Os poderes da Administração Pública

10/04/2015 às 16:17
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Para que os agentes públicos possam agir em nome do Estado a lei lhes confere algumas prerrogativas posto que devem ter por meta, a satisfação dos interesses públicos, Estas prerrogativas devem conformar-se aos princípios da Administração Pública.

Para que os agentes públicos possam agir em nome do Estado a lei lhes confere algumas prerrogativas posto que devem ter por meta, a satisfação dos interesses públicos, Estas prerrogativas devem conformar-se aos princípios da Administração Pública. São os chamados poderes do administrador público.

Celso Antônio Bandeira de Mello adverte que tais prerrogativas não podem de forma alguma ser exercitadas com a mesma autonomia e liberdade com as quais os particulares exercitam seus direitos, pelo fato da Administração exercer função administrativa, que significa estar alguém “investido no dever de satisfazer dadas finalidades em prol do interesse de outrem, necessitando, para tanto, manejar os poderes requeridos para supri-las.”

Assim, tais poderes são instrumentais pois se destinam a satisfazer os interesses públicos e não os interesses do agente público. Desta forma, entende o doutrinador, que melhor seria denominá-los de “deveres-poderes”, pois o poder subordina-se ao dever, e assim, torna-se evidente a finalidade de tais prerrogativas e suas limitações.

A doutrina, geralmente destaca os seguintes poderes: poder vinculado; poder discricionário; poder normativo; poder hierárquico; poder disciplinar e poder de polícia.

Vamos analisar cada um dos poderes descritos para melhor compreendê-los.

Poder Vinculado

Segundo Hely Lopes Meirelles

“Poder vinculado ou regrado é aquele que o Direito Positivo – a lei – confere à Administração Pública para a prática de ato de sua competência, determinando os elementos e requisitos necessários à sua formalização”.

Como se vê, na expedição destes atos, fica o administrador condicionado ao que diz a norma legal, ou seja, não tem liberdade de ação, pois se o ato for praticado sem observância de qualquer dado constante na lei, é nulo, situação que pode ser reconhecida pela própria Administração, ou pelo Judiciário mediante provocação do interessado

O doutrinador citado esclarece que

“dificilmente encontraremos um ato administrativo inteiramente vinculado, porque haverá sempre aspectos sobre os quais a Administração terá opções na sua realização. Mas o que caracteriza o ato vinculado é a predominância de especificações da lei sobre os elementos deixados livres para a Administração”

A competência, a forma e a finalidade são sempre elementos vinculados que não podem ser desprezados pelo Administrador, podendo a norma legal indicar outros para a realização do ato.

Poder Discricionário

Caracteriza-se como o poder, conferido ao administrador, para a prática de atos administrativos, dentro de parâmetros legais, pautado no seu juízo de oportunidade e conveniência.

Não deve em hipótese alguma ser confundido, o ato discricionário, com o ato arbitrário ou abusivo, pois este último encontra-se contaminado pelo vício da ilegalidade, da ilegitimidade ou do abuso.

Ao usar o poder discricionário o agente deve fazer a escolha dentro das alternativas permitidas pelo ordenamento, sob pena de não o fazendo, resvalar na arbitrariedade.

A autoridade que o exerce deve sempre priorizar o interesse público de acordo com a competência que lhe foi dada e, portanto, sua escolha tem limites.

A doutrina tem se debruçado sobre os questionamentos que envolvem o poder discricionário e os conceitos jurídicos indeterminados.

Conceitos jurídicos indeterminados são conceitos amplos, usados no direito público e também no direito privado, tais como boa-fé, valor histórico e cultural, ordem pública, justo preço, etc.

A questão debatida é se a presença de conceitos jurídicos indeterminados, conduziria ao uso do poder discricionário. Duas correntes opostas se formaram. Entretanto, parece coerente a posição de Odete Medauar ao afirmar: “Havendo parâmetros de objetividade para enquadrar a situação fática na fórmula ampla, ensejando uma única solução, não há que se falar em discricionariedade. Se a fórnula ampla, aplicada a uma situação fática admitir margem de escolha de soluções, todas igualmente válidas e fundamentadas na noção, o poder discricionário se exerce.”

Portanto, pode se dizer, que existe discricionariedade quando a lei permite ao Administrador liberdade para atuar dentro de certos limites e também quando, havendo na lei conceitos jurídicos indeterminados, surgir a possibilidade de escolha em relação ao caso concreto. No que tange ao controle judicial dos atos discricionários não mais persiste controvérsia, posto que a observância dos limites do ato discricionário objetivo proteger atos, que embora pautados no poder discricionário, revestem-se de arbitrariedade. O julgador, portanto, pode averiguar estes limites, sendo-lhe vedado, somente, substituir o mérito administrativo, ou seja, substituir os critérios de conveniência e oportunidade do administrador, pela valoração destes critérios pelo juiz.

Na aferição deste controle, assumem fundamental importância os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

O princípio da razoabilidade guarda o sentido de adequação entre os meios utilizados pelo Administrador e os fins a serem alcançados conforme previsto na norma. Respeitar o princípio da razoabilidade significa que o administrador deve evitar impor aos administrados, obrigações, restrições ou sanções que excedam o estritamente necessário para atender ao interesse público. Este princípio tem por escopo evitar condutas desequilibradas, desmedidas, que possam extrapolar os deveres conferidos pela lei aos agentes públicos.

Celso Antônio Bandeira de Mello define os contornos deste princípio. Segundo ele “a Administração ao atuar no exercício de discrição, terá que obedecer a critérios aceitáveis do ponto de vista racional, em sintonia com o senso normal de pessoas equilibradas e respeitosas das finalidades que presidiram a outorga da competência exercida. Vale dizer: pretende se colocar em claro que não serão apenas inconvenientes, mas também ilegítimas e, portanto, jurisdicional mente invalidáveis – as condutas desarrazoadas, bizarras, incoerentes ou praticadas com desconsideração às situações e circunstâncias que seriam atendidas por quem tivesse atributos normais de prudência, sensatez e disposição de acatamento às finalidades da lei atributiva da discrição manejada.”

O autor defende a correção de atos administrativos discricionários pelo Judiciário, com fundamento neste princípio, pois a liberdade conferida ao Administrador deve ser exercida dentro da lei.

Quanto ao princípio da proporcionalidade, insere-se no princípio da razoabilidade. Isto porque, a conduta razoável exige que os meios utilizados sejam proporcionais ao fim que se pretende, pois caso seja desproporcional, estará caracterizado o excesso na conduta do agente público.

Poder Hierárquico

Segundo Hely Lopes Meirelles

“Poder hierárquico é o de que dispõe o Executivo para distribuir e escalonar as funções de seus órgãos, ordenar e rever a atuação de seus agentes estabelecendo a relação de subordinação entre os servidores de seu quadro de pessoal”

A hierarquia e consequentemente o poder hierárquico só existem no âmbito das atividades administrativas e compreende a prerrogativa que tem a Administração para coordenar, controlar, ordenar e corrigir as atividades administrativas dos órgãos e agentes no seu âmbito interno.

Do poder hierárquico decorre para o superior as prerrogativas de dar ordens, para organizar as atividades, fiscalizar o cumprimento dos deveres de seus subordinados, bem como, rever suas condutas; delegar atribuições e avocá-las, quando necessário.

Para os subordinados decorre o dever de obediência ao superior hierárquico, só podendo furtar-se ao cumprimento de ordens manifestamente ilegais, que caso ocorram, geram para o subordinado, o dever de representar contra a ilegalidade cometida pelo superior.

Os subordinados não podem deixar de cumprir ordens, ou retardá-las, a não ser no caso supra referido, sob pena de incorrerem em falta disciplinar e, ainda, em crime funcional previsto no artigo 319 do CP.

Do poder hierárquico, decorre para o superior, o dever de fiscalizar os atos dos subordinados, para que se enquadrem nos padrões exigidos para as atividades realizadas.

Por delegação, entende-se a possibilidade do superior, delegar a subordinados atribuições genéricas, que não sejam privativas, De forma geral, podem ocorrer dentro de um mesmo Poder, não sendo admitidas, as delegações de um Poder para outro. Não são todas as atribuições que podem ser delegadas, pois as de natureza política são indelegáveis.

A competência é irrenunciável pode ser feita delegação respeitando-se as seguintes regras:

  • A regra é a possibilidade de delegação ao menos que haja impedimento legal
  • A delegação é sempre parcial, não podendo atingir todas as atribuições do cargo ou do órgão
  • O ato que estabelece a delegação deve ter duração certa podendo ser revogada a qualquer tempo, sempre devendo ser publicado o ato nos meios oficiais.
  • A delegação pode conter ressalva de exercício no tocante a atribuição delegada.
  • as decisões tomadas por delegação devem conter expressamente que assim foram feitas, sendo do delegado toda a responsabilidade por seus atos.

Segundo a lei do processo administrativo não podem ser objeto de delegação a edição de atos de caráter normativo; as decisões de recursos administrativos e as matérias de competência exclusiva do órgão ou da autoridade.

Por avocação, entende-se o poder do superior avocar para si, atribuições originariamente entregues ao subordinado. Da mesma forma como não podem ser delegadas atribuições que a lei confere de forma específica a determinado órgão ou agente, também neste caso não se pode avocar. A delegação e a avocação, encontram-se delineadas na lei 9784/99

Por revisão entende-se o poder do superior em rever os atos dos subordinados sob todos os aspectos a fim de mantê-los ou invalidá-los, que seja de ofício ou mediante provocação do interessado. Todavia, permite-se a revisão enquanto o ato não tenha se tornado imutável para a própria Administração, ou que não tenha criado direito subjetivo para o particular oponível à Administração.

Poder Disciplinar

É um poder sancionatório, punitivo, de aplicação de penalidades. Não é qualquer sanção, pois nem toda penalidade decorre do poder disciplinar. O poder disciplinar é exercido somente em relação àqueles que tem um vínculo especial com a administração, que embasem a possibilidade da administração aplicar uma pena.

Ex: multa é penalidade, mas não decorre do poder disciplinar, pois não há nenhum vínculo especial. O Estado te aplica uma multa porque você descumpriu uma norma geral.

Ex2: servidor que descumpre uma regra do estatuto e sofre uma penalidade de suspensão => decorre do poder disciplinar / contratado ao qual se aplica uma multa dentro de um contrato administrativo.

O poder disciplinar é o poder de aplicar penalidades em virtude de um vínculo especial entre a administração e o particular. É a penalidade àqueles que estão sujeitos à disciplina normativa.

O poder disciplinar pode decorrer de hierarquia ou de contratos administrativos (são vínculos especiais que geram a possibilidade de aplicação de penalidades), ou até mesmo por outra vinculação especial.

Ex: 2 meninos numa escola municipal foram suspensos pela diretora da escola => decorre do poder disciplinar, pois a diretora só pode aplicar uma penalidade aos alunos; cria-se um vínculo escola-aluno no momento da matrícula, decorrente do poder disciplinar.

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Poder de Polícia:

É um poder que decorre da supremacia do interesse público sobre o interesse privado. Não exige nenhum vínculo especial entre o particular e o Estado. O Estado estabelece normas gerais e pode aplicar sanções diante do descumprimento dessas normas.

Ex: multa de trânsito.

A polícia administrativa não se confunde com a polícia judiciária (do processo penal, sempre repressiva e investigativa, e incide sobre pessoas). A polícia administrativa tem regulamentação no CTN (artigo 78).

Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

Polícia judiciária

A polícia judiciária é de caráter repressivo. Sua razão de ser é a punição dos infratores da lei penal.

A polícia judiciária se rege pelo Direito Processual Penal. Ela incide sobre pessoas.

A polícia judiciária é exercida pelas corporações especializadas, chamadas de polícia civil e polícia militar.

Características

As características do poder de polícia que costumam ser apontadas são, segundo Maria Sylvia Zanella DI PIETRO, a discricionariedade, a auto-executoriedade e a coercibilidade.

A discricionariedade é uma liberdade existente ao administrador para agir quando a lei deixa certa margem de liberdade para a escolha da oportunidade ou da conveniência de agir, ou, como diz DI PIETRO, "o motivo ou o objeto", do ato a ser realizado. Quando a Administração Pública tiver que decidir "qual o melhor momento de agir, qual o meio de ação mais adequado, qual a sanção cabível diante das previstas na norma legal. Em tais circunstâncias, o poder de polícia será discricionário".

Pode-se dizer, no entanto, que o poder de polícia pode ser discricionário ou vinculado.

Outra característica é a auto-executoriedade. Ela é a possibilidade da Administração utilizar seus próprios meios para executar as suas decisões sem precisar recorrer ao Poder Judiciário.

Como opina DI PIETRO:

"Pelo atributo da auto-executoriedade, a Administração compele materialmente o administrado, usando meios diretos de coação. Por exemplo, ela dissolve uma reunião, apreende mercadorias, interdita uma fábrica".

Finalmente, o poder de polícia tem como característica a coercibilidade indissociavelmente ligada à auto-executoriedade.

Lembra a autora: "O ato de polícia só é auto-executório porque dotado de força coercitiva".(13)

Polícia Administrativa

A polícia administrativa tem caráter preventivo, enquanto a Judiciária tem caráter repressivo, porém, ambas podem, em um ou outro momento, atuar tanto de forma repressiva quanto preventiva.

O que difere a polícia administrativa da Judiciária é ter ocorrido ou não o ilícito penal. Caso o ilícito seja administrativo será polícia administrativa, e em se tratando de ilícito penal agirá a polícia judiciária. A polícia administrativa é regida pelo Direito Administrativo e age sobre bens, direitos ou atividades, enquanto a polícia judiciária incide sobre pessoas. A polícia administrativa é exercida por diversos órgãos da administração e a Judiciária é privativa de corporações especializadas (polícia civil e militar).

Conclusão

Em primeiro lugar, pressupõe-se que todos são iguais perante a lei. No Brasil, desde 1988, realmente o são. Entretanto, o povo brasileiro conquistou o direito de viver uma democracia republicana, onde os esforços do governo devem se dirigir ao atendimento do bem, comum. Isto porque o povo é o soberano nas relações sociais e políticas que se sucedem dentro do nosso conjunto de leis em vigor, de leis que devem ser observadas.

Há de se considerar que os poderes da administração o são em razão mesmo da organização política e social estabelecida a partir da nossa Constituição. O poder de polícia é aquela capacidade, é aquele poder que o Estado tem de delimitar a utilização das liberdades individuais em prol do bem comum.

Dentro do contexto atual, de que vivemos dentro de um Estado de Direito, há de haver um verdadeiro respeito às leis pelo Poder Público para que prevaleçam as raízes, os próprios pensamentos sobre os quais foi elaborado o modelo de Estado adotado em nossa Constituição.

São notórios os exemplos de desrespeito à lei por parte de órgãos e agentes públicos em prejuízo não só aos indivíduos que fazem parte das relações onde o poder é verdadeiramente desviado, mas também a toda a nação brasileira.

Todos os nossos esforços devem ser efetivados no sentido de que tais desvios sejam detectados, e que se punam os responsáveis.

Referências.

BARRETO, Alex Muniz. Direito Administrativo Positivo. 2ª edição, Rio de Janeiro, Grupo Gen, Editora Forense, 2010.

JÚNIOR, Aloísio Zimmer. Direito Administrativo Teoria Resumida. São Paulo, Grupo Gen, Editora Método.

MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 10ª. Edição revista e atualizada. 2006. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. 24ª edição, São Paulo, Editora Malheiros, 1999.

NOHARA, Irene Patrícia. Direito Administrativo. Série Leituras Jurídicas – Provas e Concursos. 2ª. Edição, 2006, São Paulo, Editora Altas.

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo descomplicado. São Paulo, Editora Método, 2009.

DI PIETRO, Maria Sylvia. Direito Administrativo. São Paulo, Editora Atlas, 2008.

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo, Editora Malheiros, 2004.

BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. São Paulo, Editora Saraiva, 1999.

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Harrisson S. Poggio

Graduando em Direito

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