Um tema bastante recorrente em bancas examinadoras de concursos e, certamente, de grande impacto no universo jurídico é a “teoria da coculpabilidade às avessas”. Neste contexto, quando nos referimos isoladamente ao termo “coculpabilidade”, devemos correlacioná-lo à ideia de “corresponsabilidade”, ou seja, divisão de responsabilidade.
Segundo a teoria da coculpabilidade, muito difundida por Eugênio Raúl Zaffaroni em suas obras, o Estado, responsável pela erradicação das desigualdades econômicas e sociais e também pela adoção de políticas públicas de combate à pobreza, teria parcela de responsabilidade na prática do delito quando perpetrado por pessoas marginalizadas, menos favorecidas e que tiveram menos oportunidades diante da sociedade.
Desse modo, de acordo com esse ilustre jurista argentino, “coculpabilidade é corresponsabilidade do Estado no cometimento de determinados delitos, praticados por cidadãos que possuem menor âmbito de autodeterminação diante das circunstâncias do caso concreto, principalmente no que se refere a condições sociais e econômicas do agente, o que enseja menor reprovação social“. Segue dizendo ainda que “a sobrecarga de reprovação que se deve impor a quem padece de uma carência social, deve ser retransmitida à sociedade que motiva essa carência e não ao carenciado que não pode prover a sua própria superação“.
Desta forma, segundo o princípio da coculpabilidade, o Estado-juiz haveria de considerar como atenuante as condições sócio-econômicas do réu no momento na aplicação da pena. Veja que o artigo 66 do Código Penal autoriza ao Juiz esse postulado, através da, chamada pela doutrina, atenuante inonimada:
Art. 66 – A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei.
Essa é a teoria da coculpabilidade. Mas o que seria coculpabilidade às avessas, então ?
Como o próprio nome sugere, seria a inversão dessa corresponsabilidade do Estado, tratado até então. O Estado, ao invés de atenuar a pena aplicada aos menos favorecidos, por vezes, chega, inclusive, a tipificar infrações penais punindo a marginalidade, como eram os casos das contravenções penais de vadiagem (artigo 59) e mendicância (artigo 60), ambos artigos revogados pela Lei 11.983/2009.
Desta forma, a coculpabilidade às avessas se divide em duas perspectivas:
1ª – É o abrandamento da aplicação da pena nos crimes praticados por pessoas de alto poder sócio-econômico, como é o caso da extinção da punibilidade pelo pagamento da dívida nos crimes contra a ordem tributária, previstos na Lei 8.137/90, quando na verdade, essas mesmas pessoas deveriam sofrer um maior rigor na aplicação da pena, porquanto tiveram maiores oportunidades perante a sociedade.
2ª- É a criação pelo Estado de leis que incriminem as condutas passíveis de estarem sujeitas somente as pessoas de menor capacidade sócio-econômica, como é caso da vadiagem e mendicância, já mencionadas acima.
Apesar das mais variadas críticas, inclusive minhas, essa teoria exerce muita influência no direito brasileiro. Suas proposições vão muito ao encontro do pensamento abolicionista penal, ao qual reúne inúmeros juristas no Brasil e no mundo.