Da abusividade das cláusulas de fidelidade nos contratos de prestação de serviços telefônicos: uma análise à luz do CDC

08/04/2015 às 11:11
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Como instrumento básico da política de proteção integral ao consumidor, estabelecido na Constituição Federal de 1988, foi promulgada a Lei nº 8079/90, ao qual dispôs sobre os princípios básicos nas relações de consumo.

Resumo

Como instrumento básico da política de proteção integral ao consumidor, estabelecido na Constituição Federal de 1988, foi promulgada a Lei nº 8079/90, ao qual dispôs sobre os princípios básicos nas relações de consumo. Nesse contexto, objetiva o artigo abordar acerca da abusividade das cláusulas de fidelidade nos contratos de prestação de serviços telefônicos em face de sua má prestação. Ao consumidor não deve ser obrigado a permanecer em uma relação jurídica desfavorável a si ao acaso de haver vícios em sua prestação deve ser assegurado o seu desfazimento, devendo neste contexto ser declarada abusiva toda e qualquer cláusula contrária a esse posicionamento.

Palavras-chave: consumidor; serviços; vícios; abusividade contratual.

Sumário: Introdução; 1- Pressupostos fundamentais; 2- Princípios que regem o direito do consumidor; 3- Evolução contratual nas relações de consumo; 4- Abusividade das cláusulas contratuais; 5- Considerações Finais; Bibliografia.

Abstract

As a basic tool of full consumer protection policy, established in the Federal Constitution of 1988, was enacted Law No. 8079/90, which provided for the basic policy in consumer relations. In this context, the article aims to address regarding the unconscionability of the terms of fidelity in the provision of telephone services in the face of its poor performance contracts. The consumer should not be forced to remain in an unfavorable legal relationship to each other at random from addictions in his offer, and must be declared unfair in any position contrary to this clause.

Keywords: consumer; services; vices; contractual unconscionability.

Introdução    

A problemática do estudo do tema ora em questão, qual seja a abusividade das cláusulas de fidelidade nos contratos de prestação de serviços telefônicos, reside nos diversos danos reflexos que podem nascer da pactuação dessa conduta, notadamente a qualidade da prestação do serviço de telefonia.

Partindo dessa questão preliminar, o artigo ora a ser realizado estudará acerca da questão da possibilidade de anular os negócios jurídicos pactuados entre as partes, após ser constatado vício na qualidade do serviço prestado ou até mesmo insatisfação subjetiva do cliente/consumidor mesmo havendo a chamada cláusula de fidelidade, ao qual determina um tempo mínimo de permanência do consumidor na relação negocial.

No sistema econômico atual, ao qual o capitalismo impõe a lógica incessante do lucro desmoderado, o consumidor fica a mercê de práticas abusivas que muitas vezes por falta de conhecimento jurídico ou técnico do que esteja se tratando, não dispõe dos meios necessários para se defender, de modo que, dentro desse panorama de adversidade surge a necessidade de cooperação mútua dos órgãos do executivo e do judiciário, para coibir essa prática nociva ao interesse do elo mais frágil.

Em um primeiro momento da linha de pesquisa, serão analisados os conceitos básicos pertinentes, como “responsabilidade civil”, “dano indenizável” e “serviço”, de pontos de vista diversos, abrangendo temas como o ensaio de Anderson Schreiber, Novos paradigmas da responsabilidade civil, a questão do dano e a necessidade de seleção em concreto dos interesses tutelados, apontando, sob esse aspecto, a dificuldade que surge entre o dano e a sua quantificação, de modo que possa insurgir a anulação do negócio jurídico pactuado.

Ultrapassada esta discussão, o artigo se deparará com a análise concreta das situações aos qual o consumidor percebe-se “refém” dos contratos de telefonia ao qual fora signatário, mesmo em face da má prestação do serviço telefônico.

À luz desse debate, procurará estabelecer parâmetros avaliadores de pesos e contrapesos da segurança jurídica e o limite da força contratual, de modo que, o consumidor seja salvaguardado da voraz sede dos fornecedores em arrecadas cada vez mais fundos independentemente dos resultados que causem.

  1. Pressupostos fundamentais

Anteriormente a adentrar-se a temática em questão, qual seja a declaração de abusividade nas cláusulas a qual opõe fidelidade nos contratos de prestação de serviço telefônico, mister se faz, para a completa inteiração e interpretação do fenômeno jurídico consumerista envolvido,  a análise dos pressupostos fundamentais que trouxeram a tona o surgimento da Lei nº 8.079/90, a qual dispõe em linhas gerais sobre a proteção do consumidor.

Inicialmente, percebe-se que o Código de Defesa do Consumidor foi uma lei editada tardiamente no direito brasileiro, de forma que por muitos anos o sistema jurídico responsável para discutir eventuais danos que o consumidor tivesse era o da lei Civil. Em decorrência desse panorama, toda essa herança privatista obstaculizou em parte o real entendimento e atendimento da proposta de proteção trazida por essa lei.

A título de exemplo, os Estados Unidos possuía desde 1890, ou seja, um século antes do atual sistema protecionista do consumidor no Brasil, uma lei (Lei Shermann ou Lei Antitruste americana) que tutelava o particular em face do modelo de consumo globalizado que estava se estabelecendo no mundo.

Dessa forma, inspirado pelo sistema protecionista norte-americano, Rizzatto Nunes (2011,59) defende que a elaboração no Brasil do atual Código de Defesa do Consumidor, trouxe as situações mais modernas no que concerne a tutela da pessoa nas relações de consumo, muitas situações inéditas no país em decorrência da menor industrialização comparado com os países nortistas. Veja-se:

“(...) quando chega até nós uma lei no final do século XX ela, então, traz uma série de situações que importam em experiência que não tínhamos ainda vivenciado. Porém, apesar de atrasado no tempo, o Código de Defesa do Consumidor acabou tendo resultados altamente positivos.”

E continua dizendo:

“(...) porque o legislador pensou e trouxe aquilo que existia e existe de mais moderno na proteção do consumidor.”.

Toda essa modernidade advinda do Código de Proteção ao Consumidor norte-americano foi necessária para entender e basilar os pressupostos fundamentais históricos responsáveis pelo advento da Lei nº 8079/90, os quais seriam a chamada sociedade de massa e a sua produção em série sedimentada na sociedade capitalista pós- Revolução Industrial.

Com o elevado crescimento populacional nos grandes centros urbanos, decorrentes do desenvolvimento e aprimoramento da medicina além de outras ciências notadamente a política e a economia, houve, em sua decorrência, o aumento da demanda por mais produtos e serviços, passando á indústria o dever de incrementar em sua linha de produção novas técnicas com o principal fito de produzir mais e atender as novas necessidades.

A definição da sociedade de massa assenta-se nessas características apontadas. Entre as novas técnicas de produção que nasceram com o objetivo de aprimorar a disponibilidade de bens, destaca-se o planejamento unilateral do produto a ser ofertado pelo fabricante de modo a produzi-lo em massa, ou seja, em múltiplas vezes.

Cumpra-se aqui neste ponto logo destacar que o mesmo fenômeno ocorreu com os contratos celebrados entre as partes nesse tipo de relação jurídica. Eles se desenvolvem no mesmo sentido que a produção, ou seja, em massa. Assim, este planejamento que envolve novas técnicas de produção, envolveu também um novo tipo de contrato, o contrato de adesão.

O contrato de adesão em uma apertada síntese significa em tese que o consumidor só pode aderir as suas cláusulas, não havendo possibilidade de acrescentar, modificar ou extinguir o seu conteúdo.

Exemplificando os comentários acima mencionados, ao ser planejado a fabricação de um veículo automotor por parte da fabricante/montadora, ela realiza estudos e investimentos para a produção de um único carro, e após, estando apto, realiza a sua reprodução em milhares de vezes, com a consequente reprodução múltipla de seus contratos.

O outro pressuposto, em decorrência da iminente necessidade de planejar um modelo capaz de fornecer as pessoas, mais produtos e serviços, atendendo as novas perspectivas de crescimento populacional e por consequência direta do desenvolvimento da sociedade em massa, é a chamada produção em série ou standartização da produção.

Essa forma de produção está balizada em duas perspectivas, a

primeira é a diminuição de custos, e a segunda é um aumento progressivo da oferta. Ocorre a diminuição de custos quando toda a matéria prima é adquirida de uma só vez e nela é empregado o uso da mão de obra qualificada e específica para a realização daquela atividade, evitando assim perdas de produção, e o fruto que decorre desse molde produtivo é o aumento da receita por parte do fornecedor.

Pois bem, este é o modelo de produção capitalista do século XXI. Dentro deste aspecto, destaca-se nesse ponto a necessidade de diferenciar as relações jurídicas regidas pelo direito comum, notadamente o código civil, e as relações jurídicas tidas como de consumo e consequentemente tuteladas pelo Código de Defesa do Consumidor.

Em virtude de nossa herança privatista, muitas vezes a relação de consumo é interpretada à luz do Código Civil, ao ver o contrato inserido na cláusula geral pacta sunt servanda, o contrato faz lei entre as partes, posto que, no direito civil por haver teoricamente a igualdade de condições, não há motivos para a mitigação deste instituto.

Porém, considerando a necessidade de inserir na legislação um sistema protecionista ao consumidor de modo que possa diminuir as desigualdades presentes nas suas relações jurídicas, emergiu a Lei nº 8078/90, que disciplina as chamadas relações de consumo.

A relação de consumo ou relação jurídica de consumo é aquela existente entre o consumidor e o fornecedor sob o qual o primeiro pode exigir do segundo a execução de certa obrigação podendo ser esta de dar, fazer ou não fazer sob o objeto que fora avençado, ou a execução de um serviço prontamente contratado; como cediço, nessas relações incide o microssistema jurídico do Código de Defesa do Consumidor, responsável por traças os paradigmas de igualdade à luz do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana no ordenamento jurídico brasileiro.

Assim, em apertada síntese, a Lei nº 8078/90, ao qual dispôs sobre o CDC, tem por escopo a proteção do consumidor, tendo como vulnerável/hipossuficiente dentro das relações de consumo, em face do novo modelo econômico mundial advindo do sistema capitalista da globalização, em virtude da necessidade de garantir a efetivação dos princípios constitucionais salvaguardores do bem-estar social, já tão abalado dentro do panorama jurídico contemporâneo.

2- princípios que regem o Código de Defesa do Consumidor

Diante da atual mitigação legal no alcance das normas que regem as relações jurídicas tidas como de consumo, necessário é, para o alcance do verdadeiro sentido da criação deste microssistema jurídico protetivo, o estudo dos seus principais princípios que o regulam.

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O princípio é o pilar aonde se sustenta as leis, é o modelo ou paradigma orientador da construção do direito dentro no próprio ordenamento jurídico, justificando-se como uma leitura orientadora na aplicação do caso concreto à luz do direito.

Como bem assevera Celso Antônio Bandeira de Melo:

 
“Princípio – já averbamos alhures – é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo. Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.”

Assim, destarte ao entendimento do ilustre professor Bandeira de Melo, é princípio é a mola propulsora de todo o ordenamento jurídico, ao qual se encontram positivadas às leis.

É importante frisar, que as leis ou normas regras são dotadas de um alto grau de concretude, deixando adstrito ao intérprete, grande grau de discricionariedade na ordem de aplicação da lei ao caso concreto. Pois parte do pensamento que uma regra é aplicada ou não é, ou seja, a incidência de uma afastaria totalmente o predomínio da outra, pois somente há uma regra determinando a legalidade de cada caso sub judice.

Os princípios, nadando em águas contrárias, se determinam como normas dotadas de alto grau de abstração e carga valorativa, ocorrendo que, em sua aplicação, há uma dinâmica diferenciada em face das regras, devida ao fato de um princípio não necessariamente excluirá o outro, mas sim, poderão harmoniosamente conviver um com o outro, com o fito de legitimar a norma exposta.

Segundo Nunes (2008, pág. 37), “a dignidade da pessoa humana – e do consumidor – é garantia fundamental que ilumina todos os demais princípios e normas e que, então, a ela devem respeito, dentro do sistema constitucional soberano brasileiro.”


Os princípios gerais de proteção à vulnerabilidade da pessoa humana trazidos pelo Código de Defesa do Consumidor brasileiro encontram-se dispostos no artigo 4º do referido diploma infraconstitucional.

Tal referido artigo, em seus incisos traz oito princípios que devem ser observados conforme os ditames que regem a dignidade, saúde e segurança, a proteção dos interesses econômicos, a melhoria da qualidade de vida dos consumidores, bem como a transparência e harmonia das relações que envolvem consumo.

A dignidade da pessoa humana prevista no artigo 4º está interligada aquela estampada no texto da Constituição Federal, remetendo desta forma, a leitura do Código de defesa do consumidor ao princípio constitucional, notadamente na necessidade de sua tutela e perpetuação, para fins de alcançar e salvaguardar a vida humana.

A proteção à saúde, à vida e a segurança também está ligada precipuamente ao princípio da dignidade da pessoa humana supra referido, pois a dignidade humana presume diretamente a todos estes pressupostos, “um piso vital mínimo”. Também, essa tutela, liga-se a uma proteção moral e material do consumidor- vulnerável, no que se refere qualidade de vida tanto individual e quanto para com os outros em sua vida social.

A proteção dos interesses econômicos denota a uma intervenção do Estado nas relações consumeristas, ou seja, aquela que ocorre entre os fornecedores e consumidores, ao qual, aqueles se obrigam a fazer, não fazer, dar ou realizar determinado serviço. Está ligada a garantia nas realizações das necessidades básicas do consumidor.

Exemplificando o caso acima referido, ocorrendo à necessidade de reposição de medicamentos classificados como de urgências pelo Sistema único de Saúde, é de responsabilidade de o Estado garantir a manutenção regular da substancia, pois põe em risco a vida e segurança dos pacientes-consumidores.

Em relação à transparência e harmonia nas relações de consumo, traduz-se na obrigação a qual possui o fornecedor de apresentar os produtos e serviços por ele oferecidos assim como o contrato (geralmente encontra-se amparo neste contexto o chamado contrato de adesão) a ser pactuado, completada pela regra do artigo 46. Em relação à harmonia, encontra-se respaldada no princípio constitucional da isonomia, solidariedade e dos princípios da atividade econômica.

O primeiro dos princípios trazidos pelo artigo 4º é o estabelecimento da vulnerabilidade do consumidor nas relações consumeristas.

Para SIMONETTI (2005; pág33), a vulnerabilidade traduz-se como o princípio que institui a arquitetura de todo o direito do consumidor, de modo que defende:

No Direito, vulnerabilidade é o princípio segundo o qual o sistema jurídico reconhece a qualidade do agente mais fraco na relação, seja com relação a trabalhadores, a gestantes, ao consumidor, etc. Daí que se tem que especificamente o princípio da vulnerabilidade do consumidor é a caracterização absoluta do consumidor como sendo ente vulnerável, sendo essa uma premissa básica e indispensável para a harmonização e equilíbrio nas relações de consumo.

Dentro deste diapasão, a vulnerabilidade do consumidor representa acima de tudo o reconhecimento que ele representa o ele mais fraco da relação e, portanto necessita uma maior atenção pelo Estado. Assim, ao dizer que a parte mais fraca da relação de consumo é o consumidor a vulnerabilidade esta que pode ser decorrente da fragilidade técnica e/ou econômica.

O próximo princípio a ser discutido contido no artigo 4º é o da intervenção do Estado. Este princípio infraconstitucional permite ao Estado intervir diretamente para proteção do consumidor/cliente, pois, acima de tudo ele é cidadão e necessita assegurar-lhe tanto o acesso a produtos e/ou serviços quanto com o objetivo de garantir a qualidade e adequação destes.

O inciso III do supracitado artigo 4º traz consigo o dever de harmonizar os interesses nas relações consumeristas, compatibilizando a tutela do consumidor com a necessidade emergente a qual se faz em torno do desenvolvimento econômico, com base no princípio constitucional da boa-fé. Refere-se a chamada boa-fé objetiva, que é uma regra de conduta, um agir, conforme parâmetros concretos de honestidade e lealdade, é portanto, um modelo, um standard.

Continuando com a análise dos princípios constantes no Código de Defesa do Consumidor, o próximo refere-se a educação e informação de fornecedores e consumidores quanto a seus direitos e deveres.

Dentro da sistemática do Código de Defesa do Consumidor, o fornecedor é obrigado a prestar todas as informações a respeito do seu produto ou serviço, de maneira precisa e clara. O produto ou serviço não poderá ser oferecido sem essa informação. Esse princípio da informação tem ligação com a orientação de transparência trazida pelo caput do artigo 4º.76

Para PRUX, “informar faz parte da boa-fé objetiva (como padrão de comportamento a ser aplicado), devendo a informação ser acrescida do aconselhamento ministrado pelo profissional para que o consumidor, desde a escolha, possa obter os melhores efeitos do contrato, ou seja, o ideal de satisfação de sua necessidade da melhor forma possível.”

  1. Evolução contratual nas relações de consumo

Historicamente, temos que a evolução comercial está intimamente relacionada à evolução do homem como personagem social o qual é, notadamente as relações de comércio nos tempos hodiernos se tornaram mais múltiplas, complexas e conexas entre si. Neste pensamento, com a evolução do modo ou modelo de produção capitalista, em via de consequência, tivemos o desenvolvimento das relações comerciais, dentre todas elas as simples relações de mero consumo. E considerando a necessidade de através da norma jurídica (r)estabelecer o necessário equilíbrio em uma relação jurídica notadamente alterada (produtor/fornecedor-consumidor), fora criado o chamado Código de Defesa e proteção do Consumidor – CDC.

Neste aspecto e vislumbrando alcançar a referida igualdade entre as parte contratantes, o Código do Consumidor trouxe o instituto da teoria do risco do empreendimento, assim todo aquele que exerce uma atividade em forma de empresa ou não é responsável pelos riscos que advindos na constituição desse fim, seja para o fornecimento de bens ou de serviços, respondendo pelos fatos e vícios oriundos da prestação, independente de culpa. O propósito da lei é a proteção plena do consumidor como elo mais frágil da relação, que não pode ser imputado a si os riscos oriundos das relações de consumo.

Ressalte-se aqui que por diversas vezes a relação consumerista assume características específicas dos contratos mercantis, exigindo-se nesse contexto a elaboração das mais diversas cláusulas contratuais, a mingua da discussão com o consumidor. Sob a mesma análise, alguns fornecedores, claramente vislumbrando o afastamento total ou parcial da proteção da lei dada aos consumidores, ao apresentar minutas dos contratos, desconsidera os termos especializados e especificados do Código de Defesa e proteção do Consumidor e aplica simplesmente a legislação referente à seara privatista no tocante ao Código Civil de 2002.

Importante destacar, ademais que por estarmos diante das relações de consumo, ou seja, aquela relação jurídica realizada entre o fornecedor de produtos ou serviços e consumidor, devemos utilizar o princípio denominado especialidade legislativa, assim sendo, a lei aplicável é aquela disposta no Código de Defesa do Consumidor.

Ocorre que, mesmo após o advento do CDC, muitas empresas fabricantes de produtos e prestadores de serviços, seja tacitamente ou contratualmente, ousam burlar os ditames legais com fins de utilizar o Código Civil como parâmetro contratual e assim induzir o Consumidor a erro de modo a realizar oneração ou vantagem indevida ante o próprio desconhecimento da lei pela outra parte.

Exemplificando esse embate acima referido, é interessante ressaltar os desacordos que ocorriam entre as entidades financeiras e seus clientes. Essa ação, após um longo debate na aplicabilidade de suas normas, foi julgada procedente pelo Supremo Tribunal Federal brasileiro, entendendo nossa Corte Máxima que a relação entre os bancos e os seus correntistas ou investidores no papel de operação de crédito é de consumo e que as instituições financeiras deve respeitar o Código de Defesa e Proteção ao Consumidor.

O jornal Gazeta Mercantil na edição de oito de junho de 2006 pág. 09 diz que:

“Por nove votos a dois, o Supremo Tribunal Federal decidiu que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) deve ser aplicado também nas relações entre bancos, instituições financeiras em geral e seus clientes -inclusive no questionamento de taxas de juros abusivas- ao fim do julgamento de uma ação de inconstitucionalidade proposta pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif), iniciado em 2002, e que foi interrompido por sucessivos pedidos de vista. Os votos vencedores foram na linha de que esse tipo de relação é "tipicamente de consumo", com exceção da fixação da taxa básica de juros (Selic), competência do Banco Central.”

Não é incomum que determinada empresa ao ser firmado o contrato, indevidamente, alegar em cláusula o direito de receber valores a título de cancelamento da compra ou do serviço, exigindo, dentre outros, multas contratuais de caráter exorbitante. Utilizando-se para este fim, interpretação completamente equivocada do próprio CDC com o fito de confundir o consumidor ao erro pela citação.

Assim, as empresas ao apresentarem seus contratos previamente formulados, ou seja, contratos de adesão, que se limitam no tocante ao debate sob as suas cláusulas que é inexistente ou pouco maleável indicam uma série de legislações e doutrinas para a satisfação do contrato, muitos deles se revestindo de aparente (in)validade perante o consumidor/cliente, que não possui em muitas relações o conhecimento técnico necessário e suficiente da legislação adequada a ser aplicada, e pela a ausência de profissional do direito próprio, confia nos termos contratuais apresentados e o firma levando em consideração a boa-fé da outra parte.

  1. Abusividade das cláusulas contratuais

Dispõe o art.51 do CDC:

"Art.51º "São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

(...)

IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa fé ou a equidade;.".

Nas palavras de Hélio Zagheto Gama:

"As cláusulas abusivas são aquelas que, inseridas num contrato, possam contaminar o necessário equilíbrio ou possam, se utilizadas, causar uma lesão contratual à parte a quem desfavoreçam".

Segundo Nelson Nery Junior:

"são aquelas notoriamente desfavoráveis à parte mais fraca na relação contratual de consumo. São sinônimas de cláusulas abusivas as expressões cláusulas opressivas, onerosas, vexatórias ou, ainda, excessivas...".

Assim, há de se entender que as cláusulas abusivas são aquelas realizadas á mingua dos princípios norteadores do Direito do Consumidor. Nesta senda, objetivando alcançar ao quanto disposto no CDC, todos os contratos celebrados entre o consumidor e o fornecedor de produtos ou prestador de serviços devem ser realizados conforme as normas protetivas do consumidor.

Ratificando os termos acima esposados, o Direito do Consumidor como instituto próprio serve para basilar as relações consumeristas em face do famigerado poder predatório do capitalismo crescente, o qual prescinde de parâmetro norteador das possibilidades de alcance do seu livre arbitro com o fito de fomentar o principio constitucional da dignidade da pessoa humana.

Os tribunais como instancia superior e uniformizadora das decisões cognitivas de primeiro grau, já estão garantindo em sede recursal a anulabilidade das cláusulas que afrontem aos ditames legais e específicos.

Assim, frente ao embate entre os consumidores e fornecedores deve ser garantindo a insuficiência daqueles em face destes, tornando qualquer pactuação desvirtuadora considerada nula de pleno direito e suas cláusulas revogadas.

Cumprindo destacar que somente a cláusula abusiva será considerada nula, as demais, ao acaso de cumprirem os preceitos do Código de Defesa e Proteção ao Consumidor são consideradas válidas e por isso merecedora do seu completo adimplemento por parte do consumidor, tudo isto em vista do principio da segurança jurídica.

Veja-se abaixo as jurisprudências colecionadas a este respeito:

"Assim, a mais abalizada doutrina e atual jurisprudência, com os olhos postos no presente, têm decidido em casos tais que, cláusulas como essa do instrumento havido entre as partes ostentam-se indisfarçavelmente ineficazes e sequer possível o seu aproveitamento". (STJ – AG Nº 170.699 –MG (97/0088907-6) (Anexo II)

"Conflito de Competência. Competência Territorial. Foro de Eleição. Cláusula Abusiva O juiz do foro escolhido em contrato de adesão pode declarar de ofício a nulidade da cláusula e declinar da sua competência para o juízo do foro do domicílio do réu. Prevalência da norma de ordem pública que define o consumidor como hipossuficiente e garante sua defesa em juízo". (STJ, Processo N°: 21540, Órgão: Segunda Seção, Relator: Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ-24/08/1998)

"Competência. Código de Defesa do Consumidor. Cláusula de eleição de foro. Contrato de adesão. Cláusula de eleição de foro, em contrato de adesão, de que resulta dificuldade para a defesa do réu. Tratando-se de ação derivada de relação de consumo, em que deve ser facilitada a defesa do direito do consumidor (Art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor), impende considerar como absoluta a competência do foro do domicílio do réu, não se exigindo, pois, exceção de incompetência. Conflito conhecido." ( S.T.J. - 2ª Seção - j. em 13.05.1998, DJU de 16.11.98 )

Assim, com espeque nesses posicionamentos jurisprudenciais nota-se claramente a possibilidade da anulação das cláusulas frontalmente nocivas ao direito do consumidor.

  1. Considerações finais

Ao passo em que o modo de produção capitalista se desenvolve ao ponto de abranger a todos os segmentos da sociedade, é necessário o estabelecimento de normas protetivas ao consumidor com o fulcro de garantir a consecução do principio constitucional da dignidade da pessoa humana.

O contrato de prestação de serviços telefônicos por sua vez, não é diferente das outras formas de prestação do serviço.

Ao consumidor não deve ser posto a continuidade de uma relação contratual alheia ao seu bem estar. Uma má prestação de serviço telefônico pautada em rede sem linha, cobrança de preços abusivos ou outras intempéries configura abuso do poder contratual e classifica a clausula de sua permanência totalmente abusiva e consequentemente não escrita ou sem efeito.

É garantia do contratante, que o serviço por si contratado para ser prestado ocorra com fundamento na sua boa realização e eficiência, fora desses conceitos básicos que reafirmam ao princípio da proporcionalidade e razoabilidade devem ser excluídas ao caso concreto.

Difícil é para o judiciário estabelecer com precisão parâmetros concretos e avaliadores da abusividade das cláusulas. Devendo para isso, abrir mão de critérios do bom-senso aliado ao caso concreto para perceber se houve ou não prejuízo exacerbado ao consumidor.

Assim, deve ser garantido o acesso à justiça do ele mais fraco na relação consumerista ao pleitear a anulação das cláusulas de fidelidade ao serem consideradas abusivas pois não deve ser permitido ao consumidor permanecer obrigatoriamente em uma má prestação de serviço.

As clausulas de fidelidade, como o próprio nome já sugere, garante a continuidade compulsória na contratação da prestação de um serviço. Dessa forma, ao contratante é adstrito a descontinuação unilateral da respectiva prestação salvo se acordado entre as partes.

Ocorre que, como já bem apontado no artigo, deve ser garantido ao consumidor o direito da descontinuidade contratual por isso se classificar como uma c

cláusula abusiva, devendo o poder judiciário declarar a nulidade dessas cláusulas como forma de garantira tão esperada proteção total ao consumidor.

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Sobre o autor
Leonardo Maciel

Graduado em Direito pela Universidade Católica do Salvador UCSAL, pósgraduado em Direito Administrativo pela Universidade Cândido Mendes (RJ), Pósgraduando em Docência para o ensino superior pela Faculdade Católica Paulista (SP), Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Nacional de Córdoba (ARG). Autor de diversos artigos baseado na linha de pesquisa da efetividade do Direito e limitação da intervenção Estatal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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