inteiro fica autorizado a exigir de cada um dos demais a sua quota (art. 283, parte final).

Circunstâncias existem nas quais essa igualdade nas quotas partes não ocorre. Pode suceder, inclusive, caso em que a dívida solidária interesse exclusivamente a um dos co-devedores. Nesta hipótese, este responderá integralmente para com aquele que adimplir a obrigação (NCCB, art. 285).

Nos contratos que impliquem a concessão de crédito a um determinado sujeito passivo é muito comum a cláusula através da qual um terceiro obriga-se solidariamente pela restituição à instituição financeira da importância creditada, embora dela não tenha feito qualquer uso, pessoal ou profissional.

O devedor solidário que deixa de fazer objeção comum ou de opor exceção comum poderá vir a ser responsabilizado pelos demais co-devedores, salvo se ignorava a existência de uma ou outra [64].

Pontes de Miranda discorre sobre o suposto dever, atribuído a um dos co-devedores solidários, de avisar aos demais sobre o pagamento que efetuara ao credor, para evitar-se um provável bis in idem, ou de questioná-los acerca de possível adimplemento da parte destes últimos, quando deseje adimplir. A primeira situação, segundo o tratadista, supõe que todos os co-devedores se conheçam, o que, às vezes, inocorre. Já a outra implicaria num injustificável atraso no adimplemento das obrigações de cumprimento urgente [65].

"Dever de aviso existe se, segundo o tráfico, seria de esperar-se que o devedor solvente avisasse", explica o jurista, para, logo em seguida, concluir que quanto ao dever de informar-se, "não há como extraí-lo do sistema jurídico".

Antunes Varela, em sentido contrário, sustenta que o devedor que realizar a prestação, por força dos princípios decorrentes da boa-fé objetiva, tem o dever de avisar os demais, sob pena de responder pelos danos que vier a causar em face de sua omissão [66].

O co-devedor solidário que, por desconhecer o cumprimento da prestação efetuado por outro devedor, deixe de deduzir tal exceção comum frente ao credor, quando demandado, cumprindo a obrigação por inteiro, não pode ser responsabilizado pelos demais [67].

Se demandado pelo total ou parte da dívida comum, quando condenatória a ação movida pelo sujeito ativo da obrigação, poderá o co-devedor acionado chamar ao processo os demais, na forma do disposto no Código de Processo Civil, art. 77, inciso III.

Para que o juiz possa declarar na mesma sentença proferida em face do credor qual o limite e a extensão das responsabilidades de cada co-obrigado, o devedor demandado inicialmente deverá requerer, no prazo para contestar a ação, a citação do demais devedores solidários, chamados ao processo (CPC 78), o qual ficará inicialmente suspenso (art. 79).

A sentença nele prolatada, em julgando procedente a ação, condenando os devedores, valerá como título executivo judicial em favor daquele que satisfizer a dívida, a fim de que o mesmo possa exigir, por inteiro, do devedor principal, ou de cada co-devedor a sua cota, na proporção que lhes tocar (CPC 80).

Originário do chamamento à demanda, previsto no CPC Português [68], o chamamento ao processo se constitui numa faculdade assegurada exclusivamente aos réus, para que estes "chamem à causa como seus litisconsortes passivos, na demanda comum, ou outro, ou os outros coobrigados, perante o mesmo devedor" [69].

Frente ao co-devedor que tiver cumprido a prestação por inteiro os demais respondem não como devedores solidários, mas cada um pela parte que lhe seja correspondente [70].

3.2. LIMITAÇÃO AO IUS VARIANDI DO CREDOR EM RELAÇÃO AOS DEVEDORES SOLIDÁRIOS.

O princípio da boa-fé objetiva encontra assento nos arts. 113 e 422 do Novo Código Civil. De acordo com o primeiro, "os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos e costumes do lugar de sua celebração"; em conformidade com o segundo, os contratantes "são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé".

Ao comentar o art. 1.443 do Código Civil de 1916, Clóvis Beviláqua, no longínquo ano de 1926, já sustentava que "todos os contractos devem ser de boa fé" [71].

Durante muito tempo, contudo, careceu nossa legislação material civil de disposições como as encontradas nos códigos civis francês, italiano, alemão, que exigiam, de há muito, dos partícipes das relações obrigacionais, condutas pautadas pela cláusula geral de boa-fé.

A inovação introduzida pelo art. 422 do Novo Código Civil permitirá a expressa e indiscutível inclusão do instituto em nosso sistema jurídico.

Para Judith Martins-Costa [72] a boa-fé objetiva desempenha no campo obrigacional três funções distintas: a) cânone hermenêutico-integrativo do contrato; b) norma de criação de deveres jurídicos; c) norma de limitação ao exercício de direitos subjetivos.

A inovação legislativa, por um lado, e o influxo sofrido na doutrina contratual pelo pensamento dos escritores alemães, em especial, de outro, exigiu a adoção da boa-fé objetiva como parâmetro objetivo, genérico, nas relações obrigatórias.

Cláudia Lima Marques ensina que a boa-fé objetiva, enquanto standard, implica [73]:

"... uma atuação ‘refletida’, uma atuação refletindo, pensando no outro, no parceiro contratual, respeitando-o, respeitando seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis, seus direitos, agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem excessiva, cooperando para atingir o bom fim das obrigações: o cumprimento do objetivo contratual e a realização dos interesses das partes."

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A limitação ao ius variandi atribuído ao credor, nas relações solidárias passivas, a partir da boa-fé objetiva, não tem sido objeto da atenção de muitos doutrinadores.

Pontes de Miranda não conseguia divisar qualquer dever de cooperação entre os partícipes de uma relação obrigacional. "Em que é que o autor do ato ilícito, do ato-fato ilícito ou do fato ilícito coopera ?" [74], pergunta-se aquele prestigiado autor, numa clara crítica a Emilio Betti e sua conhecida visão do fenômeno obrigacional.

Couto e Silva, diversamente, observa que "a concepção atual de relação jurídica, em virtude da incidência da boa-fé, é de uma ordem de cooperação, em que se aluem as posições tradicionais do devedor e credor" [75].

Não se trata de enfraquecer a posição do credor, o qual continuará a ser o titular da obrigação, podendo exigi-la coativamente do devedor, mas de: a) atribuírem-lhe determinados deveres de conduta em face do sujeito passivo, os quais deverão estar presentes antes, durante e após o cumprimento das prestações reciprocamente acordadas; e b) limitar-lhe o exercício de determinados direitos subjetivos, sempre que estes direitos, quando exercitados, revelem-se, afinal, abusivos.

Tal como ocorre com o dever de prestar, imposto ao sujeito passivo da obrigação, o dever de boa-fé se aplica a todos os credores, independentemente da fonte do seu direito de crédito [76].

Cooperar para que a obrigação chegue a seu termo, sem criar obstáculos ou dificuldades ao seu adimplemento pelo devedor se constitui, ademais, num dos deveres impostos ao credor pela cláusula geral de boa-fé, presente em todo e qualquer negócio jurídico (NCCB, art. 113), inclusive nos contratos (art. 422).

Na doutrina espanhola, Diez-Picazo incursiona no tema da boa-fé, ao discorrer sobre o ius variandi atribuído ao credor, não sem antes lhe precisar os contornos:

"Para el ejercicio del ius variandi, no es necesaria ninguna forma especial, ni es exigible haber hecho excusión en los bienes anteriores demandados, ni el carácter infructuoso de la persecución contra éstos. El acreedor, después de haberse dirigido contra un primer deudor, puede volverse contra otros u otros, siempre que no haya obtenido todavía un pago íntegro. El jus variandi no queda impedido por el hecho de que se haya interpuesto una demanda judicial, sin perjuicio de los problemas procesales que de ello puedan derivar" [77].

Esta faculdade de o credor escolher indistintamente o devedor solidário sobre quem pudesse valer a sua pretensão, de acordo com Diez-Picazo, despertou a atenção de pelo menos dois autores hispânicos, Puig-Ferriol e Caffarena, para quem o princípio da boa-fé – expressamente regulado pelo art. 7.º, do Código Civil Espanhol – e a interdição do abuso do direito poderiam supor um sério limite ao ius variandi.

Diez-Picazo, contudo, dissente daqueles doutrinadores, e considera que apenas se poderia considerar vulnerados os princípios da boa-fé e da proibição do abuso do direito na penhora excessiva de bens, seja preventivamente – através do equivalente espanhol da nossa ação cautelar de arresto –, seja como medida preventiva da ação de execução, requeridos pelo credor, neste caso, como ato de emulação, sem a finalidade precípua de cobrar seu crédito [78].

A amplitude com que se trata, atualmente, a boa-fé objetiva contratual, os contornos que a doutrina empresta ao instituto – com expressa previsão normativa (NCCB, arts. 113 e 422) – não permite pré-excluir uma eventual infração ao princípio pelo credor, ainda que no exercício da faculdade prevista no art. 275, parágrafo único, do Novo Código Civil.

De outro lado, o titular de um determinado direito que exceder manifestamente, no seu exercício, os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes, estará cometendo um ato ilícito, de acordo com o art. 187, do NCCB.

Não se afiguraria difícil a ocorrência de caso em que o credor, no pleno exercício do ius variandi em relação aos devedores solidários, viesse a infringir a boa-fé objetiva contratual.

Pense-se, por exemplo, num caso em que o credor tenha proposto demanda contra apenas um dos devedores solidários, embora pudesse fazê-lo, desde logo, contra todos os demais co-devedores.

Já se observou que o Código Civil Português estabelece restrições expressas ao exercício do ius variandi por parte do credor. Embora possa este último cobrar de todos ou cada um a dívida toda – um dos traços distintivos da solidariedade –, se optar por ajuizar demanda contra apenas um dos sujeitos passivos pela integralidade do crédito, não poderá voltar-se contra os demais senão no caso em que sua pretensão não possa ser atendida.

O Código Civil de 1916, em seu art. 910, prescreve, in verbis, que: "o credor, propondo ação contra um dos devedores solidários, não fica inibido de acionar os outros".

O dispositivo que se aponta como sucedâneo do art. 910 do CC/1916 – o parágrafo único do art. 275 do Novo Código Civil – cuida, apenas, em prescrever que "não importará renúncia da solidariedade a propositura de ação pelo credor contra um ou alguns dos devedores".

Não nos parece que ambos os dispositivos possam ensejar interpretações absolutamente idênticas.

A norma do art. 910 do CC/1916 trata especificamente do exercício da tutela jurisdicional pelo credor, estabelecendo a impossibilidade de sua limitação quanto aos demais devedores, excluídos, num primeiro momento, de demanda anterior proposta pelo sujeito ativo.

O art. 275, parágrafo único, do NCCB estatui, apenas, que não implicará renúncia à solidariedade a propositura de ação pelo credor contra um ou alguns dos devedores. Reforça, portanto, neste aspecto, a norma do caput, segundo a qual "o credor tem direito a exigir e receber de um ou de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum; se o pagamento tiver sido parcial, todos os demais devedores continuam obrigados solidariamente pelo resto". Se o credor propuser ação condenatória ou executiva contra qualquer um dos obrigados, não estará renunciando à solidariedade em face dos demais, que continuarão obrigados pela totalidade da dívida até sua completa satisfação.

Na nova edição de seu prestigiado manual, o Professor Silvio Rodrigues sustenta, inicialmente, que na obrigação solidária "pode o credor que sem êxito exigiu de um devedor o pagamento voltar-se contra outro para cobrar integralmente a prestação, e assim por diante" [79].

Após transcrever a norma do art. 910 do CC/1916, Silvio Rodrigues reconhece que "o Código de 2002 não repetiu o preceito"; acredita, contudo, na continuidade de sua vigência "em virtude de ser elementar no conceito de solidariedade". "Todavia", conclui, "a idéia é repetida no parágrafo único do art. 275 do novo Código" [80].

Não acreditamos que a idéia do ius variandi ilimitado tenha se repetido no parágrafo único, do art. 275 do Novo Código Civil, cuja redação é extremamente diversa daquela do art. 910 do CC/1916, embora várias publicações que se propõem a cotejar os dois diplomas vejam naquele o sucedâneo legal deste último.

Conquanto ínsito à idéia da solidariedade, o ius variandi comporta temperamentos.

Se o sujeito ativo da relação obrigacional poderia, de início, acionar todos os devedores solidários, mas não o faz – sem qualquer motivo plausível –, dirigindo sua pretensão contra apenas um, ou alguns deles, cujo patrimônio se mostre suficiente para cobrir a dívida comum com todos os seus acréscimos, para exigir dele a integralidade da prestação, deve-se impor um certo limite ao seu ius variandi, sob pena de, em se permitindo que o credor proceda contra os demais co-devedores, sem qualquer razão admissível, o exercício de tal direito se afigure, na hipótese, abusivo e contrário à boa-fé objetiva.

Na Espanha, o Código Civil possui prescrição semelhante a do art. 910 do CC/1916. Seu artigo 1.144 dispõe, verbis:

"Artículo 1144.

El acreedor puede dirigirse contra cualquiera de los deudores solidarios o contra todos ellos simultáneamente.

Las reclamaciones entabladas contra uno no serán obstáculo para las que posteriormente se dirijan contra los demás, mientras no resulte cobrada la deuda por completo".

O regramento dado ao ius variandi pelo ordenamento civil espanhol não impediu, entretanto, que vozes abalizadas, como a de Garcia Goyena, Puig Ferriol e Caffarena entendessem da conveniência de se impor um certo limite àquele direito subjetivo, sempre que seu exercício redundasse abusivo ou se mostrasse contrário à boa-fé objetiva.

Ainda na vigência do Código Civil de 1916 algumas decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) já impunham alguma restrição ao ius variandi do credor.

Para o STJ não se afigura lícito possa o sujeito ativo da relação obrigacional ajuizar demandas executivas distintas para cobrança da dívida comum: uma contra o devedor principal com base no contrato de mútuo, p. ex., e outra contra os avalistas com base na cambial emitida em garantia do adimplemento daquele.

Em voto proferido no julgamento do Recurso Especial nº 167.221/MG, o relator, Ministro Aldir Passarinho Junior, sustentou a impossibilidade do ajuizamento das ações distintas contra os co-devedores solidários, pois, ainda quando o credor faça a ressalva "quanto à dedução do valor apurado em uma execução, da dívida exigida na outra, resta evidente que tal procedimento é mais oneroso para os devedores, acarreta dificuldades extremas quanto à apuração do saldo devedor que sobejaria..." [81].

Embora não tenha constado nos fundamentos da decisão a eventual infração à boa-fé objetiva contratual ou a configuração do abuso do direito na hipótese, acreditamos que à luz do Novo Código Civil Brasileiro o recurso àqueles institutos mostrar-se-ia plenamente admissível, para impedir o indiscriminado ius variandi.

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Sobre o autor
Eduardo Messias Gonçalves de Lyra Júnior

advogado, pós-graduando em Direito Privado pelo Centro de Estudos Superiores de Maceió (CESMAC)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LYRA JÚNIOR, Eduardo Messias Gonçalves. Notas sobre a solidariedade passiva no novo Código Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3513. Acesso em: 25 abr. 2024.

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