Pressupostos da gestão e gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos e sua interface com a legislação ambiental brasileira

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A Política Nacional de Resíduos Sólidos é um importante instrumento na promoção da gestão e gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos nas cidades brasileiras.

INTRODUÇÃO

Atualmente, os resíduos sólidos são um dos grandes problemas da sociedade, apresentando-se com mais intensidade nas áreas urbanas, nas quais agravam os problemas ambientais já existentes e levam ao aparecimento de outros, quase sempre relacionados às formas incorretas de disposição e ineficiência na gestão dos resíduos.

A promulgação da Lei nº. 12.305/2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), representou um grande progresso no cenário da gestão e gerenciamento dos resíduos sólidos no Brasil.

A legislação também trouxe a importância dos catadores de materiais recicláveis, que contribuem para minimizar o problema dos resíduos sólidos urbanos para o ambiente. Destacando o trabalho dos catadores que é essencial para garantir o reaproveitamento e a reciclagem dos materiais que compõem os resíduos sólidos urbanos que seriam depositados em lixões ou aterros e não teriam nenhum aproveitamento econômico ou social, resultando em prejuízo ambiental.

Por isso, um bom sistema de gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos municipal e a organização destes trabalhadores em cooperativas ou associações, garante tanto a melhoria da qualidade ambiental, quanto social. Pois os catadores podem ter melhores formas de organização social, condições de trabalho e, consequentemente, o aumento da renda e da qualidade de vida.

SITUAÇÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS NO BRASIL

Para Figueiredo (1995, p.48), no decorrer da história, a população humana aumenta e se espalha rapidamente, e os resíduos gerados como subprodutos de suas atividades transcendem a capacidade de adaptação do meio ambiente, que passa a não mais incorporar  estes elementos  em seus ciclos originais.

            Parte crucial que se faz necessário para entender essas transformações mundiais, que envolvem o espaço urbano, é a questão do consumo. Sendo a maioria das mercadorias adquiridas por meio do consumo torna-se rapidamente descartáveis, tanto pela redução da durabilidade de diversos produtos, quanto pelo excesso de embalagens descartadas.

Transformando-se assim, em uma sociedade de consumo, que alimenta a sobrevivência do modelo econômico capitalista. Assim, milhares de pessoas no mundo contribuem com a geração de toneladas de lixo diariamente no planeta (TABELA 01).

Tabela 01 – Geração per capita de resíduos sólidos no mundo. Fonte: Monteiro, 2001.
TAMANHO DA CIDADE POULAÇÃO URBANA (habitantes) GERAÇÃO PER CAPITA (Kg/hab/dia
Pequena Até 30 mil 0,50
Média De 30 mil a 500 mil  De 0,50 a 0,80
Grande De 500 mil a 5 milhões De 0,80 a 1,00
Megalópole Acima de 5 milhões Acima de 1,00

Segundo a Abrelpe (2012, p.31), “a geração de Resíduos Sólidos Urbanos (RSU) no Brasil registrou crescimento de 1,8%, de 2010 para 2011, índice percentual que é superior à taxa de crescimento populacional urbano do país, que foi de 0,9% no mesmo período”. Ou seja, a quantidade de geração de RSU está sendo maior que o crescimento da população que habita as cidades, caracterizando um aumento da geração per capita de resíduos.

Foram gerados no país em 2010 cerca de 61 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos e coletados, aproximadamente 54 milhões de toneladas. E em 2011, com o aumento de 1,8% a geração foi de quase 62 milhões de toneladas e a coleta também aumentou 1,7% em relação ao ano passado, sendo coletadas cerca de 55,5 milhões de toneladas (ABRELPE,2012).

Com isso, essa quantidade de resíduos que não é coletada, acaba sendo descartada inapropriadamente, sejam nas ruas das cidades, em locais irregulares de deposição, em cursos d’água, entre outros.

Muitos problemas estão associados ao descarte incorreto em logradouros públicos e lixões a céu aberto. São eles, segundo Lajolo (2003, p.16):

  • A decomposição do lixo atrai vetores de doenças, como baratas, moscas e ratos;
  • embalagens podem acumular água, favorecendo a criação de pernilongos e outros insetos transmissores de doenças, como a Dengue;
  • embalagens e outros objetos lançados nas ruas podem entupir canais e valas, favorecendo enchentes;
  • a paisagem é afetada pelo acúmulo de lixo em terrenos baldios e lixões;
  • gasta-se muito na limpeza e no atendimento a problemas de saúde resultantes dessas situações.

Os lixões a céu aberto, consequentemente, não oferece nenhuma proteção ao ambiente, onde diversos trabalhadores realizam a catação dos materiais recicláveis nesse local, sem nenhuma proteção, condicionando sérios riscos à saúde deles.

Um instrumento utilizado para evitar que este cenário de degradação causado pela ineficiência na gestão e no gerenciamento dos resíduos sólidos se repita ou que se torne cada vez menos frequente no território brasileiro é a Política Nacional de Resíduos Sólidos, que determina a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos.

A Política Nacional de Resíduos Sólidos.

            A Lei nº. 12.305 de 2 de Agosto de 2010 institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, regulamentada pelo Decreto 7.404 de 2010, sendo considerada um grande avanço na legislação vigente sobre o tema no país. Essa lei apresenta diretrizes para superação de problemas causados pelo manejo e disposição inadequada dos resíduos sólidos, tanto na esfera ambiental, quanto na econômica e social.

            Essa lei criou princípios e normativas que compartilham a responsabilidade pelos diversos agentes que devem atuar na gestão dos resíduos sólidos, bem como especifica as diversas variáveis que essa questão envolve, desde a produção, o ciclo de vida desse produto até o seu consumo e a destinação final.

            Complementando com o Art. 30, a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos deve abranger os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, os consumidores e os responsáveis pelos serviços de limpeza pública e pelo manejo dos resíduos sólidos.

            A PNRS é contemplada por 15 objetivos, porém dois destes se destacam: o que prioriza a contratações e aquisições governamentais de produtos e serviços de empresas que promovem a sustentabilidade ambiental e priorizem o uso de produtos reciclados e a sua reutilização. Outro ponto que não poderia deixar de ser destacado é a integração dos catadores de materiais recicláveis no processo da responsabilidade compartilhada dos resíduos sólidos. Este item fortalece o trabalho dos catadores, garantindo que não sejam excluídos da cadeia produtiva dos resíduos sólidos urbanos.

            Há diversos instrumentos que devem ser adotados para que a PNRS seja implementada e efetivada corretamente. Aqui serão tratados aqueles que julgamos mais necessários à abordagem no momento.

            Um desses instrumentos é o plano de resíduos sólidos, que são exigidos de estados e municípios, para que possam ser firmados convênios e contratos com o Governo Federal, a fim de conseguirem repasse de recursos para o desenvolvimento da política em seu território. É importante que estes planos sejam realizados de maneira participativa com a comunidade, ou seja, para que se desenvolvam políticas públicas juntamente com a sociedade, prolongando assim a sua duração.

            Com isso, todas as diretrizes, metas, estratégias e ações que estiverem estabelecidas nos planos, necessitam estar de acordo com diversos tipos de responsabilidades compartilhadas na gestão dos resíduos:

  • responsabilidades pelos serviços públicos de limpeza urbana e manejo, e pelos resíduos gerados em instalações públicas;
  • responsabilidades dos entes privados pelos resíduos gerados em ambientes sob sua gestão;
  • responsabilidades decorrentes da logística reversa e da implementação de Plano de Gerenciamento obrigatório;
  • responsabilidades do consumidor/gerador domiciliar (BRASIL, 2012, p.40).

Outro instrumento de grande importância são os programas de coleta seletiva nos municípios, onde deverá ser feita a separação prévia dos resíduos sólidos nas fontes geradoras, necessariamente, entre aqueles que são orgânicos e os inorgânicos, para que se consiga dar uma destinação adequada ambientalmente aos resíduos.

            Além disso, também está prevista a logística reversa que se faz cada vez mais necessária, já que há um aumento do consumo pela população e a nítida redução no tempo de vida útil dos produtos em todos os setores da atividade humana, provocando o aumento dos resíduos que deverão ser encaminhados à reciclagem ou à destinação final.

            Segundo Leite (2009, p.14)

O ciclo de vida mercadológico dos produtos se reduz em virtude da introdução de novos modelos, que tornam os anteriores ultrapassados em consequência de seu próprio projeto, pela concepção de ser utilizado uma única vez, pelo uso de materiais de menor durabilidade, pela dificuldade técnica e econômica de concerto, etc. A tendência a descartabilidade acentua-se como uma realidade em nossos dias.

           As legislações ambientais vigentes no país, a exemplo da PNRS, estão cada vez mais desobrigando os governos e responsabilizando as empresas por esses produtos do pós-venda, que provocam contaminação e a poluição por excesso, causando impactos no ambiente.

Com isso, a logística reversa ganha a preocupação de empresas de diversos setores da produção de mercadorias. Define-se então logística reversa como sendo “o papel da logística no retorno de produtos, redução na fonte, reciclagem, substituição de materiais, reuso de materiais, disposição de resíduos, reforma, reparação e remanufatura” (STOCK apud LEITE, 2009, p. 16).

Porém, o Brasil ainda necessita avançar muito nesse setor, pois a maior parte das empresas ainda não conseguiram efetivar esse processo e falta, ainda, o esclarecimento a população sobre esse serviço.

Também faz parte dos instrumentos da PNRS, o incentivo à criação e ao desenvolvimento de associações e cooperativas de trabalhadores catadores de materiais recicláveis, para que além da questão ambiental, os catadores também sejam integrados socialmente, gerando assim melhores condições de trabalho para essas pessoas e a garantia de trabalho e renda. Esse instrumento aborda um caráter político onde “obriga” o poder municipal a reconhecer os catadores e garantir o fortalecimento desses empreendimentos.

Para que isso ocorra de maneira eficaz, um instrumento muito importante que está na PNRS é a educação ambiental. Sendo essa uma importante ação para conscientizar a população e sensibilizá-la a discutir, participar e contribuir para a solução dos problemas ambientais, que estão integrados também às questões sociais, econômicas e políticas.

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            Diante disso, é necessário que existam órgãos gestores destinados ao controle social e ambiental dos serviços de resíduos sólidos urbanos. Esses órgãos devem ser constituídos por profissionais capacitados na área de gestão e gerenciamento dos resíduos sólidos. Devem promover o diálogo entre todos os setores que compõem o sistema de limpeza pública municipal e estar aliado às cooperativas ou associações de trabalhadores catadores de materiais recicláveis, fomentando assim o seu desenvolvimento e um serviço de qualidade. É importante também a existência de órgãos colegiados municipais com uma composição mais ampla, contendo membros da comunidade, do poder público municipal, de universidades, catadores, entre outros.

            O Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (SINIR) também é um dos instrumentos previstos na lei, está aguardando um decreto regulamentador para sua criação, disponibilizando informações, dados e documentos sobre a gestão dos resíduos sólidos no Brasil e funcionará em conjunto com o Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico (SINISA).

            Além disso, esta política estabelecia que fossem fechados todos os locais em que o lixo é depositado sem tratamento ou separação até o ano de 2014, ou seja, no entanto, foi avaliado um prazo de prorrogação de quatro anos, que foi vetado pela presidente Dilma Rousseff, no momento o um novo prazo está sendo discutido no Congresso Nacional.

A PNRS tem um grande potencial para garantir a regulamentação da gestão e gerenciamento dos resíduos sólidos no Brasil, contribuindo para a melhoria do cenário do lixo urbano no país.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

            Apesar da questão dos resíduos sólidos urbanos estar em bastante evidência na contemporaneidade, visto a preocupação com a sua destinação correta do lixo, a separação eficaz para a coleta seletiva, o trabalho dos catadores de materiais recicláveis que se faz presente nesse cenário e todas as outras etapas que estão engendradas nesse sistema. As principais preocupações remetem-se ao consumo, cada vez maior da população, que, consequentemente, faz aumentar o volume de resíduos a serem descartados, aumentando a preocupação com a sua disposição final.

            Nesse sentido, a  PNRS necessita ter maior eficiência para alcançar seus objetivos, sobretudo entre os municípios, visto que já fazem quase cinco anos da sua vigência. Isso se deve possivelmente a falta de recursos financeiros para que as cidades resolvam seus problemas com resíduos sólidos urbanos e também a falta de fiscalização para o cumprimento da lei.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABRELPE, Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais. Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2011. São Paulo, 2012.

BRASIL. Lei nº. 9.795, de 27 de Abril de 1999. Dispõe sobre a educação ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9795.ht>. Acesso em: 05 de Novembro de 2012.

FIGUEIREDO, Paulo Jorge Moraes. A sociedade do lixo: os resíduos, a questão energética e a crise ambiental. Piracicaba: Editora Unimep, 1995.

LAJOLO, Roberto Domenico. Cooperativa de catadores de materiais recicláveis: guia de implantação. São Paulo: Instituto de Pesquisas Tecnológicas: SEBRAE, 2003.

LEITE, Paulo Roberto. Logistica revesa: meio ambiente e competitividade. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2009.

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Sobre as autoras
Letícia Roberta Trombeta

Mestranda em Geografia no Programa de Pós-Graduação da UNESP de Presidente Prudente.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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