O INSS, autarquia federal vinculada ao Ministério da Previdência Social, tem por finalidade conceder e manter os benefícios previdenciários aos beneficiários (segurados e dependentes) do Regime Geral de Previdência Social – RGPS, bem como aos titulares do benefício de prestação continuada – BPC da Lei 8.742/93. Recentemente, o INSS, por força da MP 665/2014, passou a ser também responsável pelo processamento dos benefícios de seguro-desemprego" data-type="category">seguro desemprego (seguro defeso) ao pescador artesanal.
Não obstante o volume de atribuições imputadas ao INSS, ressalte-se que as atividades de arrecadação e fiscalização das contribuições previdenciárias – antes de responsabilidade do gestor do RGPS – foram, com base na Lei 11.457/2007, atribuídas à Secretaria da Receita Federal do Brasil objetivando conferir mais eficiência na prestação do serviço público em prol do cidadão brasileiro.
Nesse contexto, os advogados militantes na seara previdenciária, além de enfrentarem a morosidade do Poder Judiciário em processos que versam sobre direitos sociais fundamentais de natureza previdenciária (envolvendo benefícios de caráter alimentar), encontram grande dificuldade de atuação junto às agências do INSS e perante o Conselho de Recursos de Previdência Social.
Muito embora a legislação não exija a presença do advogado no processo administrativo previdenciário, constata-se que a atuação de um profissional especializado em previdência social acaba minimizando a afronta dos direitos contemplados na Lei 8.213/91, sobretudo porque o pleito deduzido pelo segurado, desprovido de uma assistência jurídica especializada, tem uma maior probabilidade de ser indeferido pelo gestor do RGPS.
A apresentação de documentação incompleta para a comprovação dos fatos geradores dos direitos previdenciários postulados pelos beneficiários da previdência social constitui uma das principais razões pelas quais os requerimentos administrativos são negados. Não há dúvida, portanto, que em diversos casos a presença do advogado na via administrativa, inclusive por intermédio da interposição de recursos bem fundamentados perante o Conselho de Recursos de Previdência Social, acaba diminuindo a judicialização de questões afetas ao direito previdenciário.
Com efeito, a atuação dos advogados na proteção dos direitos do segurado da Previdência Social é de fundamental relevância. A Constituição Federal da Republica Federativa do Brasil dispõe em seu art. 133:
Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.
Há de se reconhecer que houve uma expressiva melhora no atendimento em favor do segurado da previdência social na última década. Eram comuns as cenas de longas filas nas agências do INSS, bem como condutas manifestamente arbitrárias adotadas por alguns servidores públicos da autarquia previdenciária. A criação de procedimentos como senhas e o próprio agendamento para a formulação de requerimentos administrativos foi fundamental para o aprimoramento da atuação do gestor do RGPS.
Os advogados, contudo, quando se dirigem a uma agência do INSS estão devidamente constituídos para a defesa de interesses alheios e, por outro lado, necessitam exercer sua atividade profissional sem embaraços excessivos para garantia de sua própria sobrevivência, porquanto o grau de zelo de sua atuação profissional é elemento constitutivo para a cobrança dos honorários advocatícios devidos nos termos do art. 20, §3º, alínea “a”, do Código de Processo Civil, que pode ser analogicamente aplicado para a discussão ora travada.
É fato público e notório que os agendamentos de benefícios previdenciários podem demorar meses para o efetivo atendimento realizado por um servidor público do INSS, situação que se torna absurda quando esses requerimentos são realizados por advogados em prol de sua clientela. Por outro lado, os operadores do direito são obrigados a permanecer durante horas no interior das agências do INSS para a obtenção de uma simples cópia da relação dos salários de contribuição dos segurados (CNIS), não podendo sequer ter acesso a mais de uma senha de forma concomitante para a obtenção de elementos probatórios para mais de um cliente.
O Estatuto da Advocacia, Lei 8.906 de 4 de julho de 1994, precisamente em seu art. 7º, inciso VI, alínea “c”, assim dispõe:
Art. 7º São direitos do advogado:
(...)
VI - ingressar livremente:
(...)
c) em qualquer edifício ou recinto em que funcione repartição judicial ou outro serviço público onde o advogado deva praticar ato ou colher prova ou informação útil ao exercício da atividade profissional, dentro do expediente ou fora dele, e ser atendido, desde que se ache presente qualquer servidor ou empregado;
Portanto, as regras restritivas ao advogado que milita administrativamente perante o INSS configura violação à liberdade de exercício profissional e ao direito de petição. Não há de se falar em privilégio à classe dos advogados, mas violação de suas prerrogativas.
Não se pode argumentar, para invalidar a legitimidade do atendimento diferenciado ao advogado, que o INSS, caso adotasse o procedimento aqui sustentado, estaria ofendendo aos princípios da isonomia e da dignidade humana.
O princípio da Isonomia garante o tratamento desigual no intuito de sanar as desigualdades existentes na sociedade. Apenas dessa forma os tratamentos diferenciados seriam compatíveis com a Constituição de 1988, uma vez que haveria proporção ao fim pretendido.
O art. 3º da Carta Magna dispõe:
Art.3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
(...)
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
De acordo com os defensores da tese contrária ao atendimento preferencial, a concessão dessa prerrogativa aos advogados é indevida, pois o tratamento desigual, supostamente beneficiando a classe, não possui um viés de reparação da desigualdade social e sim um mero conforto a eles.
Em recente decisão do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 277.065/RS, firmou-se o entendimento de que descabe impor ao advogado, no exercício da profissão, a obtenção da ficha de atendimento. Cabe aqui transcrever trechos do voto do Ministro Marco Aurélio de Mello no julgamento do referido RE que afastou a suposta violação ao princípio da isonomia:
“(...)
Considerada a atividade desempenhada e os bens jurídicos tutelados, atua o advogado como guardião da liberdade. Conforme disse o Mestre José Afonso da Silva, a advocacia “é um dos elementos da administração democrática da Justiça”, sendo “nada mais natural, portanto, que a Constituição o consagrasse e prestigiasse, se se reconhece 2 Cópia RE 277065 / RS no exercício do seu mister a prestação de um serviço público” (SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 612-613). Daí não ter a decisão recorrida implicado ofensa ao princípio da igualdade, não vindo a conferir privilégio injustificado, e sim a observar a relevância constitucional da advocacia, presente, inclusive, atuação de defesa do cidadão em instituição administrativa.
(...)
A alínea “c” do inciso VI do artigo 7º da Lei nº 8.906/94 – Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil – é categórica ao revelar como direito dos citados profissionais ingressar livremente “em qualquer edifício ou recinto em que funcione repartição judicial ou outro serviço público onde o advogado deva praticar ato ou colher prova ou informação útil ao exercício da atividade profissional, dentro do expediente ou fora dele, e ser atendido desde que se ache presente qualquer servidor ou empregado”. Essa norma dá concreção ao preceito constitucional a versar a indispensabilidade do profissional da advocacia, e foi justamente isso que assentou o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, afastando a situação jurídica imposta pelo Instituto aos advogados – a obtenção de ficha numérica, seguindo-se a da ordem de chegada. Além do mais, incumbe ao Instituto aparelhar-se para atender, a tempo e a modo, não só os profissionais da advocacia que adentrem o recinto para cuidar de interesses de constituintes, mas também todos os segurados. Espera-se que o tratamento célere seja proporcionado tanto aos advogados quanto ao público em geral (...)”
Assim, o STF manteve o acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e garantiu aos advogados gaúchos o atendimento durante o horário de expediente, independente de distribuição de fichas e em lugar próprio de atendimento. Esse entendimento tem sido adotado em outros TRF’s como o da 3ª Região.
Insta salientar que a iniciativa deste Mandado de Segurança Coletivo partiu da OAB-RS, na defesa dos interesses do pleno exercício profissional dos advogados gaúchos.
Diante de atos administrativos que violam a legislação previdenciária, o acesso pleno e rápido do advogado às informações necessárias constitui medida fundamental para que os segurados do RGPS tenham seus direitos assegurados, garantindo maior efetividade ao princípio da dignidade da pessoa humana, bem como preservando as prerrogativas previstas em lei aos advogados.
A importância em facilitar a postulação administrativa de direitos de segurados vinculados ao INSS por intermédio dos advogados ganha ainda mais relevo diante do entendimento propugnado pelo STF, no julgamento do RE 631.240 realizado em 27 de agosto de 2014, no sentido de ser indispensável o prévio requerimento administrativo antes da propositura de uma ação judicial.
Por último, é indubitável que a eliminação de entraves no atendimento aos advogados nas agências do INSS contribuirá, conforme já mencionado, para a diminuição de litígios no âmbito do Poder Judiciário, especialmente nos Juizados Especiais Federais cujo maior quantitativo de feitos certamente envolve conflitos entre o INSS e os beneficiários do RGPS.