O princípio genérico da legalidade encontra-se consagrado no art. 5º, II, da Constituição Federal (CF), segundo o qual “ninguém será obrigado a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
Mais adiante, em seu art. 150, I, a Constituição da República proíbe os entes federados de “exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”, fazendo constitucional o princípio da legalidade tributária, também previsto no art. 3º do Código Tributário Nacional (CTN), que define tributo como uma prestação “instituída em lei”. Ainda, o art. 97 do CTN enumera as matérias submetidas à reserva legal.
Sob essas normas, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no Ac. Rec. Esp. 151.625-PE, DJ de 08-02-99, assentou que “Não é lícito, mediante Portaria, instituir tributo, alterar-lhe alíquota ou base de cálculo”.
Quanto à instituição de tributos, esclarece Ricardo Alexandre:
A palavra “exigir”, constante do transcrito art. 150, I, da CF, possui o sentido de cobrar o tributo. Como a cobrança depende, por óbvio, da prévia instituição da exação, o dispositivo acaba por impor que o tributo só pode ser criado por lei, seja ordinária, casos que pode haver a utilização de Medida Provisória, ou complementar (somente no caso de Empréstimos Compulsórios, do Imposto sobre Grandes Fortunas – IGF, e dos Impostos ou Contribuições Residuais – conforme os arts. 148; 153, VII; 154, I e 195, § 4º, todos da CF. (Direito Tributário Esquematizado. 3. ed. São Paulo: Método, 2009. p. 103.)
Pode-se dizer, pois, que o princípio da legalidade não possui exceções quanto à criação de tributos.
No que concerne à alteração de alíquotas, todavia, observam-se atenuações ao princípio da legalidade tributária. Com efeito, veja-se o que dispõe o art. 153, §1º da Constituição Federal:
Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:
I - importação de produtos estrangeiros;
II - exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados;
III - renda e proventos de qualquer natureza;
IV - produtos industrializados;
V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários;
VI - propriedade territorial rural;
VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar.
§ 1º - É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V.
[...]
Dessa forma, é facultado ao Poder Executivo Federal, independentemente de lei, “alterar as alíquotas” do Imposto de Importação, do Imposto de Exportação, do Imposto sobre Produtos Industrializados e do Imposto sobre Operações Financeiras – impostos considerados extrafiscais.
Ainda, com o advento da Emenda Constitucional 33/2001, passou-se a permitir ao Poder Executivo também a redução e o restabelecimento das alíquotas da CIDE-Combustíveis (art. 177, § 4º, I, b, da CF), bem como ao Poder Executivo dos Estados e do Distrito Federal, mediante convênio, a definição das alíquotas do ICMS-monofásico incidente sobre combustíveis definidos em lei complementar (CF, art. 155, § 4º, IV).
A par do exposto, importante notar que, conquanto a Constituição Federal preveja a possibilidade de alteração das alíquotas de certos tributos pelo Poder Executivo, silencia quanto à espécie de ato normativo que deverá ser utilizado por esse Poder para concretizar a alteração. A respeito do assunto, veja-se, mais uma vez, a lição de Ricardo Alexandre:
[...] Apesar de a maioria da doutrina entender que deve ser um Decreto Presidencial, deve-se repisar que a Constituição Federal de 1988 não afirma isto.
Na prática, as alíquotas dos tributos aduaneiros (II e IE) têm sido alteradas por Portaria do Ministro da Fazenda, enquanto o IPI e o IOF têm suas alíquotas alteradas por decreto. Em ambos os casos, a alteração tem sido feita por ato do Poder Executivo, não havendo desobediência ao texto constitucional (idem, p. 103.)
Roberval Rocha Ferreira Filho e João Gomes da Silva Júnior lecionam (Direito Tributário. Teoria, Jurisprudência e Questões. 2ª ed. Salvador: Juspodivm, 2008. p. 112.):
No caso de ICMS sobre combustíveis e lubrificantes, as alíquotas são definidas por convênio entre Estados e DF, e o ato do Poder Executivo não é um decreto, mas uma deliberação entre os representantes dos entes federativos. Nos demais casos, o ato do Poder Executivo também não será, necessariamente, um decreto:
A faculdade de alteração das alíquotas do imposto de importação, nos termos do § 1º do art. 153 da Constituição Federal, foi conferida ao Poder Executivo, e não apenas ao Presidente da República (TRF5. INAMS 94.05.46994/PE. Rel. Juiz Ridalvo Costa. DJ 04.05.1998).
O julgado do STJ anteriormente mencionado ainda fala sobre a impossibilidade de se alterar, mediante portaria, a base de cálculo do tributo.
A afirmativa, por certo, é verdadeira, mas merece ponderações relativas à atualização monetária da base de cálculo do tributo (CTN, art. 97, § 2º), que não está abrangida pelo princípio da legalidade. Gize-se que aqui se fala em “atualização monetária”, e não em “aumento” da base de cálculo (ALEXANDRE, Ricardo. Op. cit. p. 102.).
Conclui-se, pois, que o julgado referido relaciona-se diretamente com o princípio da legalidade tributária, merecendo destaque as atenuações ao mencionado princípio. Como exposto, não há exceções ao princípio da legalidade quanto à criação de tributos e à alteração da base de cálculo (embora esta aceite atualização do valor monetário por outros meios que não a lei), mas certas espécies tributárias admitem a alteração de suas alíquotas por ato do Poder Executivo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 3. ed. São Paulo: Método, 2009.
FERREIRA FILHO, Roberval Rocha; SILVA JÚNIOR, João Gomes. Direito Tributário. Teoria, Jurisprudência e Questões. 2ª ed. Salvador: Juspodivm, 2008.